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segunda-feira, 7 de novembro de 2016

GOD SAVE THE AMERICA!

Amanhã conheceremos quem será o novo presidente da nação mais importante do mundo. Se os EUA são a nação mais importante do mundo - quanto a isso não há dúvida - , é óbvio que o resultado dessa que está sendo considerada a eleição mais polarizada de todos os tempos lá nas terras do tio San irá interferir e/ou mexer com todas as demais nações do globo terrestre.

Lowered the level¹


Desde o início de 2016, o quadro eleitoral norte-americano desenha-se em torno de linhas de retrocesso. Contrastando com 2008, quando Barack Obama, um novo candidato jovem, negro, carismático, emergiu no Partido Democrata derrotando a até então favorita senadora e ex-primeira dama Hillary Clinton nas primárias, a conjuntura eleitoral é desalentadora.

Pelo lado democrata, Clinton será confirmada e, pelo republicano, o excêntrico milionário do ramo da construção civil Donald Trump foi o escolhido, e a nação estará imersa em uma batalha pela Casa Branca que tem o potencial de ser uma das de mais baixo nível das últimas décadas.

De 2008 à 2016


Em 2008, a eleição de Obama foi pela mudança, e o retrato de um país dividido: sua vitória deu voz às minorias e representava a ascensão de uma América multirracial e multicultural, cujo perfil populacional, social e de renda encontra-se em transição. 

De uma nação branca, anglo-saxã e protestante (WASP- White, Anglo-Saxon and Protestant), os Estados Unidos estão se consolidando como um país negro, latino e miscigenado. De um país rico, de forte classe média em um espaço de crescente linha de pobreza, exclusão social e tensões raciais, incluindo as polarizações de gênero e valorativas. 

No ano da eclosão da maior recessão contemporânea nos núcleos do poder mundial (Estados Unidos e União Europeia), Obama trazia a esperança da conciliação e a quebra do militarismo e unilateralismo da gestão W. Bush, que cresceu à sombra do medo e da restrição às liberdades civis geradas pelo 11/09/2001. 

Duas eleições depois, os Estados Unidos permanecem divididos em uma guerra de secessão, que se assemelha à do século XIX, quando travaram uma batalha sangrenta, que os dividiu entre a modernização e o retrocesso, entre o Norte industrial e o Sul escravocrata. 

Ainda que usemos novos termos para definir os interlocutores, a raiz do problema é a mesma: olhar para o futuro ou permanecer no passado. Se Obama foi a face da América em 2008, Trump e Hillary são a América de 2016. Mas como chegamos a Hillary e Trump, principalmente Trump? 

The division and the union²


A presidência Obama cumpriu menos do que prometeu: em termos internos existiram avanços em muitos temas sociais, especialmente gênero e direitos das minorias, mas a pobreza, a exclusão e perda de renda continuam. A violência é endêmica, alimentada pelo preconceito e pela cultura da arma. Somados a isso, o racismo e a intolerância mútua crescem, simbolizados por uma guerra civil diária, em desrespeito aos direitos humanos. 

Mesmo que parte da mídia brasileira ignore estes fatos, as bases domésticas do poder estadunidense sofrem há mais de vinte anos um processo de desgaste. Neste processo, a exclusão social é componente da secessão: enquanto o grupo que perde poder quer se manter sólido e se reorganiza em torno de novos nomes como Trump e "movimentos", aqueles à margem demandam que a democracia em seu país, nos mesmos moldes que os Estados Unidos pregam para outras nações.

  • Externamente, Obama manteve a postura hegemônica: mudou discursos e práticas, 
  • ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2009, 
  • retirou as tropas do Iraque (2011) e Afeganistão (2014), interveio na Líbia (2011), 
  • contém os emergentes representados pelos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), 
  • faz ingerências, 
  • retomou as relações com Cuba (2014), sem abrir mão do embargo, fechou o Acordo Nuclear com o Irã em 2015(depois de descartar o Acordo Tripartite Brasil-Irã-Turquia de 2010), 
  • bombardeia por via aérea o Estado Islâmico, 
  • ignora a crise dos refugiados na União Europeia, dentre outros fatos (e a lista continua). 
É nesse vácuo que se consolidam Clinton e Trump, desaparecem forças tradicionais como os Bush e se impede o crescimento de novos nomes como Marco Rubio e moderados como John Kasich. O republicano Kasich, governador de Ohio, poderia ser um novo Obama, mas não conseguiu competir com a máquina Trump. 

