Boato vem do latim boatus, significando "mugido, grito agudo". Na Antiga Roma, os imperadores, cientes de que a plebe gostava tanto de um rumor quanto de uma luta de gladiadores, nomearam os delatores (do latim delatio, que significa contar, referir), cujo trabalho era circular pelas ruas e levar ao imperador a vox populi. Caso os boatos fossem prejudiciais à imagem do imperador, os delatores, como agentes desse verdadeiro serviço nacional de informações, versados nas artes da guerra psicológica adversa, lançavam boatos em sentido contrário.
Um exemplo é o incêndio de Roma em 64. Não há quem não tenha aprendido que o responsável foi o insano imperador Nero. Mas é possível que essa versão tenha nascido do fato de ser Nero um imperador impopular. No episódio, de nada adiantou o desmentido oficial; para se defender, Nero recorreu então à contra-informação: os responsáveis pelo incêndio foram os cristãos, na época uma minoria hostilizada - e mais que depressa a fúria da plebe voltou-se contra eles.
Todo boato tem um fundo de verdade?
Nem todo boato pode ter um fundo de verdade, ao contrário do que quer o ditado. Mas seguramente todo boato tem alguma verdade a ensinar sobre o comportamento das pessoas e o funcionamento das sociedades em que elas vivem.
Vira e mexe são lançados vários boatos na internet. As principais vítimas são as personalidades, celebridades e sub-celebridades de todo o segmento, muitas delas que se fazem mais conhecidas pelos escândalos e polêmicas que se envolvem do que por algo de louvável que façam ou pelo talento (que via de regra não têm). O pior de tudo é que não raramente encontramos quem dê crédito a essa boataria e, como papagaio de pirata sai repetindo (e/ou compartilhando) e, pior, há muitos que acreditam em tudo o que circula no universo on line.
Telefone sem fio
É sempre tudo muito parecido: uma história que ninguém sabe exatamente de onde saiu passa de boca em boca e, em questão de horas, se tanto, com os devidos acréscimos e bordados, vira verdade verdadeira. É o boato, um dos mais assíduos frequentadores de conversas, em toda parte e de todo tipo de gente. Costuma crescer feito bola de neve em situações de tensão e ansiedade. E pode murchar como um balão furado assim que alguém se dá ao trabalho de conferir o rumor antes de passá-lo adiante, o que porém raramente acontece. Às vezes, sobrevive a todas as checagens - e aí vira lenda.
A morte de Paul MacCartney
Bem antes do advento das redes sociais, um exemplo clássico que correu mundo por se referir a uma celebridade foi o da morte do beatle Paul McCartney, que chegou a ser notícia de primeira página nos Estados Unidos em 1967, nos anos de glória do conjunto. Paul, naturalmente, estava vivo da silva - mas nem isso iria convencer os partidários da teoria do passamento do senhor McCartney, como o americano que telefonou para uma estação de rádio de Detroit munido da seguinte prova: na música 'Strawberry Fields Forever' do disco "Magical Mistery Tour", gravado naquele ano de 1967, era possível ouvir, depois de uma filtragem de sons, uma voz que dizia "I buried Paul" ("eu enterrei Paul"). Outras evidências do gênero foram arranjadas para demonstrar que o boato era fato. Na capa do disco "Sergeant Pepper’s Lonely Hearts Club Band", por exemplo, podia-se ler numa guitarra a inscrição "Paul is dead" ("Paul está morto").
E assim a história foi sendo enriquecida com detalhes do arco-da-velha: ele teria morrido em um acidente automobilístico em novembro de 1966 e fora substituído por um dublê. A lenda se alimentaria ainda das imagens da capa do último disco do conjunto, "Abbey Road", gravado em 1970, onde Paul aparece descalço, como são enterradas algumas pessoas na Inglaterra; a foto também mostra um carro, um fusca placa LMW 28 IF. Era só o que faltava: os boateiros entenderam que, se ("if") Paul estivesse vivo, teria 28 anos.
Por aí se vê como fecunda, por assim dizer, a imaginação dos que não abrem mão de um bom rumor, apesar de todas as evidências da vida real. E olha que tudo isso aconteceu há quase meio século, quando ainda sequer se sonhava com o advento da tecnologia.
