Há 75 anos, quando Adolf Hitler (alemão = Adɔlf Hɪtlɐ) se suicidou em 30 de abril de 1945, aos 56 anos, o Nazismo foi dado também como morto. Mas, será que realmente está? É a reflexão que proponho no texto deste artigo.
Minibiografia de Hitler
Nascido em 20 de abril de 1889, na Áustria, Hitler foi o principal governante da Alemanha de 1933 até 1945. Ditador e líder do Nazismo durante a Segunda Guerra Mundial e do Holocausto, desencadeando mais de 10 milhões de mortes durante todo esse período.
Após a Primeira Guerra Mundial, Hitler retornou à Munique, cidade alemã, e continuou servindo o Exército como oficial de Inteligência, monitorando as atividades do Partido dos Trabalhadores Alemães. Pouco depois, Adolf começou a fazer parte do Partido e mudou seu nome para Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei, em alemão), que teve sua abreviação para Nazi.
A suástica virou o símbolo do partido e a bandeira teve sua cor vermelha e seu símbolo branco em volta, assim como conhecemos hoje. Hitler foi ganhando seu reconhecimento por discursar contra o Tratado de Versalhes, políticos rivais, Marxistas e judeus. Em 1921, Hitler virou líder do Partido Nazi.
Enquanto estava no poder, Adolf Hitler oprimiu minorias como homossexuais e pessoas com deficiência, além de judeus, que eram arduamente perseguidos pelo exército nazista. Os campos de concentração eram os lugares em que esses grupos sociais eram encontrados e dificilmente estavam vivos durante todo o poder de Hitler.
Toda a sua direção política estava envolta de violência e mortes. Seus ideais políticos fascistas tiveram e têm até hoje repercussão mundial. Hitler ficou reconhecido pela sua inteligência e frieza, além de influenciar outras áreas, como a indústria, a mídia e a cultura alemã e mundial.
O fim de sua vida foi misterioso. Hitler se suicidou com sua mulher, Eva Braun, em um bunker de Berlim em 30 de abril de 1945.
Por décadas, o mundo olhou para ele como se não passasse de um surto de loucura – um desvario coletivo sem sentido ou explicação. O horror inigualável do Holocausto leva, à procura de sentidos e explicações, que pesquisadores investiguem à profundeza todo e qualquer aspecto da vida de Hitler – até mesmo os mais íntimos e fisiológicos.
Há, inclusive, pesquisas que confirmam que ele tinha anomalia no órgão genital. Um livro recente trouxe à tona uma antiga pesquisa, que teve acesso aos registros médicos de Hitler, afirmando que o Führer ("líder", em alemão) tinha um micropênis e, além disso, possuía hipospádia, uma condição em que abertura urinária se localiza em uma parte lateral do órgão. Como se não bastasse, afirma-se que o ditador possuía somente um testículo.
Pesquisadores afirmam que tais diagnósticos foram confirmados pelo próprio médico pessoal de Hitler, Theodor Morell (✩1886/✞1948). Tais especulações se sustentam já por mais de sete décadas, mas, é claro, utiliza-las como justificativa para o horror do Holocausto e da Segunda Guerra Mundial é uma maneira torta de evitar encarar o real mal de que o ser humano é capaz, independentemente de qualquer aspecto fisiológico.
O que foi o Nazismo?
Mas, agora, vários pesquisadores têm tido coragem de procurar alguma lógica no Nazismo, por mais insano que ele seja em sua essência, inclusive para evitar que se repita. E algumas conclusões estão surgindo. Segundo elas, o Nazismo não é uma ideia louca vinda do nada e sumida para sempre. Ele é consequência de 5 outras ideias – 1ª o carimbo da ciência, 2ª um ódio ancestral, 3ª o amor à pátria, 4ª a fria modernidade e 5ª a ilusão da beleza – todas aparentemente inofensivas sozinhas, todas vivas até hoje.
Hitler, um cristão?
Uma das muitas afirmações estapafúrdias feitas por ateístas e pelos inimigos da cruz, é a de que Hitler era cristão. Mas, essa afirmação tem alguma base? Em que ela é fundamentada? Em um alicerce firmado sobre um vasto areal movediço. Simples assim.
A eugenia (seleção dos seres humanos com base em suas características) forneceu a base teórica para o assassinato de ciganos, deficientes, homossexuais e outros "inferiores". Mas por que só um povo foi marcado para o extermínio? Por que os judeus? Essa resposta é ainda mais antiga.
"O primeiro antissemitismo foi o dos romanos, que não toleravam costumes judaicos como o shabat (dia do descanso) e o culto ao Deus único",
escreveu o jornalista e historiador francês Gerald Messadié (✩1931/✞2018) em "História Geral do Antissemitismo" (editora Bertrand, 2003, 420 páginas).
Quando o Império Romano adotou o cristianismo, no século 4, a perseguição cultural e política virou religiosa.
"Esquecendo-se de que Jesus foi judeu, os partidários da Igreja iriam, em nome de Jesus, cobrir os judeus de acusações",
diz Messadié.
