Total de visualizações de página

sábado, 10 de dezembro de 2022

PRONTO, FALEI! — "FAROFA DA GKAY": OSTENTAÇÃO DA VULGARIDADE

Devido ao grande número de acessos no primeiro artigo dessa série especial "Pronto, Falei!", que já conta com quase um milhão de visualizações, desde que o postei, há exatamente uma semana (veja ➫ aqui) e também correspondendo aos muitos e-mails que recebi, me pedindo para escrever outro capítulo para a série, em respeito aos meus amados seguidores aqui no blogue Circuito Geral, resolvi atender aos pedidos.

Dentre os pedidos, também me fizeram algumas sugestões de temas e assuntos, sendo o campeão, o pedido para eu dar minha opinião sobre esse tal evento, que, até então, eu só conhecia de muito ouvir falar. A abominável — sob todos os aspectos — "Farofa da GKay", que virou o assunto preferido dos tão abomináveis quanto portais de fofocas sobre a vida glamourosa, porém, futil e inútil dessas subcelebridades, que, acham o máximo expor, dentre outras inutilidades, detalhes sórdidos de suas movimentadas e promíscuas aventuras sexuais.

Pois bem, lá fui eu na árdua e hercúlea tarefa de pesquisar sobre, afinal, que m... é essa tal tão balada "Farofa da GKay"? Eu já desconfiava que boa coisa não era, pois, para atrair o interesse de uma determinada emissora em fazer a exibição desse famigerado evento através de um de seus canais fechados, como se ele fosse mais um dos seus inomináveis realities shows, por certo, não haveria de ser algo bom. Pois bem, eis minha opinião sobre mais esse lixo luxuoso.

Circo dos horrores


A banda Legião Urbana, em uma de suas músicas, o hit "Eduardo e Mônica", em certo trecho canta:
"...Festa estranha, com gente esquisita...",
pois é exatamente a impressão que tive, quando fui ler sobre esse evento.

Pode ser que você tenha se cansado de ler sobre essa festa. Que não interesse. Mas recomendo que continue a ler porque descobri um mundo muito além do que eu conhecia.

Famosos quem?


O primeiro passo foi recorrer à velha e boa bolha do Twitter. Nada. Concluí rapidamente que minha bolhazinha é maravilhosa para se discutir política, mas uma negação pra falar sobre "babados".

Invoquei o grande oráculo da Era Moderna, a luz que ilumina as trevas de nossa ignorância… sim, minha gente. Apelei para o ilustríssimo mestre de todos os especialistas: o teacher Google.

"Farofa da GKay", digitei com cuidado no buscador do meu velho e amado PC de mesa (estou sem notebook e tenho uma paixão assumida por meu veínho PC...). E voilà, como diriam em francês na redação do Le Monde: ali estava a resposta!

Centenas de referências, ou melhor, milhares (bastando apenas fazer a rolagem da página) pipocaram em frente aos meus olhos, assim como uma inesperada receita de bolo de cenoura com cauda de chocolate.

"Gkay"? Quem?


Desculpe minha ignorância, mas, até então, eu não fazia a menor ideia de quem era essa criatura na já extensa fila da picanha gratuíta! Pois bem, descobri que "GKay" é codinome de uma tal que se diz atriz e influenciadora paraibana Gessica Kayane Rocha de Vasconcelos, natural de Solânea, distante 130 quilômetros da capital do Estado.

Descobri que a moça (30 anos recém-completos) já acumula quase 20 milhões de seguidores no Instagram, e mais de um milhão no YouTube. Estrelou dois filmes (me desculpe, mas não tive a curiosidade de saber quais foram as películas) e participou de séries de comédia no Multishow (o mesmo canal que agora está fazendo a exibição de sua farrinha)…

Espera aí: dezesseis milhões de seguidores? Então tem história aí. Tem relevância, para usar um termo bem clichê. Fiquei envergonhado. Eu, um cara bem antenado, que sempre procura estar a par dos acontecimentos atuais, ávido pesquisador e leitor voraz, nunca ter ouvido falar dessa moça antes do evento. Vivemos em bolhas e estourá-las é necessário. Plec!

"Farofa" é o nome que a mesma deu à sua festinha de aniversário, desde 2017. É mais que um singelo "parabéns pra você" com bolo, refrigerantes e salgadinhos comprados na padaria do sr. Manoel, aquela ali da esquina; virou um evento com mais regularidade que o Rock in Rio!

"Mim gosta ganhar dinheiro..."


Para ter o inenarrável privilégio de participar desse espetáculo, digno de ser comparado aos bacanais promovidos pelos devassos imperados romanos em seus surtos e delírios megalomaníacos, o custo é de R$ 2,8 milhões (não, querido(a), você não leu errado), "dark room" (um quarto escuro para prática sexual, muito comuns em casas de swuings e saunas gays), bebidas e aglomeração, muita aglomeração. Mas, não precisa se preocupar, a apresentação do comprovante de vacina é obrigatória aos convidados. Por lá, ao menos a covid não passa!

Com entrada permitida apenas para convidados, a festa ocorreu no Marina Park Hotel, um luxuoso hoteu "mil estrelas", em Fortaleza (CE), com a presença de "relevantes celebridades" como Kefera(?), Whindersson Nunes, Viih Tube(?), Boca Rosa(?), Matheus Mazzafera(?), Valesca Popozuda, João Guilherme(?), Belo, Gracyanne Barbosa, MC Kevinho(?), Leo Santana, Carlinhos Maia e até o "irmão Wesley Safadão", sim, aquele mesmo, que foi batizado pelo pastor André Valadão, aqui (escrevo de Belo Horizonte, MG) da igreja Batista da Lagoinha, que se apresenta como evangélico.

Comentários nas redes sociais indicam que houve uso de drogas ilícitas e prática de orgias durante os três dias da "Farofa da GKay" — com direito até a apresentação de streap tease realizada por um anão  —, e a própria anfitriã disse em entrevista ter convidado pelo menos 20 homens, com os quais queria praticar sexo. Diante de toda a promiscuidade anunciada (e exibida àqueles que, apesar de não poderem estar presentes [Oh, dó!], pagaram para assistir no tal já citado canal fechado).

Fake life:

Zero espontaneidade!


Não tem problema (e talvez até ajude) se até domingo passado a aniversariante e os convidados eram os "famosos quem?" para muita gente. A estratégia de marketing da "farofa" deu certo e é sobre isso que estudiosos da Comunicação nos convidam a refletir.
"O importante é entender que não há nada de espontâneo nisso, mas muito de estratégia e mensuração"
analisa Simone Faustino, 35, jornalista e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Ceará, onde pesquisa influência digital e autoestima adolescente.

A pesquisadora lembra que os influenciadores têm uma equipe por trás, promovendo continuamente análises que vão desde as mais simples (como a contagem de likes, dislikes, comentários, compartilhamentos e posts salvos), até mais complexas, a exemplo das taxas de conversão ou compra geradas para as marcas após postagens publieditoriais.
"A taxa de engajamento — que mostra a quantidade ou o percentual de pessoas que interagiram com determinado conteúdo após sua postagem — é um índice importante para fazer com que novas pessoas procurem pelos influenciadores para segui-los e que novas marcas os contactem para contratá-los. É isso que faz a roda girar"
observa.

Logo, se você deu sua curtida para Gkay e a turma da farofa, reforçou o poder de mobilização dessas websubcelebridades, como explica Jeimes Alencar, 45, professor e coordenador dos cursos de Marketing da Unifor.
"Eles praticamente criaram um reality show no próprio evento, em que tudo que acontecia era transmitido por meio de lives e postagens. 

Fizeram uma série de ações de marketing, uma forma de trazer a imprensa e a sociedade como um todo para os digitais influencers, para mostrar a força que eles têm como poder de marca"
entende.

O "eu" como negócio


Ainda que algumas pessoas custem a entender esses fenômenos virais, que parecem ter se tornado famosos da noite para o dia, o percurso de parte deles não é tão rápido assim. A própria Gkay já vinha amadurecendo produções para internet desde 2013, primeiro, conforme eu já disse, como humorista, depois como atriz (perdoe-me Fernanda Montenegro) e influenciadora digital — agora com tantos milhões de seguidores no Instagram, quase 2 milhões obtidos só essa semana.

A pesquisadora Simone Faustino recupera o conceito de celebridade pré-internet para entender diante do que estamos agora.
"(Antes) Estava mais ligada ao arquétipo do herói, celebrado na Idade Antiga e ligado a sujeitos que se destacavam pelos seus feitos, pela fama criada por grandes feitos, por ser uma grande pessoa. Elas geravam admiração e até fomentavam relações afetivas e de consumo, mas costumavam ser pouco tangíveis para o público"
diz.

Hoje, porém, nesse cenário de mercantilização da imagem dominado por mídias como o Instagram, o YouTube e o TikTok, Faustino admite a ascensão de outro tipo de figura pública.
"São pessoas que constroem a si não mais como somente formadoras de opinião, mas enquanto marcas, extrapolando os limites das relações que ocorrem no meio digital. A gente vive o chamado capitalismo de plataforma, que favorece um modelo de negócio onde as pessoas monetizam a si mesmas, seus cotidianos e seus gostos para gerar menções, engajamento e negociar publicidade. Alguns autores chegam até a falar que os tempos atuais transformaram o 'eu' em uma commodity"
contextualiza.

Neste sentido, o professor Jeimes Alencar alerta também para uma falsa aproximação. 
"O digital influencer trabalha como símbolo. Às vezes, muito do que você gostaria de ser, muito do que você almeja, está ali. E o seguidor se identifica, mas, às vezes, está diante de uma falsa relação. Nem sempre é tudo cem por cento verdadeiro, né?"
provoca.

Ética e consumo


No jogo de realidade e aparência, um princípio ético pouco respeitado é o da sinalização objetiva do que é publicidade. 
"Sem separação entre o que se diz porque acredita e o que se diz porque houve pagamento, o público fica confuso e pode engolir tudo como verdade",
expõe Faustino.

De acordo com a pesquisadora, eventos como a "Farofa da GKay" vendem cotas de patrocínio para grandes marcas, fazem parcerias com inúmeros fornecedores — que incluem decoradores, estilistas, buffets e, mais recentemente, laboratórios que fazem testagem de convidados para a covid-19 (Isso mesmo, senhores!) — e pagam caro por postagens em perfis de fofocas, alguns com milhões de seguidores, que chegam a cobrar de 20 a 80 mil reais por menção no feed.
"Tudo nesse universo de superexposição é monetizado, desde a indicação do produtinho de skincare até os lugares onde eles comem e as viagens que fazem. Um exemplo: nunca se vendeu tantos pacotes para as Ilhas Maldivas, mesmo com a desvalorização enorme do real. Por quê? É lá que os influencers estão casando, passando lua de mel, fazendo fotos para serem imitadas. A vida perfeita vendida por eles gera nas pessoas o desejo da mímese, que é a imitação"
analisa. Entendeu a jogada?

Ainda segundo Faustino, muitos webfamosos têm noção de storytelling, um universo de técnicas para contar histórias de maneira marcante, usando elementos capazes de conectar o espectador em nível emocional. 
"Quando vemos, estamos com o cartão de crédito na mão".
E assim, enquanto os seguidores dessa gente se entretem com a pegação de uns e a separação ou a reconciliação de outros, os valores de consumo vão dando conta do recado.
"Naquele momento, as pessoas simplesmente deixam de se preocupar com outros assuntos do dia a dia: gasolina, preço de cesta básica e tudo mais, e focam na questão do consumo. 

Então, qual é o vestido que a influencer tal está usando? Qual o valor que foi gasto para pagar, por exemplo, um buffet ou almoço. E isso é muito divulgado por eles, inclusive o tempo todo"
pontua Jeimes Alencar sobre os R$2,8 milhões de investimento da GKay, que provavelmente já retornaram para ela.

Seguir ou não seguir?


Ok, se você chegou até aqui, talvez esteja se perguntando se quer ou não fazer essa roda girar. A primeira recomendação de Faustino é tomar cuidado para não seguir alguém apenas pelo medo de estar perdendo algo, síndrome mais conhecida como FoMO, "fear of missing out".

Depois, a pesquisadora reforça a importância de não perder de vista o ecossistema da internet como um cenário muito rico para a discussão de riscos e oportunidades. 
"Podemos debater muitas coisas, como padrões de beleza, pornografia de vingança, discurso de ódio e a responsabilidade dos influenciadores nesse contexto, pois há, sim, muita gente que se espelha neles"
ressalta.

A própria pandemia, a responsabilidade com o coletivo, o combate ao negacionismo científico e todas as questões sociais e legais envolvidas também devem estar no cerne dessa reflexão, segundo a estudiosa.
"As pessoas falam muito de fake news, mas, além de fake news, é bom a gente entender o que deve ser propagado ou não, ou quem eu devo seguir ou não. Então, criar esse filtro aí talvez seja um caminho melhor para se ter uma uma sociedade mais conectada, com mais sabedoria e conhecimento".
Fica aí a dica de quem sabe o que está falando!

Conclusão


Inegável que a abominável festa tomou proporções muito maiores do que se pode imaginar. Foi impossível você passar pelo Instagram ou pelo Twitter sem ser bombardeado por alguma notícia, foto ou vídeo.

Você, assim como eu, até pode não saber quem é GKay, mas não dá para alegar que não ouviu falar desse evento.

Fosse eu, para comemorar 30 anos, no final de 2022, abriria uma licitação para definir a cidade-sede. Sim, porque pode ser igual Olimpíadas, cada ano em um hotel diferente.

E o que eu tenho a ver com isso?


Absolutamente nada (Graças a Deus!). Mas, falar eu ainda posso, né? Apesar de minha descrença original, concluí que esse imenso "muitas felicidades" se enquadra em política e entretenimento.

Quase todo mundo ali era ligado a alguma categoria do show business, como já exposto com detalhes acima, movimentando cifras inconcebíveis (logo, entretenimento); e foram feitas declarações de protesto e preferências políticas (obviamente, todo mundo ali está no pêndulo da esquerda...). Momentos de cunho político em sua mais crua acepção, inclusive levando a alguns bate-bocas.

Numa vitrine para 66 milhões de pessoas. Pense nisso. Não tenho feito outra coisa desde que me deparei com a informação.

Para encerrar, na edição 2021, assim como na do ano corrente, houveram várias frases marcantes; preferi escolher uma, que resumisse bem o espírito festa de arromba, proferida pela referida Viih Tube(?): 
"não peguei sapinho, isso que importa"!
Ah, para terminar, do jeito que as coisas andam degringolando ladeira abaixo, não duvide se daqui a pouco, algum surtado inventar uma modalidade gospel dessa aberração. Pronto, falei!

[Fonte: Prensa, por Clarissa Blümen Dias; Agora RN]

Ao Deus Perfeito Criador, toda glória.
Fique sempre atualizado! Acompanhe todas as postagens do nosso blog https://conexaogeral2015.blogspot.com.br/. Temos atualização diária dos mais variados assuntos sempre com um comprometimento cristão, porém sem religiosidade.
E nem 1% religioso.

Um comentário: