sábado, 2 de janeiro de 2021

ANO NOVO, VELHAS PROMESSAS

Conversando informalmente com uma velha amiga, me veio a inspiração para o texto deste artigo. O ano de 2020 sem dúvida, apesar de sua fácil e sugestiva paridade numérica, foi um ano paradoxalmente impar em todos os aspectos. A humanidade foi pega de surpresa no último ano da década passada. Foi um ano desafiador, surpreendente e que nos trouxe uma abrupta e imperdível oportunidade — quiçá, a única para a maioria de nós — de aprendizado e melhora como seres humanos. 

Entretanto, mesmo com um ano tão diferente, tão cheio de incertezas, algo foi exatamente igual aos anteriores em muitos aspectos. Na virada do ano, lá vêm aquelas tradicionais promessas que muitos fazem e que a maioria nunca cumpre. O fato é que sempre queremos melhorar nossa vida em diversos aspectos, e, consequentemente, acabamos fazendo as famosas promessas ou repromessas de começo de ano. Por exemplo, quem de nós nunca, ao menos uma vez, fez aquela listinha de promessas e levamos para o culto da virada, que atire a primeira pedra ou se cale para sempre. O objeto da promessa é livre, mas não vale prometer o inexequível.

Roda viva


Qual é sua lista de resoluções para 2021? Uma rápida passada pelo Google, um bate-papo casual com amigos (como o que eu tive com minha amiga) ou a leitura dos principais jornais lhe darão boas sugestões. É verdade que você não pode esperar muita originalidade dessas fontes; afinal, parece que a maioria de nós deseja as mesmas coisas: emagrecer, gastar mais tempo com a família, praticar atividades físicas, abandonar um vício, controlar as finanças, viajar, estudar, mudar de emprego, dar mais atenção aos amigos, ter mais carinho com a família, abandonar aquele amor que parece impossível, começar a investir na carreira dos sonhos, começar a estudar inglês (ou algum outro idioma) pra valer... Enfim, uma lista infindável que muitos de nós conhecemos. Razões não faltam para as mais diversas promessas.

O fim de um ciclo marcado pelo calendário ou ano civil traz a muitas pessoas a esperança de mudanças ou melhoras. Os cristãos costumam acrescentar a essa lista o desenvolvimento das disciplinas espirituais, como leitura da Bíblia, oração, compromisso com o exercício ministerial, maior frequência às reuniões de cultos congregacionais e o culto familiar. Porém, se você quer ter sucesso nas metas para o ano novo é preciso prestar atenção a uma lição simples e eficaz da natureza: bons frutos são o resultado de raízes saudáveis.

Isso é tão verdade que as resoluções tomadas sob o encanto dos fogos de artifício costumam durar pouco tempo. Essas promessas surgem pela mesma lógica que estimula as pessoas a começarem uma dieta na segunda-feira. Para muitos, essa hora da virada é o momento que poderão se organizar para estabelecer a mudança, renovar seus sentimentos, aumentar sua disposição em cumprir as metas estabelecidas, retomar propósitos ou criar novos e mesmo abandonar o que avaliam que não foi bom no ano que termina. Richard Wiseman, renomado psicólogo britânico, realizou uma pesquisa em 2007 e mostrou que pouco mais de 10% das pessoas cumprem suas promessas de fim de ano ("Quirkology: The Curious Science Of Everyday Lives", 2007, sem tradução no Brasil).

"Adeus ano velho, feliz ano novo" (Será?)


Existem muitas razões para isso. Uma delas pode ser nossa crença infantil na cantiga "adeus ano velho, feliz ano novo!" Não me entenda mal, eu também me encanto com as celebrações de fim de ano. Porém, à parte da festa do Ano-Novo (aqui sim, com hífen e maiúsculas), esse "mantra" comunica um conceito equivocado: que o velho seja ruim, incompleto e descartável, enquanto o novo é desejável. É como se o "novo" mudasse tudo simplesmente por ser novo. Será? 

Na realidade, ano novo significa a continuidade da vida, da velha vida. Para que isso seja diferente, é preciso haver mudança no nível das raízes. Só então poderemos experimentar vida renovada. Sorte, acaso ou destino têm pouco ou nada que ver com sucesso ou fracasso no ano novo.

Outro fenômeno que desponta nesta época, sobretudo na mídia, são os denominados "gurus" (nos círculo evangélicos substitua-se por "profetas") das mais variadas denominações, formações e integridades. Pessoas que fazem previsões, apontam metas e dão respostas simples e mágicas para entender tudo e responder tudo. 