Eu vi no Face!
A boataria já teve finais trágicos, como a mulher que foi espancada até a morte, após boatos em rede social que diziam que ela matava crianças para praticar rituais de magia negra. O lamentável caso acontecem em 2014, no Guarujá, litoral de São Paulo. O mais triste de tudo isso é a que a mulher assassinada era evangélica.
Mas o boateiro não é uma pessoa diferente das demais ou coisa que o valha. Não há quem, com maior ou menor convicção, não tenha sido cúmplice da difusão de uma história, geralmente envolvendo gente famosa, sem ter a menor ideia se era verdadeira ou não. Ou, o que ainda é mais comum, sem se perguntar se o boato não teria sido plantado de propósito por alguém interessado em beneficiar-se da circulação da notícia falsa.
Passar adiante um boato, em suma, parece parte da condição humana. Muitos boatos nascem de um mal-entendido. Alguém tira uma conclusão errada do que vê, lê ou escuta, confunde um gesto ou uma frase, e pronto - faz brotar uma inverdade que, levada às últimas consequências, pode envenenar a reputação de pessoas inocentes antes mesmo que fiquem sabendo dos rumores em que caíram.
Pois nem sempre o reino da verdade se restabelece com igual rapidez. Como no episódio do beatle Paul, há boatos que resistem, impávidos, aos mais contundentes golpes da realidade. Mas uma coisa todos eles têm em comum: sua fonte primária é sempre anônima. Rastrear a origem de um boato é tarefa tanto mais difícil quanto maior e mais complexo for o ambiente social onde ele surgiu.
"O dia do fico"
Desde de Abril de 2016, tem circulado na rede meme com o deputado Jean Wyllys (PSol) dizendo que deixaria o Brasil se tivesse impeachment. Claro que com o resultado do impeachment da ex-presidente Dilma, o memê voltou a circular com força em compartilhamentos pedindo que o Deputado honre a sua palavra e de fato saia do Brasil.
A grande questão aqui, é saber se de fato Jean Wyllys disse que deixaria o Brasil caso a Dilma perdesse o mandato. Será que ele falou mesmo isso? Não, para alegria de uns e tristeza de outros - nos quais eu me incluo -, dentre as muitas bravatas que vocifera em seus discursos, Jean Wyllys nunca disse que deixaria o Brasil e - infelizmente, digo eu - nem sequer chegou a cogitar a hipótese.
Tudo não passou de boato e para não dizerem que ele agora diz isso, só porque a Dilma saiu do poder e ele não tem coragem de cumprir sua promessa, vale ressaltar que não existe em lugar algum, nenhuma matéria em que o ilustre deputado Jean Wyllys disse que deixará o Brasil (Ah, que pena!).
Por outro lado, existe o registro no dia 06/04/2016, um esclarecimento do próprio Jean Wyllys sobre o boato mentiroso envolvendo o seu nome.
A verdade, nada mais que a verdade
Não, Jean Wyllys nunca disse que deixaria o Brasil em caso de impeachment da Dilma, não há nenhuma declaração dele em lugar algum da internet. Por outro lado existe um desmentido feito pelo deputado em sua página do Facebook, bem antes do processo de impeachment ser votado na Câmara e encaminhado ao Senado. Bom seria se ele tivesse dito e melhor ainda se tivesse feito. Afinal, que falta ele faria aqui no Brasil? Absolutamente nenhuma!
Conclusão
"Porque nada podemos contra verdade, senão pela verdade." - 1 Coríntios 13:8
Fica fácil de se perceber como é fácil espalhar uma mentira na internet, mas por outro lado, também é fácil para toda pessoa com um minimo de inteligência, procurar saber se as coisas ditas realmente foram ditas e descobrir a verdade. Todos os homens carregam pela vida afora uma bagagem de ideias, opiniões, imagens e crenças sobre o mundo que o rodeia, a maioria adquiridas simplesmente por ouvir dizer, num processo lento, gradual - e imperceptível.
O boato recria esse processo de forma acelerada, de modo a torná-la perceptível. Daí a conclusão que o estudo do boato proporciona - não é que o homem acredite naquilo que é verdade provada; mas a prova da verdade de algo é o fato de o homem acreditar nisso.
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