Ontem (24), por volta das 20h, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), realizou um polêmico pronunciamento em cadeia nacional de rádio e televisão que ainda está repercutindo, tanto entre as autoridades médicas e políticas, como também entre a sociedade em geral. Há os que se posicionam contra e os que são favoráveis à fala do presidente.
Entre ataques à imprensa e aos governadores que estão restringindo os acessos em alguns estados da federação, assim como incentivando o isolamento social como medida de prevenção ao Covid-19, o presidente defendeu a volta imediata das pessoas aos postos de trabalho, alegando que a população jovem não precisa ficar reclusa ao isolamento e sim apenas os mais idosos e portadores de doenças crônicas. A fala do presidente vai frontalmente contra às recomendações dadas pela OMS (Organização Mundial de Saúde).
Mas será que ele está de todo errado?
Era uma vez um vírus...
No princípio era o vírus. Coronavírus. Em menos de dois meses após a primeira morte, registrada na China em 9 de janeiro, ele atravessou o mundo a bordo de nossos corpos que voam em aviões. Tornou-se onipresente no planeta, ainda que tão invisível quanto certos deuses para olhos humanos.
Hoje, 1,7 bilhão de pessoas, cerca de um quinto da população global, está em isolamento. Escolas, universidades, restaurantes, cinemas e até shoppings cerraram as portas, fronteiras de países e de continentes fecharam, aviões se esvaziaram, presidentes maníacos finalmente foram reconhecidos como presidentes maníacos, neoliberais foram vistos clamando —
"cadê o Estado? cadê o Estado?"
—, ardorosos defensores dos planos privados de saúde compartilharam campanhas pelo fortalecimento do até então malfadado SUS, terraplanistas exigiram respostas da ciência. Por suas hashtags nas janelas do Facebook, Twitter, Whatsapp e Instagram, pessoas decretam: o mundo nunca mais será o mesmo.
Os "profetas do Apocalipse" proclamam que agora sim é chegado o fim do mundo. Outros afirmam que é o julgamento divino em resposta aos pecados da humanidade incrédula. Todos têm respostas e ninguém sabe ao certo o que fazer.
O colapso na saúde ou o colapso na economia? Estão lançados os dados
Desde quando a OMS classificou o surto da Covid-19 como uma pandemia e o Brasil confirmava 52 casos da doença no país, o Governo de Jair Bolsonaro revisava o crescimento brasileiro deste ano de 2,4% para 2,1%. Após o registro das primeiras mortes, das centenas de casos confirmados e um decreto de estado de calamidade pública no país, a revisão dos cálculos da equipe econômica foi bem mais drástica:
- o país caminha para a estagnação e irá crescer próximo de zero, 0,02%, em 2020.
Já os mercados e instituições privadas estimam números bem mais pessimistas. Segundo previsão da Fundação Getulio Vargas (FGV), a economia brasileira poderá ter contração de 4,4% em 2020, com riscos de a atividade ainda sentir efeitos negativos "significativos" até 2023.
Mandetta apela por isolamento para evitar colapso do sistema de saúde no final de abril
Vem aí recessão e demissão. Bares e restaurantes, empresas da área cultural e varejo são dos primeiros a começar a fazer seus cálculos. Em São Paulo, por exemplo, o Estado proibiu o funcionamento do comércio, o gerou impacto na taxa de desemprego, que hoje já é alta, de 11,2%, com uma população desocupada de 11,9 milhões de desempregados.
É uma urgência não só no Brasil, como no mundo. A crise gerada pelo Covid-19 pode aumentar o número de desempregados em quase 25 milhões, segundo estimativa da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e uma perda de renda do trabalhador de 3 trilhões de dólares.
Voo rasante
Por ora, algumas empresas no Brasil tentam adiar o inevitável. Companhias aéreas, por exemplo, optaram por reduções de jornada e salário. A Gol Linhas Aéreas, por exemplo, decidiu reduzir as horas trabalhadas e os salários para funcionários e diretores diante da crise no setor, que é hoje um dos mais afetados com a redução de voos.
A jornada dos colaboradores internos e aeroviários foi reduzida em 35%, assim como as remunerações e benefícios. Já os diretores, vice-presidentes e o CEO terão uma redução salarial de 40%, válida para os meses de abril, maio e junho. A empresa não descarta, no entanto, revisão da medida a depender da evolução da crise gerada pela pandemia. Segundo o Sindicato Nacional dos Aeroviários (SNA), as companhias aéreas apresentaram seus programas sem dar qualquer possibilidade de colocar as propostas em assembleia para a categoria.
O Governo também quer permitir que as empresas afetadas pela crise do coronavírus cortem temporariamente metade da jornada e dos salários dos trabalhadores. Nos próximos dias, uma medida provisória (MP) deve ser editada para flexibilizar normas trabalhistas durante o estado de calamidade pública.
"Não é algo simples, mas a ideia é preservar o emprego. Muito mais grave, diante de uma crise dessa, é a pessoa perder o emprego e sobreviver sem salário",
justificou o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco.
Segundo ele, a ideia é que o trabalhador tenha uma renda de subsistência durante o estado de calamidade. Atualmente, a legislação permite, que por motivos de força maior, as empresas reduzam até 25% da jornada e do salário dos funcionários. Enquanto a proposta não sai do papel, empresários consultam advogados trabalhistas para saber qual caminho tomar. Os funcionários, seguem temerosos, não só do risco do contágio pelo novo coronavírus, mas também pela incerteza do que lhes acontecerá.
Já há demissões
Mas alguns, já começaram seus cortes assim que a epidemia deu as caras no Brasil. Alguns funcionários estão sendo cortados num processo de demissão coletiva.
As grandes fábricas também já começam a fazer seus ajustes e a parar. Várias montadoras, como a Fiat, a Ford, a Volkswagen, a General Motors e a Mercedes-Benz, suspenderam a produção por tempo indeterminado e estão dando férias coletivas para os funcionários. Juntas somam mais de 50.000 funcionários que estarão em casa recolhidos por conta da disseminação da doença.
O governo no olho do furacão
A equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou que pretende pagar uma parcela do seguro-desemprego a trabalhadores que tiverem o salário e a jornada reduzidos pelos empregadores para amenizar os efeitos da Covid-19 na atividade econômica. No último dia 16, Guedes já tinha anunciado um pacote de estímulos de quase 150 bilhões de reais, além de prometer descomprimir o Bolsa Família.
De acordo com a pasta, as pessoas que recebem até dois salários mínimos (2.090 reais) e tiverem a redução de salário e jornada, receberão uma antecipação de 25% do valor de seguro-desemprego a que teriam direito mensalmente. O ministério informou que o menor benefício que será pago será de 261,25 reais e o maior, de 381,22 reais.
Há dúvidas sobre a eficiência da política do Governo que entrou com a promessa de enxugar o Estado, e agora se vê às voltas com as decisão de aumentar o gasto público numa situação de emergência. Guedes anunciou, por exemplo, que a meta fiscal deste ano está suspensa.
"As medidas de Paulo Guedes são interessantes, mas acabam beneficiando as grandes empresas e indústrias. E os pequenos?",
questiona o professor Otto Nogammi, do Insper.
"Quem tem problema de fluxo e estrutura enxuta não tem saída. As medidas não ajudam a sociedade como um todo",
avalia o especialista, em entrevista ao portal do jornal El País.
Ainda de acordo com o El País, a avaliação da corretora XP investimentos, a magnitude das medidas da equipe de Guedes ainda parece "aquém considerando o tamanho da urgência na área da saúde e da desaceleração econômica em curso".
"O Governo parece reticente em avançar no gasto fiscal, apesar da flexibilização do primário decorrente da oficialização do estado de calamidade pública",
avalia a corretora em relatório.
A manutenção do emprego é um desafio no mundo inteiro neste momento. Na França, por exemplo, o Governo vai pagar aluguéis de empresas e até os salários de funcionários de empresas que não são necessários na crise.
Aos informais, 200 reais
No início da semana, a equipe econômica do Governo anunciou um pacote de 147,3 bilhões de reais para atenuar os efeitos da crise, com suporte principalmente às empresas. Na quinta-feira passada (19), garantiu apoio para as pessoas sem contrato formal de trabalho, que representam quase metade da força produtiva do país. O Governo Bolsonaro propôs uma ajuda de 200 reais por três meses para trabalhadores informais que estão no Cadastro Único, o que atingiria 38 milhões de pessoas.
A decretação de estado de calamidade pública, aprovada pelo Senado nesta sexta-feira (20), é avaliado também como um importante passo para dar maior flexibilidade financeira para o Governo Federal, que poderá gastar um pouco mais do que a meta fiscal que se havia imposto.
Os especialistas acreditam que será preciso abrir mão de tudo que foi conquistado fiscalmente nos últimos dois anos. Mas, quando tudo voltar ao normal e com um planejamento bem claro, as contas públicas voltarão aos patamares de hoje.
O professor Nogammi alerta, no entanto, que os problemas podem perdurar mais do que dois meses, como estimado pelo ministro Paulo Guedes. Para ele, a crise afetará principalmente pequenos, micros e médios empresários e avalia que dar um bônus de 200 reais é tapar o sol com a peneira.
"O que manteve a economia em pé foi o consumo por via de crédito nos últimos anos. Com a paralisia, como ficará o endividamento das famílias, que será potencializado por mais desemprego? Vamos ter esse outro problema",
conclui.
Conclusão
Toda a arrogância será castiga
"A soberba precede a ruína, o espírito arrogante vem antes da queda. Melhor é ter espírito humilde entre os oprimidos do que repartir um grande espólio com os arrogantes" (Provérbios, 16:18,19).
Bem disse o sábio Salomão em seus ensinamentos que ora se mostram tão contextuais, apesar da distância do tempo em que foram proferidos.
Toda a ilusão de que o mundo é controlado pelos humanos se desfez em tempo recorde. E a humanidade finalmente descobriu que há um mundo além de si, povoado por outros que podem até mesmo acabar com a nossa espécie. Outros que a gente nem consegue enxergar.
No nosso furor de espécie dominante, extinguimos tantas outras e tantos modos de vida no vale tudo pela sobrevivência. Achávamos que podíamos tudo.
E eis que vem o vírus, que não está interessado em nos passar nenhuma mensagem, só está mesmo cuidando da própria vida, e mostra: vocês, humanos, não estão sozinhos nesse planeta nem têm o controle que acreditam ter. Muitos até acreditam e afirmam que o coronavírus é uma "gripezinha", "uma fantasia", "uma histeria". Os defensores das transcendentais e cada vez mais criativas teorias de conspiração, afirmam, com base em nada mais que suposições e achologias, que o vírus "foi criado em laboratório", para ser usado como arma em uma "guerra biológica".
Mas o povo brinca com tudo e está pronto a acreditar em qualquer bobagem, até em Terra Plana, desde que lhe garantam seguir no seu modo zumbi. É a síndrome coletiva de The Walking Dead. Mas o povo não brinca com saúde. Quando o assunto é saúde, até a Terra Plana dá voltas.
Toda a ilusão de que o mundo é controlado pelos humanos se desfez em tempo recorde. E a humanidade finalmente descobriu que há um mundo além de si, povoado por outros que podem até mesmo acabar com a nossa espécie. Outros que a gente nem consegue enxergar.
No nosso furor de espécie dominante, extinguimos tantas outras e tantos modos de vida no vale tudo pela sobrevivência. Achávamos que podíamos tudo.
E eis que vem o vírus, que não está interessado em nos passar nenhuma mensagem, só está mesmo cuidando da própria vida, e mostra: vocês, humanos, não estão sozinhos nesse planeta nem têm o controle que acreditam ter. Muitos até acreditam e afirmam que o coronavírus é uma "gripezinha", "uma fantasia", "uma histeria". Os defensores das transcendentais e cada vez mais criativas teorias de conspiração, afirmam, com base em nada mais que suposições e achologias, que o vírus "foi criado em laboratório", para ser usado como arma em uma "guerra biológica".
Mas o povo brinca com tudo e está pronto a acreditar em qualquer bobagem, até em Terra Plana, desde que lhe garantam seguir no seu modo zumbi. É a síndrome coletiva de The Walking Dead. Mas o povo não brinca com saúde. Quando o assunto é saúde, até a Terra Plana dá voltas.
Mas, não se iludam. Assim que a pandemia passar, o Mercado voltará com todo o seu poder de oráculo para, por meio de suas sacerdotisas, os economistas neoliberais ou ultraliberais, nos ditar tudo o que temos que fazer para sair da recessão. Este ônus, como sempre, será dividido igualmente entre os mais pobres.
[Fonte: El Pais, por Heloísa Mendonça e Eliane Brum]
A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.
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