Quando nos debruçamos no estudo da consciência, acabamos por ver um grande problema que já perpassa toda história da filosofia, relativo a não univocidade do conceito de consciência. Nas palavras iniciais de Searle [John Rogers Searle, filósofo analítico e escritor norte-americano, professor da Universidade de Berkeley, na Califórnia, Estados Unidos.] vemos um conceito simples de se definir, a saber, a consciência é o conjunto de estados subjetivos de sensibilidade (sentience) ou ciência (awareness), que se iniciam quando uma pessoa acorda na parte da manha, e que se estendem ao longo do dia. Ou seja, em resumo de conceptualizações filosóficas e também psicológicas, a consciência é a percepção imediata do sujeito daquilo que se passa, dentro ou fora dele.
A consciência pode definir-se como o conhecimento que o Homem possui dos seus próprios pensamentos, sentimentos e atos. Podem-se distinguir dois tipos de consciência, a consciência imediata e a refletida. A consciência imediata ou espontânea caracteriza-se por ser a que remete para a existência do Homem perante si mesmo, no momento em que pensa ou age. A consciência refletida ou secundária é a capacidade do Homem recuar perante os seus pensamentos, julgá-los e analisá-los.
Consciência negra ou humana?
A história do Brasil é marcada por quase quatro séculos de escravidão da população africana e afro-brasileira, porém, apesar da abolição da escravatura (13 de maio de 1888), não houve a ruptura do formato "dominante x dominado". Os ex-escravizados foram jogados à margem da sociedade sem reparação pelos séculos de violência.
Angela Davis, filósofa e ativista afro-americana, explica
"Nós proclamamos a abolição da escravidão pensando que os impactos econômicos, culturais e sociais da escravidão fossem desaparecer automaticamente".Com o desenvolvimento da lógica capitalista, a elite, outrora senhores de escravos, continuou intacta e usou o racismo como elemento estruturante das divisões de classe, concentração de renda, superexploração do trabalho, além de estabelecer mecanismos repressivos contra os dominados.
Isto é, foram empreendidos processos muito bem articulados para o estabelecimento do racismo estrutural e a permanência do status quo. Nesse sentido, o racismo é configurado no estabelecimento do fosso entre negros e brancos, onde somente os últimos encontram-se numa posição privilegiada e condenam a sobrevivência dos que estão no degrau inferior de qualquer hierarquização no sistema político-econômico.
No Brasil, o mês de novembro é tradicionalmente dedicado à consciência negra. A data se refere à morte do líder de quilombo Zumbi dos Palmares, ocorrida em 20 de novembro de 1695, símbolo de resistência negra na história do país. Embora criticada por muitos que, em vez, defendem um "Dia da Consciência Humana" já que somos todos humanos e iguais, ainda há muito o que se falar em "Dia da Consciência Negra" em um país onde a humanidade não é ofertada igualmente a todos.
Paleta de cores e raças
Iguais, porém, diferentes
A Constituição Federal de 1988 dispõe em seu artigo 5º, caput, sobre o princípio constitucional da igualdade, perante a lei, nos seguintes termos:
- Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.
Conclui-se, portanto, que o princípio constitucional da igualdade, exposto no artigo 5º, da Constituição Federal, traduz-se em norma de eficácia plena, cuja exigência de indefectível cumprimento independe de qualquer norma regulamentadora, assegurando a todos, indistintamente, independentemente de raça, cor, sexo, classe social, situação econômica, orientação sexual, convicções políticas e religiosas, igual tratamento perante a lei, mas, também e principalmente, igualdade material ou substancial.
O artigo 5º, caput, da Constituição Federal assegura mais do que uma igualdade formal perante a lei, mas, uma igualdade material que se baseia em determinados fatores.
Somos diferentes, porque somos diversos. E não só no tom de pele ou na textura do cabelo; nossa cultura, nossa história, nossa ancestralidade são diferentes daquilo que sempre foi considerado norma de civilidade neste país: a branquitude e seu legado colonial europeu. Nosso apelo por igualdade deve ser compreendido como uma afirmação de respeito e inclusão de nossas diferenças. Hoje precisamos ter um mês de consciência negra para que elas não sejam mais usadas como fator de discriminação.
"Somos todos iguais" pero no mucho
Somos diferentes e isso é maravilhoso. Quando vazio, o discurso do "somos todos iguais" também é perigoso porque camufla o desejo de se apagar as diferenças em nome de um ideal hegemônico. Nesse caso, o que há no contexto social é uma pretensa igualdade que vai silenciosamente eliminando o diferente e negando as diversidades.
O poeta inglês do século 18, William Cowpern (✩1731/✞1800), já dizia que
"a variedade é o tempero da vida e o que dá a ela seu mais verdadeiro sabor".Eu reafirmo: nossas diferenças e diversidade é o que dá vida e sabor à democracia.
Dia da Consciência Negra, mais do que uma data, é tempo forte de reflexão sobre os males sociais resultantes do pós 13 de maio de 1888, quando, em uma abolição que indenizou os senhores de escravos e deu apoio aos imigrantes europeus que substituíram o povo negro no trabalho, o Estado nada fez para dar aos ex-escravos condições de ascensão social, antes os abandonou à própria sorte.
No Brasil, atos de racismo são presentes no dia a dia de muitos negros e afro-brasileiros, todavia, sob os mantos do negacionismo e silencionismo, o assunto ainda é muito ausente das discussões cotidianas. Aqui não vivemos conflitos segregacionistas abertos como os que ocorrem nos Estados Unidos, contudo, dados apresentados pelo IBGE apontam que três em cada quatro pessoas que estão na parcela dos 10% mais pobres do país são negras. Além de fulgurarem na ponta de tal estatística que revela a cor da pobreza nacional, pessoas negras também encabeçam estatísticas das vítimas de homicídios.
"O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons" (Martin Luther King).
Aqueles que pedem o silêncio ao debate da questão racial, o fazem exatamente por não perceber que o racismo não os afeta. Ledo engano. O racismo atinge a todos, negros e não negros, atores de Hollywood e de qualquer outro lugar. Porque racismo não é apenas xingar alguém de macaco (e assim retirar a humanidade da pessoa) ou "preto preguiçoso". Mais do que isso, racismo é um sistema estrutural de opressão, que favorece quem o pratica e empobrece quem o sofre.
Nos últimos 40 anos, tivemos avanços significativos da população negra em relação a alguns aspectos, como: acesso, permanência e sucesso na trajetória escolar tanto na educação básica quanto na superior; acesso ao mundo do trabalho, reconfigurando os lugares socialmente estabelecidos para a população negra; avanços significativos na política pública na área da saúde e assistências. Contudo, o fato é que há muito o que se fazer, sem vitimismo, sem usar a questão como pauta ideológica, mas, sim, encarar o problema de frente e com determinação, ação e reação, continuar lutando para que essa balança de pesos e valores tão desiguais se equilibre no bom senso.
Conclusão
Nossa luta deve ser pela coletividade e contra o racismo invisível, institucional e estrutural que mina o país e destrói vidas negras. Enquanto ainda existir gente achando normal uma morte negra ou anormal e espantoso um negro em um lugar de destaque na sociedade como juízes, médicos, cientistas, professores..., isso é um claro sinal de que ainda temos, sim, que conversar sobre o racismo e em todas instâncias.
E não apenas no mês de novembro. Por conta disso, em nosso meio, vergonhosamente, ainda se manifestam expressões tipo: "[você é um(a)] negro(a) de alma branca", "negro(a) da cor do pecado", "negros batalhões", "urubu", "chipanzé", "macaco", "veja se não vai fazer um serviço de preto, hein?", "o preto, quando não caga na entrada, caga na saída", "apesar de negro(a) é inteligente/bonito(a)", dentre outras tão desprezíveis e estúpidas quanto.
O caminho é longo. Que Deus nos ajude a trilharmos por ele pautados no enfrentamento, justiça, confissão, perdão, cura e restauração.
[Fonte: TJDFT, por Noemia Colonna dos Santos, técnico judiciário do TJDFT, participante do curso Promoção da Igualdade Racial no Judiciário realizado pelo Projeto Justiça Comunitária, edição 2018; Expositor Cristão, por Sara de Paula]
A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.
O uso correto da máscara não precisava ser obrigatório, por se tratar de uma proteção individual extensiva ao coletivo. É tudo uma questão não de obrigação, mas de consciência.
Respeite a etiqueta e o distanciamento sociais e evite aglomerações. A pandemia não passou, a guerra não acabou.
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