sábado, 30 de janeiro de 2021

LIVROS QUE EU LI — "DEUS NO BANCO DOS RÉUS", C. S. LEWIS

"Porque o Senhor é o nosso Juiz; o Senhor é o nosso legislador; o Senhor é o nosso rei, ele nos salvará. [...] Porquanto, todos nós deveremos comparecer diante do tribunal de Cristo, a fim de que cada um receba o que merece em retribuição pelas obras praticadas por meio do corpo, quer seja o bem, quer seja o mal" (Isaías 33:22; 2 Coríntios 5:10).
Nunca gostei de livros óbvios. Não que eu já não tenha lido alguns, claro, li sim, mas, não gosto. Prefiro sempre livros cuja leitura me confronte, me faça pensar, me faça questionar, me deixe aquela "pulguinha atrás da orelha" e me faça lê-lo outras vezes. 

Foi assim com mais um clássico do mestre C. S. Lewis, uma obra que já impacta no título. Quando o li, eu exercitei minha imaginação e fiquei pensando como seria se levássemos Deus ao tribunal. Heresia? De maneira alguma! Deus é o justo juiz e isso para mim está claro e indubitável. 

Sei que Ele é quem nos irá levar diante de seu tribunal. Como disse, apenas exercitei minha imaginação. E o veredito a que cheguei, obviamente, não poderia ser outro: Deus é inocente e toda a humanidade, culpada!

Sobre o autor


Clive Staples Lewis nasceu na Irlanda, em 1898. Em 1954, tornou-se professor de Literatura Medieval e Renascentista em Cambridge. Foi ateu durante muitos anos e se converteu em 1929. Essa experiência o ajudou a entender não somente a indiferença como também a indisposição de aceitar a religião. 

Suas obras são conhecidas por milhões de pessoas no mundo inteiro. "A Abolição do Homem", "Cartas de um Diabo a seu Aprendiz", "Cristianismo Puro e Simples" (escrevi artigo sobre este livro ➫ aqui)  e "Os quatro amores" são apenas alguns de seus bestsellers

Escreveu também livros de ficção científica, de crítica literária e para crianças. Entre estes estão "As Crônicas de Nárnia", sucesso mundial absoluto. C. S. Lewis morreu em 1963, em sua casa em Oxford.
"Lewis me dava a sensação de ser o homem mais convertido que já conheci"
observa Walter Hooper (1931/2020) — editor e conselheiro literário das obras de C. S. Lewis — no prefácio desta coletânea de ensaios. 
"Em sua perspectiva geral da vida, o natural e o sobrenatural pareciam ser indissoluvelmente unidos."
É precisamente esse cristianismo difundido que é demonstrado nos ensaios que compõem esta obra. Em "Deus no Banco dos Réus", Lewis se volta tanto para questões teológicas quanto para aquelas que Hooper chama de "semiteológicas" ou éticas com percepções e observações completa e profundamente cristãs. 

Valendo-se de diversas fontes, os ensaios foram projetados para atender a uma série de necessidades e ilustrar as diferentes formas como somos capazes de ver a religião cristã. Eles vão desde textos relativamente populares escritos para jornais até defesas mais eruditas da fé. 

Caracterizados pela honestidade e realismo de Lewis, sua percepção e convicção e, acima de tudo, seus compromissos firmes com o cristianismo, esses ensaios fazem de "Deus no Banco dos Réus" um livro único para o nosso tempo.

Sobre a obra


Publicado em 1970, sete anos após a morte de seu escritor, "Deus no Banco dos Réus" compila vários artigos e textos de Clive Staples Lewis ao longo de 24 anos. Organizado por Walter Hooper, antigo secretário de Lewis, o livro divide-se em quatro partes bem explicadas no prefácio: 
"A Parte I contém ensaios claramente teológicos; a Parte II contém ensaios que chamo de semiteológicos; e a Parte III inclui ensaios cujo tema básico é ética. A Parte IV é composta por cartas de Lewis organizadas na ordem cronológica em que foram publicadas."
Dito isso, o livro compõe-se basicamente dos temas mais abordados por Lewis em sua vida, inclusive os quais para alguns fez livros exclusivos como, por exemplo: "Ética para Viver Melhor" e "Cristianismo Puro e Simples".

Minhas considerações sobre o livro


Como disse no início, o livro não é nada óbvio. Nesse contexto, com 400 páginas, quatro partes, 48 capítulos e 12 cartas, "Deus no Banco dos Réus" entrega um pouco de tudo, desde entrevistas e conversas de Lewis até suas crenças no Deus Altíssimo. 

Além disso, réplicas a contestações de suas obras e opiniões diversas sobre o natal, pena de morte, questões sobre religião e ciência e até uma crítica a um nacionalismo exacerbado (tão presente e assustador nos dias de hoje) encontram-se igualmente presentes.

Por esse motivo, poucos são os capítulos com mais de vinte páginas, menos ainda aqueles os quais se estendem muito nos pensamentos complexos de Lewis. Tal característica não desfaz a bela forma pela qual o autor demonstra sua crença e sustenta seus conteúdos profundos e pertinentes. 

Pelo contrário, apenas tira o peso e o medo da obra ser exageradamente "difícil", tornando-a, mesmo sem ser óbvia, uma leitura leve e acessível para aqueles sem muito tempo os quais desejam ter belos momentos de aprendizado e fé enquanto conhecem um pouco mais o criador de Nárnia.

