🚨Atenção: O tema central deste texto não é recomendado à pessoas sensíveis.🚨Em mais um capítulo da nossa série especial de artigos "Canções Eternas Canções", vamos analisar a letra de uma música que curto muito, mesmo o significado de sua letra não estar em sintonia com sua linha melódica: 'Flores'.
Essa música, que foi gravada pelos Titãs, fala basicamente de um tema sensível, delicado e que, portanto, deve sempre ser tratado com muita responsabilidade: a visão de um suicida após sua morte (ou após o livramento dela).
A verdade é que quando comecei a analisar essa letra duas ideias me vieram à mente: a de um suicida que após sua morte narra o que vê da sua condição de morto, e a do mesmo suicida que consegue sobreviver após a tentativa de suicídio e aprende com seu ato, eu preferi ficar com a segunda opção.
Sobre a banda
A formação clássica dos Titãs — da esquerda para a direita: Branco Mello, Sérgio Britto, Paulo Miklos, Toni Belloto, Arnaldo Antunes, Charles Gavin, Marcelo Frommer e Nando Reis |
Com mais de quatro décadas, o Titãs é uma das bandas mais misteriosas e longevas do rock nacional.
No início, os nove integrantes apostaram na diversidade, misturando estilos como punk, funk, hard rock, pop, new wave e MPB.
No início, os nove integrantes apostaram na diversidade, misturando estilos como punk, funk, hard rock, pop, new wave e MPB.
Mudaram de imagem e intenções diversas vezes, e conseguiram realizar uma façanha: mantiveram por todos esses anos um público fiel e, com certeza, causaram muita controvérsia, pois não pensavam duas vezes antes de fazer duras críticas a sociedade e incluir palavrões em suas músicas.
Em 1982, com um grande número de integrantes, a banda já causava estranheza no público, eram nove: Arnaldo Antunes (vocal), Paulo Miklos (vocal, sax, guitarra), Marcelo Frommer (✰1961/✞2001 — guitarra), Sérgio Britto (vocal, teclado), Toni Belloto (guitarra), Branco Mello (vocal), Nando Reis (baixo, vocal), André Jung (bateria) e Ciro Pessoa (vocal).
Essa formação surgia com o nome de "Titãs do Iê-Iê" (e não "Iê Iê Iê" como muitos contam) e a proposta inicial era fazer apenas uma releitura da Jovem Guarda.
Essa formação surgia com o nome de "Titãs do Iê-Iê" (e não "Iê Iê Iê" como muitos contam) e a proposta inicial era fazer apenas uma releitura da Jovem Guarda.
Dois anos depois, com a saída de Ciro Pessoa em 84, assinaram com o selo WEA e lançaram o primeiro disco, auto-intitulado.
Sem estilo definido, o único sucesso do disco foi 'Sonífera Ilha', que chegava a ser cantada de 3 a 4 vezes durante os shows.
Segundo Sérgio Britto, a falta de um estilo próprio, de um direcionamento musical definido era proposital, uma ideologia da banda.
Sem estilo definido, o único sucesso do disco foi 'Sonífera Ilha', que chegava a ser cantada de 3 a 4 vezes durante os shows.
Segundo Sérgio Britto, a falta de um estilo próprio, de um direcionamento musical definido era proposital, uma ideologia da banda.
Com vários discos que fizeram muito sucesso e outros nem tantos (Os Titãs gravaram um total de 16 álbuns de estúdio, 9 álbuns ao vivo, uma coletânea e 9 álbuns de vídeo até hoje.), durante esses quarenta anos, a banda passou por várias transformações, com as saídas de vários membros da formação original e a trágica morte do guitarrista Marcelo Frommer.
Hoje os Titãs são apenas um trio: Branco, Toni e Sérgio, mas continuam na ativa, mesmo sem a mesma expressividade de antes.
'Flores'
A letra
'Olhei até ficar cansado
De ver os meus olhos no espelho
Chorei por ter despedaçado
As flores que estão no canteiro
Os punhos e os pulsos cortados
E o resto do meu corpo inteiro
Há flores cobrindo o telhado
E embaixo do meu travesseiro
Há flores por todos os lados
Há flores em tudo que eu vejo
A dor vai curar essas lástimas
O soro tem gosto de lágrimas
As flores têm cheiro de morte
A dor vai fechar esses cortes
Flores, flores...
As flores de plástico não morrem
Olhei até ficar cansado
De ver os meus olhos no espelho
Chorei por ter despedaçado
As flores que estão no canteiro
Os punhos e os pulsos cortados
E o resto do meu corpo inteiro
Há flores cobrindo o telhado
E embaixo do meu travesseiro
Há flores por todos os lados
Há flores em tudo que eu vejo
A dor vai curar essas lástimas
O soro tem gosto de lágrimas
As flores têm cheiro de morte
A dor vai fechar esses cortes
Flores, flores...
As flores de plástico não morrem
Flores, flores...
