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terça-feira, 2 de maio de 2017

LIVROS QUE EU LI - "DECEPCIONADOS COM A GRAÇA"

Antes de falar sobre o livro propriamente dito, acho imprescindível sabermos qual o principal assunto no qual ele se baseia.

Definindo a Teologia da Prosperidade


Antes de definir o que é a chamada "teologia da prosperidade", que tem seduzido a muitos atualmente, é necessário entender a sua origem. Ela nasceu no movimento pentecostal e este teve três grandes "ondas" no Brasil.

A primeira onda é representada pelas igrejas pentecostais "clássicas", por assim dizer, tais como Assembleia de Deus, Congregação Cristã do Brasil etc. Ela se caracterizava pela centralidade em Deus, ou seja, Jesus iria voltar em breve, por isso era necessário responder com a busca sincera pela santidade. É a onda do "Deus dos carismas".

Aquelas igrejas receberam influência direta de um movimento americano denominado "Hollyness" o qual enfatizava precisamente a grandeza de Deus, a centralidade do retorno de nosso Senhor Jesus Cristo e a santidade na vida pessoal, por isso, a primeira onda de pentecostalismo pode ser definida como uma busca de santidade de vida na presença de Deus.

A segunda onda de pentecostalismo no Brasil se manifesta nas igrejas Deus É Amor, Igreja do Evangelho Quadrangular, O Brasil para Cristo etc, e a centralidade se concentra agora nos carismas e nos milagres, por isso são chamadas de "taumatúrgicas", ou seja, voltadas para as curas, os prodígios, das poderosas unções e todo tipo de "serviços" e cultos religiosos voltados para os milagres.

Por fim, a terceira onda do movimento pentecostal é justamente a da "Teologia da Prosperidade". Se antes era o Deus dos carismas (1ª onda), depois os carismas de Deus (2ª onda), agora, finalmente, o homem tomou o centro e é Deus quem está a seu serviço.

A teologia da prosperidade baseia-se na chamada "lei da reciprocidade", ou seja, se o ser humano for bom para com Deus, Deus é "obrigado" a ser bom de volta. É uma relação matemática, com ação e reação; na medida em que a fidelidade humana é demonstrada de forma material, necessariamente se obterá a prosperidade material nesta vida.

Antropocentrismo


O pentecostalismo dessa teologia é antropocêntrico: não é o homem que serve a Deus, mas Deus que serve ao homem. As Igrejas dessa onda não tem fiéis e sim, clientes. O que leva inevitavelmente a uma progressiva paganização do cristianismo, pois as pessoas pulam de igreja em igreja não em busca de salvação, mas de um "serviço".

A teologia da prosperidade traiu o cristianismo de forma clara. Enquanto nas duas ondas precedentes observava-se ainda um núcleo cristão, nesta o que se tem é um desagregamento do que é próprio do cristão, pois toda a tradição evangélica segue a teologia de que o que importa é a fé e não as obras. A teologia da prosperidade consegue perverter essa tradição por meio de um jogo linguístico em que as obras são renomeadas como "materialização, manifestação da fé". Isso significa que o que importa são as obras, pois Deus irá "pagar".

Mas não é só isso. A teologia da prosperidade trai também o próprio cristianismo, pois ela não exige conversão, mudança de vida, uma vida moral reta. O que se tem no neo-pentecostalismo, em que a teologia da prosperidade se insere, uma acentuação no fato de que as obras morais são desprezíveis, o que se traduz pela aceitação de todo tipo de desregramento sexual.

Diante disso, é possível afirmar que a teologia da prosperidade é a paganização do cristianismo, pois tal qual ocorre nos cultos pagãos, faz-se uma "oferenda", não mais em encruzilhadas, mas na conta bancária da igreja. De forma asséptica, rápida e quase indolor, munido apenas de um cartão, oferece-se um "sacrifício", pagando pelo serviço que Deus irá prestar. Isso é paganismo.

Enquanto no cristianismo o homem crê que Deus é o Senhor e que deve estar a serviço dEle, no paganismo é justamente o contrário: Deus é que está a serviço do homem. E cada vez mais novas "fórmulas", "visões" são apresentadas para que Deus se torne como que escravo do homem e atenda a todos os seus caprichos.

Por tudo isso conclui-se que a teologia da prosperidade é muito equivocada. Ela só se explica como uma verdadeira tentação satânica em que cristãos, aos poucos, são levados a transformar o cristianismo e o nome do Senhor Jesus Cristo em uma fórmula mágica e pagã.

Durante muito tempo os evangélicos acusaram os católicos de praticarem um cristianismo paganizado, no entanto, com a teologia da prosperidade, a acusação voltou-se para eles mesmos, pois, enfim, os evangélicos paganizaram o cristianismo.

Depois desse "desabafo", agora sim...


Vamos ao livro


O melhor livro que pude ler sobre este ensino tão difundido nos dias de hoje. O livro trata das "esperanças e das frustrações no Brasil neopentecostal". Como de costume, compartilho com outros irmãos daquilo que o Senhor tem me acrescentado (sem a preocupação de que alguém venha a discordar de mim).

Esta obra ajudará o cristão a identificar igrejas que abusam do autoritarismo entre outras coisas. Muitos pensam que a famigerada "teologia da prosperidade" trata apenas de dinheiro. De fato, este é seu carro forte. Contudo, vai além! "Trata do culto a personalidade do líder" – "confissão positiva" – "batalha espiritual estética" -, entre outros ensinos espúrios que são contrários aos ensinos das Escrituras.

Por muitos anos o Pastor e Doutor Paulo Romeiro vem se especializando no assunto. Suas obras "Supercrentes" e "Evangélicos em Crise" têm uma abordagem mais apologética do assunto. Já "Decepcionados com a graça" traz uma abordagem acadêmica, fruto de sua tese de doutorado pela Universidade Metodista de São Paulo. A seriedade da obra se percebe logo pelo prefácio. 

É uma obra riquíssima em informações históricas. Relatos por meio de pesquisas de campo tornou empírica toda nocividade que este movimento tem sido na história da Igreja de Cristo. Só em referências bibliográficas, o Dr. Paulo se utiliza de 10 páginas para registrá-las, ajudando o pesquisador interessado no tema. O livro é dividido em três partes. Em um modo sucinto, quero abordar os principais assuntos destes tópicos.


Parte 1 – A trajetória histórica do neopentecostalismo


O livro trata da origem do pentecostalismo a partir do século XX. Ele também aborda o "motanismo", o "pietismo", o "metodismo" como tendo em parte, certa influência neste movimento. Aborda os percussores do pentecostalismo atual: o pregador Charles Parham e Willian Seymour. O movimento pentecostal chegou ao Brasil em 1910 através da Congregação Cristã do Brasil, fundada por Louis Francescon. 

Contudo, o movimento ganhou força través das "Assembleias de Deus". Com a chegada de Gunnar Vingren e Daniel Berg ao Brasil, a Assembleia de Deus tornou a maior denominação evangélica do país. Logo após chegou a "Igreja do Evangelho Quadrangular", fundada em Los Angeles pela canadense Aimée Semple McPherson. Esta denominação chegou em solo brasileiro através do missionário Harold Williams. 

"O Brasil para Cristo" veio na sequência da esteira pentecostal. Foi a primeira denominação pentecostal brasileira, fundada em São Paulo por Manuel de Mello. A Deus é amor, movimento fundado por David Miranda chegou logo após. A partir da "Igreja de Nova Vida" fundada pelo Bispo McAlister, a recepção para receber o neopentecostalismo estava pronta. Pois da Igreja de Nova Vida saíram os principais líderes do neopentecostalismo brasileiro como Edir Macedo, R. R Soares e Miguel Ângelo, fundador e líder do ministério Cristo Vive.

Estabelecido o neopentecostalismo no Brasil, Paulo Romeiro passa então a definir este movimento pelas principais denominações e delas a obra especifica um pouco de sua história e o processo de conversão dos seus principais líderes e como foi implantando estes ministérios. Dentre eles, o pastor destaca: A Igreja Universal do Reino de Deus; A Igreja apostólica Renascer em Cristo; a Comunidade Sara Nossa Terra; a Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo; a Comunidade Cristã Paz e Vida; a Igreja Internacional da Graça e a Igreja Bola de Neve. Várias surgiram depois da publicação do livro, e talvez a principal seja a Igreja Mundial do Poder de Deus, que tem por líder o apóstolo Valdemiro Santiago.

Ele aborda os fatores principais que fizeram deste fenômeno [o movimento neopentecostal] crescer aglutinando multidões. Romeiro trata da "liderança carismáticas dos seus líderes"; as "mudanças de paradigma nos usos e costumes" que vão à contra mão do rigor ascético na conduta e vestimenta de algumas Assembleias de Deus, Deus é Amor e Congregação Cristã no Brasil. 

O Dr. Paulo aborda também os fatores que possibilitou o crescimento: a mudança "da liturgia nos cultos", ou seja, mais descontração e entretenimento. Ele trata por meio de pesquisas, o proselitismo que o neopentecoslismo [o ganho de fiéis] angariou do Catolicismo Romano. A divulgação na mídia através da rádio e da televisão, pelos tele-evangelistas, trouxe muitos adeptos para dentro dos seus templos.


Parte 2 – Os aspectos teológicos do neopentecostalismo brasileiro


Esta parte do livro se inicia falando a respeito da "influência da confissão positiva". Paulo Romeiro aborda o desprezo do neopentecostalismo para com as doutrinas fundamentais do cristianismo ortodoxo como a "justificação pela fé", "adoção", "predestinação" e "escatologia". Ele também traça as raízes da confissão positiva no seu líder e preletor Willian Kenyon, até chegar em Kenneth Hangin

Fala um pouco sobre a expansão controvertida acerca deste ensino. O enfoque da confissão positiva está na "doença e saúde [cristão abençoado não pode ficar doente]", "Riqueza e pobreza [todo filho de Deus não pode passar por necessidade]", e a ênfase em uma batalha mitológica dualista entre "Deus e Satanás" focando "as forças do mal".

"Hermenêutica da ganância" é o termo que o Dr. Paulo Romeiro tem usado nos últimos dias para caracterizar os sermões destes pregadores. Ele não usa este termo na obra, mas trata deste assunto no capitulo 5. A ênfase destes apóstolos e bispos não é pregar, mas arrecadar. 

Outra característica abordada na obra acerca do neopentecostalismo são os "símbolos chamados pontos de contato e as experiências místicas de seus líderes". Dentre estes símbolos estão o enxofre, óleo ungido, rosa ungida, fogueira santa de Israel, sal grosso e copo d'água em cima do rádio ou da TV.

A liturgia dos cultos neopentecostal foi amoldada segundo o gosto do fiel. Ao contrário do pentecostalismo clássico que tinha no seu bojo louvores que apregoavam mensagens de abnegação e busca da felicidade após a morte, de exaltação do sofrimento e condenação dos prazeres do mundo, as músicas entoadas nos cultos neopentecostais, incentivam a busca dos bens materiais e da felicidade terrena. 

Sua liturgia engloba também novas práticas como "mapeamento espiritual", "cura interior com regressão", "um modelo de crescimento de igrejas denominado G-12", "espíritos territoriais", "cair no espírito", "gargalhada sagrada" e "dentes de ouro". Segundo o pesquisador Michael Moriarty, as características intrínsecas no movimento neopentecostal norte-americano são muitos parecidas com as do contexto brasileiro: "sensacionalismo", "culto à personalidade", "pontos de vista exagerados de libertação", "levantamentos escandalosos de fundos", "fé enganosa", "excessiva preocupação com satanás e seus demônios", "novas revelações como meio de obter a verdade espiritual" e "crescente desconfiança do raciocínio para obter ou avaliar verdades espirituais".

No capitulo 7 do livro o pastor expõe algumas experiências de "esperanças e decepções" que alguns fiéis tiveram nestas denominações. Abordagens e pesquisas de campo foram feitas por Romeiro. Os casos continuam a se repetir por este mundão a fora. É necessário cautela e preparação para receber estes irmãos que chegam tão machucados a maculados na sua integridade psicológica e espiritual devido a experiências desastrosas. Grande é o desafio da Igreja de Cristo diante do neopentecostalismo.


Parte 3 – A prática pastoral no contexto da graça


A todos os irmãos recomendo a leitura do livro por completo. Aos "decepcionados", se possível, leiam pelo menos o capitulo 3. O Dr. Paulo Romeiro trata da "Maravilhosa Graça de Deus que está em Jesus Cristo". Ele aborda as bênçãos do Senhor sendo seu favor imerecido, apenas e exclusivamente pela graça a qual Deus livremente decidiu atuar.

O sofrimento e as esperança segundo as Escrituras. Como o cristão deve se comportar e no que acreditar em momentos de tribulações. E quando a oração não é atendida? Questões fundamentais estas que, pelo o Espírito, no conduz a "responder com mansidão a razão da nossa esperança em meio a tempestades" (1 Pedro 3:15). Nas considerações finais, o Dr. Paulo Romeiro, diz que, o neopentecostalismo brasileiro continuará sendo uma atração e um desafio para os pesquisadores de religião.

Minha opinião


Uma frase de Paulo Romeiro trouxe luz ao meu entendimento acerca de Mateus 6:24 "ninguém pode servir a Deus e as riquezas"; "o dinheiro pode ser um excelente empregado, mas nunca será um bom padrão". O texto de Paulo a Timóteo, em sua primeira epístola (6:10) traz significado ao que estamos vivendo nos dias atuais: 
"Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores".
Muitos criticam o ministério apologético, o qual denuncia a doutrina espúria destes preletores. Contudo, não imaginamos o que se passa por de traz dos bastidores. A você que não sabe – Deus não levará em conta; ao que sabe e por isso lhe pesa um dever, pois 
"aquele que sabe fazer o bem e não faz, pecou e será tido por réu diante de Deus" – 
é o que diz nosso irmão apologista Judas [não o Iscariotes]: 
"Amados, procurando eu escrever-vos com toda a diligência acerca da salvação comum, tive por necessidade escrever-vos, e exortar-vos a batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos" (1:3, NVI).
Todo cristão sério que deseja servir a Deus com uma boa consciência, mesmo que ainda não tenha tido a iluminação de toda essa podridão, hora menos hora, o Senhor lhe despertará como diz Paulo aos coríntios: 
"E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós" (1 Coríntios 11:19).
Precisamos apenas estar bem aparados de amor, de piedade e com a justiça, meios pelos quais são características e instrumentos eficazes de um servo de Deus para receber estes irmãos que chegarão a nós machucados e "Decepcionados com a Graça".
"E também houve entre o povo falsos profetas, como entre vós haverá também falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição, e negarão o Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina perdição. 
E muitos seguirão as suas dissoluções, pelos quais será blasfemado o caminho da verdade. E por avareza farão de vós negócio com palavras fingidas; sobre os quais já de largo tempo não será tardia a sentença, e a sua perdição não dormita". – 2 Pedro 2:1-3

Conclusão


O título do livro, Decepcionados com a Graça – Esperanças e frustrações no Brasil Neopentecostal (São Paulo : Mundo Cristão, 2005), mostra claramente o interesse do seu autor, Pastor e Doutor Paulo Romeiro (Th.M., Ph.D.) em expor como o nosso país tem sido influenciado pelo neopentecostalismo. Passando por pouco mais de suas 200 páginas, o leitor vai conhecer as origens, não só dos movimentos (pentecostal e neopentecostal), mas das principais igrejas que os propagaram. 

Também, como as três ondas do pentecostalismo foram somando-se, formando o que a maioria dos brasileiros, de forma geral, chama de evangélicos. O autor enriquece a obra verificando os efeitos sociais, pela pesquisa de campo, entrevistando quem tem "ganhado" e perdido com tais movimentos. 

Por fim, como qualquer livro dito evangélico deve ser suas páginas apontam para um retorno à Palavra, a fim de encontrarmos respostas, tanto teológicas como práticas, a começar pela compaixão por aqueles que têm sofrido a dor e as conseqüências de suas próprias escolhas. 

A pesquisa que o autor do fez mostra que as práticas e atividades mencionadas acima têm formado outro grupo, sem espaço na mídia, mas com problemas profundos que precisam ser resolvidos. A mensagem tem feito bem para umas pessoas, mas também faz mal a outras, pois, segundo Romeiro, poucos são beneficiados com a libertação. 

Ele teve contato com várias pessoas que por alguns anos participaram destas igrejas e conta alguns casos de decepção. Este novo grupo, que ele chama de "nômades da fé", por causa da era da velocidade (tudo tem que ser logo), demonstra que quanto mais transitam, mais se decepcionam, e quanto mais se decepcionam, mais transitam!

O interesse de Paulo Romeiro (formado em Jornalismo), somado à sua experiência no meio pentecostal, e a preocupação com os problemas doutrinários nas igrejas brasileiras instigou-o a escrever "Decepcionados com a Graça", assim como "Super Crentes: O evangelho segundo Kenneth Hagin, Valnice Milhomens e os profetas da prosperidade (1993)" e "5 Evangélicos em Crise: Decadência doutrinária na igreja (1995)". Livros que analisam, criticam e procuram dar ferramentas para combater tais movimentos ao mesmo tempo em que busca restaurar aqueles que foram atingidos pelos mesmos. 

É, portanto, um material e, porque não dizer, um autor que abre os olhos dos cristãos verdeiros que têm em seu cristianismo bíblico as respostas para a sociedade perdida, mesmo que esta esteja dentro das paredes das igrejas! 
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Ficha técnica:

  • Autor: Paulo Romeiro
  • Paginas: 257
  • Editoras: Candeia e Mundo Cristão
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OBS: Todas as citações [" "] foram extraídas do próprio livro exceto as citações bíblicas as quais foram introduzidas apenas para trazer luz ao objetivo do contexto.

A Deus toda glória. 
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