Muitos exploram o desespero das pessoas que querem soluções rápidas, mágicas e certamente positivas. Basta estarmos atentos às TVs, sobretudo no dia 31 de dezembro, para percebermos o aumento das consultas aos búzios, cartas, oráculos, crescimento nas vendas de livros de autoajuda etc. Isso sem contar os desejos feitos nessas datas que, presos às diversas simpatias, fazem desabrochar as esperanças, pelo menos, nas primeiras semanas do ano e, para muitos murcham logo depois.

A esperança é mesmo a última que morre?


O que leva as muitas promessas ao fracasso? Promessas em vão? Comprometemo-nos e não cumprimos, porque somos fracos, sem força de vontade, frágeis seres à mercê de hábitos mais fortes, vítimas de nós mesmos, de nossa estrutura de pessoa, de um passado que nos condena? Devemos, então, deixar de lado nossos planos e promessas de ano novo e continuar a fazer do mesmo jeito, ou permanecer na passividade de quem espera o trem, parado com sua mala na estação? Não devemos fazer nada de diferente e ficar esperando que as coisas mudem de direção por si mesmas?

Esperança é ter convicção da realidade de algo que se espera. Esperança significa "confiança", "expectativa" ou "perspectiva". Na Bíblia a palavra "esperança" traduz vários termos hebraicos e gregos que transmitem exatamente esse sentido de confiança.

O objeto da esperança de alguém está relacionado aos seus próprios desejos (Provérbios 13:12). Por isso na Bíblia lemos sobre pessoas que tiveram esperança de obter matrimônio, lucro, livramento físico etc. (Rute 1:2; Atos 16:19; 27:20). Para uma maior análise e entendimento da esperança, vamos avaliá-la por áreas.

Esperança humana


A esperança tem seu enraizamento antropológico e é vivenciada como experiência de base da existência humana, pessoal, comunitária e coletiva. A esperança emerge, antes de tudo, como o dinamismo da vida. O enraizamento profundo da esperança no próprio elã vital inconsciente ou pré-consciente dá ao ser humano uma força e uma significação muito especiais. Ela é vivida antes de ser conhecida. Nutrir e reforçar a esperança é, antes de mais nada, oferecer bases e condições concretas de viver.

Em sua realização propriamente humana, a esperança vem ao encontro da pessoa que é um feixe vivo de desejos e projetos. Seu ponto mesmo de inserção é o ser humano, como capacidade de êxito e fracasso. O indivíduo, o casal, a família, a sociedade em todas as suas formas, são regidos por esta lei absoluta e imanente. Tudo e todos aspiram pelo êxito e têm horror ao fracasso. Esta lei se estende, simultânea e conjuntamente, ao plano inconsciente, pré-consciente e consciente.

É verdade que, no horizonte da esperança, há incertezas e temores, mas é verdade também que, no horizonte da esperança, há o ousar, a aventura. E também, como afirma o filósofo francês Emmanuel Mounier (1905/1950): 
"Um homem sem esperança reinventa sempre qualquer esperança”. Gabriel Marcel ressaltava que quem vive a vida como uma rotina é “um desesperado que nem mesmo sabe que é desesperado".
 A esperança precisa ser vista no contexto da vida humana total. 
"Onde há vida, há esperança"
diz o adágio popular! A esperança é, porém, para muitos, a força fundamental e primária que estimula e impulsiona toda atividade humana. Outro filósofo e psicanalista, o alemão Erich Fromm (1900/1980) comparou a esperança ao salto do tigre em direção ao seu objetivo. 

Esperar, pois, é um estado do ser, uma capacidade inata de sonhar e realizar o sonho. A esperança de ser feliz é a tendência fundamental do agir humano que o faz ser mais, abrir-se ao próximo, superar o egoísmo e a avidez.

O significado de esperança na Bíblia


Quando se fala sobre o que é esperança e qual o seu significado na Bíblia, normalmente procura-se saber sobre seu uso teológico. Nesse sentido, essa palavra basicamente se refere a uma confiança no sobrenatural.

É claro que na maioria dos textos bíblicos em que isso ocorre essa confiança é direcionada a Deus, indicando uma convicção em sua bênção e provisão, tanto na vida presente como na vida porvir. Existem muitas passagens bíblicas que trazem esse conceito (ex. Esdras 10:2; Jó 11:18,20; Salmo 33:18,19; 71:4,5; Zacarias 9:12).

