quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

DIRETO AO PONTO — CONCORDE, OU CALE-SE PARA SEMPRE!

"Se a liberdade significa alguma coisa, significa o direito de dizer às pessoas o que elas não querem ouvir" (George Orwell, ☆1903/✞1950).
Tempos tristes que vivemos, quando falar a verdade incomoda tanto. As bolas da vez são alguns daqueles que, por dizerem o óbvio publicamente, são alvos dos que gostam de manipular a população para que aceite seu jeito deturpado de viver e proceder. 

A discussão sobre o conflito entre o chamado e/ou considerado "politicamente correto" e a liberdade de expressão, se faz necessário, principalmente com o advento da internet e suas mídias/redes sociais/digitais, universo online, onde todos evocam para si o direito de falar o querem, de impor o que defendem, mas nem sempre estão dispostos a ouvir o que não querem e/ou o que não concordam.

É o politicamente correto em ação, querendo destruir a sociedade em suas bases e calar quem é contra tal destruição. Hoje em dia, quantos precisam ficar calados por medo de serem censurados, proibidos, cancelados e quaisquer outros termos?

É óbvio que deve existir respeito em qualquer esfere e em relação a qualquer assunto, mas ser livre para dizer o que se quer compreende estar ciente de que haverá concordâncias, discordâncias e debate.

Uma tentativa recente de calar o óbvio aconteceu recentemente na América do Norte. No Canadá, no dia 8 de janeiro, entrou em vigor a lei C-4, que determina, entre outras coisas, que
"fornecer, promover ou fazer propaganda de terapia de conversão"
é crime. Entenda-se como "terapia de conversão" quando alguém ou alguma instituição oferece recursos para que alguém que segue determinada orientação sexual incomum tente deixar de segui-la, se for sua vontade. 

Cerca de 4 mil pastores em toda a América do Norte se reuniram para protestar contra a C-4 e a possibilidade de sua má interpretação, que pode resultar em proibir ensinamentos bíblicos sobre ética secuao ou que se fale nesse sentido abertamente.

A polêmica já começou quando um desses pastores, John MacArtur, da Grace Community Church, em Los Angeles, na Califórnia, nos Estados Unidos, manifestou sua preocupação de que a lei canadense ganhe simpatizantes no país vizinho, o seu. No púlpito, em um culto dominical veiculado no YouTube, MacArthur disse que
"não existe trangênero. Você é XX ou XY. É isso. Deus fez o ser humano como homem ou mulher. Isso é determinado geneticamente, é fisiologia, é ciência, é a realidade".
O YouTube tirou o vídeo do ar, um ato de censura, e justificou que ele viola seu regulamento sobre "discursos de ódio". 

MacArthur se manifestou em outras mídias e declarou que repressões como essa provavelmente aumentarão, principalmente quando cristãos se recusarem a ceder, e que o que há no Canadá chegue rápido aos Estados Unidos.
"Em última análise, os dissidentes, aqueles que não cedrão serão aqueles fiéis à Bíblia. E é isso que já está levando a leis contra a prática do que somos ordenados a fazer nas Escrituras que é enfrentar esse pecado. E isso só vai aumentar",
disse o pastor.

Pelo direito de discordar


A conhecida e icônica frase do pensador francês Voltarie (☆1694/✞1778)
"eu discordo do que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lo"
talvez seja a melhor definição para a liberdade de expressão. 

Afinal, é muito fácil reconhecer a liberdade de expressão às ideias que concordamos; muito mais difícil é aceitar a manifestação de ideias que desgostamos. 

O que se tem visto no Brasil nos últimos tempos, no entanto, é uma crescente vontade de reprimir formas de expressão que sejam consideradas desrespeitosas e preconceituosas. A iniciativa, embora tenha como pano de fundo uma intenção nobre, tem gerado situações desproporcionais, limitando o direito à livre expressão e violando a Constituição Federal.

O que nos diz a Constituição?


Lembrando que o direito à liberdade de expressão não é um direito absoluto, a própria Constituição Federal veda o anonimato. E ainda, ele pode estar sujeito a restrições, conforme previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos.

A Convenção prevê ainda a possibilidade de estabelecer restrições à liberdade de expressão, que se manifestam através da aplicação de responsabilidade adicional pelo exercício abusivo deste direito, que não deve de modo algum limitar, para além do estritamente necessário, a plena liberdade de expressão e tornar-se um mecanismo direto ou indireto de censura prévia.

Para determinar outras responsabilidades, é necessário cumprir três requisitos, a saber:
  • 1) devem ser expressamente estabelecidas pela lei; 
  • 2) devem ser concebidas para proteger os direitos ou a reputação de terceiros, ou a proteção da segurança nacional, a ordem pública ou a saúde ou moral pública; e 
  • 3) devem ser necessárias em uma sociedade democrática. 
Liberdade de Pensamento e de Expressão: 
1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. 
2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei a ser necessária para assegurar: 
a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou 
b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral pública.
3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões

4. A lei pode submeter os espetáculos públicos à censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2º.

5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

A proteção à liberdade de expressão não é benéfica apenas a quem expressa determinada ideia, mas a toda coletividade, na medida em que ela promove o conhecimento e novas descobertas científicas, bem como a crítica política, e educa a população para tolerância com o diferente. 

A livre expressão do pensamento é uma liberdade positiva, visto que não se trata de algo permitido por mera ausência de proibição legal, mas sim proveniente de expressa permissão constitucional, sendo inclusive vedado ao Estado restringi-la. 

