quarta-feira, 13 de julho de 2016

ACONTECIMENTOS - O INCÊNDIO NO EDIFÍCIO JOELMA EM SÃO PAULO


São Paulo, 01 de fevereiro de 1974. A abafada sexta-feira que apenas estava começando dava sinais de que seria apenas mais um dia na agitada capital paulista, mas às 08h:54min daquela manhã um curto-circuito iria transformar a rotina da cidade e de centenas de pessoas por completo. 

Endereço do terror 

"O Crime do Poço" 


O endereço do Joelma já tinha sido palco de um triste acontecimento no ano de 1948, quando um engenheiro químico decidiu acabar com a vida da mãe e de suas irmãs no caso que ficou conhecido como "O Crime do Poço". 

Dia 23 de novembro de 1948, depois de várias denúncias do estranho desaparecimento das mulheres em uma casa da Rua Santo Antonio, nº 104 (ao lado), região central de São Paulo, o químico e professor Paulo Ferreira de Camargo, com 25 anos de idade, suicida-se no exato momento em que a policia retirava do poço do seu quintal os corpos de sua mãe, Benedita de Camargo, com 56 anos de idade, e de suas duas irmãs, Maria Ferreira de Camargo, 23 anos e Cordélia Ferreira de Camargo, 19 anos, pessoas que ele havia matado há 19 dias. 

"O Crime do Poço" como ficou conhecido, foi uma vingança de Paulo contra sua família que não aceitava seu romance com uma enfermeira, a qual não era mais virgem, indo totalmente contra os padrões da época, sendo um completo escândalo para a sociedade da década de 1940. Paulo Ferreira enfrentava constantes brigas com sua mãe e irmãs, as quais eram totalmente contra seu namoro com a enfermeira. 

Irritado ao extremo, arquitetou o modo como resolveria aquilo. Mandou então que fosse construído um poço nos fundos da casa, já como parte do seu plano. No dia 23 de novembro de 1948, Paulo se reunião com sua família para lancharem, como normalmente faziam. De modo furtivo, Paulo colocou sonífero no alimento de sua mãe e irmãs. Drogadas, elas dormiram rapidamente. Em seguida Paulo pega um revólver e efetua vários disparos contra todas elas, que morrem na hora. 

Após o assassinato, Paulo coloca capuzes nas cabeças da vítimas, arrasta os corpos para os fundos da casa, e os joga no poço recém construído. Nos dias que se seguem, Paulo leva uma vida normal. Passados alguns dias, as pessoas estranham o desaparecimento das três mulheres. A polícia então visita a casa de Paulo, o qual entra em contradição, dizendo ora que sua mãe e irmãs viajaram, ora que sofreram um acidente. 

Vizinhos então contam à polícia que alguns dias antes ouviram barulho de tiros e uma estranha movimentação nos fundos da casa, próximo ao novo poço. Quando a polícia vai verificar o local, acaba encontrado a horrível cena do crime, com os corpos dentro do poço. 

Vendo que não havia mais saída, Paulo Ferreira pede para ir ao banheiro. Chegando lá, pega o revólver que havia escondido nesse local, e comete suicídio com um tiro no peito, deixando para sempre dúvidas e suposições das mais absurdas. 

Paulo Ferreira de Camargo era Professor do Departamento de Química da Universidade de são Paulo, a qual se localizava naquela época na alameda Glette. Uma carreira brilhante, interrompida estupidamente. Descobriu-se posteriormente que o Professor Paulo Ferreira fazia uso de drogas, isso talvez devido ao fácil acesso aos produtos químicos em sua profissão. 

Também foi revelado por companheiros de onde lecionava, que o Professor Paulo Ferreira já apresentava à algum tempo um comportamento desequilibrado, pois andava armado, e segundo constatado, havia efetuado disparos com seu revolver no interior do laboratório de química da faculdade. 