A maior delas veio em 325, quando a Igreja culpou os judeus pela morte de Cristo, uma acusação só retirada em 1965. A cristandade medieval viu crescer os mitos de que judeus eram aliados do diabo, utilizavam sangue de crianças cristãs e tramavam o domínio do mundo. Muitos judeus se converteram ao cristianismo para não terminar nas fogueiras da Inquisição.
Ou seja, também nesse aspecto, o nazismo não foi novidade, como deixa claro o livro "Christian Antisemitism, A History of Hate" ("Antissemitismo Cristão, Uma História de Ódio", sem versão no Brasil), de William Nicholls, estudioso da religião da Universidade de British Columbia, Canadá.
Nicholls mostra que muitas medidas antissemitas da lei canônica medieval são reencontradas quase palavra por palavra na jurisdição nazista dos anos 30. Tanto a obrigação do uso de uma insígnia nas roupas quanto as proibições aos cristãos de vender bens, casar ou fazer sexo com judeus já existiam em leis da Igreja do século XIII.
Mas o século XIX trouxe uma novidade. Antes, os judeus tinham uma saída, a conversão. Agora, com a eugenia, o antissemitismo deixou o caráter religioso e incorporou um novo conceito: a raça. A natureza dos judeus agora era imutável e nem a conversão os salvaria.
Com a vitória dos nazistas e a fundação do 3º Reich, em 1933, o antissemitismo pela primeira vez se tornou política de Estado, e a população, convencida pelos mitos medievais, não pareceu se incomodar. O historiador inglês Norman Cohn (✩1915/✞2007), da Universidade de Sussex, constatou isso ao ler interrogatórios de ex-membros das SS, as tropas de repressão nazistas.
"O genocídio dos judeus foi motivado pela ideia de que eles eram conspiradores decididos a dominar a humanidade – uma versão secularizada da ideia de feiticeiros empregados por Satanás",
afirma Cohn no livro "A Conspiração Mundial dos Judeus: Mito ou Realidade?" (Editora Ibrasa, 1969, 302 páginas).
Daniel Goldhagen, professor de Estudos Sociais e Governamentais da Universidade Harvard, ampliou a pesquisa ao estudar pessoas que participaram do assassinato de judeus.
"Movidos pelo antissemitismo, os perpetradores acreditavam que acabar com os judeus era justo, correto e necessário."
Segundo ele, nenhum homem foi morto ou mandado a campo de concentração por se recusar a matar judeus. Ou seja, tal ato não era considerado errado naquele lugar e naquela época. No discurso de alguns ideólogos nazistas, era uma medida sanitária. Quase como exterminar ratos. Aliás, Hitler chegou a comparar os judeus com animais.
"Deus está conosco!"
A participação de evangélicos e católicos no genocídio nazista
Está foi uma das célebres frases proclamadas pelo líder nazista em seus discursos. Mas, simplesmente dizê-lo significa efetivamente sê-lo? Obviamente que não. Mas, os que afirmam que Hitler era um cristão, têm muito em seu favor, pois a dualidade de alguns líderes cristãos – tanto católicos quanto protestantes – e a neutralidade dos adeptos da seita Testemunhas de Jeová, são uma mancha na história do protestantismo, que deve ser conhecida por nós. E, como eu não estou aqui para tapar roturas apodrecidas com tecido novo, vamos ao conhecimento dos fatos.
Às vésperas da chegada de Hitler ao poder alemão, tinha se formado um grupo nacional-socialista ou nazista de protestantes, eram os chamados Cristãos Alemães. Assim, que Hitler foi empossado, esse grupo se tornou maioria com a participação de diversas denominações protestantes.
Era a Igreja do Reich que logo aderiu à perseguição aos judeus. Alguns meses depois, essa unificação protestante foi consagrada num Sínodo, ao qual compareceu a maioria dos pastores e responsáveis eclesiásticos trajando o uniforme nazista. Alguns responsáveis ali presentes protestaram e se retiraram, quando ficou decidida a demissão de todos os pastores não arianos ou com ascendência judaica por parte do pai ou da mãe.
Foi quando o pastor luterano Martin Niemöeller (✩1892/✞1984)
divulgou um manifesto apelando à resistência os pastores contrários às medidas nazistas aceitas pela igreja oficial alemã. O manifesto foi assinado por um terço dos pastores, seguiram-se protestos, mas, em 1936, Martin Niemöeller foi preso e, em 1938, enviado a um campo de concentração onde ficou preso até o fim da guerra. As perseguições fizeram diminuir o número de resistentes e as poucas dezenas de pastores resistentes restantes foram também para campos de concentração, onde quase todos morreram.
Entretanto, a grande maioria dos protestantes alemães aderiram ao nazismo e o protestantismo alemão se tornou nacionalista – servir a Pátria, no caso o Estado, equivalia a servir a Deus. A isso se acrescentou uma interpretação messiânica do nazismo: Hitler seria um enviado por Deus.
O evangelho, segundo o Nazismo
Foram feitos alguns expurgos na leitura da Bíblia e os evangélicos nazistas alemães acentuaram o culto da força e o Cristo herói, não o crucificado e nem suas mensagens de amor e tolerância. O programa nazista prometia um retorno aos valores cristãos e a criação de um muro contra o comunismo.
Ao fim da guerra, os evangélicos que haviam ignorado e justificado as violências e o antissemitismo nazistas se justificaram argumentando não lhes terem sido proibido pregar o Evangelho e nem viver uma vida segundo os princípio cristãos. Nenhuma ideia de cumplicidade!
A vitória dos nazistas foi comemorada pelos evangélicos e uma euforia tomou conta das igrejas alemãs, era o surgimento de uma nova época há tanto tempo esperada. Era a vitória do combate contra a prostituição, contra o cigarro entre as mulheres, contra o nudismo e contra os abusos da vida noturna. A alienação completa em nome de uma interpretação mais do que equivocada dos verdadeiros princípios cristãos.
Pastor herói
Tempos de guerra são duros, mesmo para os religiosos. Durante a Segunda Guerra Mundial, no entanto, o pastor luterano alemão Dietrich Bonhöeffer (✩1906/✞1945) foi outro que junto com
Niemöeller fez a diferença. Ele tinha uma liberdade invejável na Alemanha nazista onde o ato de ir e vir havia sido limitado drasticamente pelo ditador Adolf Hitler.
Aos olhos alheios, seus constantes deslocamentos entre Berlim e Munique soavam quase como uma afronta diante das agruras vividas pela população. Bonhöeffer era assíduo em almoços e jantares e fazia também frequentes viagens à Suíça. Mantinha ares de alienado e tocava a vida como se o seu país e a Europa não estivessem matando e morrendo no front.
O que essas pessoas nem sequer desconfiavam era que Bonhöeffer havia se tornado um homem só, aprisionado por um segredo que não podia dividir com ninguém e que revelava a verdadeira realidade de sua existência.
Sem nenhuma esperança de uma solução pacífica para as atrocidades cometidas pelo nazismo e temendo inclusive pela própria vida, o pastor resolveu agir: aderiu a um grupo de insurgentes dentro das Forças Armadas de Hitler e tornou-se um espião infiltrado na Abwehr, a agência de inteligência do regime.
Essa e outras revelações estão na biografia "Bonhöeffer: Pastor, Mártir, Profeta, Espião" (Editora Grupo Nelson, 2012, 656 páginas), do escritor americano Eric Metaxas, que recupera a trajetória do teólogo que ajudou a salvar milhares de vidas. A vida de Boenhöffer foi também tema de filmes
O pastor que queria matar Hitler
No plano especificamente estratégico, de acordo com a obra, a ação de Bonhöeffer ia além: como agente duplo, ele passava informações sigilosas aos britânicos com os quais negociaria planos de paz após a execução do projeto principal, o assassinato de Hitler.
Metaxas relata que, apesar do ódio que sentia por Hitler, Boenhöffer hesitou em participar do grupo por ser religioso. Falou mais alto o espírito democrático. Ele chegou a estar a salvo nos EUA, mas aceitou o convite feito por amigos infiltrados nas Forças Armadas e voltou para a Alemanha. O grupo ao qual fazia parte era coordenado pelo próprio comandante da Abwehr, o almirante Wilhelm Canaris, que, como ele, foi condenado e executado no dia 9 abril de 1945.
A punição foi a morte por enforcamento. O papel de Bonhoeffer como espião era passar mensagens sigilosas ao bispo britânico George Bell, que as direcionava ao primeiro-ministro da Inglaterra, Winston Churchill (✩1874/✞1965).
Boenhöffer participou ainda do planejamento de diversas ações para salvar judeus, além, é claro, das tentativas de assassinar Hitler. Quando se deu a Operação Valquíria (1944), o mais famoso dos golpes para eliminar o Führer, Bonhöeffer já estava preso em razão de suspeitas da Gestapo. E foi justamente porque esse plano falhou que os nazistas descobriram sua ação de agente duplo, um gesto arriscado que já foi tema de diversos documentários e aparece agora minuciosamente descrito na biografia acima citada.
Conclusão
O nazismo pode até ter morrido. Mas os seus 5 principais pilares, as 5 ideias que deram origem a ele, sobreviveram à guerra e aos 60 anos depois dela. O carimbo de "aprovado pela ciência" continua sendo distribuído a esmo, e dando aval a projetos imorais.
O racismo e a noção de que os homens são desiguais continuam a ser forças que movem multidões, e o nacionalismo exacerbado anda quase sempre ao lado deles.
A "busca do progresso" e a modernidade continuam sendo argumentos invencíveis, que quase sempre dispensam a ética em nome da eficácia (ou, cada vez mais, do lucro).
E as utopias continuam convencendo o homem a desprezar o indivíduo em nome do "moderno", do "belo" ou do "sonho". Pelo menos já sabemos no que essa mistura pode dar. E, muito cuidado, pois o Nazismo pode estar dentro de você. É melhor não esquecer.
[Fonte: Superinteressante, Hypeness; IstoÉ]
A Deus, toda glória.
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E nem 1% religioso.
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