Clinton é quem ocupa este espaço pelos democratas e defenderá a continuidade. Bernie Sanders, seu adversário supostamente de esquerda por defender serviços públicos gratuitos e as revoluções políticas contra Washington, era um candidato tão folclórico e agressivo quanto Trump, e foi rejeitado pelas bases democratas, negros, latinos, classe média baixa, sendo abraçado por jovens brancos e eleitores mais velhos. 

Trump, mesmo confirmado candidato, não representa a unidade: estas divisões ficaram claras na Convenção e o slogan "Nunca Trump" (Never Trump) reproduz a mesma ferocidade verbal do candidato. A contagem de delegados atribuiu votos a Ted Cruz e a John Kasich. Enquanto Kasich representaria, como indicado, a moderação, Cruz é a polarização além de Trump. Cruz não apoiou Trump e pediu aos eleitores um voto consciente. Foi vaiado, mas pode passar sua mensagem que é para muitos a realidade: não votarão em Trump (assim como partidários de Sanders talvez não forneçam suporte a Hillary). 

A despeito de Trump ter conseguido o apoio de alguns eleitores mais religiosos e sintetizar algumas agendas da Tea Party – pró-armas, anti-imigrantes, anti-direitos sociais e civis, anti-aborto – muitos não o consideram representativo dos valores norte-americanos: o estilo frugal pregado por estas comunidades, princípios familiares chocam-se com a riqueza do candidato, seu divórcio, seu egocentrismo. 

A escolha de Mike Pence, governador de Indiana, para vice tenta matizar estas tendências. O constrangimento maior? Só o plágio da fala de Melania Trump, copiada de palavras de Michelle Obama. 

Peace and Love incorporated³


Não houve "paz e amor" no longo discurso de aceitação de Trump. Os ataques concentraram-se na figura de Clinton como representante de uma América falida, violenta e com medo, dirigida por incompetentes. Evitou-se repetir algumas falas mais xenofóbicas e homofóbicas, polêmicas de gênero e religião, mas não se pode esquecer o que foi dito nas primárias. 

Uma breve vista panorâmica da Convenção Republicana mostrava um público majoritariamente branco, masculino, um recorte artificial do país, de vez em quando mesclado por rostos negros que a câmera não se cansava de procurar na multidão. Latinos? Dificilmente.... Coincidências ou o perfil real do Partido e sua agenda de poder? 

Trump repetiu promessas de segurança, prosperidade e geração de empregos e contradições na política externa: vai atacar o Estado Islâmico, mas não é favorável a intervenções, vai defender o comércio, só que pressionando a China. Ruído em cima de ruído, envolto em muita raiva, que compõe um forte show para a mídia de uma figura carismática. 

Usar a verborragia como tática, dizer que é "movimento não política" é apenas jogo de palavras para esconder a ausência programática. As pesquisas eleitorais indicam um empate técnico, o que é preocupante. 

Hillary pode ter seus defeitos, mas representa pelo menos uma coalizão de forças mais progressista dentro de sua heterogeneidade. Cabe à sociedade norte-americana, e como pano de fundo à global, questionar: por que deixamos a agressão verbal e física escalar em silêncio ou só com respostas tímidas? Já temos nossos "Trumps".

Conclusão


Enfim, amanhã (08) o mundo conhecerá o sucessor de Barack Obama na Casa Branca. Porém, qualquer que seja o ganhador, o republicano Donald Trump ou a democrata Hillary Clinton, o resultado desta eleição presidencial americana vai entrar para a história. 

Confira a seguir por que esta disputa é tão diferente de todas as anteriores.