As flores de plástico não morrem'
A música 'Flores', dos Titãs, é uma crítica social contundente que explora a violência e a fragilidade da vida em um contexto urbano, utilizando a metáfora das flores para representar tanto a beleza quanto a fragilidade humana.
A letra aborda a banalização da violência e a sensação de impotência diante de um cenário de destruição e morte.
A música, lançada no álbum "Õ Blésq Blom" em 1989, é assinada por Tony Bellotto, Sérgio Britto, Charles Gavin e Paulo Miklos, e foi produzida por Liminha.
A canção se destaca pela sua melodia marcante e pela interpretação intensa, que enfatiza a mensagem de alerta e reflexão sobre a realidade da época.
Analisando a letra
- Uma alusão ao suicídio
'Olhei até ficar cansadoDe ver os meus olhos no espelho...
Nesse primeiro verso ele mostra um grande sentimento de frustração e insatisfação, consigo mesmo e com a vida, nos passando um grande desgosto e angustia depressiva.
...Chorei por ter despedaçadoAs flores que estão no canteiro...
Aqui ele usa uma metáfora comparando as flores do canteiro com pessoas do seu convívio que ele magoou, pessoas especiais que ele as considerava como flores, talvez sua família.
...Os punhos e os pulsos cortadosE o resto do meu corpo inteiro...
Nesse ponto o Eu lírico demonstra um desgosto pela vida que ele deixa transparecer no primeiro verso, que o leva a tentar o suicídio, ele revela os pulsos cortados, na segunda frase ele deixa claro o motivo que o levou a tal ato, ele deixa a sensação de que cortou os pulsos, pois já se sentia como que todo cortado, talvez suas aflições e angústias, suas tristezas e mágoas, lhe fizessem se sentir assim todo cortado.
Finda-se a esperança e a vontade de viver
Depois que a esperança vai embora — as flores despedaçadas no canteiro — não resta mais nada.
A vida começa a acabar no momento em que alguém decide cortar os punhos e os pulsos.
A vida começa a acabar no momento em que alguém decide cortar os punhos e os pulsos.
Na minha opinião, a frase "...e o resto do corpo inteiro..." é uma metáfora para a dor que a pessoa sente ao tomar a decisão de acabar com tudo — não acredito que necessariamente a pessoa protagonista na letra da música se cortou inteira.
Uma coisa que acho curiosa, contudo, é a transformação das flores nessa estrofe: se no início elas representavam a esperança que lentamente se esvai, agora as flores me remetem ao luto e à homenagem que prestamos a alguém que morreu durante seu velório.
Veja que, na sequência, as flores cobrem o telhado, estão debaixo do travesseiro, por toda parte, como se a pessoa na música já estivesse partindo e estivesse prestes a cruzar a linha da vida e da morte. Agora ela não precisa de esperança: ela precisa que a velem com flores.
...Há flores cobrindo o telhadoE embaixo do meu travesseiroHá flores por todos os ladosHá flores em tudo que eu vejo...
Nesse verso que segue após a tentativa de suicídio revelada no verso anterior o Eu lírico no caso o personagem narrado no texto, talvez já inconsciente contempla sua própria morte, ele deixa essa ideia quando diz
"...Há flores cobrindo o telhado..."
que da a ideia do caixão coberto de flores, e nos demais versos a ideia do túmulo onde se deposita muitas flores fica claro.
A primeira parte me remete aos dias ruins em que tudo o que a gente consegue fazer é chorar e tentar sobreviver aos tormentos existenciais e sucessão de acontecimentos caóticos da vida.
A gente chora e depois tem o costume de se olhar no espelho, pra ter o prazer mórbido de ver o estrago que o choro causa no nosso rosto: olhos inchados, vermelhos injetados. A gente olha até ficar cansado.
A meu ver, as flores na música representam, paradoxalmente a esperança, com suas cores, sua beleza e seus perfumes — a pessoa do início da canção chora por ter despedaçado as flores no canteiro, por ter exterminado a esperança.
...A dor vai curar essas lástimasO soro [não "o choro", como muitos cantam] têm gosto de lágrimas...
Esses dois versos, me dão a sensação de arrependimento, como que se ele tivesse aprendido a lição quando se viu à beira da morte ele me remete a essa ideia quando diz,
'...A dor vai curar essas lástimas...'quer dizer, com a dor a gente aprende a valorizar a vida, e continua,
'...o soro tem gosto de lágrimas...'
Ou seja, o que te traz dor é o que vai te curar, a ideia de que antes da tentativa de suicídio ele não valorizava a vida é muito forte, e fica também a ideia de que ele se recupera talvez num hospital ou clínica a base de soro.
...As flores têm cheiro de morteA dor vai fechar esses cortes...
Aqui ele deixa essa ideia do desejo que tinha de se matar, pois existe uma superstição que diz, que sentir cheiro de flores está relacionado à morte ou que alguém vai morrer, por isso ele diz
'...As flores têm cheiro de morte...',evidenciando o desejo que tinha de morrer, e mais uma vez ele deixa claro que aprendeu uma lição, a dor traz aprendizado e cura.
