O texto deste capítulo da série especial "Acontecimentos" é sobre a rede social mais querida pelos brasileiros, que deixou muito legado, várias lembranças e muita saudade. É claro que estou falando do Orkut, um projeto que conquistou o país e virou sinônimo de internet por vários anos aqui.
O início
A "febre" das comunidades
Imagem de uma das inúmeras comunidades do Orkut
Mais de 46 milhões de comunidades, 40 milhões configuradas para idioma português. O Orkut foi a primeira rede social de massa. Em um período em que a internet tornava-se cada vez mais popular, principalmente com o contato das massas graças às Lan Houses e aos preços mais cada vez mais acessíveis dos computadores (além de terem se fixados como uma ferramenta necessária na vida das pessoas), o Orkut surgiu em um momento perfeito. Pela primeira vez na história da internet, e talvez da humanidade, o Orkut registrou gerações diferentes em diferentes partes do mundo, assim como a identidade histórica dessa interação, de maneira integral e crua.
Criado em 19 de janeiro de 2004, pelo engenheiro turco Orkut Büyükkokten, o Orkut, que levou o nome de seu criador, foi um dos sites de relacionamento mais famosos no Brasil e no mundo. Orkut Büyükkokten criou o projeto independente do Orkut para o Google, que passou a incorporar diretamente ao seu serviço de contas em 2005.
O Orkut foi um site de relacionamentos - considerado o embrião das redes sociais na web - onde cada pessoa possuía um perfil, essa podia adicionar amigos, conhecidos, etc, e assim construir sua rede social virtual. Essa foi a ideia principal do Orkut, mas, além disso, o site dispunha de várias ferramentas que o tornavam muito atrativo. Em seus dez anos de existência - de 2004 à 2014, quando, com a chegada do Facebook, começou o seu declínio -, o Orkut foi uma verdadeira febre no Brasil e no mundo.
Como funcionava
Os usuários podiam mandar mensagens, depoimentos, classificar o nível de amizade e até paquerar através das ferramentas do site. De outro lado, existiam as comunidades em que os usuários se identificavam e entravam, juntamente com os fóruns onde as pessoas expressavam suas opiniões.
Além de tudo isso, o Orkut também disponibilizava mais opções ainda, como a possibilidade de saber quem acessou seu perfil - uma falta que eu sinto no Facebook -, fazer enquetes e adicionar vídeos do site Youtube ao seu perfil.
Em seu apogeu o site teve cerca de 52 milhões de usuários cadastrados e o Brasil foi o país com maior número de usuários, seguido dos Estados Unidos e Índia. Cerca de 55 %, ou seja, 29 milhões de usuários do Orkut eram brasileiros.
Da diversão ao comércio
No ano de 2007, o Google, que antes afirmava que não ganhava lucro diretamente com o site, começou a exibir anúncios e transformar o Orkut em algo lucrativo para a empresa. Outro fato interessante é que em 16 de janeiro de 2007, pela primeira vez na história do site, uma comunidade foi vendida. Tratava-se da comunidade "Eu amo Floripa", que foi adquirida pela empresa RBS. Para divulgar um festival de verão na cidade, a empresa pagou 2 mil reais na "compra" da comunidade.
Problemas históricos na atualidade
Mas nem tudo eram flores. Os problemas do Orkut giravam em torno não do site em si, mas dos usuários mal-intencionados. Perfis falsos (fakes), comunidades polêmicas e difamatórias, conteúdos pedófilos, preconceituosos, etc, eram sérios problemas que surgiram. O Orkut, que se tornou mania nacional, possuía - entre milhares - diversas comunidades com conteúdo racista, que faziam apologia ao uso de drogas, pedofilia etc. A prática de crimes involuntariamente acobertados pelo site de relacionamento cresceu assustadoramente.
Não havia o que se falar em privacidade no Orkut. O site de relacionamentos fez o sucesso que fez justamente porque não havia barreiras para a espionagem da vida alheia. A ordem era fuçar! O usuário do Orkut tinha plena consciência, a partir do momento em que criava seu perfil , que todos teriam acesso à sua página, fotos, recados, depoimentos, etc., portanto a exposição era inevitável e ratificada pelo próprio navegador-aderente.
Além disso, como não havia controle algum sobre os usuários, o site permitia que qualquer pessoa criasse o perfil com o nome de outrem, expondo falsamente sua vida, sem limites. Entretanto, ainda assim, muitas pessoas afirmavam que o uso do Orkut era muito gratificante, pois permitia encontrar amigos do passado, reencontrar pessoas, além de ampliar o círculo social.
O declínio
O começo do fim
A terceira grande mudança veio em 2011, com um novo logotipo e uma leve mudança visual. Mas o auge do Orkut já tinha passado, e em agosto de 2011 segundo o Ibope Nielsen, o Facebook virou a maior rede social do Brasil depois de sete anos de hegemonia.
Os motivos eram vários: o Orkut estava meio abandonado em desenvolvimento e investimentos, o Facebook cresceu em divulgação e rolava até um preconceito por causa da inclusão digital, e a criação do termo "orkutização" pra falar que algo ficou popular demais.
A partir daí, foi só ladeira abaixo. O Orkut virou um lar de spam, as comunidades eram invadidas por jogos tipo "beija ou passa" e muitos crimes eram cometidos lá, de racismo até pedofilia. Em 2006, ele ficou perto de ser proibido no país pela justiça, mas nada aconteceu.
