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quinta-feira, 7 de julho de 2016

AS FAMÍLIAS E SUAS VERDADES SECRETAS


"Cheguei muito próximo da ruína completa, à vista de toda a comunidade! Portanto, bebe a água da tua própria fonte, sacia tua sede com as águas que brotam do teu próprio poço. Por que deixar que os teus ribeiros transbordem pelas ruas e as tuas fontes. Que tais mananciais sejam exclusivamente teus, jamais divididos com quem bendita seja a tua fonte! Alegra-te sobremaneira com a tua esposa. Sê feliz gazela ardorosa, corsa graciosa; que os seios da tua esposa sempre te fartem de prazer, e seu amor te extasie de carinhos todos os dias de tua vida. Por qual razão, filho meu, andarias descontrolado atrás de uma mulher imoral? Por que acariciar outros seios que não os de tua esposa? Os caminhos do homem estão diante dos olhos do SENHOR, e Ele examina atentamente todos os seus passos! Quanto ao perverso, são suas próprias iniquidades que o amarram e o fazem prisioneiro das cordas do seu pecado. Com toda a certeza, ele morrerá por falta de controle; andará inseguro e cambaleante." - Provérbios 5:14-23 (versão King James Atualizada) 
O lamentável episódio ocorrido com a pastora e missionária Bianca Toledo, que veio a público acusar o ex-marido, também pastor, de ser homossexual e pedófilo, tendo ele, segundo ela, supostamente abusado sexualmente de seu filho (fruto dela com outro relacionamento anterior), um garotinho de apenas 5 anos (o caso chocante tomou as redes sociais e a imprensa em geral), me chamou a atenção para a seguinte questão: qual família não tem seus segredos? 

A tão sonhada família perfeita simplesmente não existe, a não ser na mentalidade frutífera dos publicitários na criação de comerciais para margarina e, claro, na mente obtusa de muitos crentes (não há ninguém que viva mais de utopias do que os crentes). A banda Engenheiros do Hawaii, em um dos seus hits da década de 80 cantava: "...Nós dois temos os mesmo defeitos, sabemos tudo a nosso respeito... ('Pra Ser Sincero - Humberto Gessinger)". 

Muitas histórias de família chegam a assustar as pessoas e despertam perguntas intrigantes: "Como isso foi possível"? A Bíblia, que não é um livro de psicologia, apresenta alguns relatos fantásticos, cheios de mistérios e, ao mesmo tempo, repletos de revelações que indicam rumos de famílias em todos os tempos. 

Os comportamentos dos integrantes de uma família não são questionados jamais; aliás, acontece sempre uma cumplicidade, aquele emaranhado que une aprisiona todos debaixo de um mesmo sistema. Quando alguém, um terapeuta, o pastor, um médico, algum conselheiro, levanta determinado problema e procura a base de sua resolução nos comportamentos da família, certamente vai encontrar ma resistência muito grande. 

Na verdade, a família percebe que aquele fio condutor, a carga de informações da árvore genealógica, os focos eternos dos relacionamentos, serão descobertos; e ninguém quer que isto aconteça. 

Vamos colocar as bases do nosso raciocínio sobre o problema que agora está diante dos nossos olhos, um dos mais importantes para a compreensão da nossa família:

  • 1) Nenhum comportamento é casual, acidental, aleatório, no que diz respeito a autoridade, valores, educação definição de papéis e funções, normas e regras;
  • 2) Toda família define, logo no início de sua história, uma maneira de funcionar, de viver, de existir, que será transmitida às gerações. Quer saber onde tudo começou? Vá ao primeiro momento, à raiz da árvore de sua família e venha seguindo a linha de "coincidências" e semelhanças ao do tempo.

