quinta-feira, 17 de abril de 2025

ADOLESCENTES À BEIRA DE UM ATAQUE DE FÚRIA

Conforme já disse em outras oportunidades, não sou chegado em séries. Não gosto do formato. A quantidade desse tipo de produto, disponibilizado online pelas muitas plataformas de streaming, é enorme alcançando assim os mais variados públicos. 
Muitas são as pessoas que fazem um consumo voraz — quase viciante — desse tipo de conteúdo e há quem passe dias maratonando suas séries preferidas. 

Já eu, de vez em quando arrisco a assistir uma ou outra série (preferencialmente as que têm apenas uma temporada e com poucos episódios), para alguma pesquisa acadêmica ou por indicação de alguém. É o caso da série que me inspirou a composição do texto deste artigo.

Tão Real quanto a Vida


Longe de oferecer apenas um relato policial ou juvenil, a minissérie "Adolescência", lançada pela Netflix em 2025, emerge como uma poderosa provocação sobre a falência dos laços sociais, a omissão dos adultos e a urgência de compreendermos o colapso silencioso da escuta, do cuidado e da responsabilidade compartilhada.

Essa busca desesperada pode se manifestar como raiva, violência, humilhação ou pura maldade, pois a adolescência é um período de fome emocional, em que os códigos de pertencimento mudam em velocidade alucinante, deixando os adultos perplexos e os próprios adolescentes à mercê uns dos outros.

A história


Inspirada em casos reais de violência juvenil e roteirizada com base em investigações e escutas clínicas, a série narra a história de Jamie Miller — num brilhante interpretação do jovem ator Owen Cooper —, um adolescente de 13 anos acusado de assassinar uma colega de escola, que também havia sido vítima de bullying e exclusão.

No entanto, a força da narrativa não está no crime em si, mas na ausência de vínculo emocional genuíno que atravessa todos os adultos em volta do protagonista: pais, professores, policiais, terapeutas e membros da comunidade.

Há tensão permanente, mas sem expressão emocional, ocasionalmente percebida em interações entre Jamie e a melhor amiga da vítima. Em um mundo dominado por algoritmos, mensagens cifradas e influencers misóginos, a série nos faz perguntar: o que estamos deixando de ver?

O mistério não gira em torno de quem cometeu o crime — isso é esclarecido no começo — mas do porquê. A problemática começa com a comunicação (ou a falta dela) com os jovens.
A série escancara a completa falta de habilidade de falar e com e compreender dos pais, da escola, dos professores — como se de fato fossem línguas distintas entre os adolescentes e os adultos.

"Quem não se comunica, se trumbica!"


Essa era a célebre frase repetida à exaustão pelo considerado maior comunicador da televisão brasileira, José Abelardo Barbosa de Medeiros, o Chacrinha (☆1917/✟1988), apresentador de programas de auditório de grande sucesso das décadas de 1950 a 1980.

Quase quatro décadas depois da sua morte, o conselho filosófico do nosso emblemático comunicador não só é atual, mas se tornou fundamental para toda a sociedade.

Mas o que é essa tal comunicação que preciso saber e "fazer"? Vamos à origem da palavra que vem do termo latino communicare, que significa partilhar, participar, tornar comum algo.

Desde o nascimento já entramos no mundo nos comunicando, primeiro com o choro "berrado". Esse pode ser considerado o primeiro ato de comunicação nosso. A partir daí vamos crescendo e mudando as nossas formas de interação — se antes chorávamos para indicar fome, sede, dor, fralda suja ou outro tipo de desconforto, com o passar do tempo vamos aprendendo e adotando outros tipos de contato com o nosso entorno. Sendo, na atualidade, sem sombra de dúvida, as mídias digitais.

Chegamos à vida adulta tendo passado por um processo constante de aprendizado, adquirindo saberes técnicos e habilidades comportamentais, enfim, vamos construindo a nossa relação específica com o mundo e as pessoas. Numa vida em sociedade, o ato de comunicar é uma ação essencial à vida. Por natureza, somos seres comunicadores. Inclusive nos momentos de silêncio.

