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segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

OS DEZ MANDAMENTOS - A FEBRE

Não me lembro de um filme, cujo tema relacionado à Bíblia ser tão popularizado quanto tem sido Os Dez Mandamentos nos últimos dias. Nem o aclamado filme do Mel Gibson, o ainda sempre lembrado A Paixão de Cristo (The Passion, EUA, 2004, que segundo o Wikipédia" é a maior bilheteria de um filme restrito na história dos Estados Unidos,e o filme não feito em inglês de maior bilheteria de todos os tempos") e todas as polêmicas e estardalhaços criados em seu entorno (houve boatos de pessoas morrendo em salas de exibição) - confesso que não achei lá grandes coisas - foi tão comercialmente aplicado como Os Dez Mandamentos da Record (aliás, apesar do sucesso de público, de comercial o filme de Gibson não tinha muita coisa, talvez devido ao "peso na mão" no que tange à violência - que, na análise de teólogos foi até pouco - e/ou à comoção pelo sofrimento da narrativa das últimas 12 horas de vida de Jesus Cristo). 

Ao que parece todos os ventos sopraram em direção à Rede Record. A novela que deu origem ao filme foi lançada com muita publicidade no mesmo momento em que era exibida pela sua principal concorrente, a Rede Globo, um dos maiores fracassos na sua tele-dramaturgia, a mal fadada e rejeitada Babilônia, novela do veterano autor Gilberto Braga que certamente a emissora quer esquecer (cito a novela, não o autor). No rastro do tsunami que varreu a audiência da Globo em direção à emissora do bispo Edir Macedo - travou-se uma sangrenta batalha do bem contra o mal: de um lado, a saga sacro-bíblica do herói hebreu e do outro as mazelas e desafios das diferenças que permeiam o cenário da sociedade contemporânea -, o projeto cresceu à proporção das telonas do cinema e rendeu uma segunda temporada prometida também para 2016. E o lobby da Record (entenda-se Igreja Universal do Reino de Deus) está sendo pesado e massante (massacrante até, eu diria).

Os Dez Mandamentos - Os comparativos


Verdade seja dita, fato é que ninguém esperava o fenômeno que a adaptação da novela Os Dez Mandamentos se transformaria nos cinemas nacionais. Em apenas 12 dias de pré-venda de ingressos, o filme somou 1,5 milhão de tickets. Para se ter uma ideia, é cinco vezes mais do que vendeu Star Wars: O Despertar da Força. O filme também já tirou o recorde de pré-vendas que pertencia a Saga Crepúsculo: Amanhecer – Parte 2, com 645 mil ingressos vendidos.

Com os números em mãos, Os Dez Mandamentos – O Filme pode ter a maior abertura da história do cinema nacional. O recorde ainda pertence a A Saga Crepúsculo: Amanhecer – Parte 2‘, que em 2012 levou 3,1 milhões de espectadores em seu final de semana de estreia. Porém, com 1,5 milhão de ingressos vendidos antes mesmo de sua estreia, Os Dez Mandamentos – O Filme deve ultrapassar esses números facilmente.

A dúvida fica pelo que levou ao tamanho sucesso do filme, já que a história foi exibida na TV e está disponível na Netflix. O que embalou esse fenômeno comercial? Será que foi um "milagre"? Não sabemos!

Bom, como estamos falando de números, fui aos sites Omelete e Adoro Cinema, e pesquisei quais foram até aqui as 12 Maiores Aberturas no Brasil em Público:


1. A Saga Crepúsculo: Amanhecer – Parte 2 – 3,1 milhões

2. Vingadores: Era de Ultron – 2,5 milhões
3. Velozes e Furiosos 7 – 2,27 milhões
4. Star Wars: O Despertar da Força – 2 milhões
5. A Saga Crepúsculo: Amanhecer – Parte 1 – 1,79 milhão
6. Homem-Aranha 3 – 1,71 milhão
7. Cinquenta Tons de Cinza – 1,71 milhão
8. Os Vingadores – 1,68 milhão
9. Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2 – 1,56 milhão
10. Jurassic World – 1,5 milhão
11. A Saga Crepúsculo: Lua Nova – 1,41 milhão
12. Homem-Aranha 2 – 1,36 milhão


O diretor de programação e vendas da Paris Filmes, Jorge Assumpção, em entrevista à impresa comemorou o resultado dizendo: "Além do comparativo com o antecessor campeão de pré-venda, A Saga Crepúsculo: Amanhecer – Parte 2, (que totalizou 645 mil ingressos em 2 meses de pré-venda), que já faz dessa uma marca histórica para a exibição no Brasil, esse fato nos anima, pois o filme pertence a um gênero que foge da comédia e isso é muito bom para o mercado brasileiro: ter novos gêneros de sucesso que permitam um excelente desempenho de pré-venda dos filmes nacionais".

Conforme anunciado, devido à essa intensa demanda, o filme estreou em pelo menos umas 1000 salas do circuito nacional – mais um recorde absoluto na história da exibição cinematográfica brasileira. A nova parcial de ingressos vem sendo divulgada desde o dia 15 de janeiro (a estreia do foi no dia 28) e o filme segue fazendo sucesso. Muitos que viram a novela, foram ver o filme, estão voltando para rever e os que ainda não viram, continuam na expectativa (ainda que só mesmo por curiosidade) em vê-lo.

Os Dez Mandamentos - As polêmicas


De acordo com o site Notícias da TV, a Igreja Universal estaria coletando dinheiro nos cultos para comprar ingressos para o filme Os Dez Mandamentos. O objetivo seria conseguir as colaborações de fiéis com mais condições para comprar ingressos para frequentadores carentes. Aqui em Belo Horizonte, uma sessão especial foi exibida para moradores de rua. Antes de levá-los ao cinema, levaram-nos a um upgrade no visual, tudo custeado pelo serviço social da Iurd. Ainda de acordo com o site, os pastores estão incentivando as pessoas a adquirirem os ingressos antecipados e os cultos são interrompidos várias vezes para divulgação e exibição do trailer do filme.

De acordo com o UOL, um comprador do Recife adquiriu mais de 22 mil ingressos para o filme em uma única compra. Um funcionário do cinema afirmou que a pessoa se apresentou como ligado à Igreja Universal e não pediu segredo (Uai, porque pediria?) sobre a compra. O cinema passou uma manhã inteira imprimindo os ingressos. A edição do jornal Folha Universal número 1244, trouxe como matéria de capa o que chamo de "Os ataques ao filme Os Dez Mandamentos" - "Inconformados com o sucesso do filme, alguns setores da imprensa publicaram informações falsas e apurações duvidosas sobre a Universal", dizia a chamada da matéria, indicando justamente a Folha de São Paulo e o Uol como os autores do que consideram "informações falsas e apurações duvidosas". A matéria ainda chama os "ataques" de "raiva gratuita" e diz que "questionar o apoio da Universal para que os membros assistam ao filme Os Dez Mandamentos é uma incoerência" pois "trata-se apenas de uma mobilização em prol de uma obra cinematográfica que promove a evangelização ao tratar os valores bíblicos com respeito".

Os Dez Mandamentos - "A real"


Filmes espíritas (que foi uma mania há pouco tempo e que, convenhamos, não gerou tanta polêmica), cinebiografias musicais, comédias. O cinema brasileiro não teme as tendências. Deu certo, pode dar certa outra vez - é a regra da indústria cinematográfica, aqui e no mundo. Assim, Bezerra de Menezes: O Diário de um Espírito (2008) deu origem a títulos como Nosso Lar (2010) e Chico Xavier (2010); Cazuza (2004) levou a 2 Filhos de Francisco (2005) e, mais recentemente, Tim Maia (2014); e Lisbela e o Prisioneiro (2003), Os Normais (2003) e Sexo, Amor e Traição (2004) deram início ao fenômeno das comédias nas bilheterias (nesse filão, mais atualmente, com Vai que Cola 2 e a terceira - e última? - sequência de Ate que a sorte nos separe).

Seria Os Dez Mandamentos o princípio de um novo caminho para o cinema comercial nacional (superando o recorde de Tropa de Elite 2 - 2010, não podia deixar de citar a saga do capitão Nascimento) e suas 1.289.653 entradas no fim de semana de estreia. O longa também teve a mais ampla estreia de um filme brasileiro pós-Retomada, com 1,1 mil salas, superando a marca do supra citado Até que a Sorte nos Separe 3 que estreou em 823 telas.

O enorme público chegou a marcar presença, mas é a performance do filme que assinalou uma possível tendência religiosa para o cinema brasileiro. O novo braço cinematográfico da Record certamente pretende investir em novas produções do gênero. Seu primeiro projeto será a adaptação da biografia O bispo – A história revelada de Edir Macedo, com roteiro e direção de Alexandre Avancini (o mesmo da novela e do filme Os Dez Mandamentos). Além disso, longas estrangeiros focados nesse nicho já têm previsão de estreia por aqui: Ressurreição (17 de março), O Jovem Messias (24 de março) e Deus Não Está Morto 2 (7 de abril), para a alegria do cinéfilos cristãos.

