Retornando a série especial de artigos Acontecimentos, vou relembrar o crime que chocou e abalou não só toda a sociedade mineira, mas causou comoção em todo o Brasil. Na década de 90 uma onda de sequestros assustava os mineiros. E um caso na capital, mobilizou o estado e teve um desfecho trágico.
O caso
Na casa, ainda restam pertences da menina Miriam Brandão. Lembrada pelo sorriso alegre, pelas travessuras e pela saudade. Na sala, há uma pintura grande da menina, que a mãe exibe com orgulho. Alguns desenhos da garota esboçam a alegria juvenil de toda criança repleta de sonhos. Retratos, o último vestido, os desenhos que Miriam havia apenas começado a fazer e os brinquedos favoritos: foi tudo que restou da menina de apenas cinco anos.
Em 1992, 'Beagá' parou. Mas, mesmo depois do crime que abalou o país na época, a repercussão ainda era grande. Os professores falaram muitas vezes que o plantão do MGTV (telejornal da afiliada da Rede Globo) entrava ao vivo, ao menos três vezes por dia. Os âncoras e repórteres davam esperança de que Miriam seria encontrada a qualquer momento, era uma questão de tempo. A menina havia sido sequestrada dia 22 de dezembro de 1992.
"Me lembro de todos os detalhes. De como eles entraram na minha casa disfarçados. Do quanto foram cruéis ao prolongarem nossa espera e angústia pelo resgate de nossa menina. Miriam era um doce de criança. Qualquer pessoa se encantava por ela, e ela era muito apegada a nós".
disse emocionada, Jocélia Brandão apanhando a foto mais conhecida da filha.
Guardo uma lembrança dela assim. Exatamente assim, sempre alegre, como ela era.
O Sequestro
"Eu havia saído para trabalhar e meu ex marido, o pai de Miriam, estava em casa. A moça que nos ajudava na época também estava lá. Então eu não fazia ideia do que estava acontecendo e era ainda mais aterrorizante",
conta Jocélia.
O plano fora bem articulado. Rosemaire Figueiredo Silva, ex-funcionária da farmácia de Jocélia Brandão e de Volney Henrique Brandão, pais de Miriam, mandou o namorado Wellington Gontijo sequestrar a menina Miriam como vingança pela demissão da funcionária. Wellington chamou seu irmão William para o ajudar no sequestro de Miriam.
Se apresentaram como técnicos da Telemig (a extinta companhia de telecomunicação da época) e, como a casa já apresentava problemas, a empregada permitiu a entrada na casa da família Brandão, no pacato bairro Dona Clara, região da Pampulha, em Belo Horizonte. Os irmãos Gontijo amarraram a ajudante e pegaram a menina ainda em sono profundo.
"Não há limites para a crueldade humana. Não sei como puderam sequestrar dois ossinhos e dentinhos… Uma menina tão pequena e indefesa"
— estalando os dedos, a mãe recomeça a falar. Os sequestradores ainda demorariam a pedir o resgate, fazendo com que a espera e o tormento da família durassem por mais uma semana.
"A espera por notícias era ainda pior do que saber que estavam em posse de Miriam."
Embora Jocélia tenha passado por esse trauma tão grande, seu rosto e alma expressam uma paz acolhedora. Não sei bem se porque Jocélia é uma mãe que perdeu uma filha e tem, por natureza, esse extinto materno, ou se por que é possível ver em Jocélia uma alma de guerreira, nobre. Só sei que nela também se vê paz e aconchego.
No dia 23 de dezembro, os irmãos Gontijo resolveram ligar. Do outro lado da linha, havia o homem que estava com Miriam. Não somente isso. Do outro lado, estava a esperança. Foram pedidos 150 mil dólares (hoje, cerca de trezentos mil reais) pelo resgate e a família, que não tinha o dinheiro, prometeu arrumar. O pai de Miriam disse, em depoimento na época ao MGTV, que já estava vendendo tudo para ter a filha de volta.
A negociação se prolongou por 17 dias, até que, no dia 8 de janeiro de 1993, a polícia conseguiu encontrar o cativeiro de Miriam Brandão. Os irmãos Gontijo tinham se escondido em um sítio em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte. A polícia conseguiu invadir o cativeiro, mas os irmãos Gontijo não foram encontrados. A menina Miriam, tampouco. Mas a criança tem um motivo: foi queimada.
No primeiro dia de sequestro, Miriam chorava muito e chamava pela mãe, que nunca tinha se separado tanto tempo da filha antes. O que irritou os irmãos e os fizeram temer pela liberdade, tendo em vista que a menina poderia os reconhecer. A solução que encontraram foi matar Miriam Brandão asfixiada e depois queimar o corpo para não sobrar vestígios. O cunhado de Jocélia, que na época trabalhava para a polícia, estava na operação de investigação.