Por conta disso, é positivada na Constituição Federal como um direito fundamental. Embora não seja um direito em todo absoluto, visto que no direito positivo não existem direitos irrestritos, a livre manifestação do pensamento é um direito que só pode ser limitado pela própria Constituição, sendo este o seu âmbito de proteção. 

Deste modo, na realidade, não há conflitos entre a liberdade de expressão e outros direitos fundamentais, apenas conflitos aparentes, pois na medida em que um ato comunicativo viola outro direito fundamental, este ato não é protegido pelo direito à livre expressão. 


Eis o paradoxo: o conceito de "politicamente correto", veio justamente da tão por ele combatida doutrina religiosa


Este é um movimento que já se modificou bastante ao longo do tempo, visto que houve um tempo em que o que era considerado politicamente correto era o que estava de acordo com a doutrina religiosa. 

O próprio termo "politicamente correto" é equivocado, por partir de uma premissa falsa: a de que tudo é político. Essa ideia tem sido utilizada justamente para limitar o livre-arbítrio das pessoas, por meio de razões políticas, embora o que esteja sendo limitado não seja necessariamente de conteúdo político. 

De todo modo, o que se entende atualmente por politicamente correto atualmente é um movimento que visa extirpar preconceitos e promover justiça social, por meio da neutralização da linguagem e da restrição a expressões linguísticas desrespeitosas e discriminatórias. 

Este movimento, todavia, tem influenciado na atividade estatal de maneira desproporcional, como, por exemplo, com a recomendação do Conselho Nacional de Educação de que o livro "As Caçadas de Pedrinho" (Globinho, 159 páginas, 1933), de Monteiro Lobato (1882/1948), não fosse utilizado nas escolas por ter conteúdo supostamente racista. 

A interferência do politicamente correto tem se mostrado especialmente perigosa no poder judiciário, com o crescente ativismo judicial. O exemplo mais emblemático envolvendo a liberdade de expressão é o caso do escritor Siegfried Ellwanger, condenado pela prática de racismo por escrever um livro que questionava a veracidade do holocausto, mas que em nenhum momento incita o ódio a qualquer raça que seja. 

A interferência do politicamente correto na liberdade de expressão é na realidade uma violação do princípio constitucional da igualdade, vez que gera situações em que o Estado autoriza ou veda a manifestação de uma opinião em razão de seu conteúdo. 

Percebe-se que o politicamente correto não é uma questão de direito, mas uma questão de gosto pessoal. E a repressão de uma determinada opinião por mero desgosto configura censura por razões ideológicas, algo contrário ao próprio conceito de democracia e vedado pela Constituição Federal. 

A proteção à liberdade de expressão deve se estender até mesmo às opiniões que possam ser consideradas repulsivas pela maioria, ao passo que o discurso que incita o ódio e a violação de direitos deve ser punido pelo Estado. 

Por fim, ressalta-se que o politicamente correto é ineficaz no fim que se propõe, pois impedir a expressão de um determinado pensamento não extingue esse pensamento. O que extingue uma ideia não é o silêncio, mas justamenta a sua exposição, pois permite que seja desconstruída por meio da contraposição com outras ideias.

Conclusão


Como vimos, os debates sobre o politicamente correto remetem a discussões sobre as fronteiras da liberdade de expressão hoje. De um lado, estão os que apostam nessa tendência, entendida enquanto resultado da organização de minorias, como fenômeno que combate a discriminação a grupos marginalizados, atuando sobretudo no plano da linguagem. 

Do outro lado do debate, estão os que acreditam que o politicamente correto implica em formas de restrição da liberdade de expressão. Esse argumento passa pela ideia de que o politicamente correto tudo "vigia", consistindo em uma forma atualizada e internalizada de censura. 

Essas diferentes posições presentes no debate sobre o politicamente correto no Brasil convergem no ponto exato em que, em todos os casos, o que vemos é a defesa e colisão de direitos democráticos fundamentais. Nesse quadro, parece-nos claro que estamos diante de uma rearticulação dos saberes sobre a liberdade de expressão, com o reposicionamento de suas fronteiras no Brasil contemporâneo. 

É importante notar, pois, que as tensões entre o politicamente correto e os valores democráticos em nossa sociedade devem ser consideradas à luz dessas novas configurações dos discursos sobre a liberdade de expressão. A ordem que emerge nessas fronteiras entre discursos e valores diz respeito às regras que selecionam e organizam a produção discursiva. Nessa ordem do discurso politicamente correto, configuram-se rituais da palavra: a distribuição do 48 direito de dizer dentro de determinados campos discursivos. 

De fato, em plataformas consideradas como "exemplares" do uso da linguagem, como o dicionário (vide o caso Houaiss), o registro da existência de preconceitos que circulam na sociedade configura verdadeira palavra proibida. 

Ao final deste percurso, como pano de fundo das reflexões esboçadas, encontramos, como inquietação principal, a preocupação em refletir sobre a liberdade de expressão na atualidade, sobretudo no que diz respeito às suas áreas limítrofes e fronteiriças, onde se estabelecem choques entre diferentes discursos que circulam em nossa cultura, considerando a complexidade que a comunicação e as mídias adquirem na contemporaneidade. 

Trata-se de reafirmar a importância do princípio de liberdade, sem deixar de avaliar os limites que se colocam à expressão de ideias em nossa sociedade em face de outras demandas igualmente democráticas, como as relacionadas à proteção da honra e da imagem e ao combate à discriminação.

[Fonte: Repositório Intitucional UFSC, por Bruno de Oliveira Carreirão; ABPEducom, por Nara Lya Simões Caetano Cabral]

A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.
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