Uma mudança acontece na terceira estrofe: a pessoa, afinal, não morreu.
O mais curioso na música, no entanto, é que antes de ler a letra, eu sempre entendi — como a maioria — que diziam '...o choro tem gosto de lágrimas...' (que, pra mim, faria muito sentido), e só depois que eu descobri que, na verdade, o correto é '...o soro tem gosto de lágrimas..., foi que meu entendimento sobre a canção mudou.
A pessoa na música não morreu — ela foi salva antes que o sangue se esvaísse por completo de seus punhos e pulsos cortados, e por algum motivo que não fica claro na música, eu imagino, nessa estrofe, alguém deitado numa cama de hospital conectado a tubos e aparelhos, logo após uma tentativa frustrada de suicídio.
Morte ou vida?
Vida ou morte?
Agora que a pessoa se encontra novamente viva, pensa que a dor, afinal, vai curar as lástimas que a levaram a querer acabar com tudo, e que essa mesma dor vai fechar os cortes que ela mesma provocou.
- As flores têm cheiro de morte — as mesmas flores com que velamos alguém num velório também são enviadas para alguém que está enfermo.
- O soro tem gosto de lágrimas — as lágrimas que ela verteu ao tentar acabar com tudo, e o soro que agora a mantém viva dentro do hospital.
...Flores, floresAs flores de plástico não morrem...'
Nessa parte eu entendo que ele após sua tentativa frustrada de suicídio se comparou com as flores de plástico, vazias ocas por dentro, sem vida e que não morrem, mas também pode ser que essa seria uma forma dele dizer que as coisas inertes não sofrem.
Pela primeira vez, vemos a menção às flores de plástico, o que me leva a crer que a esperança retorna (ainda que parcialmente), mas que dessa vez, vem na forma de algo imortal, como o plástico, ao contrário das flores naturais, que murcham e morrem mais cedo ou mais tarde.
Seria então uma alusão a uma esperança impossível de morrer? Ora, se a esperança não morre, então também não precisamos acabar com tudo… Um ciclo interminável de estar bem e estar mal, de morte e de vida...
Pela primeira vez, vemos a menção às flores de plástico, o que me leva a crer que a esperança retorna (ainda que parcialmente), mas que dessa vez, vem na forma de algo imortal, como o plástico, ao contrário das flores naturais, que murcham e morrem mais cedo ou mais tarde.
Seria então uma alusão a uma esperança impossível de morrer? Ora, se a esperança não morre, então também não precisamos acabar com tudo… Um ciclo interminável de estar bem e estar mal, de morte e de vida...
Porém, quando tudo parece acabar bem, a música repete as três primeiras estrofes exatamente do mesmo jeito, o que me leva a pensar que talvez a vida seja mesmo um ciclo eterno de estar bem e estar mal, de morrer e reviver, de chorar e rir, de esperanças que morrem e esperanças que nascem, assim, do nada, como num dia que acordamos nunca mais querendo dormir e em outro onde dormimos nunca mais querendo acordar.
Conclusão
De tão enigmática e plástica, com suas imagens concretistas do tema, a letra de 'Flores' — que, com seu ritmo melódico alegre, animado e dançante, também expressa o contraste entre a alegria de viver e a tristeza causada pela morte — chega a ser difícil de ser interpretada numa primeira investigação sonora.
Mas logo ficamos familiarizados com a proposta da faixa, uma das mais pulsantes do rock brasileiro que se tornou um dos grandes sucessos na carreira da banda paulista, com sua dramaticidade pop da morte na voz de Branco Mello.
Mas logo ficamos familiarizados com a proposta da faixa, uma das mais pulsantes do rock brasileiro que se tornou um dos grandes sucessos na carreira da banda paulista, com sua dramaticidade pop da morte na voz de Branco Mello.
Mas, não se deixe enganar pelas batidas e pelo ritmo agitado. Essa música é sobre dor, sobre depressão, sobre morte. É melancólica. Essa música é sobre sofrimento. Essa música é sobre suicídio. Não se deixe enganar.
Pela forma lúdica e inteligente que os Titãs abordaram um tema tão pesado que um dos muitos problemas de saúde pública, por isso, não deve ser ignorado, a canção é eterna e leva meu carimbo de
Pela forma lúdica e inteligente que os Titãs abordaram um tema tão pesado que um dos muitos problemas de saúde pública, por isso, não deve ser ignorado, a canção é eterna e leva meu carimbo de
Em 1997, a música foi toda retrabalhada e recebeu uma versão acústica, mais suave, com Branco Mello dividindo os vocais com a cantora Marisa Monte.
Essa releitura fez parte do projeto "MTV Acústico Titãs", que originou o álbum homônimo (até que ficou bom, mas eu prefiro a versão original).
Ao Deus Todo-Poderoso e Perfeito Criador, toda glória.

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