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terça-feira, 7 de agosto de 2018

LEI MARIA DA PENHA, DOZE ANOS: E QUANTOS MAIS DE VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES?


  • ✞2010✞

Aqui em Belo Horizonte, Maria Islaine, cabeleireira, 31 anos, foi morta com sete tiros à queima roupa dentro do seu salão no bairro Santa Mônica, pelo ex-marido que fugiu em seguida, sendo capturado posteriormente. O crime foi testemunhado por clientes do salão e registrado por uma câmera de segurança. Motivo: o ex não aceitava o fim do relacionamento.

  • ✞2013✞ 

São Paulo, aos 19 anos, Bárbara foi espancada, queimada e jogada da janela pelo ex-companheiro. Seus dois filhos e um vizinho que tentou ajudá-la durante o incêndio no seu apartamento morreram asfixiados. Hoje ela já passou por mais de 200 cirurgias. Até julho de 2016 o caso ainda não havia sido julgado.

  • ✞2016✞ 

Em uma comunidade da Zona Oeste do Rio de Janeiro, uma jovem de 16 anos foi violentada por, pelo menos, 30 homens. Dias depois do estupro coletivo, ela descobriu que imagens suas, sem roupas e desacordada, circulavam na internet. O caso tomou proporções internacionais e todos os envolvidos estão na cadeia.

Também neste ano, Amanda, 29 anos, ex-dançarina de funk e mãe de uma adolescente, foi assassinada no jardim da própria casa, na cidade de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, após uma discussão com o noivo. Uma câmera de segurança gravou o momento em que ele cometeu o crime e fugiu, mas que foi capturado posteriormente. 

  • ✞2018✞ 

Contagem, Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Ludmila, 27 anos, secretária da Câmara Municipal do município, foi assassinada a tiros dentro do seu local de trabalho. O autor foi seu ex-companheiro, um policial civil que, após o crime, tentou, sem sucesso, tirar a própria vida. Motivo: não aceitava o fim do relacionamento.

Em Santa Catarina, a advogada Tatiana é violentamente espancada por seu marido antes de ser atirada do 4º andar do apartamento em que moravam. Câmeras de segurança do prédio registraram a sequência de perseguição, violência, espancamento e o momento da queda. O agressor assassino tentou fugir, mas foi preso. Apesar das evidências inquestionáveis das chocantes imagens, o assassino ainda tentou negar o crime. Será levado a juri popular.

Todos os anos são centenas de Amandas, Tatianas, Bárbaras Ludmilas e Marias... agredidas e violadas por uma cultura de violência contra a mulher no Brasil. Histórias reais de mulheres que sofrem dupla violação: por um lado de seus agressores, por outro, da sociedade que não raras vezes insiste em culpabilizá-las, tentando encontrar porquês para esses crimes.

Maria da Penha, um martírio que originou uma lei


Esta não é uma realidade recente: em uma manhã de maio de 1983, Maria da Penha Maia Fernandes acordou de repente, com um tiro nas costas. Pensou logo que o marido a tivesse matado e desmaiou. Quando recuperou a consciência, percebeu a presença dos vizinhos à sua volta que, assustados, aguardavam com a família a chegada da ambulância. 

Maria sabia o que tinha ocorrido e por todas as agressões que ela e seus filhos já haviam sofrido tinha certeza que havia sido o seu companheiro o autor do disparo, no entanto, o comentário era de tentativa de assalto. Essa foi a versão de Marco Antônio, seu marido: haviam assaltantes na casa e estes é que a teriam baleado. Mas quando concluídas as investigações, a certeza de Penha foi confirmada – Marco Antônio foi o autor do disparo.

A agressão culminou na paraplegia da vítima, que após a internação hospitalar precisou voltar para casa, onde permaneceu em cárcere privado por 15 dias sendo novamente vítima de uma segunda tentativa de homicídio, desta vez através de um chuveiro elétrico que foi danificado propositadamente. A família de Penha buscou judicialmente a possibilidade dela poder sair de casa sem que configurasse abandono do lar, providência que foi tomada para evitar que ela perdesse a guarda das filhas. Assim, finalmente, ela conseguiu sair do convívio com o agressor.

Justiça seja feita


Oito anos depois do fato, o julgamento: a justiça reconheceu a materialidade e autoria do crime e o réu foi condenado com pena de 13 anos de prisão, porém, não chegou a cumprir a sentença, pois o julgamento foi anulado posteriormente. Em 1996 ocorreu o segundo julgamento. Marco foi novamente a júri sendo condenado a dez anos e seis meses de reclusão, podendo recorrer em liberdade.

O caso chegou ao conhecimento das ONGs CEJIL e CLADEM, que convidaram Maria a denunciar o Brasil à Organização dos Estados Americanos (OEA) pela negligência com que estava tratando os casos de violência doméstica no país. Ela concordou, e em 1997 a OEA aceitou a denúncia. Quatro ofícios da OEA foram encaminhados ao Brasil solicitando uma explicação para haver tanta demora na finalização desse processo, mas o Brasil nunca respondeu aos Ofícios.

Após a tramitação do caso na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que decidiu pela responsabilização do Estado brasileiro pela negligência e omissão no caso de Penha, a comissão pugnou pela rápida conclusão do processo penal de Maria da Penha, pela investigação das causas da elevada demora e das irregularidades processuais injustificadas no processo, pela efetivação de uma reparação simbólica à vítima por parte do Estado, além de medidas que buscassem combater a tolerância estatal e o tratamento discriminatório no que diz respeito à violência doméstica contra as mulheres, como, por exemplo, a multiplicação de delegacias especializadas, a inclusão nos planos pedagógicos escolares de unidades curriculares que versem sobre os direitos de gênero e a importância da mulher, entre outros.

Por duas vezes a comissão entrou em contato com o Brasil a fim de buscar um posicionamento acerca do caso. Não obtendo resposta, tornou público o relatório e o incluiu no Relatório Anual à Assembleia Geral da OEA do ano 2000.

Enfim, a Lei, entretanto...



Procurando observar as recomendações da OEA, o Brasil editou a lei nº 11.340, que promulgada em 2006, recebeu o nome "Lei Maria da Penha", como retratação simbólica ao caso. Entretanto, sabemos que mudanças legislativas não tem o poder de mudar um contexto de desigualdade, que baseado em uma cultura discriminatória, ainda atribui diferentes valores a atitudes iguais praticadas por homens e mulheres.

Nesse sentido, as lei embora inovadora, não foi o suficiente para erradicar ou reduzir satisfatoriamente os casos de violência doméstica e familiar contra as mulheres no país. Isto porque o grande espaço existente entre o discurso e a realidade fática está ocupado pelo machismo e pela discriminação de gênero. Negar essa realidade impede-nos de debater o problema de forma que possam ser encontradas alternativas mais eficazes ao combate a essas violências.

Evidente que, uma das legislações de maior popularidade no país, a Lei nº 11.340/2006 fomentou o debate acerca das diferentes violências contra a mulher e gerou grandes discussões a respeito de sua aplicação e seus limites na concretização dos direitos das mulheres ao longo da última década. Nesse sentido, também foi reconhecida como uma política pública que demanda empenho de governo e sociedade para que obtenha êxito em sua efetivação.

Todavia, ela ainda é divulgada predominantemente no seu aspecto penal, apostando-se em um maior rigor punitivo como medida de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher, como por exemplo, com as penas restritivas de liberdade para os agressores. Contudo, seu caráter mais inovador e emancipatório reside na forma ampla com a qual a lei propõe que o tema seja tratado, protegendo a integridade física da mulher nos casos concretos, mas especialmente, prevendo medidas de assistência que visem fortalecer as mulheres, e medidas de prevenção (as chamadas "medidas protetivas") que tentem romper com a reprodução das violências baseadas no gênero.

Lei do Feminicídio


Alguns anos mais tarde mais um degrau foi galgado na proteção contra a mulher. Entrou em vigor em 09 de março de 2015 a lei 13.104/15. A nova lei alterou o código penal para incluir mais uma modalidade de homicídio qualificado, o feminicídio: quando o crime for praticado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino.

O § 2º-A foi acrescentado como norma explicativa do termo "razões da condição de sexo feminino", esclarecendo que ocorrerá em duas hipóteses: 
  • a) violência doméstica e familiar; 
  • b) menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
A lei acrescentou ainda o § 7º ao art. 121 do CP estabelecendo causas de aumento de pena para o crime de feminicídio.

A pena será aumentada de 1/3 até a metade se for praticado: 
  • a) durante a gravidez ou nos 3 meses posteriores ao parto; 
  • b) contra pessoa menor de 14 anos, maior de 60 anos ou com deficiência; 
  • c) na presença de ascendente ou descendente da vítima.
Por fim, a lei alterou o art. da Lei 8072/90 (Lei de crimes hediondos) para incluir a alteração, deixando claro que o feminicídio é nova modalidade de homicídio qualificado, entrando, portanto, no rol dos crimes hediondos.

De acordo com o Instituto Avante Brasil (IAB)  uma mulher morre a cada hora no Brasil. Quase metade desses homicídios são dolosos praticados em violência doméstica ou familiar através do uso de armas de fogo. 34% são por instrumentos perfuro-cortantes (facas, por exemplo), 7% por asfixia decorrente de estrangulamento, representando os meios mais comuns nesse tipo ocorrência.

O debate que se inicia agora é: transformar em crime hediondo reduzirá os números de homicídio contra mulher? Ou estamos diante de mais uma lei simbólica, eleitoreira e populista?

Conclusão


Da mesma forma, precisamos lembrar que existem formas de violência contra mulheres em razão do gênero que sequer tem previsão legal, como é o caso das violências obstétrica, política e institucional, por exemplo. Temos também que recordar que ao falar em mulheres há diversas especificidades a serem consideradas, tanto no momento de elaboração quanto de aplicação das leis. Diferenças de raça, cor, religião, orientação sexual, idade, etc., podem precisar de proteções diferenciadas e específicas.

Se por um lado, felizmente o aumento da conscientização acerca do desrespeito sofrido cresceu, por outro percebemos que os números de mulheres expostas a situações de violência é bastante alto, mesmo após progressos legislativos. E mais: embora os dados por si só já sejam bastante impactantes, eles ainda podem representar apenas uma parte da realidade, uma vez que parcela considerável dos crimes não chega a ser denunciado. Mas, se o instrumento normativo já existe e não se demonstra suficiente para combater o problema, de que forma é possível mudar tal realidade?

[Fonte: Advoga (imagens); Conteúdo Jurídico; Jus Brasil]

A Deus toda glória. 
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E nem 1% religioso.

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