quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

FILMES QUE EU VI - ESPECIAL: "BOHEMIAN RAPSODY"

Cartaz do filme Bohemian Rhapsody.
Baseado em fatos reais, lançado nos EUA em outubro de 2018, o filme "Bohemian Rhapsody" teve a pretensão de ser uma biografia de um dos maiores conjuntos de rock de todos os tempos: o Queen. O longa metragem se foca especialmente na vida pessoal e profissional do polêmico vocalista Freddie Mercury (vivido brilhantemente por Rami Malek). 

Antes e depois do Oscar


Um sucesso de público e crítica, "Bohemian Rhapsody" arrecadou prêmios importantes como dois Globos de Ouro (Melhor Filme Dramático e Melhor Ator Dramático) e um BAFTA de Melhor Ator. 

No Oscar 2019 o longa recebeu cinco indicações: Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Montagem, Melhor Mixagem de Som e Melhor Edição de Som. No final da noite o filme levou para casa quatro troféus: Melhor Ator (Malek), Melhor Mixagem de Som, Melhor Montagem e Melhor Edição de Som.

Resumo

[Atenção, o texto abaixo contém spoilers]


O filme "Bohemian Rhapsody" conta a história biográfica da banda de rock inglesa Queen desde a união dos integrantes do conjunto até a morte do protagonista, Freddie Mercury. O pano de fundo da criação é a Inglaterra dos anos 1970, com jovens rebeldes e em busca de um meio para se expressarem. 

A criação do Queen


A banda era inicialmente composta por quatro membros: Brian May (interpretado por Gwilyn Lee), Roger Taylor (interpretado por Ben Hardy), John Deacon (interpretado por Joseph Mazzello) e um vocalista que desistiu do conjunto. Esses eram os Smile.

Freddie que era fã do conjunto, acompanhava o percurso da banda na noite e tinha o sonho de ser vocalista profissional.
Sabendo da desistência do vocalista, Mercury decidiu se oferecer para substituir o antigo vocalista.
Após alguma resistência dos integrantes do conjunto, ele consegue ocupar o lugar do antigo vocalista. Numa difícil e arriscada decisão, os quatro decidem vender a van do grupo para financiarem a produção de um disco. 

A banda, então batizada de Queen, começa a fazer enorme sucesso e vai colecionando shows ao redor do país. O grupo chama a atenção de uma gravadora, que os consegue transformar depressa em grande hit. 

A vida de Freddie Mercury


No aspecto pessoal, Freddie tem alguns problemas de rejeição em casa. Os pais, bastante severos, não aprovavam a vida boêmia e sem regras que o filho levava. Com os conflitos crescendo, o cantor deixa o trabalho seguro que tinha e passa cada vez mais tempo investindo na banda.

Love Of My Life


É também durante esse período que Mercury conhece Mary Austin, uma moça comum que trabalhava em uma boutique chamada Biba. Os dois tornam-se amigos, depois namorados e afinal grandes parceiros para a vida.
É em Mary que Freddie confia todos os seus segredos e é com ela que partilha os seus melhores e piores momentos. O afeto é tanto que o vocalista acaba pedindo Mary em casamento.
 

O sucesso da banda


Com o disco lançado e os shows se multiplicando, a banda escala rapidamente. Com criações cada vez mais tempo nas paradas de sucesso, o Queen passa a ser conhecido não só no Reino Unido como também fora do país. 
As turnês levam a banda para os quatro cantos do mundo e, em uma dessas viagens, Mercury descobre que também gosta de rapazes. Quando volta para casa, ele decide contar para Mary a descoberta em relação a sua sexualidade e o par se separa do ponto de vista amoroso (mas acaba por permanecer amigo). 

O desentendimento com o executivo da EMI Ray Foster


No auge do sucesso, Freddie cria uma canção chamada 'Bohemian Rhapsody', com seis minutos de duração. Acreditando piamente que a sua criação exótica faria o maior sucesso, o vocalista propõe que 'Bohemian Rhapsody' seja o single do próximo disco da banda ("A Night at the Opera").
Ray Foster discorda completamente da decisão porque acha a canção estranha e extremamente longa. Diante do impasse, o Queen rompe com a gravadora e Freddie leva a música para ser tocada na rádio pelo seu amigo, o DJ Kenny Everett. A criação acaba por ser um grande sucesso.


O descontrole de Freddie Mercury


O sucesso excessivo, o dinheiro, a fama súbita e algumas companhias problemáticas levam Freddie a um caminho perigoso. Ele começa a beber demais, a atrasar ou a faltar compromissos e a se auto-destruir.
Com uma vida desregrada, consumida pela droga e pela proliferação de parceiros, Mercury entra numa preocupante espiral descendente.

Convencido por um contrato milionário oferecido pelo seu agente, Mercury abandona o grupo para seguir carreira solo. O Queen termina com os integrantes profundamente magoados com o ex vocalista.

O regresso do Queen


Após um período de solidão e descontrole, também alertado por Mary, Freddie percebe a burrada que fez entrando numa vida caótica e sem os amigos que tanto prezava. O vocalista então volta atrás e pede perdão, implorando para que a banda volte a se reunir. Os outros membros do conjunto fazem exigências para que o grupo seja retomado, tentando colocar o vocalista nos eixos. O Queen volta a atuar e faz um concerto histórico no evento beneficiente Live Aid, no ano de 1985. 

Também durante esse período Mercury se apaixona por um garçom que havia trabalhado em uma festa dada em sua casa.


Love Of My Life II


Na ocasião da festa, o garçom recusa as investidas do famoso cantor e aponta o dedo para o fato dele estar indo pelo caminho errado. Em um momento de lucidez, tempos mais tarde, Mercury resolve correr atrás daquele que foi um dos poucos com uma atitude sincera e o recusou em um momento em que estava se degradando. Após uma longa busca pelo misterioso garçom, o casal se reencontra e fica junto.
 

O trágico final do vocalista


Freddie Mercury descobre que contraiu AIDS e que sua vida aparentemente será breve.  Durante um ensaio para o Live Aid ele partilha com os membros da banda a sua condição e pede que tudo continue igual, não desejando ser tratado com pena.
Apesar do final trágico, Jim Hutton, o parceiro de Freddie, fica ao seu lado até o final da vida.
 