O funcionamento da família


  •  Um caso verídico


Me lembro de um caso que testemunhei pessoalmente na igreja em que congregava. Tinha um homem, diácono, sempre muito solícito e simpático com todos, que gozava de plena admiração e confiança do pastor. Ele e a esposa eram membros do coral. Os filhos todos na igreja. Quem olhasse para aquela família, diria com base no que via: "Eis uma família abençoada!" Como eu fazia parte do grupo de intercessão na igreja, era muito comum a realização de visitas e cultos nos lares, conforme solicitado pelas famílias. Pois bem, a esposa desse ilibado diácono solicitou que a equipe realizasse uma campanha de oração em sua casa, pois estava enfrentando alguns desafios.

Lá fomos nós. Como o homem trabalhava, os filhos adolescentes estudavam e as visitas eram realizadas no período da tarde, a mulher geralmente era quem nos recebia. Se sentindo mais "à vontade", ela começou a compartilhar os fatos que estavam tirando sua paz de espírito. 

O marido sofria de compulsão sexual, contratava os serviços de garotas de programa e era viciado em pornografia. Alugava filmes pornográficos e forçava ela a assistir com ele. Além de exigir que ela praticasse com ele todos os absurdos mostrados nos filmes (sexo anal, uso de objetos - ela nos mostrou uma mala cheia deles -, sado-masoquismos...), ele a estuprava violentamente quando ela se recusava a saciar sua incontrolável tara insana. Ela contou que numa das vezes em que os filhos estavam de férias na casa dos avôs, ele a trancou em casa e a obrigou fazer sexo com ele praticamente o dia inteiro!

Aos prantos, aquela senhora começou a narrar que apanhava do marido (mostrou os hematomas nas costas e pernas...) e que ela estava desesperada, pois ele queria que ela fizesse sexo com ele e uma garota de programa. Nós, ouvimos tudo estarrecidos! Olhava para o desespero daquela mulher sofrida e buscava, sem encontrar, um traço sequer daquela alegre senhora que desfilava orgulhosa ao lado do marido e dos filhos nas reuniões de cultos da igreja.

Oramos com aquela irmã, nos compadecendo de sua aflição e levamos o caso ao conhecimento do pastor (que, inclusive na época era capitão da PM) que não fez absolutamente nada. Acho até que ele não acreditou nos horrores que contamos a ele que aquela senhora estava passando na mão do marido. Continuou tudo como sempre: eles no coral da igreja, servindo como diáconos e passando para a igreja a falsa imagem de uma família perfeita. Uma verdadeira ode à hipocrisia.

Obviamente que a senhora não disfarçava seu constrangimento diante de cada de nós com quem ela compartilhou tudo aquilo, mas nós tivemos a sabedoria e a maturidade de respeitá-la, mantendo tudo em sigilo diante da igreja e apenas prosseguimos ajudando-a em oração. (...) [Se fosse hoje, eu não pestanejaria em orientar essa senhora a denunciar o marido tarado à polícia e registrar um boletim de ocorrência por agressão e estupro contra o infeliz!]

Tínhamos dois problemas: sabíamos o segredo de uma família e não estávamos tratando ou aconselhando a família, mas somente orando. Como não tínhamos autoridade para chegar ao homem (a mulher pediu segredo e o pastor nos proibiu de falar qualquer coisa com ele), deixamos aquela questão em aberto e cada um foi levando sua vida.

Nenhum de nós tínhamos entendimento o suficiente para investigar o funcionamento das famílias. Isto acontece numa espécie de "contrato", que não é escrito, mas é proposto por palavras, gestos, padrões e as regras das famílias de origem.

Aquela mulher que ouve o namorado logo no início do namoro: "eu não deixo minha mulher trabalhar fora".  O casal entra no matrimônio, a mulher é nova, quer estudar e desenvolver uma profissão o marido diz "não". Ela argumenta, reclama, diz que ele é machista, e ele diz: "você sabia disso, não"? Ele recorre ao "contrato", do tempo do namoro, que definia o funcionamento daquela relação.

