"Quem conta um conto, aumenta um ponto."
Este é um conhecido dito popular. O conto é sem dúvida um dos entretenimentos mais populares da literatura. Caracterizado por ser curto, o conto narra acontecimentos fantásticos para divertir ou até mesmo transmitir algum tipo de mensagem e conhecimento ao público.
Enquanto isso, o conto infantil se caracteriza por dispor de um conteúdo que prende a atenção das crianças devido ao fato de que a grande maioria de seu público é extremante infantil.
Os heróis, as histórias fantásticas, os animais inanimados, são alguns dos assuntos mais abordados neste tipo de conto e que sem dúvida tem o privilegio de divertir e até mesmo ensinar o público infantil, uma vez que é muito utilizado na escola na educação das crianças para o aprendizado de conteúdos específicos.
Nada melhor que um conto para reforçar o conhecimento e ajudar a resolver certos problemas e conflitos...
A história dos contos
Porém a influência do conto não vem de hoje, tradicionalmente o conto é uma parte integrante do crescimento do indivíduo e não é por acaso que está associado à infância, que sem dúvida, é o momento que mais notamos a presença dos contos na vida das crianças que estão aprendendo a ler e escrever.
Tanto as crianças de antigamente como as de hoje pedem a seus pais que leiam um conto antes de dormir. Esta prática nunca saiu de moda, mesmo com o advento da popularidade das tecnologias digitais e, além disso, aprofunda o vínculo entre pais e filhos para compreender melhor certos conceitos e situações da vida, como também a aprender valores e a poder expressar-se, entre outras questões.
Por isso, de acordo com os especialistas, é fundamental que tanto os pais como os professores incentivem as crianças a ler contos. Sendo assim, a leitura de contos com regularidade entre pais e filhos é uma boa maneira de aproximação entre ambos.
Os contos de fadas e princesas para as meninas, e os de super-heróis que batalham contra o mal para os meninos, são os típicos contos infantis que mais chamam a atenção das crianças. Obviamente nem todos os contos destacam esse assunto, mas com certeza são os de maior interesse e que levam a preferência do público infantil.
Os contos populares são tão antigos quanto a própria civilização humana. Uma síntese do falado e do escrito, uma fusão de diferentes versões para a mesma história. O conto da Cinderela, por exemplo, apareceu na China antiga e no Egito antigo.
Os detalhes da narrativa mudam dependendo das origens culturais de quem está contando a história. No Egito, o sapatinho da Cinderela é de couro vermelho; já nas Índias Ocidentais é uma fruta-pão e não uma abóbora que é transformada em carruagem.
A história da Cinderela que aparece na coleção de contos populares alemães de Jacob e Wilhelm Grimm, publicada pela primeira vez em 1812, pode chocar os familiarizados com a versão de hoje, onde uma empregada doméstica vira princesa.
Pois é essa versão nada serena que está fazendo sucesso em uma série de animação que está fazendo grande sucesso — e, não para varirar, suscitando enorme polêmica — na plataforma de streaming Netflix.
Poltergeist literário
Imagem: Netflix, reprodução |
Em meio ao sangue e ao nervosismo tentou tirar a faca das mãos do garoto, mas acabou o matando. Quando voltou em prantos para dentro de casa, percebeu que havia esquecido o bebê na banheira e ele tinha morrido afogado.
Ela, então, não viu outra saída a não ser enforcar-se. Poderíamos parar a desgraceira por aqui, mas é que o pai dessa família chegou do trabalho, viu aquela cena horrível, não conseguiu superar tamanha tragédia e acabou morrendo de desgosto.
História fofinha, não? Poderia ser um filme do Lars von Trier ("Anticristo", EUA, 2009; "Melancolia", EUA, 2011; "Nifomaníaca", EUA, 2013), mas é um conto infantil dos Irmãos Grimm (século XIX), chamado, veja só que sugestivo, "Quando Crianças Brincam de Açougueiro".
A literatura infantil, tal como a de gente grande, nasceu das tradições orais, das histórias contadas pelas pessoas comuns, geralmente iletradas. Volta e meia alguém com mais estudo resolvia pesquisar e anotar essas narrativas, então, com o passar dos anos, foram pipocando nomes que seriam lembrados até hoje, como os irmãos citados ali em cima e também La Fontaine (✰1621/✞1695), Charles Perrault (✰1628/✞1703) e Fénelon (✰1651/✞1715) — coincidentemente ou não, todos contemporâneos.