As boas memórias
Mas falando de coisa boa, não dá pra negar que a melhor parte do Orkut eram as comunidades. A gente teve várias consagradas, como a maior do mundo, que era Eu Odeio Acordar Cedo, ou a Discografias, maior central de pirataria da internet brasileira. As comunidades de times de futebol e Cartola bombavam e eu não posso deixar de citar aqui a Futebol Alternativo.
A queda
O fim do Orkut foi lento e doloroso. O Google+ foi lançado em 2011 e, apesar de sempre ter sido deserto, ganhou prioridade na empresa. Em 2013, o Serasa Experian mostrou que o Orkut perdeu 95% do público brasileiro. Ele tentou apostar em lives, parcerias com artistas, mas não deu certo.
A rede social foi encerrada ainda com 5 milhões de usuários ativos. Não era mais possível postar, criar perfis nem receber scraps e depoimentos. Um arquivo com as comunidades ficou disponível pra conferência, mas também saiu do ar. Além disso, dava pra fazer o backup de fotos e outros conteúdos da conta até setembro de 2016.
Acompanhe o passo a passo da criação ao declínio do Orkut
- Janeiro de 2004 - Em um belo dia de janeiro, Orkut Büyükkökten, funcionário do Google, decide criar uma rede social e entitulá-la com o seu próprio nome.
- Abril de 2005 - Com a popularidade crescendo cada vez mais no Brasil, o Orkut ganha sua versão em português.
- Fevereiro de 2008 - Com os usuários usando os depoimentos para enviar recados privados, a rede social finalmente implementa as mensagens privadas (não que mude alguma coisa, todos ainda assim usavam os depoimentos).
- Outubro de 2008 - Por conta de um aumento de casos de pedofilia dentro da rede, o Wall Street Journal publica reportagem sobre os problemas do Google com o Orkut no Brasil. Surpreendentemente, as ações da gigante despencam.
- Novembro 2009 - Em seu auge de popularidade, a rede social arrisca com o lançamento de um novo redesenho. O Novo Orkut era mais rápido e bonito e até oferecia mais opções de personalização, como cores e temas.
- Abril de 2010 - Interações entre os usuários ficam mais fortes com o lançamento do BuddyPoke. O aplicativo de bonequinhos que interagiam com os dos seus amigos e ainda podiam ser customizados.
- Março de 2011 - Com o Facebook silenciosamente atacando o mercado brasileiro, o Orkut passa por uma nova onda de atualizações e se transforma. Agora as fotos de perfil são maiores e as imagens são visualizadas em tela cheia.
- Outubro de 2012 - Chegando ao fim por completo de seu reinado, o Google quietamente para de atualizar o blog oficial do Orkut.
- Dezembro de 2013 - Embora o Facebook já esteja dominando o Brasil, uma pesquisa da comScore revela que 6 milhões de pessoas ainda usavam o Orkut mensalmente.
- Junho de 2014 - O Google finalmente anuncia que estaria desligando por completo a rede social.
Conclusão
Em março de 2011, o presidente do Google, Eric Schmidt, ainda estava divulgando a proeminência do Orkut no Brasil como um sinal de que o Google tinha uma rede social a ser reconhecida. Naquela época, o Orkut tinha 32,7 milhões de usuários no Brasil - três vezes mais que o Facebook.
Mas isso não durou muito. Seis meses depois, o Facebook assumiu a liderança e o Orkut nunca mais reinou. Em um estudo da comScore sobre o tempo gasto em redes sociais no Brasil, o Facebook liderou com 92,8% do total. O Orkut tinha menos de 2%.
A dominância do Facebook foi um dos principais motivos, mas para o criador do Orkut, no entanto, o verdadeiro motivo está relacionado à evolução das redes sociais.
"É muito importante inovar sempre e manter-se em contato com as gerações, padrões de uso e temas sensíveis à comunidade. As redes sociais que não evoluem ao longo do tempo correm o risco de ficar desatualizadas ou irrelevantes",
explicou Orkut Büyükkökten, em entrevista ao site TechTudo realizada em 2017.
Já esquecido pela maioria dos brasileiros por causa do Facebook, o Orkut foi deixado de lado pelo Google. Em um comunicado publicado em 30 de junho de 2014, a empresa anunciou que iria descontinuar a rede social a partir do dia 30 de setembro. O Google, na época, apostava suas fichas no Google+, que recentemente também também foi descontinuado.
O Orkut pessoa não desistiu depois de ver o seu projeto morrer. Em 2016 o criador do Orkut trouxe de volta as comunidades, o que atraiu usuários da velha rede social do Google para a nova plataforma, que inclusive herdou o domínio do site anterior e tem como objetivo conectar pessoas por amizades profundas, não apenas gostos iguais.
Lógico que ela não conquistou a popularidade do Orkut.
Com a missão de combater o avanço do Facebook, a Hello reviveu uma série de recursos do Orkut e apostou neles como "diferencial". Entretanto, se as funções do Orkut ainda fazem sucesso, por que o Google encerrou o projeto mesmo sob protesto de alguns usuários?
Tem ainda a Orkuti, com i no final, que tentou reviver a proposta do velho site e até se deu bem por algum tempo, mas também não prosperou. A rede social russa VK, que é bem parecida em interface e funcionamento, até recebeu alguns saudosistas, mas virou algo bem de nicho.
E essa é a história do Orkut, a rede social que era brasileira de coração e que muita gente ainda não superou. Eu não cheguei a ter perfil no Orkut, tinha uma certa resistência com a ideia da superexposição, que foi superada com a vinda do Facebook, mas, e você, chegou a ter sua comunidade no Orkut, ainda tem saudade?
[Fonte: Obvious, Brasil Escola, Techmundo; Leia Já]
A Deus toda glória.
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