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terça-feira, 25 de outubro de 2016

A SÃ DOUTRINA - SANTIDADE (E/OU SANTIFICAÇÃO, CONSAGRAÇÃO)


"Portanto, estejam com a mente preparada, prontos para a ação; sejam sóbrios e coloquem toda a esperança na graça que lhes será dada quando Jesus Cristo for revelado. Como filhos obedientes, não se deixem amoldar pelos maus desejos de outrora, quando viviam na ignorância. Mas, assim como é santo aquele que os chamou, sejam santos vocês também em tudo o que fizerem." - 1 Pedro 1:13-15
  • O que significa santidade? 
  • Qual a importância da santidade na vida cristã?

Começarei este artigo com essas perguntas por simples razões, que precisamos analisar. Quando falamos várias e várias vezes sobre um assunto, isso no trabalho, na escola, ou em quaisquer outras áreas da nossa vida, isso mostra a importância que este assunto, ou tema tem para aquela realidade. A importância de algo ou de alguém é percebida, na maioria dos casos, pelo número de vezes que se comenta a seu respeito.

Isso também acontece com relação a alguns estudos bíblicos, pois quando alguns assuntos se tornam relevantes, percebe-se claramente a insistência em abordá-los. Assim sendo se a santificação é um assunto pouco discutido na igreja, talvez seja porque a sua importância, para a vida cristã, tenha sido desconsiderada ou desprezada. Faça uma pequena reflexão, há quanto tempo você é cristão? Nesse tempo você já foi instruído por seu líder, ou pastor a respeito da santidade, e qual a importância que ela tem para as nossas vidas? Se sim, quantas vezes? Você consegue se recordar qual foi a última vez em que esse tema foi ministrado em sua igreja?

Definindo o que é santidade


Acredito que seja mais produtivo esse artigo/estudo, se dizer o que não é santidade, assim teremos uma compreensão melhor quando ela for definida.

1. Santidade NÃO É


A. Mero moralismo - Notadamente, alguns cristãos se destacam por sua postura moral, seu comportamento ético, honestidade, firmeza de caráter e palavras. Espera-se exatamente isso de cada cristão e é indiscutível que uma postura moral elevada faça parte de uma vida santificada. No entanto uma pessoa não precisa ser necessariamente cristã para ter essas qualidades, um padrão moral e de conduta -  inclusive, há muitas pessoas que não são cristãs (até mesmo ateus), com conduta moral ilibada. Veja o que fala Jesus em Mateus 5:46,47:
"Se vocês amarem aqueles que os amam, que recompensa receberão? Até os publicanos fazem isso! E se vocês saudarem apenas os seus irmãos, o que estarão fazendo de mais?"
Até os pagãos fazem isso!
"Eis que alguém se aproximou de Jesus e lhe perguntou: 'Mestre, que farei de bom para ter a vida eterna?' Respondeu-lhe Jesus: 'Por que você me pergunta sobre o que é bom? Há somente um que é bom. Se você quer entrar na vida, obedeça aos mandamentos'. 'Quais?', perguntou ele. Jesus respondeu: '"Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não darás falso testemunho, honra teu pai e tua mãe e amarás o teu próximo como a ti mesmo"'. Disse-lhe o jovem: 'A tudo isso tenho obedecido. O que me falta ainda' Jesus respondeu: 'Se você quer ser perfeito, vá, venda os seus bens e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e siga-me'. Ouvindo isso, o jovem afastou-se triste, porque tinha muitas riquezas." - Mt 19:16-22 
"'Que mérito vocês terão, se amarem aos que os amam? Até os pecadores amam aos que os amam. E que mérito terão, se fizerem o bem àqueles que são bons para com vocês? Até os pecadores agem assim.'" - Lucas 6:32,33
  • Outros textos: Lc 11:12; Atos 10:1,2; 16:14; Romanos 2:14,15.

Encontramos em vários segmentos da sociedade, pessoas cujo caráter e excelência moral superam em muito os daqueles contados como cristãos. Não estou dizendo que essa pessoas não sejam cristãs, pois sabemos que valores e práticas morais são construídos e lapidados ao longo de todo um processo. Basta olhar para nós mesmos e ver o quanto ainda temos uma longa estrada a percorrer na construção de uma vida irrepreensível diante de Deus.

B. Ativismo religioso - Geralmente se confunde santidade com ativismo religioso, eu fui um que passei por esse processo, achava que a minha atividade na igreja, como líder, era uma vida de santidade, mas quando apertado pelo Senhor descobri minha fragilidade. Nessas minhas duas décadas como cristão não foram poucas as vezes que muito pouco eu cai. Não me orgulho, mas não também não me envergonho de assumir isso. Quando Deus quer que entendamos a nossa situação, Ele "nos balança" de uma forma que, não conseguimos suportar a sua santidade. 

Tendemos a qualificar as pessoas como santificadas na medida em que elas assumem cargos de liderança na igreja, ou se envolvem nas mais diversas atividades do templo. Aprendi que servir a Deus tem que partir de um coração voluntário, disponível e esse sentimento nasce naturalmente, à medida que eu estreito meu relacionamento com Ele. Uma vida consagrada a Deus trará prazer em servi-lO e servir ao próximo, mas ativismo religioso não pode ser sinônimo de vitalidade espiritual e em muitos casos é sintoma de que alguma coisa não está bem (Lc 10:40,42).

C. Conhecimento doutrinário - O conhecimento doutrinário é fundamental para a vida cristã sadia e equilibrada, mas existem pessoas que estudam e esse conhecimento vira uma doença na cabeça dessas pessoas, que começam a interpretar de uma forma errada e perigosa contra ela mesma, contra o próximo e contra Deus. 

O conhecimento é extremamente necessário para os cristãos. No passado vemos relatos, estudos e a própria Bíblia trazendo informações, sobre este assunto, sobre crescer no conhecimento: 
"Graça e paz lhes sejam multiplicadas, pelo pleno conhecimento de Deus e de Jesus, o nosso Senhor. Seu divino poder nos deu todas as coisas de que necessitamos para a vida e para a piedade, por meio do pleno conhecimento daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude." - 2 Pe 1:2,3
Porém se esse conhecimento, que nos foi dado em Jesus Cristo for usado para as nossas próprias teorias e ideias, estamos em sérios apuros. O conhecimento sozinho, não é sinônimo de santificação. É verdade que precisamos dos conhecimentos teológico (de Deus), bíblico (da Palavra) e doutrinário (da conduta, da prática) para crescer espiritualmente, todavia esses conhecimentos devem ser usados como uma ferramenta. A partir do momento em que ele se torna um objeto em si mesmo, perderá a sua razão de ser.
"Por isso mesmo, empenhem-se para acrescentar à sua fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento o domínio próprio; ao domínio próprio a perseverança; à perseverança a piedade; à piedade a fraternidade; e à fraternidade o amor. Porque, se essas qualidades existirem e estiverem crescendo em suas vidas, elas impedirão que vocês, no pleno conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo, sejam inoperantes e improdutivos." - 2 Pe 1:5-8


D. Experiências espirituais - Outra prática que se percebe em nossos dias é igualar a santificação com experiências espirituais. A vida cristã é uma comunhão (relacionamento) diária e intensa com o Senhor Deus e não pode ser padronizada por ninguém, a não ser pela própria Bíblia. 

Assim como em todos os relacionamentos, o relacionamento com Deus é marcado por experiências individuais. Entretanto ninguém pode ser rotulado como mais ou menos santo pela qualidade e tipos de experiências que tem um exemplo à igreja de Corinto. "Eu sou de Paulo, outros, eu de Apolo...", diziam isso como se "ser" de um ou de outro caracterizasse a qualidade espiritual de alguém.

Agora sim, vejamos...

2. Santidade É

a. No Antigo Testamento - A Palavra hebraica usada para se referir ao que é santo é "qadosh", cujo significado básico é "separar dentre outras coisas". Entretanto, devido à etimologia (raiz) da palavra, as opiniões sobre o significado da palavra santificar, no Antigo Testamento, oscilam entre "brilhar e cortar". Uma da a ideia de pureza e a outra de separação. 

No entanto, o conceito de separação é mais forte e adequado para o uso do termo. Pessoas eram separadas para serviços específicos (Levíticos 21:8) e utensílios eram separados para serem usados no templo (Êxodo 35:10-19). A palavra também se refere a uma separação de cunho moral e ético que distinguiria o povo de Israel dos demais. 

Enfim, os termos relacionados à santificação, no Antigo Testamento, apontavam para a realidade de que Israel era o povo santo (separado) para o serviço de [a] Deus e deveria evitar qualquer coisa que desagradasse a esse Deus. Ainda que o conceito de santidade tenha em si a realização de atributos morais e espirituais, ele tem muito mais a ver com um estado de relacionamento, de comunhão e consagração ao Senhor.

B. No Novo Testamento - No Novo Testamento a palavra é "hagios". Essa palavra é usada para descrever a santificação dos crentes em dois sentidos: 
  • O primeiro é a separação da prática do pecado deste mundo; 
  • O segundo é a consagração ao serviço de Deus.

C. Definição - Em primeiro lugar devemos lembrar que o pecado trouxe a humanidade duas consequências das quais advém todos os demais problemas da raça humana: A culpa e a corrupção. 
  • (a) A culpa está relacionada com a penalidade pela desobediência do homem a Deus e a justa retribuição pela mesma. Neste caso,o homem se encontra condenado. 
  • (b) A corrupção é o efeito do pecado sobre toda a natureza humana, levando assim o ser humano a cometer mais pecados ainda. Neste caso o homem se encontra corrompido. 
A justificação é a solução para a culpa do pecado. Ela ocorre quando o pecador é declarado por Deus justificado da sua culpa, não pesando sobre o homem nenhuma condenação (Rm 5:1), é algo que acontece fora da pessoa e de modo definitivo. É um ato livre, soberano e gracioso do Senhor Deus, no qual o homem não tem nenhuma participação ou mérito. Todo esse processo tem como base a obra expiatória de Jesus Cristo, que morreu na cruz do Calvário.

A corrupção por sua vez, é tratada pela santificação. Segundo o breve Catecismo de Westminster a "santificação é a obra da livre graça de Deus, pela qual somos renovados em todo nosso ser, segundo a imagem de Deus, habilitados a morrer cada vez mais para o pecado e a viver para a retidão". Essa obra da graça de Deus, diferentemente da justificação, é realizada dentro de nós. Seu agente é o Espírito Santo que aplica em nós os resultados da morte e ressurreição de Jesus Cristo, a quem o crente está unido. 

A santificação também envolve a nossa participação responsável, e o seu objetivo é restaurar a imagem de Deus, que em nós ficou corrompida, distorcida por causa do pecado, e nos habilitar a viver de forma a agradá-lO. Partindo dos conceitos bíblicos, pela santificação somos capacitados a um novo relacionamento com o Criador, tanto para servi-lO (justificação) quanto para adora-lO (santificação).

3. Aspectos da santidade na vida pessoal - Uma vez que a santidade não pode ser confundida com práticas externas, vejamos inicialmente como ela está intimamente ligada à vida de uma pessoa.

  • A santidade e o coração (interior)

A palavra coração no sentido bíblico é usada como o centro da vida pessoal, a fonte de toda motivação, dos pensamentos e dos desejos, ou seja, o mais intimo do ser humano. Segundo o ensino bíblico, a santidade começa exatamente no coração, já que todas as atitudes humanas são praticamente, reflexos daquilo que se passa nele (Provérbios 27:19). Assim como a água reflete o rosto, o coração reflete quem somos nós. O Antigo Testamento está repleto de referências que tratam da importância que tem o coração do homem diante de Deus: Deuteronômio 6:5; Salmos 51:10; 119:11; Pv 4:23...
 
Jesus Cristo em seu ministério, insistiu que, se o coração não estiver santificado, todo o corpo estará em pecado: Mt 15:19; Marcos 7:21. Por isso, a análise que o Senhor Deus faz da vida de uma pessoa começa pelo coração: 1 Sm 16:7; Rm 8:27.

Assim sendo, se alguém deseja trilhar o caminho da santificação deve começar examinando as suas motivações interiores, elas devem proceder do coração. Deste modo a santificação não será confundida com ascetismo, formalismo ou legalismo. A santificação deve ser uma resposta de gratidão do pecador pela graça recebida, reconhecendo não haver nele nenhum bem que o fizesse merecedor.

  • A santidade e o Temperamento

Geralmente as pessoas culpam seu temperamento para justificar as suas faltas (eu mesmo já fiz isso inúmeras vezes!). Diversos pecados são apontados, meramente como características de um determinado tipo de temperamento. Assim passou a ser a preguiça, ira, animosidade, cinismo, dentre tantos outros. Embora para algumas pessoas seus comportamentos sejam reações naturais da sua forma de ser, isso não significa que algumas das suas atitudes ou reações não sejam pecaminosas. 

O temperamento de cada pessoa também está sujeito ao pecado e precisa ser trabalhado na "escola" da santificação ("Se você fizer o bem, não será aceito? Mas se não o fizer, saiba que o pecado o ameaça à porta; ele deseja conquistá-lo, mas você deve dominá-lo" - Gênesis 4:7). Veja a repreensão que Deus estava dando a Caim, fala de procedimento, pensamentos pecaminosos, atitudes erradas. E no final do versículo Ele diz a Caim "esses desejos você deve dominá-lo". 

Tem muitos cristãos que se escondem nessas atitudes, agem de uma forma grosseira, arrogante pra com outras pessoas e se alicerça na sua verdade "ele tinha que escutar o que eu estou falando, ninguém fala dos erros dele, alguém tem que falar algumas verdades pra essa pessoa". E usam de palavras fortes e erradas para tentar corrigir tal pessoa. O apóstolo Paulo exortando aos gálatas ele diz. Gl.6. 1
"Irmãos, se alguém for surpreendido em algum pecado, vocês, que são espirituais deverão restaurá-lo [não julgá-los, excluí-los] com mansidão. Cuide-se, porém, cada um para que também não seja tentado." - Gálatas 6:1 (grifo e observação meus)
O apóstolo ainda orienta dizendo, cuide-se pra não cair no mesmo erro. Então, assim sendo, precisamos observar a nossa atitude, no falar, no temperamento, na nossa forma de agir.

  • A santidade e os relacionamentos pessoais

Viver uma vida isolada, distante das pessoas, ou das grandes cidades, ou em mosteiros etc. não nos leva a uma vida de santidade. Muitos acham que viver em uma vida isolada em clausuras, ou, coisa desse tipo, o ajuda a ter uma vida de santidade. Errado!

Certamente existe a necessidade de cultivarmos momentos de comunhão à sós com Deus, porém, definitivamente, não há santificação na busca do isolamento pleno:
"Essas regras têm, de fato, aparência de sabedoria, com sua pretensa religiosidade, falsa humildade e severidade com o corpo, mas não têm valor algum para refrear os impulsos da carne. Aliás, é exatamente por meio dos relacionamentos que haverá, ou não, a genuína demonstração de uma vida de fé e amor" - Colossenses 2:23 (em concordância com 1 Co 13:2 e Tg 2:17).

Na comunidade é que somos edificados e temos o nosso caráter testado e moldado. Na igreja, na família e na sociedade é que demostramos, ou não, os frutos do Espírito e as marcas de um coração santificado (Efésios 4:11-16).

  • A importância da santidade para a igreja

Numa época em que tanto se discute estratégias de crescimento e planejamento de igrejas, talvez a santidade, um dos principais itens, seja esquecido. Vejamos algumas verdades ministeriais do trabalho eclesiástico onde a santidade é fundamental.
  1. Pregação e ensino da Palavra de Deus - Não se vê mais pregação e estudo com esse tema. Existe todos tipos de temas menos esse SANTIDADE PARA A IGREJA DO SENHOR.
  2. Liderança - A cada dia vem crescendo o número de seminários e escolas de estudos teológicos, escola de formação de lideres etc. Técnicas são desenvolvidas e uma quantidade enorme de livros é vendida anualmente sobre o assunto. E com isso muitos tem se afastado do verdadeiro ensinamento, muitos tem esquecido este principal quesito. Não se pode esquecer que o comprometimento com a santidade é indispensável àquele que quer servir como líder entre o povo de Deus (Gn 71; Josué 1:7,8; 1 Sm 15:22). Essa orientação bíblica deve ser aplicada com sabedoria por todos aqueles que estão imbuídos da tarefa de escolher seus lideres (At 6:3; 1 Tm 3:1-7; Tito 1:5-9). Se deixarmos que o prestígio de uma pessoa, sua formação acadêmica, seu carisma ou apresentação pessoal nos fascinem, corremos o risco de fazer uma má escolha, assim como aconteceu, por exemplo com Israel ao escolher seu primeiro rei, Saul.
  3. Evangelismo - O conteúdo da atual evangelização também deve ser reavaliado segundo o proposito de Deus, que é a santificação para seus filhos (1 Ts 4.3a, Mt 3:2; 4.17; At 2:38; 17:30,31; 26:20).

Conclusão

 
Não basta um mero assentimento intelectual ou comprometimento social, porque o propósito de Deus na vida do pecador começa com a sua regeneração e caminha em direção à glorificação. A entrada que liga essas duas pontas é a santificação. Esse modelo bíblico de evangelização, onde o que é requerido do pecador é claramente explicado, deveria ser levado muito mais a sério, assim, o evangelho deixaria de ser apresentado como proposta de um bom negócio com Deus. Precisamos redescobrir a santidade, precisamos ver qual a importância que a santidade tem pra nossa vida cristã. Para finalizarmos meditemos nesses textos.
"Pois está escrito: 'Sejam santos, porque eu sou santo'" (1 Pe 1:16). "E a perseverança [santificação] deve ter ação completa, a fim de que vocês sejam maduros e íntegros, sem lhes faltar coisa alguma" (Tg 1:4). "Portanto, sejam perfeitos [santo] como perfeito é o Pai celestial de vocês" (Mt 5:48).
Que Deus nos ajude a vivermos uma vida de santidade.

[Fonte: Revista Palavra Viva - O desafio da fé, Ed. Cultura Cristã; Santidade Pessoal em Tempos de Tentação - Bruce Wilkinson, São Paulo, Mundo Cristão, 2002]

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