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quinta-feira, 20 de setembro de 2018

CANÇÕES ETERNAS CANÇÕES - "AQUARELA", TOQUINHO

















A música que destaco hoje na série especial de artigos Canções Eternas Canções, mais do que um dos grandes clássicos da MPB, é daquelas canções que desde o seu lançamento, em 1983 (há 35 anos), se tornou uma espécie de hino de todas as gerações, uma vez que sua mensagem alcança os corações infantis e adultos. Além de uma irretocável melodia, a letra de "Aquarela" nos pinta com suas matizes sonoras, um mundo ideal colorido com muita emoção e paz.

Vinícius & Toquinho... Toquinho


O nome de Toquinho quase sempre é associado ao de Vinícius. Uma associação correta, mas que nem sempre faz justiça à qualidade de compositor de Toquinho. Ele compôs clássicos, mesmo sem Vinícius, e algumas de suas músicas se eternizaram no cancioneiro popular do Brasil (e não só do Brasil).

Do site oficial de Toquinho, conta-se a bela história de "Aquarela", sucesso no Brasil e em vários países do mundo. A vinculação de Toquinho com Vinícius de Moraes se deve aos 11 anos em que foram parceiros – de 1969 a 1980, quando o poeta faleceu (Toquinho estava com ele quando deu o último suspiro).

E a confusão é porque a primeira parte de "Aquarela" é justamente uma canção que Toquinho e Vinícius fizeram em 1974, intitulada "Uma Rosa em Minha Mão", sob encomenda para a novela "Fogo Sobre Terra", da TV Globo – naquela novela, os dois foram contratados para compor toda a trilha sonora nacional.

Nasce uma Aquarela


Em 1982, após vários anos de apresentações na Itália, Toquinho já era um nome de destaque naquele país. O empresário Franco Fontana criara a gravadora "Maracana" objetivando diretamente a música brasileira, e resolvera gravar um disco com Toquinho, com músicas novas. Para isso escolheu o músico italiano Maurizio Fabrizio, que havia vencido o festival de San Remo e que, na visão de Franco, concentrava características semelhantes às do violonista brasileiro.

Do encontro dos dois resultou uma generosa parceria, material para quatro discos entre o período de 1983 e 1994. Essas canções receberam originalmente letras em italiano, a grande maioria, de Guido Morra, e poucas de Sergio Bardotti. Depois algumas foram vertidas para o castelhano por I. Baldacchi e outras por C. Toro. Parte delas recebeu versões de Toquinho, que as gravou também em português. Toquinho conta como teve início essa parceria:
"Quando o Franco decidiu investir nesse disco, surgiu a grande controvérsia: a parceria. Ele arriscou no Maurizio Fabrizio. Eu não sabia quem era o Maurizio..."
 – explica Toquinho. – 
"Não o conhecia, nunca o tinha visto. Aí, o Maurizio me telefonou do Aeroporto de Congonhas: 'Eu estou com uma blusa amarela, uma calça cinza e uma mala marrom te esperando'. E eu: 'Vou estar com um carro prata'. Cheguei, olhei, lembrei das dicas, ele me viu, nos acenamos, e pronto. 
Fomos para casa e ele dormiu um pouco. Quando acordou, almoçamos – isso no dia em que ele chegou – e eu tinha uma pianolinha, uma coisinha ridícula – ele toca piano – então peguei meu violão e disse: 'Nós temos que fazer músicas. Vamos combinar uma coisa: o que você não gostar daquilo que eu faço, me fala. E o que eu não gostar do que você faz, eu falo. Tudo bem?'. 
Ele concordou e começou a mostrar uma música. Achei meio chata a primeira parte, mas quando ele entrou na segunda parte, eu gostei, lembrava a primeira parte de 'Uma rosa em minha mão', que fiz com Vinicius, em 1974, para a novela 'Fogo Sobre Terra', da Globo. 
Então, toquei para ele, que, em seguida, começou com a segunda parte da música dele. Uma se encaixou na outra, naturalmente, na primeira tentativa, era a primeira música que ele me mostrava… Assim, gastamos nem três minutos para fazer a música que seria conhecida como 'Acquarello', em italiano, que é a nossa 'Aquarela'.
'Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo 
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo.
Corro o lápis em torno da mão e me dou uma luva, 
E se faço chover, com dois riscos tenho um guarda-chuva. 
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel, 
Num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu. 

Vai voando, contornando a imensa curva Norte e Sul, 
Vou com ela, viajando, Havai, Pequim ou Istambul. 
Pinto um barco a vela branco, navegando, é tanto céu e mar num beijo azul. 
Entre as nuvens vem surgindo um lindo avião rosa e grená. 
Tudo em volta colorindo, com suas luzes a piscar. 
Basta imaginar e ele está partindo, sereno, indo, 
E se a gente quiser ele vai pousar. 

Numa folha qualquer eu desenho um navio de partida 
Com alguns bons amigos bebendo de bem com a vida. 
De uma América a outra consigo passar num segundo, 
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo. 
Um menino caminha e caminhando chega no muro 
E ali logo em frente, a esperar pela gente, o futuro está. 

E o futuro é uma astronave que tentamos pilotar, 
Não tem tempo nem piedade, nem tem hora de chegar. 
Sem pedir licença muda nossa vida, depois convida a rir ou chorar. 
Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá. 
O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar. 
Vamos todos numa linda passarela 
De uma aquarela que um dia, enfim, descolorirá. 

Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo (que descolorirá). 
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo (que descolorirá). 
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo (que descolorirá).'

Continua Toquinho...
Achei bonita, me animei, e nos outros dias fizemos umas oito melodias. Maurizio voltou para a Itália para criar os arranjos e trabalhar com o letrista, o Guido Morra, que fez as letras de todas as nossas canções. 
Quando cheguei na Itália, em novembro de 1982, para fazer a temporada de shows e gravar o disco, nunca me esqueço, estava num restaurante e eles apareceram com todas as letras já datilografadas. 'Vamos mostrar todas as letras para você, e deixar por último, aquela pela qual todos estão encantados'.
Eu não confiava nessa música como música de sucesso, nem imaginava isso. Para mim, era só uma canção de meio de disco. Então, me mostraram todas as letras e, por fim, a última: 'Acquarello'. 
É uma letra mágica: desperta a criança que carregamos dentro de nós, reforça o romantismo da amizade, aviva as delícias de se ganhar o mundo com a rapidez moderna, e, por fim, nos alerta para o enigma do futuro que guarda em seu bojo a implacável ação do tempo, fazendo tudo perder a cor, perder o viço, perder a força. 
Gravei o disco e fizemos o lançamento em Sanremo – conta Toquinho. – Depois da primeira apresentação de 'Acquarello', começaram a pipocar comentários os mais maravilhosos, o disco saiu com 30 mil cópias, que se esgotaram no segundo dia. 
Essa música tem realmente um aspecto emocional muito forte, um apelo comercial, as pessoas ouvem e se envolvem. De repente, o Franco passou a me telefonar: 'Olha, a música estourou por aqui, está nos primeiros lugares das paradas'. Voltei lá para fazer promoção, aí, ninguém segurou mais. 
Fui o primeiro artista brasileiro a ganhar um Disco de Ouro na Itália – 100.000 cópias, como aqui. Virei artista popular fora do Brasil! Então, resolveu-se gravar a música em português. Quando conheci a letra, ainda na Itália, me empolguei em fazer a tradução. 
Sabia que encontraria dificuldades, pois é uma letra grande, as rimas tinham de ser precisas. Mudei muita coisa na forma de dizer, para poder conservar em nossa língua, a mesma magia atingida pelo Morra, em italiano. E começou a sair um negócio bonito, nem eu mesmo sabia o que era. Mesmo assim, achava a letra muito grande. 
Mas não deu outra coisa. Saiu aqui e foi outro estouro igual. Na Espanha, a mesma coisa. Na Argentina, na França, em todo lugar. Aqui no Brasil virou tema de publicidade, tarefa de escola para a criançada, e até hoje é exigida e cantada nos shows, como na época de seu lançamento. 'Aquarela' foi um marco em minha carreira, como seria na de qualquer outro" 
– continua Toquinho.
"Uma coisa definitiva na vida de um compositor. 'Aquarela' é uma música que tem algo melhor, quem sabe a força da ingenuidade infantil ligada a um encanto popular que emociona. O primeiro acorde já levanta as pessoas. Consolidou-me, tanto na Itália como aqui, na América do Sul e na Europa. A partir daí as pessoas me reconheceram também como instrumentista, tornei-me popular."

Conclusão


Conhecemos a verdadeira história sobre essa maravilhosa, inesquecível e eterna canção contada por seu próprio compositor. No Brasil, os anos finais do século passado destinaram ao grande músico Toquinho realizações artísticas que sintetizaram homenagens, recordações, reencontros e novas parcerias. E, até hoje a canção, imortalizada (na nossa memória e) na propaganda da Faber Castell, gera suspiros…

[Fonte: Toquinho]

A Deus toda glória.
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