  • 1) Idade 

Barack Obama tinha 47 anos quando assumiu a presidência dos EUA pela primeira vez, em janeiro de 2009 e era o quinto presidente mais jovem da história dos EUA. O mais jovem de todos até agora é Theodore "Theddy" Roosevelt (✰1858/✞1919), o 26º presidente a ocupar a Casa Branca, que tomou posse com 42 anos e 322 dias, em 1901. Donald Trump fez 70 anos em 14 de junho. Se vencer, quebrará o recorde que era de Ronald Reagan (69 anos quando assumiu o poder, em 1981). Já Hillary Clinton completou 69 anos em 26 de outubro. Se ganhar, será a segunda governante mais velha, posição até agora de William Henry Harrison (✰1773/✞1841), o 9º presidente, empossado em 1841. 

  • 2) New York, New York

Donald Trump é de Nova York e Hillary Clinton foi senadora pelo mesmo Estado, embora tenha nascido em Chicago. A disputa entre Trump e Hillary é a primeira entre dois nomes de Nova York desde 1944, quando o governador de Nova York, Thomas E. Dewey (✰1902/✞1971), enfrentou aquele que viria a vencer: Franklin Delano Roosevelt (✰1882/✞1945), o 32º presidente. Desta vez, depois de 71 anos, a Casa Branca receberá um inquilino novaiorquino. Embora tenha nascido em Chicago, no Estado de Illinois, Hillary foi senadora por Nova York, onde vive desde 1999. 

  • 3) Money, money, money 

Se Trump for eleito, será um dos candidatos que menos dinheiro gastou na campanha. Segundo os registros da Comissão Eleitoral Federal dos EUA, até o fim de outubro os gastos dele chegaram a US$ 254 milhões (R$ 796,3 milhões). Ele também financiou parte da sua campanha - Trump gastou do próprio bolso US$ 56 milhões (R$ 175,6 milhões), de acordo com os dados da comissão. O ex-candidato democrata Al Gore era até agora um dos que menos gastara em uma campanha presidencial Ninguém havia gasto tão pouco desde o democrata Al Gore, que em 2000 teve uma despesa de US$ 126 milhões (R$ 395 milhões). Até o momento, Hillary gastou US$ 513 milhões (R$ 1,6 bilhão) e não deve ultrapassar os US$ 556 milhões consumidos na última campanha de Obama (R$ 1,74 bilhão).

  • 4) Inexperiência 

Quando foi eleito em 1953 0 34º presidente, Dwight D. Eisenhower (✰1890/✞1969), tinha experiência como comandante militar durante a Segunda Guerra Mundial. Uma eventual vitória de Trump será importante porque, em mais de 60 anos, ninguém sem experiência política foi eleito governador, deputado ou senador nos EUA. Outro caso foi o do engenheiro Herbert Clark Hoover (✰1874/✞1964), o 31º presidente de 1929 a 1933. Por outro lado, nenhum candidato até hoje era proprietário de uma rede de cassinos e hotéis como Trump. Aliás, ele cita como vantagem sua experiência nos negócios e o fato de não estar profundamente ligado ao meio político de Washington.

  • 5) Uma mulher na Casa Branca? 

Em 2008, o republicano John McCain teve como vice Sarah Palin. Se vencer, Hillary Clinton será a primeira mulher a presidir os EUA, embora não tenha sido a primeira candidata por um dos principais partidos americanos. Por duas vezes, mulheres foram candidatas a vice em chapas derrotadas nas eleições - em 2008 e em 1984 (Geraldine Ferraro, vice do democrata Walter Mondale).

  • 6) Sucessão democrata

Apenas dois democratas foram sucessores diretos de um presidente também democrata. O primeiro foi Martin Van Buren (✰1782/✞1862), o 8º que sucedeu Andrew Jackson (✰1767/✞1645), o 7º em 1837. O outro foi James Buchanan (✰1791/✞1868), o 15º presidente de 1857 a 1861, depois de Franklin Pierce. Harry Truman (✰1884/✞1972) e Lyndon Baines Johnson (✰1908/✞1973) eram vices e tiveram que assumir por causa da morte dos respectivos presidentes. Ambos venceram as eleições seguintes. Uma vitória de Hillary, portanto, teria um importante peso para o Partido Democrata.

E assim, todo o mundo aguarda o resultado da eleição para saber quem irá residir na Casa Branca nos próximos quatro anos.

[Fonte: BBC Brasil. Traduções: ¹Baixou o nível; ²A divisão e a união; ³Corporação paz e amor]

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