Análise do filme


"Bohemian Rhapsody" enfrenta o desafio de ser um filme biográfico que pretende recriar os anos de sucesso de uma das mais famosas bandas de rock do mundo. O roteiro contou com a supervisão de alguns dos membros da icônica banda e procurou ser o mais fiel possível aos fatos, embora muitas vezes o real tenha sido posto de lado em prol de uma versão mais ficcionalizada da história.

Em termos de figurino e cenário, o longa metragem investiu forte em reproduzir de fato os costumes da época. Vemos na tela o famoso bigode de Freddie e as suas roupas polêmicas, encontramos os penteados característicos dos anos setenta e a postura rebelde dos jovens que queriam mudar o mundo através da música. O filme funciona como uma viagem no tempo e entrega ao espectador uma prova do que foi viver durante esse período tão importante para a música.

Diferenças do filme com a vida real


  • 1. O início da relação de Mercury com namorado — No filme somos convencidos que o vocalista dos Queen conhece o namorado em uma festa dada em sua própria casa. Aquele que viria a ser o seu companheiro até o final da vida supostamente havia servido de garçom na festa e não teria cedido as investidas de Freddie. A verdade é que o parceiro real do cantor, Jim Hutton, trabalhava como cabeleireiro em um hotel (Savoy). Os dois teriam se conhecido em uma casa noturna durante a década de oitenta.
O "casal" Freddie Mercury e Jim Hutton.
  • 2. O reencontro do Quee no show Live Aid — O show Live Aid, em 1985, ganha grande protagonismo no longa e praticamente os últimos vinte minutos da história são dedicados ao evento. Em "Bohemian Rhapsody" somos levados a crer que o show no Live Aid teria sido o primeiro da banda após a reconciliação, mas a verdade é que na vida real o Queen já havia se reunido para outros shows antes (eles chegaram a fazer inclusive uma turnê juntos antes do Live Aid).
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O show Life Aid, realizado em julho de 1985, não foi o primeiro show de reencontro da banda após o afastamento do conjunto
  • 3. A briga entre os membros da banda — De acordo com o longa metragem, Freddie teria decidido se separar do resto da banda de modo unilateral, seduzido especialmente por um contrato milionário para seguir carreira solo. O gesto é visto como uma traição pelos amigos, que não o perdoam pelo abandono da vida em grupo pela opção por um caminho individual. Na vida real, porém, esse desentendimento não foi verdadeiro. Enquanto estava na banda, o baterista Roger Taylor, por exemplo, já havia lançado dois álbuns solo ("Fun in Space" e "Strange Frontier"). A verdade sobre a separação do Queen foi que os membros da banda decidiram extinguir o conjunto por livre e espontânea vontade, porque todos queriam explorar caminhos diferentes sozinhos.
Ao contrário do que somos levados a crer, os Queen não se afastaram após uma grande briga
  • 4. A revelação da doença de Mercury — O Freddie do filme teria revelado que havia contraído AIDS aos parceiros da banda durante os ensaios para o Live Aid. Na cena ele apenas pede que o continuem a tratar normalmente, sem o olharem com pena. No entanto, o cantor, já visivelmente debilitado, só assumiu que estava doente um dia antes de morrer, em 24 de novembro de 1991, aos apenas 45 anos. Inclusive ele teria sido diagnosticado dois anos depois da realização do Live Aid, no ano de 1987. A doença se tornou pública através de uma nota divulgada na véspera da sua morte:
"Following the enormous conjecture in the press over the last two weeks, I wish to confirm that I have been tested HIV positive and have AIDS. I felt it correct to keep this information private to date to protect the privacy of those around me.  
However, the time has come now for my friends and fans around the world to know the truth and I hope that everyone will join with me, my doctors and all those worldwide in the fight against this terrible disease. 
My privacy has always been very special to me and I am famous for my lack of interviews. Please understand this policy will continue." — Freddie Mercury, November 23rd, 1991 
("Após a enorme pressão da imprensa nas últimas duas semanas, desejo confirmar que fui testado como soropositivo e tenho AIDS. Achei correto manter essa informação em sigilo para proteger a privacidade das pessoas ao meu redor. 
No entanto, chegou a hora dos meus amigos e fãs ao redor do mundo saberem a verdade e espero que todos se unam a mim, aos meus médicos e a todos os que estão no mundo na luta contra essa terrível doença. 
Minha privacidade sempre foi muito especial para mim e sou famoso por não conceder entrevistas. Por favor, compreendam que esta política continuará." — Freddie Mercury, 23 de novembro de 1991)
Antes da divulgação da nota, a sua última aparição pública havia sido em 1990, durante a entrega do prêmio Brit Awards.
Freddie Mercury só assumiu a doença pouco antes de falecer
  • 5. A rejeição da gravadora ao single 'Bohemian Rhapsody' — No longa metragem Ray Foster (interpretado por Mike Myers) é o todo poderoso executivo a frente da gravadora EMI. Ele teria se oposto veementemente a ideia de ter 'Bohemian Rhapsody' como o single do álbum que seria lançado em 1975. Temos a noção de que a rejeição foi um grande choque para Freddie Mercury, que bateu o pé da importância do protagonismo da criação. Esse conflito teria gerado uma verdadeira crise na relação da banda Queen com a gravadora. A verdade, contudo, é que Roy Featherstone, que estava a frente da EMI era um grande fã da banda e sempre apoiou as decisões do conjunto, dando enorme autonomia a Freddie.
Ray Foster (interpretado por Mike Myers) teria no longa se oposto veementemente à gravação de Bohemian Rhapsody
 