"Eu falei: 'Marco, eu tô pronta, me leva aonde minha filha tá'. Ele me abraçou, me carregou e falou: 'é, minha cunhada, nós perdemos a batalha'. Eu falei: 'por quê?'. 'A Miriam está morta.' 'Então me leva onde está o corpo dela.' 'Nem isso nós temos.' 'Como vocês não têm? Eu quero o corpo da minha filha.' 'Não, os policiais já estão no local, mas o corpo dela foi destruído'"
— segurando o urso da filha, Jocélia se apega agora às lembranças que sobraram de Miriam. A senhora conversou com algum deles, Jocélia?
"Sim, queria saber o porquê."
E o que ele disse?
"Ele teve coragem de falar que ele asfixiou ela com éter, porque ela chorava muito, queria eu, o irmão e o pai, e a mamadeira. Ela tomava mamadeira ainda. E que, pra não deixar vestígios, ele esquartejou e queimou ela toda. Aí levou ela no pé de bananeira onde ela tinha sido queimada. Me contou todos os detalhes do que havia feito com ela. E eu sou a mãe…"
— é preciso recobrar o fôlego desta vez, para continuar.
Quando os irmãos foram presos, junto com Rosemeire, a população foi até a porta da delegacia bradando pela pena de morte. A repercussão foi nacional. Os irmãos, então, foram levados a julgamento. Wellington Gontijo Ferreira foi condenado a 32 anos de prisão fechada; o irmão, William Gontijo, foi condenado à mesma sentença. Rosemeire, no entanto, sendo a mentora do crime foi condenada a 18 anos de regime fechado.
Wellington foi liberado por bom comportamento depois de 11 anos e já não tem mais pendências com a Justiça. Ela o veria ainda outras duas vezes. Hoje, ele é pastor em Lagoa da Prata, no interior de Minas Gerais. William cumpriu 17 anos da pena e também foi liberado.
— Eles te pediram perdão?
"Nunca!"
— em negação, Jocélia parece não se importar. — Você perdoaria?
"Depois de um certo tempo, eu consegui perdoá-los. Não tenho raiva deles, não tenho ódio deles. Só peço a Deus que eles não façam isso com mais ninguém. Porque eles conseguiram marcar minha família pro resto da vida."
O bem como caminho de superação
Depois de perder a filha, Jocélia refez sua vida: se separou, teve mais duas filhas e se tornou uma militante pela paz. Engajou-se em movimentos sociais contra a violência, em passeatas, institutos e ao Mães Sem Nomes — um grupo de mães que acredita que, compartilhando a dor, suaviza.
Foi lá que encontrou sua parceira que a ajudou em uma de suas maiores conquistas, Gloria Perez, mãe da jovem Daniella Perez, também assassinada. Juntas, elas lutaram pela homologação do homicídio qualificado como hediondo.
Somente 22 anos depois, no dia 30 de dezembro de 2014, que ela pôde receber a certidão de óbito da filha.
"É um misto de alívio e tristeza pela confirmação de um fato que eu jamais queria ter vivido. E indignação porque eu tive que me submeter à ineficiência dos órgãos competentes."
A mãe de Miriam começou o processo para conseguir a certidão de óbito ainda na Vara Criminal, mas foi encaminhada para outras esferas do Poder Judiciário e a espera se arrastou. No início de 2014, o juiz da Vara de Sucessões de Belo Horizonte determinou a expedição do documento, que só foi entregue ao advogado da família depois de várias tentativas.
Ela conta que teve ainda mais esperanças quando a mãe da modelo Eliza Samudio, executada em 2010, recebeu o benefício judicial, em 2013. Embora afirme que a conquista não muda todo o sofrimento causado pela tragédia, Jocélia considera que "fecha um ciclo" em sua vida.
"É só um papel, mas todo ser humano tem direito a essa certidão. Isso não vai mudar a situação, mas como mãe eu fico feliz porque ela foi respeitada em seu direito de cidadã, fecha esse ciclo de crueldade."
Conclusão
Apesar de ser um dos autores de um dos crimes mais hediondos ocorridos em Minas, Wellington - que cumpria pena de 21 anos na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem - teve a liberdade condicional concedida em 2003, 11 anos após a morte da menina, pelo juiz da Vara de Execuções Penais dessa cidade, Renan Chaves Carreira Machado e (pasmem) teve a pena extinta.
O próprio sequestrador afirma que o crime foi coisa do passado e o que vale é o presente. Aqui não vale nenhuma critica ou questionamento à conversão desse senhor (glória a Deus por isso), muito pelo contrário, mas sim expressarmos nossa revolta com o sistema legislativo e judiciário do nosso Brasil. Como extinguir a pena de um assassino deste porte??? Nada contra o assassino virar pastor, missionário... (o que seja) ou seguir a Jesus, mas tinha que fazer isso de dentro da cadeia, no mínimo cumprindo a sua pena completa!
[Fonte: Publicações na Internet]
A Deus toda glória.
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