A importância deles e de vários outros autores é muito maior na questão da curadoria, de reunião de informações, bem como o aspecto sociolinguístico de resguardar a memória oral de tais narrativas, do que de criação em si. Em resumo, as histórias já existiam, eles "só" colocaram no papel e foram reformulando tudo com o passar do tempo.
Charles Perrault (XVII), por exemplo, escreveu um livro que hoje encontramos com o título "Contos da Mamãe Gansa", mas que havia sido lançado como Histórias ou narrativas de tempo passado com moralidades. Ele, inclusive, nem assinou o livro na época, pois pegava meio mal entre os intelectuais esse negócio de escrever para crianças, e resolveu atribuir a autoria da obra a seu filho.
A importância deles e de vários outros autores é muito maior na questão da curadoria, de reunião de informações, bem como o aspecto sociolinguístico de resguardar a memória oral de tais narrativas, do que de criação em si.
Chapeuzinho Vermelho para adultos
É de Perrault uma das versões mais antigas e macabras do famoso conto "Chapeuzinho Vermelho". Nela, Chapeuzinho segue feliz e saltitante rumo à casa da Vovó e quando chega lá, percebe que ela está meio estranha, pois pede para que a menina tire a roupa (!?) e se deite com ela na cama.
Depois a garota percebe os olhos grandes, dentes grandes, etc. O Lobo, como sabemos, devora a avó e a netinha vira a sobremesa. Depois disso, sabe o que acontece? Nadinha de nada. É isso, ele devora as duas e não aparece ninguém pra salvá-las.
Depois a garota percebe os olhos grandes, dentes grandes, etc. O Lobo, como sabemos, devora a avó e a netinha vira a sobremesa. Depois disso, sabe o que acontece? Nadinha de nada. É isso, ele devora as duas e não aparece ninguém pra salvá-las.
Já era, perdeu. Séculos depois os Irmãos Grimm tentaram dar uma amenizada na história e enfiaram o Lenhador no meio da treta (amenizaram mais ou menos, pois na primeira versão deles, após as duas coitadas serem salvas a machadadas, eles enchem a barriga do Lobo de pedras, ele não consegue andar e acaba morrendo. Pelo menos aqui o bem vence o mal e assim temos menos crianças deprimidas).
Grimm para maiores
Os irmãos alemães Grimm — Jacob, à esquerda (✰1785/✞1863) e Wilhelm (✰1786/✞1859) — reescreveram todas as histórias (são mais de cem) algumas vezes para adaptá-las aos pequenos leitores, mas antes disso, nas versões tidas como originais, nos deparamos, por exemplo, com o fato de que a Bela Adormecida foi estuprada pelo príncipe; que as irmãs malvadas da Gata Borralheira cortaram os próprios dedos para fazer caber os pés cheios de sangue no sapatinho de cristal; que o príncipe engravida a Rapunzel, depois arranca os próprios olhos e se joga da torre; que a princesa não beija o sapo, ela o atira contra a parede para que ele exploda; e assim por diante.
Como filólogos, colecionadores, pesquisadores e editores, os irmãos ajudaram a estabelecer a metodologia de coleta e documentação do folclore. Sua abordagem pioneira e científica mudou o curso da linguística histórica, estabelecendo um padrão digno de imitação.
Para quem cresceu com uma visão "disneylândica" da infância, essas versões estilo Quentin Tarantino ("Pulp Fiction — Tempos de Violência", EUA, 1994 [escrevi artigo especial sobre este filme ➫ aqui]; "Kill Bill" 1 e 2, EUA, 2003, 2004, respectivamente; "Django Livre", EUA, 2012 [escrevi artigo especial sobre este filme ➫ aqui]), podem soar meio insanas, pois o que a maioria de nós leu/assistiu foram aqueles textos reescritos pelos Irmãos Grimm.
E antes deles, lá no início, esses livrinhos que hoje os pais leem para os seus filhos não tinham exatamente a criança como seu público-alvo (no caso de Perrault, o público eram as mulheres, então suas histórias eram cheias de "ensinamentos morais", tal como nas fábulas, que visavam fazê-las se comportarem de uma determinada maneira e não caírem na lábia de qualquer malandrão. "Encontrar o Lobo" era sinônimo de perder a virgindade, inclusive).
