O termo fundamentalismo religioso vem sendo empregado, especialmente pela mídia televisiva, de forma pejorativa (geralmente limitado ao islã). Nesta mídia não vemos o termo associado a boas ações, pelo contrário, a ataques terroristas e outros atos de violência. Entretanto, cientistas sociais, não colaboram para a solidificação de uma inverdade como esta, principalmente quando têm o monopólio da palavra em suas salas de aulas nas universidades. Eles são unânimes em concordar que tratar de tal conceito sem ir à raiz de suas origens é correr o risco de reproduzir o que a grande mídia "criou": um monstro que deve ser eliminado. Há um famoso parlamentar que vive se gabando de sua intelectualidade que usa muito o termo fundamentalista para se referir aos seus opositores da chamada bancada evangélica. O que o ilustre senhor - que também é professor universitário - não faz é a adequação do uso do termo em seus inflamados discursos. Ele trata o fundamentalismo como uma pecha aos seus adversários religiosos.
Entendendo o conceito
O fundamentalismo religioso é um fenômeno caracterizado pela cultura e que pode nominalmente ser influenciada pela religião dos partidários. O termo pode também se referir especificamente à convicção de que algum texto ou preceito religioso considerado infalível, ainda que contrários ao entendimento de estudiosos modernos. Grupos fundamentalistas religiosos frequentemente rejeitam o termo por causa das suas conotações negativas ou porque insinua semelhança entre eles e outros grupos cujos procedimentos acham censuráveis.
O termo fundamentalismo religioso foi criado por parte de um grupo religioso, os quais, no início de século XX, nos Estados Unidos, se reuniram para discutir e formular caminhos doutrinários de combate as influências dos movimentos modernistas (na teologia, o Modernismo é uma corrente heterogênea de pensamento que, basicamente, defende a evolução [e modificação ou transformação] do dogma e "uma reinterpretação da religião à luz do pensamento científico do século XIX"). Fundamentalismo é um movimento que tem por objetiva voltar aos princípios fundamentais, ou vigentes na fundação do grupo religioso. É preservar as bases doutrinárias, é não permitir de os "modismos" entrem em suas religiões. Vamos analisar o conceito aplicado dentro de três grupos religiosos: os judeus, os cristãos e os islâmicos.
1.1 - No Judaísmo
Há duas correntes, os ultra-ortodoxos e os nacionalistas religiosos, que têm atitudes agressivas no apoio a movimentos reacionários da direita política. O setor fundamentalista da religião judaica, não representativa do judaísmo em geral, é influente em Israel e a base ideológica do movimento dos colonatos, em Gaza e na Cisjordânia.
Os Rabbis do Gush Emunim, movimento messiânico nacionalista e expansionista que se mobiliza pela colonização do "grande Israel", e que atinge cerca de metade da população judaica de Israel reiteram continuadamente que os judeus que matam árabes não devem ser punidos, com base no conjunto de regras de vida do judaísmo, pois não violam a proibição religiosa do assassinato.
Razões fundamentalistas argumentam que o que parece ser um confisco de terras de propriedade de árabes para instalarem judeus, não é de fato uma ação de roubo, mas sim um ato de santificação. Do ponto de vista deles a terra está sendo redimida, porque está a ser transferida da esfera do satânico para a esfera do divino. Para acelerar este processo o uso da força é permitido, caso se torne necessário de extrema violência.
1.2 - No Cristianismo
Um dos termos religiosos mais controversos é o Fundamentalismo. Dentro dos círculos acadêmicos, o Fundamentalismo é descrito como uma forma de espiritualidade criada de modo a enfrentar o temor de que a modernidade possa afetar ou mesmo erradicar a fé e a moralidade de seus seguidores. Já a mídia utiliza o termo normalmente para descrever setores mais conservadores de determinada religião, ou mesmo grupos religiosos propensos à violência.
Preocupados com o avanço do modernismo, os fundamentalistas realizaram a Conferência Bíblica de Niágara entre 1878–1897, que estabeleceu os pontos básicos do fundamentalismo. O Fundamentalismo Cristão é um movimento teológico e social, ocorre quase que na totalidade dentro do Protestantismo que se baseia na ênfase da Bíblia como sendo a lei a ser seguida, não só na fé, mas também na regência da sociedade e na interpretação da ciência.
Consideram a Bíblia infalível; sendo suas histórias consideradas factuais. Rejeitam qualquer outra forma de Revelação (inspiração individual, magistério eclesiástico, profecias modernas, teologia natural) e o Criacionismo (teorias que de alguma forma interferem com o texto literal do gênesis, principalmente a evolução biológica, mas também teorias geológicas, físicas, cosmológicas, químicas, e arqueológicas) e deve ser interpretada literalmente, salvo nas partes conotativas.
Desde 1925 o fundamentalismo perdeu sua popularidade entre os protestantes conservadores, quando o professor John T. Scopes foi condenado por ensinar a Teoria da Evolução nas escolas públicas, porém, na década de 1940 ganhou força outro movimento conservador protestante, porém mais aberto à sociedade em geral e à ciência: o Evangelismo.
Os Fundamentalistas Cristãos creem que a Bíblia é unicamente a palavra de Deus, e rejeitam a interpretação de que se trata de um documento histórico. Por volta dos anos 1960 muitos teólogos e historiadores acreditaram que as religiões se tornariam menos conservadoras, porém isso não ocorreu. Os setores fundamentalistas cristãos assim como das principais religiões do mundo se ampliaram, dedicados a preservar suas tradições religiosas. Ao contrário, os modernistas cristãos, por exemplo, defendiam (ainda defendem) que a Bíblia não possui inspiração divina e que a mesma não pode ser seguida em todas as situações, apenas em questões que coincida com os costumes atuais. Defendem que as celebrações devem se adequar aos gostos culturais atuais. Para os fundamentalistas isso seria levar o mundo e suas coisas mundanas para dentro da igreja.
Eles acreditam que a sua causa é grande importância e valor, veem a si mesmos como protetores de uma única e distinta doutrina, modo de vida e de salvação. As virtudes fundamentalista protege a identidade do grupo que não é instituído só em oposição a religiões estranhas, mas também contra os modernizadores que compactuam continuar numa versão nominal da sua própria religião. Ética e politicamente, os fundamentalistas rejeitam a diversidade sexual, o aborto, a Teoria da Evolução, o Ecumenismo, o diálogo religioso com não fundamentalista e a possibilidade de salvação fora do Cristianismo.
1.3 - No Islamismo
No islamismo, os fundamentalistas são chamados de jama'at, que em árabe significa enclaves religiosos com conotações de irmandade fechada, mantém relação com o Jihad na luta contra a cultura ocidental que suprime o Islam autêntico que implica submissão ao modo de vida, prescrito na (determinação divina) contida na Charia.
O islamismo é uma das três grandes religiões monoteístas, ao lado do cristianismo e do judaísmo. Com 1,2 bilhão de fiéis, é a segunda em número de adeptos e a que mais se expande. A fé sempre esteve associada à conquista de novos adeptos, daí sua notável expansão histórica. O avanço atual ocorre nos países pobres, onde já é dominante, e as altas taxas de natalidade funcionam como um impulso natural para o incremento. Além disso, o Islã é visto como único contraponto à visão ocidental. Sua doutrina conservadora - em relação aos padrões ocidentais - tem sido um atrativo para camadas desfavorecidas, porém, há também integrantes bem estabelecidos na sociedade.
Existem dois grandes movimentos interpretativos no islamismo:
- Sunismo (sunitas) - seriam os mais moderados;
- Xiismo (xiitas) - seriam os mais radicais. Segundo algumas interpretações sociológicas, tem como princípio uma reação muito forte ao modelo político ocidental, que tenta penetrar nos estados árabes, muçulmanos.
Entre os muçulmanos, este tipo de manifestação apareceu somente no início do século XX. Os fundamentalistas lutam em geral pela independência política dos países islâmicos e contra a influência ocidental, em favor dos costumes primitivos e da aplicação rigorosa da lei islâmica. Ao mesmo tempo são indiferentes ao rico legado filosófico; artísticos; místicos do Islã medieval e de suas contribuições para toda a civilização ocidental. Há várias formas e povos fundamentalistas e, é óbvio, nem todo árabe é islâmico, nem todo islâmico é fundamentalista ou radical.
Isso não significa que todos os muçulmanos sejam terroristas ou violentos. Na verdade, esses são minorias nos âmbitos dos países islâmicos, também, não é a ampla maioria o que luta contra outros espaços religiosos. A religião em si não promove violência, mas sim a interpretação das pessoas, com suas subjetividades, características, psicologias, interesses políticos, culturais e sociológicos. Sempre há esse processo de tradução, que a implica subjetividade humana. Por sua vez, isso implica uma interpretação; daí a necessidade do cuidado e zelo nesses processos interpretativos.
Conclusão
Hoje, fala-se muito em respeito. O que buscam os fundamentalistas? Respeito à suas bases religiosas, aos fundamentos de sua religião. Aqui está o motivo de muitos dos conflitos que envolvem grupos religiosos fundamentalistas, especialmente os grupos não ocidentais: a invasão de costumes, hábitos e valores ocidentais em tais grupos.
Não busco defender o fundamentalismo religioso, apenas acredito que respeito deve ser uma ação mútua. Por que, por exemplo, querer criar leis que obrigue os padres e pastores brasileiros a casarem homossexuais (já passou algo assim pelo Congresso Nacional)? Os homossexuais ao buscarem aceitação em outros grupos sociais acabam, mesmo sem desejar, ferindo preceitos fundamentais desses grupos. Por que, por exemplo, querer criar leis que obrigue os templos serem usados como salas de aula durante o dia (também já passou algo assim pelo Congresso Nacional)? Como buscar respeito desrespeitando? Será que a nossa história de etnocídio cultural (o caso de nossos índios) nada nos ensinou? Quantos índios fundamentalistas foram mortos por cruzes afiadas (lembram da expressão "entre a cruz e a espada"?)?
Se agarrar aos preceitos do mundo moderno (globalizado) e não se abrir ao respeito à grupos étnicos e religiosos não seria uma defesa tão legítima quanto daqueles que querem preservar suas fundações? Por que as práticas modernas devem ser aceitas? Ou melhor, impostas?
A crítica não deve se voltar a prática fundamentalista, mas a fundamentos que são realmente nocivos, do mal. O desafio maior é definir um parâmetro para tal juízo de valor. Estaria a modernidade (impregnada de concepções capitalistas, individualistas, egocêntricas e mercadológica) habilitada a julgar os fundamentos de grupos minoritários?
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