"Deus no Banco dos Réus" era, antes mesmo de terminar, um dos meus livros favoritos. Com uma diversidade única dos trabalhos do autor, não foram poucas as páginas grifadas e as reflexões tiradas desta obra tão rica em sabedoria a qual foi responsável por transformar C.S Lewis em um dos meus escritores preferidos, inclusive responsável por um conselho inesquecível sobre escrever no qual diz: 
"O caminho para se desenvolver um estilo é: (a) saber exatamente o que deseja dizer; e (b) ter certeza de que está dizendo exatamente isso".
Pertinente, instigante, diverso e sábio, esses são apenas alguns dos elogios possíveis a essa obra tão bela a qual consegue ao mesmo tempo, gerar bons aprendizados e homenagear o Deus a quem Lewis servia.

A contextualidade da obra


Diante da miséria humana, da dor e sofrimento no mundo, as constantes tragédias, as pragas, as doenças incuráveis... como também as catástrofes naturais, e o silencio absurdamente gritante de Deus, como sua ausência constante jamais interrompida, se Deus estivesse nos bancos dos réus, para ser julgado por toda humanidade, Deus seria declarado Culpado ou Inocente? 

Pelo que se vê, "Deus não existe". E mesmo que exista, parece ter esquecido da Terra e do ser humano, porque todo mundo está passando por maus bocados. Não há segurança, paz, amor, e a situação parece que só piora. O mal está vencendo! Se isso já passou por sua cabeça (verdade é que já passou pela cabeça de muitos, só que, muitos não têm a coragem de assumir tal pensamento) ou se é uma conclusão óbvia para você, leia este livro. Ele vai surpreendê-lo. 

O tribunal e seus atores


Deus, o diabo e os seres humanos estão envolvidos nesse grande julgamento! Isso afeta o presente e o futuro de cada um de nós. Como numa conversa pessoal, cheia de análises objetivas, raciocínios claros e embasados nas Escrituras Sagradas, o autor monta um quadro rico em detalhes para você tirar suas conclusões sobre Deus e o que está acontecendo no mundo. "Deus no Banco dos Réus" é um livro que vai cativar sua atenção do começo ao fim e fazer brilhar uma luz em sua mente, que nunca se apagará.

A teodicéia cristã 


Todos os povos criaram narrações da origem e significado do mundo. Geralmente com imagens e exemplos acessíveis às pessoas comuns. Nas grandes religiões multinacionais, este material foi sistematizado pelos sacerdotes e teólogos. C. S. Lewis apresenta  uma versão clara, lúcida e direta, calcada em trechos retirados das Escrituras e exemplos do cotidiano. 

Um empreendimento corajoso e não isento de riscos. Colocamos Deus no banco dos réus a cada vez que nos queixamos das aparentes injustiças que verificamos cotidianamente. Este processo chegou a um ponto que as pessoas se perguntam se Deus não deu as costas ao nosso mundo por desgosto, dando origem a um largo processo de ateísmo contemporâneo. 

Diante deste problema o autor retoma a Teodicéia Cristã, iniciando sua argumentação com o primeiro distúrbio da criação: a rebelião dos anjos e a introdução do Mal no Universo. E segue mapeando as intervenções divinas no sentido da Redenção. 

O risco embutido na minha analogia imaginária está ancorado na escolha da abordagem. A Justiça e o Direito fornecem as imagens, alegorias e argumentos, que nos levam diretamente ao mundo dos processos, dívidas, pagamentos, pendências e julgamentos. Sendo a justiça humana o que é atualmente — sentenças judiciais são compradas e advogados acobertam o crime organizado — a minha analogia, decerto fica prejudicada, já que a justiça de Deus não está passível de falhas (Apocalipse 20:11-15).

Porém, na obra de Lewis não há negociação: há uma escolha individual a ser cumprida na obra de Redenção e isto não é negociável. O autor ataca o problema de forma vigorosa, didática e veemente. A meu ver, seu maior mérito é retomar a exposição de uma velha questão de maneira clara e com um vocabulário contemporâneo, acessível a todos.

Conclusão


E ai, meu caro amigo leitor, conseguiu chegar a uma conclusão final? Qual das alternativas você escolhe? Deus, afinal de contas, partido sempre do ponto de vista humano — até porque, é o único ponto de vista que temos, pois não conhecemos e nem podemos imaginar-nos, olhando do ponto de vista de Deus — é culpado ou inocente?

"Deus no Bancos dos Réus" é uma obra que reúne ensaios, artigos, resenhas e entrevistas sobre temas relacionados ao cristianismo, teologia, moral e até mesmo algumas questões políticas e ideológicas. É uma obra bem interessante para quem gosta dos assuntos citados ou pretende conhecer mais o lado cristão do autor, que ficou conhecido por suas obras de fantasia. É um livro que nos faz refletir, por isso esta aqui nesse capítulo da serie especial de artigos Livros Que Eu Li e por isso eu o

Ficha Técnica

  • Título original: "God in the Dock: Essays on Theology and Ethics" (1ª Ed 2018)
  • Páginas: 416
  • Editora: Thomas Nelson

A Deus toda glória. 
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E nem 1% religioso. 
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