Esse tipo de aplicação pode ser visto claramente nas palavras do salmista. Ele diz: 
"Espero no Senhor com todo o meu ser, e na sua palavra ponho a minha esperança" (Sl 130:5). 
Depois dessa declaração pessoal, ele aconselha: 
"Ponha a sua esperança no Senhor, ó Israel, pois no Senhor há amor leal e plena redenção" (130:7).

A esperança cristã e um futuro melhor

"Amarás ao Senhor teu Deus de todo o coração, de toda a alma e de todo o entendimento" (Mateus 22:37Lucas 10:27). 
Este mandamento convida o homem a crer em Deus, a esperar nEle e a amá-Lo acima de tudo. O homem tem o dever de cultuar e adorar ao Senhor, tanto individualmente quanto em sociedade, portanto, a superstição é um desvio do culto que rendemos ao verdadeiro Deus, demonstrando-se na idolatria, na adivinhação e na magia.

A Bíblia diz que é muito feliz aquele cuja esperança está no Senhor (Sl 146:5). O profeta Jeremias concorda com o salmista, e diz que a pessoa que deposita sua confiança no Senhor é como uma árvore plantada junto às águas. Essa pessoa não ficará ansiosa diante das circunstâncias da vida (17:7,8).

O conceito de esperança permeia todo o Novo Testamento. Nele aprendemos que a esperança do cristão é Cristo (1 Timóteo 1:1). Essa esperança reside em nosso Deus, e assim Ele é chamado de "o Deus da esperança" (Romanos 15:13; 1 Pedro 1:21). Deus elegeu para Si um povo ainda na eternidade, e no tempo oportuno lhe deu esperança através do Evangelho (Colossenses 1:23; cf. Filipenses 1:20; Efésios 1:18).

A esperança cristã é vivida na oração, na virtude da paciência e na prática do amor. O agir cristão é todo esperança, pois busca o fim último do homem em Deus. Esperar, para o cristão, nunca foi um acomodar-se. A esperança cristã possui um caráter de confiança em Deus que inclui um desejo e uma tendência em direção ao futuro. A experiência momentânea não pode ser o único fundamento de uma teologia cristã da esperança.

Toda esperança se apoia na convicção de que é possível alcançar o objeto esperado. Na esperança humana, o fundamento dessa convicção são as forças humanas e a crença na bondade fundamental dos seres. No homem religioso, isso se transforma na crença numa providência divina, em um Deus que se revelou como Pai e quer o bem de seus filhos. O cristão não busca respostas ou iluminações em objetos, superstições ou falsos "gurus", mas é na Palavra de Deus que encontra luz para o futuro e forças para caminhar.

Iluminar corações e mentes com a Boa Notícia da Salvação (as Boas Novas do Evangelho da Paz) é essencial para que todos possam compreender que a esperança humana — os anseios mais profundos do homem — se realizam, de modo definitivo, na esperança cristã.

A comunidade cristã pode, finalmente, dar sentido às cruzes e aos sofrimentos do homem contemporâneo, pois ela própria sabe que sua esperança repousa na cruz e na ressurreição do seu Senhor. Sem grandes ilusões, mas também sem pessimismo exagerado e sem desespero, enfrentemos cada ano novo como quem crê nos bons e quem não tem medo dos maus. Que cada ano novo nos encontre como encontrou os outros cristãos desde o ano primeiro da nossa era. Esperando dias melhores e fazendo os dias melhores.

Cristo em nós, a esperança da glória!


A esperança do fiel, portanto, aponta para a consumação final de todas as coisas. Os cristãos esperam pela alegria incalculável de estar com Cristo na glória por toda eternidade. Nesse dia eles poderão desfrutar de sua salvação em seu cumprimento mais pleno, com seus corpos glorificados (At 23:6; Rm 8:18-25). Já no presente essa esperança da glória é confirmada e garantida com a habitação de Cristo no salvo através do Espírito Santo (Cl 1:27).

Por isso a esperança está diretamente ligada à fé. O escritor de Hebreus escreve que a fé é 
"...a certeza das coisas que se esperam..." (11:1). 
Depois, o mesmo escritor diz que a esperança do crente é 
"...âncora da alma, firme e segura por causa da obra redentora de Cristo, nosso Sumo Sacerdote" (6:19).

