quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

ACONTECIMENTOS — A TRAGÉDIA DA VILA BARRAGINHA (CONTAGEM/MG)

Início de uma tarde do dia 18 de março de 1992 de repente um estouro, um barulho horrível, diferente, parecia que o mundo estava acabando. Uma avalanche de terra veio arrastando casas, pessoas, animais e tudo mais que tinha pela frente.

O barulho ensurdecedor não conseguia abafar os gritos de pânicos, os choros, os pedidos de socorro. De uma hora para outra sumiu tudo, só ficou aquele monte de terra, de entulhos, um enorme cemitério a céu aberto.

Uma história que não acabou


Há 28 anos o município de Contagem, a 19,5 km da capital mineira, Belo Horizonte, protagonizava uma das maiores tragédias em sua história. O município da região metropolitana, que, de acordo com dados do IBGE, atualmente conta com um número de 659.070 (segundo estimativas de 2018) habitantes, é um dos que tem o maior PIB per capita e arrecadação de impostos, devido às muitas indústrias, empresas dos mais variados setores e uma extensa área comercial, é onde está localizado a Vila Barraginha.

A área, ocupada por famílias de baixa renda, tinha sido um lixão, além de abrigar uma antiga e pequena barragem artificial que supria as indústrias do local. Não bastasse, o seu subsolo é argiloso, instável. O deslizamento de terras da Vila Barraginha, matou 37 pessoas, deixou 300 feridos e mais de 1.700 desabrigados. 

Cenas de um filme de terror na vida real


Muito barulho e ventania anunciavam uma avalanche de terra que provocaria a morte de 36 pessoas, deixaria centenas de feridos e desabrigados e soterraria 150 barracos e casas na Vila Barraginha, no bairro Industrial. A ocupação teve início nos anos 1940, quando dezenas de famílias instalaram-se sob um antigo depósito de lixo, construído sobre um solo argiloso.

Após um período com excesso de chuva, uma movimentação de terra prejudicou a estabilidade da bacia de argila mole sobre a qual as casas estavam assentadas, ocasionando a movimentação do aterro. O local foi alvo de um deslizamento de aterro de 15 metros de altura por 100 metros de extensão.
"Eu cheguei lá com mais quatro companheiros para atender a uma ocorrência de desabamento de uma residência. Eram 13h15.  
Quando desci do carro pude constatar a dimensão da tragédia. Logo um menino veio me puxando pela calça e apontando para a mistura de terra e lama onde a mãe e o pai dele estariam. 
Pelo rádio comuniquei a tragédia ao meu superior. Umas pessoas se ofereceram como voluntárias, eu as dividi em quatro grupos, com um bombeiro em cada um deles e começamos a cavar".
O relato impressionante é do oficial reformado do Corpo de Bombeiros Gildásio Andrade, que à época era um jovem soldado de 26 anos.
"Fui cavando com as próprias mãos e tirando as pessoas, nem sei quantas salvei. Retirava uma pessoa e chorava, e voltava e retirava outra. Tirei muitos corpos também. A casa de uma senhora, uma das poucas que ficou de pé, se transformou num necrotério."
Gildásio e os companheiros ficaram até à noite no trabalho de resgate: 
"...não dá vontade de se alimentar, de parar, nada". 
Para ele, o que mais marcou foi o resgate dos corpos de uma mãe e seu bebezinho: 
"Ela estava abraçada a ele, todo curvada tentando protege-lo. Essa imagem não sai da gente". 
Naquela época, o município ainda não contava com a atuação de uma Defesa Civil estruturada, situação muito diferente da que é encontrada hoje. 

Atualmente, a Defesa Civil de Contagem dispõe de uma Central de Atendimento que funciona 24 horas (Telefone 199) e que realiza monitoramentos para evitar riscos de desabamento de moradias em áreas de aterro. A prevenção é palavra-chave do trabalho atual da Defesa Civil do município.

Resistência heroica


Nair Rodrigues Ferreira, que há 55 anos mora na Vila Barraginha, foi quem teve a casa transformada em necrotério é quem conta:
"Eu estava fazendo uma feijoada e corri para ver o que era, vi aquele mundo de terra carregando os barracos, as pessoas, os animais,vindo em minha direção e parou pertinho da minha porta. 
Sumiu tudo, só ficou aquele monte de terra, de entulhos... Minha casa se transformou num necrotério. A gente ficava torcendo junto com os bombeiros para que as pessoas soterradas ainda estivessem vivas", 
conta.

Quanto à dona Nair, Gildásio disse que ela foi fundamental no trabalho de socorro e salvamento: 
"ela apontava direitinho onde existia uma casa, onde deveria estar alguém e a gente cavava".
Estes são apenas dois dos muitos personagens que participaram daquela terrível tragédia, uma das maiores ocorridas em Minas Gerais. 

Conclusão


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Hoje os moradores da Vila Barraginha vivem com um pouco mais de dignidade, com a construção de 18 blocos de apartamentos com 103 unidades de dois quartos (49 metros quadrados) e 23 com três quartos. Para a construção dos apartamentos, foram investidos mais de R$ 12 milhões de recursos provenientes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por meio de convênio firmado entre a prefeitura e o governo federal. 
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No total, 567 famílias da Vila Barraginha foram beneficiadas com as moradias. A construção das 442 unidades restantes estão inseridas em novas etapas, hoje em fase final de projeto. Já o local da tragédia deu lugar a um parque linear com área de lazer e preservação, pois o solo não é propício para outras construções.

Contudo, por mais que se tente amenizar, jamais será possível curar a dor de quem perdeu parentes e amigos e 28 anos depois, a área, que continua sendo um local de risco, ainda é ocupada por centenas de famílias que esperam ter condições de ir para uma região melhor.

A Deus, toda glória.
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