Observa-se que após a retirada dos corpos das vítimas de dentro do poço, um dos bombeiros morreu de infecção cadavérica, sugerindo ser mais uma vítima da "maldição" contida no local [Infecção Cadavérica: É um tipo de infecção adquirida quando uma pessoa sem as devidas proteções, não utilizando luvas e máscara apropriada, realiza contato com cadáveres, adquirindo dessa forma infecções diversas pelo corpo, podendo levar em alguns casos até a morte.]

A casa onde ocorreu o crime ficou fechada por muitos anos. 
Mais tarde foi demolida e no seu terreno foi construído o Edifício Joelma, um novo e imponente arranha-céu, objeto de tão triste memória. 

Edifício Joelma, um monumento à irresponsabilidade 


Um dos grandes colossos de concreto do centro de São Paulo, o Edifício Joelma ainda era um jovem perto da maioria de seus vizinhos, erguidos décadas antes mas desde sua inauguração, em 1971, chamava a atenção pelas suas linhas modernas e pela sua altura imponente, com 25 andares. Tão logo foi inaugurado, o prédio foi alugado para o Banco Crefisul. 

O terror em chamas 


O fatídico curto-circuito não poderia ter acontecido em andar pior, no décimo segundo pavimento, justamente o meio do edifício. Para piorar, as salas do edifício eram repletas de materiais que colaboravam com a propagação do fogo, como divisórias, carpetes, cortinas e móveis de madeira, além dos forros que eram de fibra. 

Poucos minutos após o incêndio ter início, a fumaça e o calor já tomavam conta do interior do prédio impedindo as pessoas de fugirem pelas escadas, já que elas eram localizadas no centro da construção. Para piorar a situação, o prédio não possuía escadas de incêndio o que levou muitas pessoas a se arriscarem descer pelos elevadores do Joelma. 

E mesmo sendo a opção mais arriscada muitos se salvaram descendo pelos elevadores do edifício, enquanto estes ainda funcionavam. Mas não ia demorar para ter um colapso no sistema elétrico e os elevadores pararem, ocasionando a morte de um ascensorista no vigésimo andar. 

Sem alternativas e com o pavor à flor da pele, as pessoas que ainda estavam no Joelma se dividiram. Muitos foram para o terraço na esperança de um resgate de helicóptero e outros foram para os parapeitos das janelas. Para complicar ainda mais a situação, o edifício não possuía heliporto e as telhas e a fumaça impediam um pouso ou aproximação maior dos helicópteros. 

Muitas pessoas, em pânico, não enxergam outra solução para se salvarem que não seja pular. Assim, mais de vinte pessoas optaram por esta solução desesperada mesmo com o pedido de bombeiros de não fazê-lo. Nenhuma sobreviveu. 

Cerca de uma hora e meia depois do incêndio ter tido início, todo o material inflamável do prédio já havia sido consumido pelas chamas, assim o incêndio finalmente seria debelado. Os resgates continuariam por mais algumas horas, até que às 13:30 todos os serviços de socorro e resgate aos sobreviventes foram concluídos. Terminava assim o mais terrível incêndio da história da Cidade de São Paulo. 

O Joelma 42 anos depois 


  • Dados do edifício 
Nome: Edifício Praça da Bandeira 
Ano da construção: 1971 
Andares: 25 
Elevadores: 4 

  • Dados da tragédia 
Dia: 01/02/1974 
Mortos: 188 
Feridos: 300 (número aproximado) 

À época o terrível incêndio do Joelma, ocorrido poucos anos após o fatídico incêndio do Edifício Andraus, abriu o debate para a necessidade da revisão urgente do código do obras da cidade de São Paulo. O que estava em vigor em 1974 havia sido criado 4 décadas antes, em 1934, quando a cidade era muito menor, seus edifícios não eram tão complexos e a cidade tinha pouco mais de 700.000 habitantes. 

A investigação das causas que levaram o edifício a incendiar-se apontaram falhas na execução da manutenção do sistema elétrico do edifício, cujo sistema que era precário, estava muito sobrecarregado. Tanto a empresa responsável pela manutenção à época como o próprio Banco Crefisul e seus representantes diretamente ligados ao ocorrido receberam condenações. 

