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quinta-feira, 8 de março de 2018

ACONTECIMENTOS - ESPECIAL DIA DAS MULHERES: O CASO ELOÁ PIMENTEL

Desde o ano de 2015 o dicionário criminalista brasileiro registra um novo e incômodo termo: Feminicídio perseguição e morte intencional de pessoas do sexo feminino, classificado como um crime hediondo no Brasil. 

O feminicídio se configura quando é comprovada as causas do assassinato, devendo este ser exclusivamente por questões de gênero, ou seja, quando uma mulher é morta simplesmente por ser mulher. 

Alguns estudiosos do tema alegam que o termo feminicídio se originou a partir da expressão "generocídio", que significa o assassinato massivo de um determinado tipo de gênero sexual. 

De modo geral, o feminicídio pode ser considerado uma forma extrema de misoginia, ou seja, ódio e repulsa às mulheres ou contra tudo o que seja ligado ao feminino. 

Para tentar impedir os crimes contra as pessoas do sexo feminino, a então presidente do Brasil, Dilma Rousseff, sancionou a Lei 13.104, em 9 de março de 2015, conhecida como a Lei do Feminicídio.

A lei altera o Código Penal (art. 121 do Decreto Lei nº 2.848/40), incluindo o feminicídio como uma modalidade de homicídio qualificado, entrando no rol dos crimes hediondos.

A justificativa para a necessidade de uma lei especifica para os crimes relacionados ao gênero feminino, está no fato de 40% dos assassinatos de mulheres nos últimos anos serem cometidos dentro da própria casa das vítimas, muitas vezes por companheiros ou ex-companheiros.

Pois é, sete anos da Lei do Feminicídio ter sido sancionada, quando nem mesmo o termo existia, uma adolescente já protagonizava este que viria a ser um dos mais intensos e comoventes casos de Feminicídio registrado na história policial brasileira. Nesse dia especial dedicado às mulheres, eu te convido a recordar comigo essa triste história, que, infelizmente, não encerrou o trágico ciclo de violência contra as mulheres.

O Caso Eloá Pimentel

Os envolvidos


Eloá Cristina Pimentel tinha 15 anos quando foi feita refém pelo ex-namorado, Lindemberg Fernandes Alves, juntamente com sua melhor amiga, Nayara Rodrigues da Silva, e dois rapazes. Era uma segunda-feira, dia 13 de outubro de 2008, quando o auxiliar de produção Lindemberg, de 22 anos, invadiu o apartamento da ex-namorada, a estudante Eloá, em Santo André (SP), e a manteve em cárcere privado junto com mais três amigos.

Após mais de cem horas como refém, Eloá levou dois tiros e morreu. Nayara, 15, foi baleada no rosto, mas sobreviveu. Os garotos Vitor Lopes de Campos e Iago Vilera de Oliveira foram liberados ilesos no primeiro dia de sequestro. Lindemberg está detido no presídio de Tremembé (SP).


O início


Às 13h30 do dia 13 de outubro de 2008, os jovens estudavam no apartamento de Eloá, em um conjunto habitacional de Santo André, ABC paulista, quando Lindemberg, à época com 22 anos, invadiu o local. Às 20h, o pai de um dos meninos bateu à porta do apartamento e ouviu Nayara pedir para que ele se afastasse. Inciava ali as mais de 100 horas de sequestro com um desfecho trágico.

Os dois garotos foram liberados naquela mesma noite, mas as meninas permaneceram reféns de Lindemberg. No final da noite do segundo dia de cárcere privado, Nayara foi libertada pelo sequestrador. Porém, a jovem voltou ao local no dia 15 para negociar com Lindemberg a libertação da amiga e foi feita refém novamente.

O desfecho


Às 18h08 do dia 17 de outubro, policiais do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) invadiram o apartamento e, em meio à troca de tiros, Eloá e Nayara foram atingidas. Eloá foi baleada na virilha e na cabeça. A jovem não resistiu ao ferimentos e faleceu no final da noite do dia seguinte. Nayara recebeu um disparo no rosto, mas sobreviveu. Sem ferimentos, Lindemberg foi detido e levado para o 6º Distrito Policial.

Crítica à espetacularização do caso


Assim que o sequestro foi comunicado à Polícia, emissoras de rádio e TV passaram a transmitir em tempo real toda a movimentação em volta do caso, desde o desespero dos familiares das vítimas até as exigências do sequestrador, entrevistado ao vivo pela apresentadora Sônia Abrão para o programa A Tarde É Sua (Rede TV!).

A esse respeito, a secretária-executiva de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Lourdes Bandeira, criticou: 
"Eloá teve várias mortes: em sua exposição midiática, sua perda de dignidade, de identidade, de humanidade, e sua morte física. Esse feminicídio evidencia o caráter violento que caracteriza as relações de gênero, sobretudo, as relações mais íntimas."

A condenação


Relatado pela imprensa como o mais longo período de cárcere privado na literatura policial no Brasil, com mais de 100 horas de duração, o caso teve seu desfecho pouco mais de três anos depois. Em fevereiro de 2012, Lindemberg Alves foi levado a júri popular e condenado a 30 anos de prisão por homicídio doloso qualificado por motivo torpe contra Eloá, a 20 anos por tentativa de homicídio contra Nayara, a 10 anos por tentativa de homicídio contra o sargento Atos Valeriano, a 4 anos e 2 meses para cada um dos cárceres privados e a 4 anos e 3 meses para cada um dos quatro disparos.

Enquanto o STF decidia o "futuro do país" em julgamento da Lei da Ficha Limpa, a imprensa de um modo geral acompanhava de perto o Júri marcado pelo mais longo cárcere privado (quase 100 horas) do estado de São Paulo e pelo homicídio de Eloá Pimentel, sendo o acusado Lindemberg Alves condenado pelo Conselho de Sentença pela prática de 12 crimes, a uma pena total de 98 anos e 10 meses de reclusão.
Em síntese, os delitos foram os seguintes: 
  • homicídio qualificado pelo motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima (Eloá Pimentel), 
  • homicídio tentado qualificado pelo motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima (Nayara), 
  • homicídio qualificado tentado (vítima Atos Valeriano), 
  • cinco crimes de cárcere privado e 
  • quatro crimes de disparo de arma de fogo.
O total de 98 anos de condenação em primeira instância, com pagamento de 1.320 dias-multa, no valor mínimo legal, foi reduzido em junho de 2013 pelo Tribunal de Justiça de São Paulo para 39 anos e 3 meses de reclusão, com início em regime fechado, e ao pagamento de 16 dias-multa.

Crime passional


De acordo com o Ministério Público tratou-se de crime passional (e não premeditado), assim como nos casos Daniella Perez, Sandra Gomide, Mércia Nakashima e Eliza Samúdio. Delitos estes fruto de uma sociedade machista e sexista, como se os homens fossem "Deuses do Olimpo".

São 11 mulheres vitimadas por dia em nosso país, e a máxima é sempre a mesma: "se não for minha não será de mais ninguém", por isso o fim do relacionamento levou o acusado ao desespero e a consequente perda do senso de controle sobre suas atitudes. Aliás, é exatamente isso que leva muitas pessoas ao cárcere: a influência do álcool, drogas, ou alguma forte emoção faz as pessoas perderem a razão, o controle e, como se sabe, o homem é naturalmente mau, sendo-lhe ínsito o animus necandi.

A condenação com certeza foi justa, merecida. Analisando a teoria eclética (art. 59, parte final, do CP) quanto às finalidades da pena, é possível afirmar que houve a retribuição pelo mal causado e foi mostrado para a sociedade que o Estado tem o monopólio do direito de punir, de modo que se outro agressor portar-se da mesma forma receberá tratamento penal similar ao de Lindemberg. Todavia, será que haverá a ressocialização desse condenado?

Uma punição exemplar (?)


Logo após a divulgação da sentença, a Secretaria de Políticas para as Mulheres divulgou nota em que comemora: 
"Em pleno andamento da Campanha Compromisso e Atitude, o Judiciário de São Paulo dá um grande passo para ampliarmos e acelerarmos os vários processos parados nos tribunais regionais, de crimes contra as mulheres.  
Diante desse novo entendimento dos processos de violência contra mulheres, aprovado pelo STF, julgamento como este do assassinato de Eloá Pimentel resgata nas mulheres a confiança nas instituições de defesa dos direitos e acesso à Justiça, principalmente o direito das mulheres",
 declarou a ministra da SPM-PR, Eleonora Menicucci.

Conclusão


Nada mais seguro que prever o passado, não há erro. O Brasil de tantos técnicos de futebol quantos torcedores, revelou-se nesse episódio com igual número de técnicos de segurança, de paixão e de loucura. O caso Eloá exige. Parece ser insuportável simplesmente não entender, enfrentar o impacto não só da violência mas também o da surpresa e da estranheza.

Podemos julgar uma ação por seus princípios, ou por suas consequências. No caso, frente à morte, o que importa é a consequência, mais que os princípios: Eloá morreu, logo, houve um erro. O fato de sabermos que houve um erro quer dizer que necessariamente ele poderia ter sido evitado? É o que gostaríamos que fosse, mas a resposta é não; há sempre um imponderável, podemos melhorar os acertos, mas não garanti-los.

Na intimidade é mais fácil sermos incoerentes, duvidarmos, revermos. Agora, se você resolve convocar uma grande platéia, muito maior que a de um teatro, aí as proporções são outras, o jogo é outro: acabou a conversa, começou a legitimação, o popularmente dito: jogo para a torcida. A patologia do amor pode fazer que alguém, um jovem tendo perdido a sua coisa, o seu objeto, a sua mulher, e queira consagrar a presença perdida.

Ele entendeu mal a lição do Romeu e da Julieta, e para expressar o seu amor doente, se ele não pode casar, para inventar a vida, que seja a morte que lhe invente a eternidade; sim, ele pode assim querer. Ele pedia insistentemente algo como: 
"Invadam logo esse bagulho aqui, vamos acabar logo com isso, eu insisto, eu insisto...". 
E o palco foi feito com muito mais câmaras de fotografia e de televisão, que em qualquer casamento de filho de político com de banqueiro. O que poderíamos esperar do policial negociador que tentou parar esse casamento trágico? Muito pouco, nada, a conversa não era com ele, era com a tela, com o estar bonito na fotografia, com a consagração do crime. O tempora, o mores! ["Ó tempos, ó costumes", em tradução livre]. 

E nessa dança macabra, o passo final, a imprescindível prisão do falso amante - pois entender não é desculpar - é dado pelos acordes da nossa música social. Caímos na armadilha: temos que prender quem quer ser preso. Quanto a Eloá, foi presa à eternidade com apenas 15 anos de uma breve existência eternizada na indignação de tantas outras  mulheres que seguem encarceradas no anonimato até serem reveladas como as vítimas fatais de alguma manchete policial.


A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.

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