Comer lentilha, pular sete ondinhas, usar roupa branca (nova, obviamente), chupar uvas, comer romã (e/ou guardar suas sementes), não comer carne de aves. Com a virada tem gente (inclusive muitos evangélicos) achando que fazer essas coisas vai tornar o ano novo um ano melhor. Para quem é cristão, acreditar nisso tem um nome muito claro: superstição e, em última instância, idolatria, isto é, pôr a confiança não no Deus verdadeiro, mas em qualquer objeto ou prática.
Evidentemente, há muitos irmãos que estão alertas quanto a isso e reconhecem que atribuir algum tipo de poder à ingestão de lentilha contraria frontalmente a fé em Deus. É preciso, porém, estar consciente não somente das superstições que cercam datas como a virada do ano, mas do risco que a postura supersticiosa traz para o próprio âmbito da fé cristã. O desfile de roupas brancas nos tradicionais cultos da virada, principalmente nos realizados nas denominações neopentecostais (mas não necessariamente apenas nas denominações dessa vertente) é muito comum (quem tiver dúvida, pode assistir às transmissões dos cultos pela televisão ou internet)
Na vertente católica também é comum e tradicional a prática de tais ritos supersticiosos. Entretanto, é interessante observar que é sobretudo com esse âmbito que o Catecismo da Igreja Católica se preocupa no parágrafo em que aborda a superstição. Vejamos:
"A superstição é um desvio do sentimento religioso e das práticas que ele impõe. Também pode afetar o culto que prestamos ao verdadeiro Deus: por exemplo, quando atribuímos uma importância de algum modo mágica a certas práticas, aliás legítimas ou necessárias.
Atribuir só à materialidade das orações ou aos sinais sacramentais a respectiva eficácia, independentemente das disposições interiores que exigem, é cair na superstição" (n. 2111, grifo meu).
Como deixa claro o texto do dogma católico, não se trata de apontar uma ou outra prática do cristianismo que especialmente incorre em risco de se tornar superstição. A postura supersticiosa e idolátrica pode recair sobre qualquer coisa.
É cômico como existem segmentos evangélicos que acusam o catolicismo de idolatria por causa dos santos ou da eucaristia, mas tratam de maneira idolátrica as palavras da Bíblia (como os Salmos 23 e 91, por exemplo), além da escrachada prática de sincretismos.
A superstição é um mal que foi se entretecendo no Cristianismo como uma teia invisível
Este veneno foi se espalhando desde a época em que o Cristianismo se tornou uma religião apoiada pelo Estado, a partir do momento em que o imperador romano Constantino abraçou-a como a sua religião, no ano aproximado de 312 a.C.. Naquela época, Constantino fez com que o povo, sob seu domínio, se convertesse ao Cristianismo, sem se preocupar com as práticas religiosas dos "novos convertidos".
Esta atitude fez com que o Cristianismo, aos poucos, se transformasse em uma "religião sincrética", totalmente destituída dos fundamentos doutrinários iniciais. Este sincretismo trouxe consigo a superstição, que fez com que os cristãos passassem a utilizar objetos, símbolos e frutos da natureza como amuletos protetores. Até a Bíblia Sagrada passou a ser utilizada, por muitos, como objeto de proteção em seus lares.
Russell Norman Champlin¹, ao tratar sobre a superstição, disse que
"[...] Esse termo deriva-se do latim, supersto, 'pairar por cima', 'ameaçar', dando a entender algum tipo de temor ou receio religioso, em face do desconhecido, ou de forças naturais potencialmente negativas, como os deuses, a sorte, o destino, etc".
Sendo assim, superstição é todo o temor por coisas sobrenaturais, que leva o ser humano a práticas diversas em busca de proteção.
A superstição teve seu maior desenvolvimento no Cristianismo no período da idade média, onde ocorreu uma crescente comercialização de relíquias, como por exemplo: lascas e pregos da cruz do Cristo; ossos, cabelos, unhas e pedaços de roupas dos apóstolos; etc. O Papa Leão X fomentou a venda de relíquias e indulgências para promover a reconstrução da Basílica de São Pedro. Este fato causou muita indignação no coração de muitos religiosos sinceros, o qual fez resultar na grande Reforma Protestante.
A Reforma, embora não tivesse purificado totalmente o Cristianismo do sincretismo pagão, trouxe muita contribuição, especialmente no desenvolvimento econômico e cultural da Europa ocidental. Infelizmente, o sincretismo teve seu maior desenvolvimento, após a Reforma, com o advento do "evangelicalismo", que resultou nos movimentos pentecostal, carismático e neopentecostal.
Este último movimento tem incentivado, de forma extraordinária, o crescimento da superstição religiosa, através da desvirtuação do Evangelho. Como exemplo, pode-se ver o aumento constante da dependência dos objetos e frutos da natureza, tais como: lenços ungidos, óleos de unção, objetos utilizados em campanhas, novenas, "atos e declarações proféticas", etc.
Infelizmente o evangelicalismo neopentecostal carrega consigo uma filosofia de discipulado, através da qual a Bíblia Sagrada esta sendo afastada dos fiéis propositadamente (pois o conhecimento conduz ao questionamento, e isto é inadmissível na teologia neopentecostal), sendo substituída por manuais de discipulado contendo ensinamentos que conduzem as pessoas a uma obediência cega, amedrontados pela mentirosa ideia de maldição. Isto permite que as pessoas sejam amarradas pelo temor e pela ignorância, impedindo-as de se desvencilharem deste nefasto movimento escravizador. O incentivo à ignorância (desconhecimento das coisas) sempre foi um instrumento utilizado pelos dominantes opressores.
Ter isso em mente é um bom critério para discernir se estamos caindo na superstição ou não. Pode parecer que eu tenho muita fé se frequento infalivelmente uma campanha em busca de um favor divino. Mas se o meu pedido está fora do contexto de uma vida em que a experiência do amor ao próximo é o centro e é fonte de uma resposta de amor a Deus, então já não se trata de fé cristã, mas de uma forma de idolatria.
Não é mais ao Deus revelado por Cristo que estou me dirigindo. A oração fundamental do cristianismo nos dá a direção de um relacionamento verdadeiro com Deus: é Aquele a quem peço que venha o seu reino, que seja feita a sua vontade e que me perdoe na medida em que perdoo o próximo.
Conclusão
O resultado terrível do crescimento da superstição cristã nos nossos dias, que nada mais é do que o ressurgimento do paganismo cristão da idade média com um formato moderno, é o desenvolvimento de uma "falsa fé", baseada em coisas visíveis e palpáveis, completamente diferente da fé bíblica, definida em Hebreus 11:1² como sendo
"[...] o firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que se não vêem".
O cristão pode comer lentilha, usar roupa branca e deixar de comer ave na virada do ano ou em qualquer outro dia do ano que bem entender. Mas porque lentilha é gostoso, roupa branca pega bem com esse calor tropical e o frango e o peru já deram o que tinham que dar no natal (afinal, variar o cardápio de vez em quando é sempre bom). Mas sem acreditar que tudo vai dar errado se ele não fizer isso ou mesmo usar a Bíblia como "horóscopo gospel".
A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.
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