Curiosidades da produção

  • 1. Rami Malek não foi a primeira escolha para viver Freddie Mercury — Apesar de Rami Malek parecer claramente a escolha ideal para viver a pele do vocalista, na verdade a primeira escolha da produção foi Sasha Baron Cohen, a segunda opção foi Ben Whishaw.
Sasha Baron Cohen e Ben Whishaw foram as primeiras opções escolhidas para a interpretação de Freddie Mercury
  • 2. O esforço de Rami Malek para se aparentar com o vocalista dos Queen — Para se aproximar ainda mais do seu personagem, Malek fez uma série de aulas de canto e piano. Apesar de parecer, no longa Malek não canta. Quem faz a voz do vocalista dos Queen é o cantor gospel canadense Marc Martel, que já era cover de Mercury e teve entre 2012 e 2015 a banda Queen Extravaganza, que fazia um tributo ao conjunto inglês. No longa metragem algumas canções são efetivamente gravações feitas de Mercury e outras são cantadas por Marc Martel. Em termos de aparência física, para se assemelhar ainda mais com Mercury, Rami Malek colocou uma prótese dentária feita de acrílico para ficar com a dentição parecida com a do personagem.
Malek usou uma prótese de acrílico para alcançar a dentição do vocalista
  • 3. A mudança de diretor — O longa metragem tinha inicialmente como diretor Stephen Frears (que esteve a frente do longa A Rainha), no entanto ele foi demitido logo após a demissão de Sasha Baron Cohen.
Stephen Frears foi o primeiro diretor a trabalhar no filme biografia do Queen
O segundo diretor contratado foi Bryan Singer (diretor do filme X men), mas a escolha também não deu certo. Rumores dizem que Bryan começou a atrasar compromissos e a nutrir desavenças com a equipe e Rami Malek, por isso foi demitido pela Fox.
Após a saída de Stephen Frears, o direto Bryan Singer entrou em cena para conduzir a direção, mas não durou muito tempo.

A terceira opção foi Dexter Fletcher, que efetivamente entrou no projeto a meio e acabou as filmagens e a pósprodução do filme.
Quem de fato concluiu a direção de Bohemian Rhapsody foi Dexter Fletcher
  • 4. As imagens do maior show do Queen são efetivamente reais — Em uma das cenas do filme, Mercury assiste pela televisão as imagens do show com maior público da banda Queen. O show efetivamente aconteceu, no Rio de Janeiro, e as imagens utilizadas são do Rock in Rio do ano de 1985, quando a banda atuou.
As imagens que aparecem no filme são de fato da apresentação dos Queen no Rock in Rio 1985
  • 5. Apesar de ser o título do filme, a canção Bohemian Rhapsody não é apresentada na íntegra — Embora o longa metragem seja intitulado com uma das canções mais polêmicas do Queen, a verdade é que, devido a sua longa duração, a música não é apresentada na íntegra no filme. O que assistimos na produção é apenas uma exibição de trechos específicos.

Ficha técnica

  • Título original: "Bohemian Rhapsody"
  • Lançamento (EUA): 24 de outubro de 2018
  • Direção: Bryan Singer / Dexter Fletcher
  • Roteiro: Anthony McCarten, Peter Morgan
  • Gênero: Drama/biografia
  • Duração: 2h14min
  • Elenco Principal: Rami Malek, Lucy Boynton, Gwilym Lee 
  • Prêmios: Globo de Ouro 2019 — nas categoria Melhor Filme Dramático e Melhor Ator em Filme Dramático (Rami Malek). BAFTA 2019 — nas categorias Melhor Ator (Rami Malek) e Melhor Som. Oscar 2019 — nas categorias Melhor Ator (Rami Malek), Melhor Mixagem de Som, Melhor Montagem e Melhor Edição de Som

[Fonte: Cultura Genial, por Rebeca Fuks Doutora em Estudos da Cultura]

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terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

PAPO RETO -11: O CRISTÃO E OS JOGOS DE AZAR

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"'Tudo me é permitido', mas nem tudo convém. 'Tudo me é permitido', mas eu não deixarei que nada domine" (1 Coríntios 6:12).

Jogos de Azar - Pode ou Não?


Já me fizeram esta pergunta várias vezes. Sou contra jogos de azar, mas este é o tipo de posição que admite revisão se me aparecerem argumentos melhores e mais coerentes do que aqueles que vou colocar aqui.

Entre os jogos de azar estão aqueles jogos permitidos por lei, que são as várias modalidades de loteria, os bingos - este último, muito usado até por igrejas cristãs e instituições - e os sorteios pelo telefone valendo dinheiro, carros e outros prêmios. Quem explora este tipo de jogo tem licença de órgão público competente. Mas nem por isso quer dizer que sejam jogos que convêm ao crente - observe que falo sobre o princípio da conveniência e não da licitude.

Temos também os jogos ilícitos, cujo mais popular é o Jogo do Bicho. Os cassinos são mais uma modalidade de jogos de azar cuja legalidade e implantação oficial está sendo discutida no Brasil. Nos EUA, a cidade mais populosa e mais densamente povoada do estado americano de Nevada, a famosa Las Vegas, localizada ao sul do estado, no Condado de Clark, é conhecida mundialmente como a cidade dos cassinos.  Para o cristão, o que realmente importa é se estas modalidades de jogo acabam por afetar algum princípio bíblico.


Analisando os princípios


Apostas e jogos de sorte são uma realidade no meio social, pois a diversão, o lazer e o entretenimento, nas suas várias expressões, fazem parte de uma das dimensões do ser humano. Porém, a pergunta é se essas práticas são convenientes ou não. Diante do que a Igreja ensina sobre apostas e jogos de sorte ou azar, sendo essa uma questão complexa, um aspecto imprescindível é destacar o abandono e a confiança na Providência de Deus, que rege todas as coisas e deve ter a primazia na vida de todo ser humano. Também é preciso a todos disposição e empenho para o trabalho, que não deve ser descartado frente a possíveis acomodamentos por motivos fúteis.

Exemplos de incoerência


Um pai de família que deixa de comprar o necessário para sua casa se manter com dignidade e gasta seu dinheiro com jogos de sorte e apostas está dando prioridade ao que é secundário. Outra situação é quando uma pessoa, devido a sua exagerada frequência nos jogos e apostas, acaba viciando-se nessas práticas e deixa de fazer as coisas realmente necessárias em sua vida, como cuidar da própria saúde, cumprir com responsabilidades familiares e sociais.

Outro risco é acreditar mais em apostas e jogos de sorte/azar do que no próprio Deus, o que pode interferir tanto na espiritualidade da pessoa quanto no seu equilíbrio na vivência social. Com efeito, o vício provoca a perda da liberdade de filho de Deus e dos princípios básicos do Evangelho (Gálatas 5:1, 13, 16, 17). 

Assim, é importante ter claro que o ser humano também deve trabalhar para sua sobrevivência, pois, em Gênesis 3:17, ao falar sobre a terra, diz que o homem 
"...tirará dela com trabalhos penosos o teu sustento todos os dias de tua vida". 
Ou seja, não se deve confiar o sustento às apostas e jogos.

Tem algum versículo na Bíblia que proíbe a prática dos jogos de sorte/azar?


Esta é a pergunta que segue à outra. Ou esta pergunta é feita por quem realmente tem interesse  no conhecimento das regras bíblicas ou é feita por quem quer  confrontar, só para justificar uma decisão que já tomou no coração. Em ambos os casos a resposta é uma só: NÃO!

A Bíblia não proíbe de forma explícita os jogos de azar - assim como não proíbe fumar ou beber bebidas alcoólicas. Entretanto, nossa ética é elaborada não somente com aquilo que a Bíblia ensina explicitamente como também com aquilo que pode ser legitimamente derivado e inferido das Escrituras. Existem diversos princípios bíblicos que deveriam fazer o crente hesitar antes de jogar:

1. O trabalho é o caminho normal que a Bíblia nos apresenta para ganharmos o dinheiro que precisamos - Provérbios 31, Efésios 4:282 Tessalonicenses 3:12.


Quando uma pessoa não pode trabalhar, por motivos diversos, desde desemprego até incapacidade, ela deve procurar outros meios de sustento e depender de Deus pela oração (Filipenses 4:6,19). A probabilidade da situação do desempregado piorar ainda mais se ele gastar seu pouco dinheiro em jogo é muito grande.

2. Tudo que ganho pertence a Deus (Salmo 24:1), e como mordomo, não sou livre para usar o dinheiro do jeito que quiser, mas sim para atingir os propósitos de Deus. 


E quais são estes propósitos? Aqui vão alguns mencionados na Palavra: 
  1. Suprir as necessidades da minha família (1 Timóteo 5:8), o que pode incluir, além de sustento e educação, lazer e outras atividades que contribuam para a vida familiar; 
  2. compartilhar com os irmãos que têm necessidades e sustentar a obra do Evangelho (2 Coríntios capítulos 8 e 9; Gl 6:6-10; 3 João).

3. Deus usa o dinheiro para realizar alguns importantes propósitos em minha vida.


Suprir minhas necessidades básicas (Mateus 6:11; 1 Tm 6:8); modelar meu caráter (Fp 4:10-13); guiar-me em determinadas decisões pela falta ou suficiência de recursos; ajudar outros por meu intermédio; mostrar seu poder provendo miraculosamente as minhas necessidades. Jogar na loteria não contribui para qualquer destes objetivos.

4. Cobiça e inveja são pecado (Êxodo 20:18; 1 Tm 6:9; Hebreus 13:5).


Estas são as principais motivações para os jogos de azar na grande maioria das vezes. A atração de ganhar dinheiro fácil tem fascinado a muitos evangélicos.


5. Existem várias advertências no livro de Provérbios sobre ganhar dinheiro que podem se aplicar aos jogos de azar.


O desejo de enriquecer rapidamente traz castigo (28:20,22); o dinheiro que se ganha facilmente vai embora da mesma forma (13:11); e riqueza acumulada da forma errada prejudica a família (15:27).

Os jogos de sorte/azar no contexto social


É importante lembrar, ainda, que os jogos de azar são responsáveis por muitos males sociais, emocionais e jurídicos no povo, tanto de crentes como de não crentes. Menciono alguns deles:
  1. O empobrecimento - Há pessoas que são cativadas pelo vício de jogar e, diariamente estão jogando. E, como só um ou poucos ganham, há pessoas que passam a vida toda jogando sem nunca ganhar. Não poucos perderam tudo o que tinham em jogos. Muitos pais de família pobres gastam o dinheiro da feira no jogo.
  2. O vício de jogar apostando dinheiro - A tentação para jogar começa desde cedo a estimular uma compulsão entre crianças e jovens que começam a adquirir o hábito de "tentar a sorte". Há milhares de jovens que já são viciados no jogo, especialmente com a vinda da internet e a possibilidade de jogos online com apostas.
  3. Arruinar vidas e carreiras - Não são poucas as histórias de pessoas que se arruinaram financeiramente jogando na bolsa de valores – conheço pelo menos uma pessoa nesta condição – ou apostando em outros tipos de jogo.
  4. Jogar dinheiro fora - As chances de se ganhar na loteria são piores do que se pensa. Para efeito de comparação, a probabilidade de uma pessoa morrer em um atentado terrorista durante uma viagem ao exterior é de 1 em 650 mil e atingida por um raio é de 1 em 30 mil. Se uma pessoa compra 50 bilhetes a cada semana, ela irá ganhar o prêmio principal uma vez a cada 5 mil anos.

Conclusão

Postura coerente frente a essa realidade


Diante da participação de apostas e jogos de sorte, conforme a Igreja ensina, é importante que cada um saiba analisar suas próprias limitações e intenções por trás de cada prática, para não se viciar, ou optar sempre por aquilo que pode ser supérfluo. Com isso, se for por simples diversão, sem resquício de vícios e com uma consciência moral reta, não haverá problemas nesse sentido.

Uma forma de não incorrer em riscos relacionados ao excesso de jogos de sorte, cartas e apostas é perceber como e o quanto estamos envolvidos, se temos o domínio sobre nós mesmos para dizer sim e não na hora de começar e na hora de parar.

Outra pergunta frequente é se as igrejas deveriam receber ofertas e dízimos de dinheiro ganho em loteria. Minha tendência é dizer que não deveriam. Guardadas as devidas proporções, lembro que no Antigo Testamento o sacerdote era proibido de receber oferta de dinheiro ganho na prostituição (Deuteronômio 23:18) e que no Novo, Pedro recusou o dinheiro de Ananias e Safira (Atos 5) e de Simão, o Mago (8:18-20).

Alguém pode dizer que o valor gasto nas apostas em casas lotéricas é muito pequeno. Concordo. Mas é uma questão de princípio e não de quantidade. Quando o que está em jogo são princípios, um centavo vale tanto quanto um milhão.

Assim, o que precisa reger nossa vida é a Providência de Deus, tanto na parte material quanto a promoção de divertimentos que sejam saudáveis para o corpo e a alma. 

O básico e necessário sempre nos será concedido pelo Senhor por meio da Sua Providência junto ao nosso esforço e trabalho, pois Jesus nos garante: 
"Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo" (Mt 6:33).

[Fonte: Algumas informações deste artigo foram extraídas com base no vídeo "Encontro Apologético - O Cristão e os Jogos de Azar", com preleção do pr. Paulo Romeiro]

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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

CANÇÕES ETERNAS CANÇÕES - "CHÃO DE GIZ", ZÉ RAMALHO

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"Chão de Giz" é um clássico da música brasileira. Ela tem aquele clima de roda de amigos com vozes e violão "disputando" quem desafina mais. Me lembro dos meus tempos de ginásio (atual ensino médio), no pátio da Escola Estadual Odilon Berhens, aqui em minha cidade natal, Belo Horizonte, capital de Minas Gerais. Eu estudava à noite e toda sexta-feira tinha um colega (infelizmente não me lembro o nome dele agora) que levava o seu violão e fazíamos uma rodinha na hora do recreio.

O repertório era essencialmente de MPB e/ou do rock nacional da década de oitenta. "Chão de Giz" constava na lista dos cantantes. Mas, apesar da linda e melancólica melodia, o certo é que nenhum de nós sabia ao certo o significado dos versos da complexa letra. E tem muita gente que ainda hoje, ouve e canta a música, mas ainda não sabe o seu significado. Porém, atualmente a internet está aí para nos ajudar e fazendo uma pesquisa descobri o significado da letra explicada por ninguém menos que o seu próprio compositor.

Uma música, uma história


"Chão de Giz" é uma música da autoria do cantor e compositor brasileiro Zé Ramalho que descreve o fim de um relacionamento amoroso. A canção foi gravada em 1978 no álbum de estreia solo do artista paraibano. 

"Chão de Giz" foi composta pelo próprio cantor é uma das suas obras-primas tendo sido regravada algumas vezes ao longo dos últimos quarenta anos. A música também fez parte da trilha sonora da novela "Cordel Encantado", exibida no horário das 18h:00, pela Rede Globo originalmente em 2011 e que está sendo reexibida atualmente na sessão "Vale a Pena Ver de Novo".

Muita gente sabe que "Chão de Giz" é uma das principais canções de Zé Ramalho. Muita gente admira a canção e sempre a canta quando a ouve no rádio ou no barzinho, mas poucas pessoas entendem ou sabe o significado da letra tão complexa. "Chão de Giz" é realmente espetacular. Descubra agora um pouco mais sobre o significado e a interpretação dessa belíssima canção.

Letra da Música Chão de Giz


"Eu desço dessa solidão 
Espalho coisas sobre 
Um chão de giz 
Há meros devaneios tolos 
A me torturar 
Fotografias recortadas
Em jornais de folhas 
Amiúdes! 
Eu vou te jogar 
Num pano de guardar confetes 
Eu vou te jogar 
Num pano de guardar confetes 

Disparo balas de canhão 
É inútil, pois existe 
Um grão-vizir 
Há tantas violetas velhas 
Sem um colibri 
Queria usar quem sabe 
Uma camisa de força 
Ou de Vênus 
Mas não vou gozar de nós 
Apenas um cigarro 
Nem vou lhe beijar 
Gastando assim o meu batom 

Agora pego 
Um caminhão na lona 
Vou a nocaute outra vez 
Prá sempre fui acorrentado 
No seu calcanhar 
Meus vinte anos de 'boy that's over, baby'! 
Freud explica 
Não vou me sujar 
Fumando apenas um cigarro 
Nem vou lhe beijar 
Gastando assim o meu batom 
Quanto ao pano dos confetes 
Já passou meu carnaval 
E isso explica porque o sexo 
É assunto popular 
  
No mais estou indo embora! 
No mais estou indo embora! 
No mais estou indo embora! 
No mais!"

Significado da música Chão de Giz


Chão de Giz é uma das composições mais famosas do artista e consiste em uma letra poética repleta de metáforas. Por este motivo, existem também várias interpretações possíveis. É possível concluir que a música se trata de um amor não correspondido ou do fim de um amor entre duas pessoas.

Uma teoria bastante divulgada indica que a música foi criada para lidar com um alegado relacionamento frustrado do compositor com uma mulher casada. A relação teria durado bastante tempo e a mulher era bem mais velha, casada com uma pessoa influente da sociedade de João Pessoa.

Apesar de Zé Ramalho ter ficado perdidamente apaixonado e o casal ter mantido o caso durante um longo período, a mulher acabou por dispensa-lo. Desiludido, o compositor teria criado "Chão de Giz".
Zé Ramalho, nos anos setenta. 

No entanto, existe ainda a interpretação que a música retrata as coisas efêmeras da vida. Essas coisas passageiras se apagam da nossa vida com facilidade, assim como o giz é apagado do chão.

Uma interpretação não tão consensual indica que o giz se refere à cocaína e a música se refere ao consumo da droga em questão e os dilemas causados. Teorias à parte, vamos à

Interpretação da música "Chão de Giz", segundo o próprio Zé Ramalho.


A fim de fazermos uma interpretação mais completa da canção destrinchamos a letra verso a verso para analisarmos ao pormenor. Vamos ao primeiro verso:
"Eu desço desta solidão e espalho coisas sobre um chão de giz..."
Esta frase evidencia o sofrimento causado pelas lembranças. O autor desce e se encontra humilde no chão, olhando para as memórias de um relacionamento que se apagou rapidamente, como o giz e apagado do chão.
"...Há meros devaneios tolos, a me torturar..."
O passado causa dor e as memórias de um amor frustrado são uma tortura que fazem o autor delirar.
"...Fotografias recortadas de jornais de folhas amiúdes..."
Existia o hábito de colecionar as fotos da sua amada, que saíam no jornal, o que indica que ela era alguém da alta sociedade.
"...Eu vou te jogar num pano de guardar confetes..."
Os panos de guardar confetes eram sacos usados por costureiras do nordeste, onde guardavam retalhos de pano ou papel. Neste caso, o artista refere que vai guardar essas partes da sua vida, para que não causem mais dor.
"...Disparo balas de canhão, é inútil, pois existe um grão-vizir..."
Um grão-vizir era uma figura importante e de autoridade, que servia como conselheiro de um sultão da antiga Pérsia. O compositor revela vontade de lutar pelo relacionamento, mas sabe que não vale a pena lutar, porque existe alguém que é mais influente, poderoso ou rico (provavelmente o marido).
"...Há tantas violetas velhas sem um colibri..."
Nesta metáfora, a violeta velha representa uma pessoa mais velha e o colibri alguém mais jovem. Com esta frase, o autor revela que há muitas pessoas mais velhas que não têm alguém novo ou alguém que saiba amá-las verdadeiramente.
"...Queria usar, quem sabe, uma camisa de força ou de Vênus..."
É possível ver nesta frase o conflito de sentimentos que existem no autor, a loucura (representada pela camisa de forças) e a paixão, o prazer (representados pela camisa de Vênus).
"...Agora pego um caminhão, na lona vou a nocaute outra vez..."
Revela a decisão de ir embora, porque sabe que o relacionamento nunca terá um futuro. No entanto, ter chegado a essa conclusão foi devastador e o eu-lírico se sente abatido, como um lutador de boxe que é nocauteado por um forte golpe.
"...Pra sempre fui acorrentado no seu calcanhar 
Meus vinte anos de 'boy, that's over, baby'..." 
É revelada a dependência do elemento mais novo do relacionamento, que está preso. Ele se descreve como um rapaz (boy - palavra em inglês) e com a expressão em inglês "that's over, baby" (que significa: "terminou, querida"), revela que essa ligação entre os dois chegou ao fim.
"...Não vou me sujar fumando apenas um cigarro..."
Depois de muito sofrimento e consciente que ela nunca largaria o marido/status para ficar com ele, ele decide esquecê-la. Essa parte ele diz que não vai se sujar transando mais uma vez com ela, pois agora tem consciência de que nunca passará disso.
"...Quanto ao pano dos confetes, já passou meu carnaval..." 
Esta frase indica que os dois provavelmente se conheceram durante o carnaval e o pano de confetes (onde guarda as recordações), já não tem mais utilidade, porque já está no passado.
"...E isso explica porque o sexo é assunto popular..."
Aqui ele faz um arremate do que parece ter sido apenas o que restou do amor dele por ela (ou dela por ele): sexo. Por isso o sexo é tão popular, pois apenas ele é valorizado. Ela só queria sexo e nada mais.
"...No mais, estou indo embora." 
No fim da canção, depois de todas as recordações e afirmações o compositor conclui que para ele terminou e que está indo embora. No fim da música, ele se despede desse amor que causou dor e o fez olhar para o chão de giz.

  • Repetindo: Toda essa explicação foi dada pelo próprio Zé Ramalho.

Conclusão

Sobre a gravação



Capa do disco que contem faixa com a música

"Chão de Giz" foi gravada pela primeira vez no ano de 1978, no primeiro CD solo do cantor paraibano Zé Ramalho. O álbum, lançado pela gravadora Epic/CDB já continha sucessos que vieram a acompanhar o cantor pelo resto de sua carreira. Falo de canções como como 'Avohai' e 'Vila do Sossego'.

As músicas desse primeiro álbum foram todas compostas pelo cantor. A maior parte delas é de criação individual, embora em quatro faixas haja uma parceria com outros músicos.


A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.

TRAGÉDIA EM BRUMADINHO: 30 DIAS DE LUTO


Era o meio de um dia aparentemente comum. Uma sexta-feira que parecia mais um fim de semana como outro qualquer. Na manhã daquele dia 25 de janeiro de 2019, 313 pessoas se levantaram e começaram os seus afazeres cotidianos. Trabalhadores(as) se levantaram, tomaram seu café, se despediram de suas famílias e foram à luta. 

Muitos(as) deixaram esposos(as), filhos(as); outros deixaram mães, pais e irmão(ãs), alguns ainda dormindo. Profissionais dos setores administrativos entraram em suas salas, ligaram seus computadores e deram início aos seus despachos. Profissionais dos setores operacionais assumiram seus postos, suas máquinas, seus volantes, suas cabines, suas ferramentas. Pequenos agricultores encaminharam-se à suas hortas, já preparados para mais um dia de plantar, colher, ordenhar e alimentar seus animais... 

Todos já com o físico, a mente e até a aparência cansada pela labuta, porém, felizes pela semana que findava. "Graças a Deus, mais uma semana chega ao fim!", certamente era o pensamento de muitos deles - quiçá de todos eles.

Dentre eles, havia os que iriam emendar a semana para um ganho extra no intuito de dar uma equilibrada nas finanças, afinal os tempos são difíceis e a crise econômica pela qual passa o Brasil ainda resiste, apesar de números estatísticos insistirem em afirmar que ela está indo embora. Sendo assim, algumas horas extras sempre ajudam. Outros já se preparavam para relaxar no sábado e no domingo. Curtir a família. Tomar uma cervejinha gelada ("afinal, ninguém é de ferro..."), ir à missa ou ao culto no domingo ("há muito o que agradecer a Deus..."). 

"Nesse final de semana de calor intenso, vou curtir uma cachoeira com a galera." "Domingo é dia da peladinha com a turma, preciso acabar com essa barriga." "Minha última semana de trabalho. À partir de segunda-feira, enfim começam minhas férias."... Um dia como outro qualquer. Apenas mais uma sexta-feira no cotidiano. 

Após o almoço, muitos se espalharam em busca de um cantinho para fazer a sesta e depois recomeçarem a jornada. Outros jogavam conversa fora. Outros viam televisão no refeitório ou mesmo na sala de suas casas. Os mais privilegiados, desfrutavam das luxuosas instalações da Pousada Nova Estância, enquanto outros lá mesmo já estavam no exercício de suas funções profissionais (afinal, o trabalho não podia parar...).

O dia que ainda não acabou


De repente, não mais que de repente, ouve-se um barulho ensurdecedor! O que seria? Um vagão descarrilando? Uma batida de algum caminhão pesado (daqueles enormes, conhecidos como "fora-de-estrada", que transitam nas mineradoras)? Não, está mais parecendo o barulho da queda de um avião. Misericórdia! Pânico, correria, gritos, destruição, devastação. 

O som aumentando cada vez mais e não era som de nenhuma sirene. Era uma tsunami de lama de rejeitos de minérios que descia de uma das minas do Córrego do Feijão, pertencente à mineradora Vale. Com uma força descomunal e impossível de se conter, ela veio varrendo tudo com sua onda violenta: estruturas, edificações, máquinas... VIDAS! Muitas vidas.

Em um tempo recorde, apenas poucos minutos, sonhos, planos, projetos e futuros deixaram de existir e tudo o que se via, tudo o que sobrou foram destroços e corpos soterrados, inúmeros deles dilacerados. Assim, num abrir e fechar de olhos, aquele que parecia ser um dia como outro qualquer assumiu um tom cinza... ou melhor, cinza não, vermelho, da cor do sangue... Muito sangue. Choros, lamentos, dores, muitas dores.

O azul do céu foi tomado por um outro vermelho, mas não o vermelho que desceu misturado à lama e aos rejeitos do minério, mas o vermelho dos helicópteros do Corpo de Bombeiros. Cada decolagem, fazia nascer a esperança nos corações doídos de muitas famílias ainda consternadas, quase não acreditando no que estava acontecendo, apesar do que os olhos mostravam.

Cada pouso, se não trazia o alento esperado, ao menos trazia a dignidade devida a um ser humano, ainda que embrulhada em sacos pretos, ainda que não inteiros, apenas segmentos de corpos, mas símbolos da existência do ente querido de alguém. Em terra, o vermelho das fardas perdia a cor ao ser mergulhado no mar de lama. Rostos cansadas, sujos, mas com expressões bem delineadas de consternação e sensibilidade.

Corpos exaustos, porém, imbatíveis em busca de outros corpos que jaziam perdidos em meio ao lamaçal assassino. Embora não gostam de ser assim chamados, não há outra definição para estes homens e mulheres a não ser: HERÓIS e HEROÍNAS da vida real. Toda a heroica corporação representada em uma pessoa: voz equilibrada, coerente, gentil, firme, responsável, sem perder o tom da serenidade, da sensatez, da humanidade, da sensibilidade - vencendo o embargo imposto pela emoção e comoção que os olhos puxados dos traços orientais não conseguiam conter. Tenente Pedro Aihara. Um jovem de apenas 26 anos, uma presença e uma voz que diariamente deram o tom sombrio da tragédia de proporções tão devastadoras que ainda não é possível dimensionar. 

Vidas de pessoas, de animais, do tão celebrado e conhecido rio Paraopeba, habitat natural de outras centenas de vidas aquáticas que também se foram, levadas pela lama intrusa, invasora cuja matiz de cores perturbadoras pintou com o cenário de destruição, outrora cenário de um pacato e verde povoado, um monumento fúnebre à ganância de outros seres humanos que neste exato momento estão traçando seus planejamentos para os ganhos dos seus futuros que estão garantidos pela afronta e ousadia da impunidade grassante em cifras numerárias.

Conclusão


30 dias se passaram. O saldo até o momento é de 134 desaparecidos. O número de mortos chega a 179. Ricos, pobres, negros, brancos, magros, gordos, fortes, fracos, bebês, crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, homens, mulheres, bons, maus, humildes, arrogantes, religiosos, ateus...: 313 VIDAS, PESSOAS, SEMELHANTES!

De acordo com informações, a barragem, localizada a 57 quilômetros de Belo Horizonte, rompeu-se por volta das 12h20, de sexta-feira, 25 de janeiro. Sobreviventes relatam que um mar de lama tomou conta de estradas, do rio, do povoado e, sobretudo, da área da Vale, empresa responsável pela barragem. Como era hora do almoço, muitos funcionários ficaram retidos no restaurante. 

O misto de perplexidade, tristeza e indignação se instalou no país. As dificuldades causadas pela lama e riscos de contaminação aliados à chuva intensa aumentaram ainda mais a tensão nas buscas por vítimas. Famílias inteiras desapareceram. Nem todos foram localizados. Ontem (24), ocorreram manifestações em Brumadinho e em Belo Horizonte para homenagear os mortos. Pela estimativa do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, os trabalhos deverão se estender por três a quatro meses após o rompimento.

Pela estimativa do Corpo de Bombeiros, os trabalhos de resgate e de localização de vítimas deverão se estender por mais dois ou três meses. Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o rompimento é o pior desastre em uma barragem em todo o mundo na última década.

Oito profissionais da Vale ligados à segurança da estrutura seguem presos. Para o Ministério Público de Minas Gerais, não foi acidente, mas "crime doloso" (com intenção) e, por isso, é preciso investigar até a cúpula da Vale. Uma das linhas de apuração envolve descobrir quem detinha informações sobre a barragem antes do rompimento.

Enfim, para mim e você que leu este artigo, a vida continua, vida que segue até que...
"Qual de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar algum tempo à jornada da sua vida?" (Mateus 6:27)

[Fonte: EBC - Agência Brasil; Veja]

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domingo, 24 de fevereiro de 2019

ACONTECIMENTOS - OS 20 ANOS DA MORTE DO CALOURO DA USP

O estudante Edison Chi Hsueh, morto durante trote na USP (Crédito: Reprodução )
Na maioria das faculdades brasileiras os alunos recém ingressos são recebidos com tinta, máquinas de cortar cabelo e brincadeiras de mal gosto. Além disso, se tratando da Medicina da USP, há mais um agravante. Há 20 anos a faculdade foi marcada pela morte do estudante Edison Tsung-Chi Hsueh, encontrado morto na piscina da instituição, no dia seguinte do trote da faculdade.

O dia fatídico


Certamente ingressar na Universidade de São Paulo (USP) é um dos grandes sonhos muitos jovens estudantes. Todos os anos, para muitos o desejo de entrar na USP começa muito antes do ano de formatura do ensino médio. Parece um sonho! Entrar numa das maiores, mais concorridas e endeusadas universidades públicas do País sem precisar enfrentar novas provas. Mas, na prática, o processo não é tão fácil. A procura é muito grande! 

Porém, em 1999, no dia 23 de fevereiro, uma terça-feira, o sonho colorido se transformou em um bizarro pesadelo e revelou o seu lado obscuro, com o caso mais emblemático de trote universitário violento. 

A recepção aos calouros de Medicina terminou com a morte do estudante Edison Chi Hsueh, de apenas 22 anos. Segundo testemunhas, ele foi jogado em uma piscina olímpica mesmo após ter dito aos veteranos que não sabia nadar.

O estudante de medicina foi encontrado morto dentro da piscina da Associação Atlética Acadêmica Oswaldo Cruz, que pertence ao diretório acadêmico da Faculdade de Medicina. No local, havia ocorrido uma festa de confraternização entre calouros e veteranos dois dias antes. 

Recém-ingresso na faculdade, Hsueh estava na comemoração. A Polícia informou que a morte pode ter acontecido durante ou após a festa. Segundo a família, ele não sabia nadar. Apesar de o corpo não apresentar sinais de violência, a polícia não descartou a hipótese de homicídio (intencional ou não). A bermuda do estudante estava manchada com tinta, sinal de que ele passou por um trote. Os 180 alunos do 1º ano de medicina participaram na manhã de segunda-feira da aula inaugural.

Depois da aula, eles foram pintados com tinta pelos veteranos. Por volta das 12h, um grupo de aproximadamente 200 pessoas (entre veteranos e calouros) foi para a associação para participar de uma festa de confraternização.

Duração


Segundo as investigações, a festa durou pelo menos até as 18h, com muita cerveja e acesso livre à piscina. O que aconteceu depois disso ninguém sabe. Segundo informações dadas pela direção da Faculdade de Medicina, o IML (Instituto Médico Legal) informou que o corpo ficou por cerca de nove horas dentro da água. O corpo, que estava submerso na piscina, foi encontrado por volta das 7h30 da terça-feira por um funcionário da limpeza. Isso indica que o estudante teria morrido às 22h30 do dia anterior.

Os acusados

Impunidade


O Superior Tribunal de Justiça - STJ trancou a ação penal em relação a todos os acusados, em fevereiro de 2005. Os acusados Frederico Carlos Jaña Neto, Ari de Azevedo Marques Neto, Guilherme Novita Garcia e Luís Eduardo Passarelli Tirico ficaram livres da ação penal a que respondiam pela morte de Hsueh. Eles eram veteranos do curso de Medicina da Universidade de São Paulo e foram acusados de causar a morte por afogamento do calouro durante um trote. Mas, mesmo com toda a repercussão nacional que o caso ganho, os quatro acusados pela morte foram absolvidos pelo Superior Tribunal Federal - STF.

Trote ou assassinato?

O "prêmio" de Edison


Imagem relacionada
Depois das brincadeiras, os estudantes caminharam até a Associação Atlética. No bosque, foram lavados com jatos de tinta - os calouros pelas veteranas, as calouras pelos veteranos. Seguiram então até a arquibancada em frente à piscina. Enfileirados, acompanhados pelo som de uma bateria, entoaram alguns hinos.

Ao ouvir gritos de ordem, caíram na água. Dois calouros relatam que, devido ao grande número de pessoas, aqueles que estavam na frente eram empurrados. 
Filho de imigrantes chineses de Taiwan, de classe média, Edison não foi visto perto da piscina. 

De acordo com o laudo médico, ele morreu de asfixia mecânica. Entrou na água e não voltou a emergir. A lenta agonia durou entre três e cinco minutos. A piscina é profunda - tem entre 2 e 4 metros. Cerca de uma centena de alunos pulou ao mesmo tempo, provocando evidente situação de risco. A água estava turva devido ao excesso de tinta e aos restos da farinha despejada nos estudantes durante o trote.

Edison não foi visto perto da piscina, mas seu corpo sem vida foi encontrado dentro dela. Este foi o "prêmio" que o brilhante aluno recebeu pela realização de seu sonho.

O que mudou?


Mas, de lá para cá muita coisa mudou. No ano seguinte da morte de Edison a direção da faculdade aboliu qualquer tipo de trote e os veteranos deixaram de lado as pinturas no rosto e os cortes de cabelo, para serem guias dos novos estudantes, mostrando as instalações da faculdade.

Semana do calouros


A recepção aos estudantes não termina no dia da matrícula. Na primeira semana de aula dos calouros, que neste ano está sendo entre 21 e 25 de fevereiro, não há aula, apenas atividades de integração. 

O mais próximo dos trotes convencionais acontece nessa semana. Existe um dia apropriado para os estudantes que querem se pintar e os veteranos programam um dia para que os calouros façam pedágio nos carros que circulam pela Avenida Dr. Arnaldo, nos arredores da faculdade.

Como é o trote ao redor do mundo


As brincadeiras com os "bixos" não é exclusividade do Brasil. Veja como é em outros países e como os governos lidam com os exageros e abusos.

Muitos pensam que só no Brasil o trote é considerado um evento que pode terminar em violência ou abuso. Um engano. Executado há mais de setecentos anos, o trote surgiu na era medieval e permanece espalhado pelo mundo até hoje. Foi apenas a partir do século 20 que o trote passou a receber limites e punições para quem os comete.
  • Suécia - O "nollning", o trote sueco, é sempre um sucesso. O motivo é simples: o rito de iniciação dos nórdicos inclui algo raro: nudez. Tudo por causa de um jogo chamado "klädstreck" ou "fila de roupas".
  • Espanha - Chamado de "novatada", o trote na Espanha ocorre apenas em universidades grandes ou tradicionais e raramente é violento. 
  • França - Não pense que os franceses são requintados e de bom gosto também na universidade. Após vários casos de violência e até de mortes, o trote, conhecido como bizutage, foi proibido por lei em 1998.
  • Portugal - A universidade de Coimbra, a mais antiga em Portugal, registra casos de trotes no século 16, na era medieval. Trote, não. Na terrinha, o termo correto é "praxe" e corresponde não só à primeira semana, mas ao ano inteiro de aulas.
  • Canadá - Apesar de ser um país reconhecido pela educação e os baixos índices de criminalidade, os trotes no Canadá são marcados por abuso de álcool e violência contra estudantes. Chamado de "frosh week", muitos estados criaram leis proibindo esse tipo de trote.

Conclusão


No ano seguinte à morte de Edison, o então governador Mario Covas (1930-2001) sancionou uma lei proibindo trotes violentos no estado de São Paulo. No entanto, denúncias de abusos em rituais de boas-vindas ainda são frequentes. Em 2015, a Assembleia Legislativa de São Paulo criou uma CPI para apurar violações de direitos humanos nas universidades paulistas. A faculdade de Medicina da USP, a mesma de Edison, foi citada em cinco denúncias de estupro.

Recentemente, também foram identificados sites com mensagens que incentivavam o abuso sexual de alunas da Universidade Federal do Ceará e da Universidade de Brasília. Isto sem contar as ocorrências que evidenciam outros tipos de humilhações e manifestações racistas. Ou seja, apesar da tragédia e das leis, na prática, tudo continua como dantes no quartel de Abrantes. Pra frente, Brasil!


A Deus toda glória.
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