Quem nunca ouviu um patriarca dizer: "Na minha família, ninguém se separa", ou. " A religião da minha família é esta". O que ele chama de "minha família" vai além de seu casamento e entra no casamento dos filhos e dos netos e todos são "fiéis" a este contrato, a esta forma de funcionamento que vem a ser a forma de funcionamento dos demais.

O contrato implícito de um casamento pode exigir que a mulher se rebaixe e se submeta, enquanto o marido controla, domina e cresce. Em troca, a mulher recebe sustento, dinheiro, presentes, casa e comida, faz um papel de "coitada feliz", limitada, para que o marido seja o gênio, mostre sua capacidade varonil de conquistar. Normalmente um é são e o outro "doente".

Pausa para a Bíblia


Vamos terminar esta parte com um exemplo bíblico, o de Abraão e Sara, o casal perfeito, mas cheio de "segredos". Esta informação está em Gênesis 12: "...e acontecerá que, quando os egípcios te virem, dirão: 'Esta é mulher dele'. E me matarão a mim, mas a ti guardarão em vida. Dize, peço-te, que és minha irmã, para que me vá bem por tua causa, e que viva a minha alma em atenção a ti." (vs. 12, 13). No versículo 16, Abraão já tem ovelhas, bois, camelos e jumentos, servos e servas; mas no versículo 15, encontramos algo difícil: "...e foi levada a mulher para a casa de Faraó".

No capítulo 20 de Gênesis, há uma segunda história, agora envolvendo um homem chamado Abimeleque, rei de Gerar: "E havendo Abraão dito de Sara, sua mulher, é minha irmã, enviou Abimeleque, rei de Gerar, e tomou a Sara" (v.2). Deus interfere na história e a conclusão é muito interessante: "Respondeu Abraão: porque pensei: Certamente não temor de Deus neste lugar, matar-me-ão por causa da minha mulher. Além disso, ela é realmente minha irmã, filha de meu pai, mas não de minha mãe; e veio a ser minha mulher. Quando Deus me fez sair errante da casa de meu pai, eu lhe disse a ela: esta é a graça que me farás: em todo o lugar aonde formos, dize de mim: Ele é meu irmão (v.11-13). A história termina com Abraão saindo cheio de mais ovelhas, bois, jumentos, servos e servas e moedas de pratas (vv. 14 e 16). Realmente, se deu bem. Sara cumpria o contrato e Abraão ia acumulando riquezas. Esta na Bíblia!!!

Os segredos e suas implicações


Nem toda família é problema, nem todos têm patologias, claro. Há a família saudável, que está estruturada sobre bases coerentes, sólidas, postas com sabedoria e maturidade; porém, estamos considerando, aquela dimensão da dificuldade, das questões que "nunca foram tocadas", mas estão ali, veladas e conhecidas, nunca resolvidas.

A revelação de determinados segredos pode ter a função curativa na vida das pessoas e de muitos relacionamentos; noutro sentido, a revelação de determinados segredos pode colocar as pessoas em perigo, ameaçar o conforto, a imagem da "família feliz".

Existem segredos que, se revelados, vão além de uma briga ou de um desequilíbrio, mas exigem ações policiais, éticas e legais, como é o caso do estupro e da violência física. Precisamos ouvir com cuidado aquela frase "não existem segredos no nosso relacionamento", como se a vida fosse um livro aberto; talvez essa atitude seja a tentativa de revelar algo que ninguém ainda revelou.

O "teatro das perfeições"


Nas relações matrimoniais, existe uma crença que os especialistas chamam de "teatro da perfeição", que é um jogo onde as pessoas se comprometem a "fazer tudo direitinho", inclusive nunca tocar nos temas escondidos, nos problemas, nos segredos do outro. O casal assim passa a zelar por uma imagem e não por uma relação. O problema é manter o faz-de-conta por muito tempo; chega a hora em que tudo o que está equilibrado sobre "segredos" se desmorona e a realidade se mostra.

As pessoas inventam muitas maneiras de "driblar" a revelação do segredo para que possam continuar vivendo, o ser humano é extremamente criativo e possui a capacidade, também, de mentir para si mesmo, aquele exercício desgastante de "fechar os olhos" para os problemas para que eles não sejam maiores que o amor ou o desejo da família.

Geralmente as relações se perdem quando as pessoas estão de "olhos fechados", vulgarizando critérios e condições vitais; a alienação é a opção consciente, algo como "eu decidi que não quero ver". Mas isso não faz problemas desaparecerem e nem resulta na cura de doenças de fundo emocional; na verdade, a perda do sentido vai despertando e alimentando problemas como: desvio da sexualidade (o campeão!), uso de drogas, consumo de álcool, dores, problemas cardíacos, úlceras, câncer e muitos outros.

Por que muita gente tem medo de fazer terapia? Alguns gritam dentro e fora de suas casas: "Isso aí é pra quem está louco; eu não estou louco". Um pastor, dependendo da pessoa com que esteja atendendo, ou mesmo do nível de sua igreja, pode ter problemas sérios se recomendar ou encaminhar alguém para um profissional da terapia. O medo de ter a vida desvendada e os segredos revelados cria artifícios para desviar o foco do problema que vão desde a espiritualização da história até o sacrilégio do "pastor que quer que eu faça um tratamento como se estivesse louco (a)". Imediatamente surge um coro de iguais, que podem trazer as mesmas necessidades para deixar de olhar as suas necessidades, os seus problemas, os seus segredos, e falar do que não interessa: a recomendação do pastor.

Conclusão

Por uma relação transparente

  • Palavra de um solteirão convicto por opção (mas que não tem nada pessoal contra o casamento)


O casamento pode ser uma das mais extraordinárias experiências; pode funcionar como um escudo contra a vida; pode ser um inferno; pode ser um meio de realização, porém, tudo vai depender de uma conquista, com maturidade dos parceiros, desde que conheçam suas histórias e tragam modelos saudáveis de companheirismo, maternidade,paternidade, autoridade, verdade e saúde.

  1. Vida autêntica e sem disfarces - é o que chamamos de padrão de verdade, a maneira mais adequada de estruturar as questões pessoais e relacionais sem desprender energia para suplantar problemas. Alguém já disse que a verdade é independente; Jesus Cristo ensino a prática da verdade como expressão de vida.
  2. Vida proativa - a tendência egoísta das pessoas é a reatividade, isto é, ficar sempre na expectativa de como alguém vai reagir frente às situações que vão surgindo. Na família é assim também: "Se ele(a) quiser receber alguma coisa boa, terá que ser bom(boa)"; as pessoas proativas são geradoras de mudanças, elas enxergam além das condições comuns da vida; elas sabem compartilhar mesmo com a adversidade.
  3. Vida integral - às vezes, queremos dividir a vida em compartimentos, como um sistema de arquivos de um computador; num arquivo está a espiritualidade; noutro, o dinheiro; noutro, a profissão e assim vai. Apesar de fazer sentido, a vida não é fragmentada; é integral. Aqueles que conseguem perceber a integridade da vida estendem seus horizontes para conquistas maiores e melhores porque não estão apoiadas sobre pilares separados, distantes, mas sobre uma plataforma onde muitos elementos estão interagindo num conjunto completo.
  4. Vida de comunhão -  a questão religiosa deve ser discutida e trabalhada na família com naturalidade, uma experiência de prazer, convincente, sem medos, sem culpas, sem coação, livre para adorar a Deus em "espírito e em verdade."
Podemos terminar este artigo com as palavras do Salmo 37:4: "Deleita-te também no Senhor, e ele te concederá o que deseja o teu coração". Algumas deduções fazemos desse texto: os desejos devem ser coerentes com a vontade de Deus e, assim, saudáveis. Se todos da família pensarem assim, certamente haverá uma família melhor.

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