A família retratada na história de "Adolescência" pode ser considerada "normal": pais carinhosos, irmã acolhedora e não há abuso ou violência dentro de casa. Em uma das cenas que mais me marcaram, o pai Eddie (Stephen Grahan) afirma: 
"Ele ficava muito no quarto, achei que estava seguro."
Deixando claro o quanto a falta de comunicação e de interação offline, ou seja, fora do ambiente digital da internet, é um dos grandes complicadores no desenvolvimento dos jovens como cidadãos. Nunca a calma e o silêncio foram tão perigosos.

A grande questão que fica no final é: de quem é a culpa? Obviamente não há resposta certa ou simples. Os jovens têm dificuldades de expressar seus sentimentos e o que eles consomem digitalmente podem ser excelentes fios condutores para suas mentes. 

O algoritmo de seus celulares, tablets e computadores deixam rastros; os influenciadores que seguem, os vídeos e posts que são mostrados dão dicas do que eles têm curtido.

Sem spoilers, com reflexões


Com texto afiado e atuações primorosas, todos os episódios da série são filmados em tomada única, provocando no telespectador uma sensação de realidade e de tensão que cresce ao longo das cenas. Do ponto de vista da dramaturgia, a merece muitos elogios.

O maior mérito da obra, no entanto, é provocar discussões — especialmente sobre a educação de adolescentes.
  • Como é possível que um garoto de 13 anos, aparentemente comum e sem histórico significativo de delinquência, cometa um assassinato brutal contra uma colega da mesma idade? 
  • Onde os pais falharam? 
  • De que forma a escola pode ter contribuído? 
  • Qual o papel das redes sociais nesse processo? 
A série, então, suscita reflexões sobre essas múltiplas dimensões.

O Papel da Escola e a Sociedade que Julga


O ambiente escolar é um dos cenários centrais de Adolescência, e a série faz questão de mostrar como a escola falha em proteger seus alunos. O bullying está presente em toda parte, e não apenas Jamie sofre com isso. 

Katie Leonard, a própria vítima do crime, também era alvo de ataques constantes e, além disso, sofreu sexting, tendo uma foto íntima exposta e ridicularizada, um retrato cruel da misoginia na sociedade.

Ao mesmo tempo, os professores se mostram completamente despreparados para lidar com essas questões. A falta de intervenção eficaz transforma a escola em um espaço onde o sofrimento é normalizado e os problemas dos alunos são ignorados até que se tornem graves demais para serem contornados.

E então surge a sociedade que julga. Os pais de Jamie passam a ser condenados e rotulados. A irmã também carrega o peso de um sobrenome que agora se tornou um estigma. 

Mas a grande ironia é que as mesmas pessoas que apedrejam essa família, que se perguntam "como não viram?", são aquelas que também fecham os olhos para o que acontece dentro de seus próprios lares.

A Reflexão Brutal dos Pais: 

Até onde Poderiam Ter Evitado?


Um dos momentos mais emocionantes da série é a reflexão dos pais de Jamie. O pai admite que sofreu violência doméstica na infância e quis criar o filho de uma maneira diferente. 

A mãe lembra que sempre tentaram oferecer o melhor: um quarto bem montado, um videogame, conforto. Mas, ao mesmo tempo, confessa que notava que o filho passava cada vez mais tempo isolado no quarto. E ela não viu problema nisso.

O pai se lembra da cena em que não conseguiu olhar para o filho, quando ele não atendeu às expectativas por não ser bom nos esportes. Ele também admite que, mesmo vendo o vídeo, não quis acreditar, não soube lidar.

E quantos pais não fazem o mesmo? Acreditam que o perigo está nos grandes sinais: nas explosões de raiva, nas agressões físicas, nos comportamentos que fogem completamente da normalidade. Mas e as pequenas coisas? Os silêncios prolongados, os afastamentos sutis, as mudanças imperceptíveis no comportamento?

A grande lição de Adolescência é que é preciso equilibrar responsabilidade e auto-perdão. Sim, os pais concluem que poderiam ter feito mais. Mas também precisam aceitar que não existe uma fórmula perfeita para criar um filho e que, muitas vezes, os sinais de alerta são quase invisíveis.

O Impacto da Psicóloga e a Importância do Trabalho Profissional


Outro ponto forte da série é a relação entre Jamie e a psicóloga, Dra. Briony Ariston (Erin Doherty). Essa cena é fundamental porque mostra como um profissional bem preparado pode acessar as verdades que estão escondidas sob camadas de silêncio e autodefesa.

Jamie chega a comparar o trabalho da psicóloga com o de outro profissional que o atendeu anteriormente, mencionando que "ele não fazia perguntas difíceis". Essa diferença é crucial: enquanto um apenas tocava na superfície, o outro realmente conseguiu penetrar nas camadas emocionais do adolescente, criando um espaço onde ele, finalmente, se abriu.

E isso levanta uma questão importante, principalmente para os que como eu, são profissionais atuantes na área de saúde mental: 
  • quantos profissionais estão realmente preparados para lidar com adolescentes? 
  • Quantos conseguem sair da trivialidade e mergulhar nos dilemas dessa fase da vida?

Conclusão

Vida que segue...?


Diante dos desafios impostos pela radicalização juvenil e pelo esgarçamento dos vínculos, precisamos substituir o medo pela escuta, a punição cega pela reparação consciente, e o silêncio pela presença.

A série "Adolescência" nos alerta — mas também nos orienta: há caminhos possíveis, e eles passam necessariamente pelo reencontro com o outro. 

E, sobretudo, pelo compromisso de nos responsabilizarmos, como adultos, pelas escolhas que oferecemos aos nossos jovens e pela cultura que cultivamos com eles. 
  • O que precisamos enxergar neles, que nos refletem e nos imitam? 
  • Como criar uma sociedade em que eles possam pertencer sem precisar romper para serem ouvidos?
A série termina sem um desfecho fechado porque a vida continua. Os policiais seguirão fazendo seu trabalho. Os pais precisarão encontrar um jeito de seguir em frente e reconstruir sua família. 

A irmã de Jamie precisará lidar com o peso do que aconteceu. A sociedade seguirá julgando, e a maioria das pessoas continuará não enxergando o que acontece dentro de suas próprias casas.

E fica o questionamento final: 
  • será que vamos aprender algo com essa reflexão? 
  • Ou apenas assistiremos à série "Adolescência" e deixaremos tudo seguir como sempre foi?
[Fonte: Parent Coaching original porJ acqueline Vilela — Educadora Parental Especialista em Adolescentes. Fundadora da Parent Brasil, empresa pioneira em formação de profissionais parentais e criadora do método SER. Psicanalista. Professora. Escritora. Autora dos Livros "Meu Filho Cresceu, e Agora?", "Pare o Mundo que Eu Quero Descer" e "Detox Digital". Formada em Parent Coaching pela ACPI — Academy for Coaching Parents International (EUA). Membro do PCA (Parent Coaching Academy): The Global Organization for Family Support — London (UK). Certificada em Life Coaching, Positive Coaching, Executive Coaching e MBA em Coaching. Le Monde Diplomatique Brasil, original por Rubens Bollos — médico, mentor e palestrante. Mestre e Doutor (Ph.D) em Ciências da Saúde pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e Pós-Doutorado em Biologia do Desenvolvimento (USP/ICB). Pesquisador nas áreas de imunologia, epigenética, salutogênese e cultura de paz com foco no estudo de indicadores de êxito em saúde. É presidente-fundador da ABMPP.org (Associação Brasileira de Medicina Personalizada e de Precisão). Brazil Journaloriginal por Alessandra Levy é economista e palestrante de atualidades.]

Ao Deus Todo-Poderoso e Perfeito Criador, toda glória.

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E nem 1% religioso.

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