Outro teste será ver se as produções religiosas se sobressaem sem “ações de caridade”. A resposta, afinal, sempre vem do público, não importa o que diga a crítica. Nos EUA, o gênero já encontrou seu espaço, com produções como Deus Não Está Morto fazendo mais de US$ 60 milhões em bilheteria (para um orçamento de US$ 2 milhões). Portanto, em análise comercial, é uma questão de demanda, não de milagre.

Conclusão

Os Dez Mandamentos - Os prós e os contras


Era de se esperar, no processo de transformar uma novela de 176 capítulos em um filme de 120 minutos, que muita coisa marcante ficasse de fora. O que mais chama a atenção em Os Dez Mandamentos - O filme, no entanto, é que ele se livrou de tudo que fez a fama do folhetim bíblico. E acho que isso fez bem para o longa-metragem.

Todas as tramas paralelas, os amores impossíveis, os dramas terríveis, os três grandes vilões, enfim, as invenções mais rocambolescas de Vivian de Oliveira se tornaram acessórias ou simplesmente sumiram no filme. Nefertari (Camila Rodrigues), que passou nove meses com o coração dividido entre Ramsés (Sérgio Marone) e Moisés (Guilherme Winter), mal abre a boca na tela grande. Sua mãe, Yunet (Adriana Garambone), uma das vilãs mais implacáveis da teledramaturgia brasileira, quiçá mundial, só comete uma pequena vilania no filme.

O capataz Apuki (Heitor Martinez), que passou a novela espancando a mulher, oprimindo a filha e chicoteando os escravos, só tem importância na cena da adoração ao bezerro. O hebreu traíra Corá (Vitor Hugo), que entre outros absurdos roubou o cajado de Moisés, passa as duas horas no cinema praticamente calado. O filme também sumiu com todas as histórias de amor impossíveis, em especial a de Oséias (Sidney Sampaio) e Ana (Tammy Di Calafiori). E a da princesa Henutmire (Vera Zimmerman) e o joalheiro hebreu Hur (Floriano Peixoto).

Todo o núcleo de Meketre (Luciano Szafir) e Tais (Babi Xavier) simplesmente desapareceu (nesse caso, duvido que alguém reclame, pois foi um dos mais sofríveis núcleos da trama). Por outro lado, o ótimo sacerdote Paser (Giuseppe Oristânio) e seu hilário assistente Simut (Renato Livera) mal dão as caras. O terrível drama da hebréia que foi obrigada a se prostituir na casa de Senet não é sequer mencionado. Assim como também é ignorada a saga do casal formado por Uri (Rafael Sardão) e Leila (Juliana Didone), divididos em relação a fé e o amor. Bem como todas as histórias de Zípora (Gisele Itiê) e suas irmãs, em especial a da que se apaixona por Moisés e vira prostituta.

O que sobrou então?


Você deve estar se perguntando: o que sobrou? Bem, o filme se limita a relatar as histórias bíblicas conhecidas por qualquer leitor do Velho Testamento. Nada muito além disso. Para quem assistiu a novela, o mais bacana é ver as cenas de maior impacto na tela grande – a diferença é notável. A história de Vivian Oliveira, porém, não foi pensada originalmente para o cinema e isso acarreta um outro problema. Ao excluir todo o recheio que a autora inventou, muitos fios ficam soltos, difíceis de entender. Para resolver isso, Josué (ex-Oseias) surge como o narrador da história, num tom que lembra professor de história do primário.

Nos últimos dez minutos, o filme avança na trama, mostrando uns poucos episódios que a novela não exibiu. Serão seguramente vistos na chamada “segunda temporada” de “Os Dez Mandamentos”, que a Record ainda não definiu quando vai estrear. Quem não assistiu a novela vai se surpreender, talvez, com o tom de pregação religiosa de Moisés e seus familiares – uma característica marcante do folhetim bíblico da emissora, o que dá ao longa um tom bem mais fidedigno aos registros das Escrituras Sagradas. As duas horas correm rápido e, nos momentos épicos mais conhecidos (as pragas, a abertura do Mar Vermelho, a entrega das tábuas por Deus), não fica devendo muita coisa a outros filmes do gênero.



[Fonte: UOL, Folha de S. Paulo, Folha Universal, Omelete, Adoro Cinema]

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