Isso de ver a criança como criança mesmo, do jeito que a gente vê hoje, e não como praticamente um anão, só ocorreu no período da Revolução Industrial (século XVIII), com a ascensão da burguesia e aquela coisa toda das aulas de História.
Foi ali que a criança deixou de ser vista como um mini adulto, pois percebeu-se que ela não poderia trabalhar nas fábricas imundas (até porque isso agravava o desemprego e a miséria) e passou a representar o centro da família, um ser frágil que requeria todos os cuidados, etc.
"Contos de Grimm"
Os irmãos Grimm, então, publicaram o que se tornaria uma das coleções mais influentes e famosas do folclore mundial. "Contos Infantis e Domésticos (Kinder und Hausmärchen)", mais tarde intitulados "Contos de Grimm" — exatamente a série de animação da Netflix —, são histórias que definem a infância.
Os Grimms, no entanto, haviam montado a coleção como uma antologia acadêmica para estudiosos da cultura alemã, não como uma coleção de histórias para ninar jovens leitores. Parece que os responsáveis pela indicação de idade da plataforma ou não sabem disso, ou, pior, sabem mas não estão nem aí, já que a tal série está sendo exibida com livre indicação, ou seja, para o público infantil.
A ideia de escrever livros para crianças poderia ter uma origem nobre e emocionante, inclusive em alguns momentos pode até ter sido, mas na real mesmo, os adultos perceberam que os pequenos, agora alfabetizados, pois a escola passara a ser obrigatória para todas as classes, poderiam representar um mercado consumidor importante.
Basicamente eles olharam para aquelas carteiras cheias de alunos e ouviram um som de caixa registradora no subconsciente, foi então que resolveram entupir a criançada de livros e McLanches Felizes.
Em resumo, lá pelas tantas saíram o sangue e o sexo, e entraram o amor idealizado e as grandes virtudes. Boa parte das histórias ficaram mais fofinhas e coloridas, muita gente entrou nessa só para ganhar dinheiro, mas pelo menos assim evitou-se que toda uma geração crescesse tendo que tomar Rivotril. Pelo menos, até hoje, né?
Conclusão
Polêmicas atuais a parte, os irmãos Grimm fizeram um trabalho pioneiro: ainda não havia institutos de filologia germânica que eles pudessem consultar. Também não havia editoras a disputar a tapas seus contos de fadas.
O destino de suas obras era, na ocasião, completamente incerto.
"Tanto mais admirável e espantoso que os dois tenham se atido tenazmente à sua pesquisa linguística",
diz o professor Steffen Martus, autor de uma abrangente biografia sobre os irmãos Grimm.
A persistência valeu a pena: suas histórias infantis e contos de fadas são até hoje um sucesso (né, Netflix?), e eles são considerados os fundadores da germanística. O fato de terem recebido, inicialmente, pouco reconhecimento pelo seu trabalho, não os incomodava. Eles sempre seguiram seu próprio caminho.
Até o fim de suas vidas, os irmãos Grimm trabalharam intensamente. Wilhelm morreu aos 73 anos, em 1859, e Jacob, em 1863, aos 78 anos. Seu maior projeto, no entanto, eles não puderam terminar: o "Dicionário Alemão" foi concluído somente um século mais tarde, por mais de uma centena de estudiosos do alemão. Um projeto notável — tão notável quanto os próprios irmãos Grimm.
[Fonte: Escoltilha, por Eder Alex — Updated On 5 de setembro de 2015, "O mundo sombrio da literatura infantil", acessado para pesquisa em 27 de outubro de 2021; Que Conceito, acessado para pesquisa em 28 de outubro de 2021; National Geografic/Brasil, por Isabel Hernández — Updated On 3 de outubro de 2019, "Contos de Fadas dos Irmãos Grimm Nunca Foram Feitos para Crianças", acessado para pesquisa em 01 de novembro de 2021; DW Brasil]
A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.
O uso correto da máscara não precisava ser obrigatório, por se tratar de uma proteção individual extensiva ao coletivo. É tudo uma questão não de obrigação, mas de consciência.
Respeite a etiqueta e o distanciamento sociais e evite aglomerações. A pandemia não passou, a guerra não acabou.
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