Os efeitos da verdadeira esperança


Certamente faz parte da vida cristã os sofrimentos e as aflições (2 Co 4:7-18). Mas quando a aflição alcança o cristão, ela produz a paciência, e a paciência, a esperança (Rm 5:3-5; 8:25). Por causa dessa esperança os redimidos vivem como peregrinos neste mundo a caminho do lar celestial (Hb 11:13; 1 Pd 2:11). Eles estão sempre prontos a deixar esta terra a qualquer momento (2 Co 5:6-8; Fp 1:21-24).

Mas enquanto esse dia glorioso não vem, essa confiança verdadeira leva o crente à santificação pessoal (1 João 3:1-3). O cristão nunca deve ter dúvida de sua esperança. Antes, ele deve estar preparado para responder a qualquer um que lhe pedir a razão da esperança que há nele (1 Pd 3:15).

Essa esperança faz o crente viver sua vida sem desespero (1 Jo 4:18). Ela o leva a suportar as tribulações, a combater o bom combate e a completar a carreira, aguardando o aparecimento glorioso de seu Deus e Salvador, Jesus Cristo (2 Tm 4:7,8; Tito 2:12,13).

A importância das raízes para as promessas do ano nascituro


Voltando à questão das raízes, o livro bíblico dos Salmos, que tem servido de guia espiritual para milhões de pessoas há milhares de anos, não sem razão traz em sua primeira poesia esse ensino da natureza. Segundo o texto bíblico, a pessoa espiritualmente renovada é 
"...como árvore plantada à beira de águas correntes: Dá fruto no tempo certo e suas folhas não murcham. Tudo o que ele faz prospera!" (Sl 1:3).
Em outras palavras, as metas e resoluções dessa pessoa terão êxito. A verdade é que na espiritualidade, podemos até simular a aparência de fruta, mas apenas uma árvore com raízes saudáveis pode produzir frutas saudáveis.

Resoluções de ano novo são importantes. Porém, mais importante é realizar e colher os resultados positivos das metas estabelecidas. Para isso, é preciso concentrar forças no que realmente produzirá os resultados que desejamos. 

Nessa direção, sugiro que você tome uma lista bíblica, que contempla valores relacionados ao nível das raízes da espiritualidade. Os leitores da Bíblia conhecem essa lista como "o fruto do Espírito": amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio (Gálatas 5:22, 23).

Vejo nessa lista de valores bíblicos as "raízes" para os desejos mais comuns de ano novo (veja o quadro abaixo). Por isso, creio que precisamos nos concentrar em desenvolver raízes saudáveis, a fim de que os frutos desejados venham naturalmente. 

Essa renovação espiritual começa no comprometimento sem reservas com Deus, se reflete na presença diária do Espírito na vida e resulta no desenvolvimento de um caráter semelhante ao de Jesus.

Conclusão


Com tudo isso, afirmo que não é um mal fazer promessas no início do ano, assumir propósitos, estabelecer metas, fazer projetos. É próprio do ser humano a esperança, o estabelecer projetos. O problema está no uso dos meios errados, falsos, ilusórios e mesmo de superstições como formas de conhecer o futuro e criar projetos. A superstição, crença ou prática, que geralmente se considera irracional ou resultado da ignorância e do medo do desconhecido, implica em crença nas forças invisíveis sobre as quais acredita ser possível influir.

Quem deseja colher melhores frutos em 2021 precisa se concentrar primeiramente nas sementes que semeia, que são quem irão criar as raízes e o restante será consequência. Se a mudança não ocorrer nesse nível, o ano velho continuará conosco e o ano novo não começará no dia 1º de janeiro. Reflita sobre isso.

[Fonte: Estilo Adoração, por Daniel Conegero, escritor, professor de teologia e pregador da Palavra de Deus. Daniel é formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie; Canção Nova]

A Deus toda glória. 
Fique sempre atualizado! Acompanhe todas as postagens do nosso blog https://conexaogeral2015.blogspot.com.br/. Temos atualização diária dos mais variados assuntos sempre com um comprometimento cristão, porém sem religiosidade. 
E nem 1% religioso. 
O uso correto da máscara não precisava ser obrigatório, por se tratar de uma proteção individual extensiva ao coletivo. É tudo uma questão não de obrigação, mas de consciência.
Respeite a etiqueta e o distanciamento sociais e evite aglomerações. A pandemia não passou, a guerra não acabou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário