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segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

COMO FOI O PROCESSO DE "IMPEACHEMENT" DO COLLOR?

Impeachement. Palavra de pronúncia e grafia complicadas é uma das mais faladas nos dias. Impeachment é uma palavra de origem inglesa que significa "impedimento" ou "impugnação", utilizada como um modelo de processo instaurado contra altas autoridades governamentais acusadas de infringir os seus deveres funcionais. Dizer que ocorreu impeachment ao Presidente da República, significa que este não poderá continuar exercendo funções. Nesse calor da repercussão sobre o tão alardeado e, dadas as devidas proporções, até possível impeachement da presidente Dilma Rousseff, me veio à mente algo que vivi em minha juventude: o "impeachement" do presidente Fernando Collor de Melo.

Os jovens dessa geração conhecem esse fato tão importante na história recente do Brasil através de livros didáticos. Mas eu participei intensamente desse fato. Fui às ruas com a cara pintada e fazendo coro com uma multidão de outros jovens estudantes que invadiram as ruas dos centros das capitais brasileiras e em uníssono bradavam: "Fora, Collor!" Não posso falar pelos outros, mas confesso que eu não sabia absolutamente nada do que estava fazendo. Fui seguindo a galera. O típico caso de um "maria-vai-com-as-outras". Mas, afinal, o que acontecem naqueles dias de turbulência política, lá pelos idos dos anos 1990? Afinal, como foi o processo de impeachement do presidente Fernando Collor de Mello? Entre comigo nesse túnel do tempo voltemos aos anos 90.

A ascensão



Em 1979, Fernando Collor de Melo foi nomeado prefeito de Alagoas pelo Governo Militar. Passados três anos, Collor foi eleito deputado federal pelo PDS (Partido Democrático Social). No ano de 1986, concorreu e venceu as eleições para governador de Alagoas. Em seu mandato ganhou notoriedade por combater os “marajás”, funcionários públicos acusados de receberem salários astronômicos.

Empossado no dia 15 de março de 1990 após derrotar o candidato Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das primeiras eleições presidenciais diretas após o fim da ditadura, o ex-governador alagoano Fernando Collor de Mello tornou-se o mais jovem presidente brasileiro. Seu governo, contudo, perdeu gradualmente a sustentação política e foi marcado por escândalos de corrupção, além de medidas administrativas impopulares.

O início do governo Collor caracterizou-se por políticas radicais para conter a inflação e estabilizar a moeda. O presidente reduziu os gastos do governo, privatizou estatais e deixou de fornecer subsídios à exportação. Também realizou um confisco sobre parte das contas correntes e das poupanças que excedessem 50 mil cruzeiros, teto que, segundo a então ministra da Fazenda, Zélia de Melo, teria sido escolhido arbitrariamente durante uma festa. 

A medida, apesar de ter sido considerada em outros meios além dos ministérios de Collor, provocou grande descontentamento devido à arbitrariedade do teto e às posteriores denúncias de que o presidente e seu tesoureiro de campanha, PC Farias, teriam feito saques substanciais em suas contas antes do bloqueio. Mas a história de Collor na presidência da República Federativa do Brasil não duraria muito tempo.

Os cara pintadas



Os Caras Pintadas foi um importante movimento estudantil ocorrido em 1992 no Brasil. Enquanto era instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para averiguar as denúncias contra o presidente Fernando Collor de Mello, os estudantes promoveram o movimento Caras Pintadas. Este ocorreu nos meses iniciais de 1992, logo após as denúncias de corrupção. A CPI julgava o caso e os estudantes se manifestavam exigindo o impeachment do presidente em exercício no Brasil. 

O movimento tomou as ruas das principais cidades brasileiras e recebeu esse nome justamente porque os estudantes reuniam-se com seus rostos pintados com as cores da bandeira do Brasil, verde e amarelo, para manifestar contra a corrupção na presidência. 

No final do ano de 1992, no dia 29 de dezembro, Fernando Collor de Mello renunciou ao seu cargo na expectativa de manter seus direitos políticos. No entanto, a pressão do movimento dos Caras Pintadas foi tamanho que o Congresso Nacional se sentiu forçado a julgar o caso e realmente concluir pela deposição do presidente, que foi substituído por seu vice,Itamar Franco.

O "impeachement"


O processo que culminou com a renúncia do presidente Collor, em 29 de dezembro de 1992, foi resultado de meses de investigação parlamentar provocada por denúncias de corrupção divulgadas pela imprensa. Ainda candidato, em 1989, Collor era bem diferente dos políticos da época: relativamente jovem (39 anos), fazia cooper, andava de jet-ski e estampava frases de impacto, como "Não fale em crise. Trabalhe", em suas camisetas.

Quando assumiu, em março de 1990, sua popularidade começou a ficar abalada ao confiscar o saldo das poupanças bancárias a fim de frear a inflação. Cada pessoa ficou com apenas 50 mil cruzeiros (hoje, cerca de R$ 6 mil) disponíveis e muita gente empobreceu da noite para o dia. Foi uma verdadeira tragédia social. Não deu certo: a inflação continuou crescendo e, em 1991, já passava dos 400% acumulados no ano, quando surgiram os primeiros escândalos de corrupção ligados a Collor.


A queda


Fraudes financeiras provocaram a cassação do primeiro presidente eleito por voto direto após 30 anos de ditadura. Siga a sequência da queda livre de Collor, conforme a figura acima, em matéria publicada pela revista Veja:
1. Pedro Collor, irmão do presidente, concedeu entrevista à revista VEJA, em maio de 1992, denunciando um esquema de lavagem de dinheiro no exterior comandado por Paulo César (PC) Farias, tesoureiro da campanha eleitoral de 1989. Fernando acusou o irmão de insanidade mental - desmentida por exames. 
2. O Congresso Nacional criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as denúncias. Vieram à tona esquemas como a Operação Uruguai: empréstimos fraudulentos para financiar a campanha de 1989. Além disso, contas fantasma operadas por PC financiavam a reforma da Casa da Dinda, onde Collor morava. 
3. As ligações do presidente com os golpes de PC ficaram evidentes. Um carro Fiat Elba para uso pessoal do presidente foi comprado com dinheiro vindo das contas fantasma do tesoureiro de campanha. Em agosto, o motorista Eriberto França contou à revista Istoé como levava contas de Collor para serem pagas por empresas de fachada de PC. 
4. Em busca de apoio, o presidente fez um pronunciamento pedindo para que a população fosse às ruas, em 16 de agosto, vestida com as cores da bandeira nacional. O povo não atendeu e saiu vestido de preto, em protesto. Entre os manifestantes, destacaram-se grupos de estudantes batizados pela imprensa de "caras-pintadas". 
5. Em 24 de agosto, um relatório da CPI atestou que US$ 6,5 milhões haviam sido transferidos irregularmente para financiar gastos do presidente. A insatisfação popular aumentou e, em 29 de setembro, o impeachment foi aprovado por 441 dos 509 deputados. Collor foi afastado e substituído por Itamar Franco, seu vice. 
6. Collor foi, então, julgado pelo Senado Federal. Em 29 de dezembro, o presidente renunciou para tentar engavetar o processo e preservar seus direitos políticos. No entanto, por 76 votos a 3, os senadores condenaram o presidente, que não poderia concorrer em eleições pelos oito anos seguintes.

Curiosidades:


  • Também foram descobertas compras superfaturadas na Legião Brasileira de Assistência, entidade do governo presidida pela primeira-dama, Rosane Collor.   
  • Collor foi eleito pelo Partido da Reconstrução Nacional, criado só para abrigar sua candidatura. Em 2000, o PRN virou PTC (Partido Trabalhista Cristão).  
  • A renúncia foi ofuscada no noticiário pelo assassinato da atriz Daniela Perez por Guilherme de Pádua. A dupla contracenava na novela De Corpo e Alma, escrita por Glória Perez, mãe de Daniela.  
  • Em 17 de setembro, ocorreu a maior manifestação contra Collor, com 750 mil pessoas lotando o vale do Anhangabaú, em São Paulo.

Por onde anda?


Que fim levaram? Mortes misteriosas e reviravoltas políticas marcam a trajetória dos principais personagens do impeachment:

  • Fernando Collor

Absolvido criminalmente pelo Supremo Tribunal Federal em 1994. Em 2006, foi eleito senador - cargo que ocupa até hoje (dezembro de 2015) -, representando o estado de Alagoas.

  • Pedro Collor

Morreu com 42 anos, em 1994, vítima de um câncer cerebral. A mãe, Leda, sofreu um AVC durante o auge da crise e ficou três anos em coma, até morrer, em 1995.

  • Pc Farias

Condenado por sonegação fiscal, falsidade ideológica e outros crimes. Em 1996, em liberdade condicional, foi achado morto com a namorada - ambos baleados - em circunstâncias misteriosas.

Opositores


"Estrelas" da CPI do impeachment acabaram passando de juízes a julgados, caso dos então deputados José Dirceu e José Genoíno, condenados no escândalo do Mensalão.

Conclusão


O primeiro desafio surgido após o impeachment de Fernando Collor, o caçador de marajás, foi encontrar um brasileiro que admitisse ter votado nele. É verdade! Mesmo hoje, perguntando a todos que devemos perguntar, especialmente a algumas referências da política nacional, chegamos à conclusão de que Collor foi presidente somente com o seu próprio voto e com o voto do seu vice-presidente. Relembrar o impeachment de Collor, o caçador de marajás, é um dever de consciência, só isso. Não sobraram lições e multiplicaram-se os marajás que, diga-se de passagem, nunca foram culpados de nada, foram, e ainda são, produtos de uma institucionalidade, de um Estado, dedicados a bem servir os pragmáticos de plantão; aliás, o plantão não termina nunca.

[Fonte: Revistas VEJA e Istoé e jornais Folha de S. Paulo, o Estado de S. Paulo, O Globo e Jornal do Brasil; Livros Notícias do Planalto, de Mário Sérgio Conti e Morcegos Negros, de Lucas Figueiredo.]

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