Após o fatídico incêndio o Joelma ficou fechado para reformas e adequações por 4 anos, sendo reaberto em 1978 com o nome de Edifício Praça da Bandeira. 

A tragédia de dois grandes edifícios paulistanos nos anos 1970 também desencadeou uma série de comentários sobre qual seria o próximo arranha-céu da cidade a ter problemas de incêndio. As apostas da época apontavam o Palácio Zarzur Kogan como o próximo da lista, mas a campanha era mais difamatória do que realista. Os boatos levaram o edifício a mudar de nome, trocando para Mirante do Vale. 

Lendas "sobrenaturais" 


A professora Volquimar Carvalho dos Santos, 21 anos, trabalhava no setor de processamento de dados de um banco que funcionava no 23º andar do Edifico Joelma. Ela era funcionária da empresa havia um ano e meio. O irmão dela, Álvaro, trabalhava no 10º andar do mesmo prédio. 

A família de Volquimar era espírita. Ao ser dado o aviso de incêndio, Volquimar e outras quatro companheiras tentaram fugir pela escada, mas quase foram atropeladas pelos funcionários desesperados que tentavam se salvar. Elas correram para a cobertura do prédio, mas acabaram morrendo por asfixia. 

Álvaro, irmão de Volquimar, sobreviveu ao incêndio. Álvaro localizou o corpo da irmã no IML horas depois do incêndio ter terminado. Meses depois, Volquimar teria enviado uma mensagem psicografada para a mãe através do médium Chico Xavier . Na mensagem ela contava como tinha sido os seus últimos minutos de vida. 

Em 1979, a história de Volquimar se transformou no filme "Joelma, 23º andar". O roteiro é baseado nas cartas psicografadas por Chico Xavier que estão no livro "Somos Seis". 

Conta-se que fatos estranhos ocorreram durante as filmagens, como ruídos misteriosos no local onde não havia ninguém, refletores que eram "derrubados", embora estivessem bem fixados, sendo que um dos fatos mais incríveis, foi a imagem de uma "pessoa" que não estava nas filmagens ao lado dos personagens em uma das cenas, "indicando ser um dos fantasmas do Edifício Joelma". 

Há uma outra lenda que diz que no incêndio do edifício Joelma, nos anos 70 , morreram treze pessoas queimadas que nunca foram identificadas e que por isto foram enterradas como indigentes. Na época surgiu o boato de que estas treze pessoas eram foragidos políticos que o povo diz que esses treze espíritos atendem aos pedidos das pessoas que rezam para eles. Eles estavam escondidos naquele edifício para fugir da ditadura . 

Trata-se do corpo de 13 pessoas que foram encontrados em um dos elevadores. Após diversos testes, não foi possível a identificação dos cadáveres, devido ao terrível estado em que se encontravam. Hoje, as 13 vítimas estão enterradas lado a lado no cemitério São Pedro.

A tragédia do Joelma e "O Caso do Poço" acabaram ajudando a espalhar entre a população rumores de que o terreno onde o prédio foi construído seria amaldiçoado, com especulações de que ali teria sido um pelourinho, e que fantasmas rondavam o local. 

Conclusão


A investigação sobre as causas da tragédia, concluída e encaminhada à justiça em julho de 1974, apontava o banco Crefisul e a Termoclima, empresa responsável pela manutenção elétrica, como principais responsáveis pelo incêndio. Os laudos finais das perícias afirmavam que o sistema elétrico do Joelma era precário e estava sobrecarregado. 

Além disso, os registros dos hidrantes do prédio estavam inexplicavelmente fechados, apesar de o reservatório conter na hora do incêndio 29,000 litros de água. O resultado do julgamento foi divulgado em 30 de abril de 1975: Kiril Petrov, gerente-administrativo do Crefisul, foi condenado a três anos de prisão. Walfrid Georg, proprietário da Termoclima, seu funcionário, o eletricista Gilberto Araújo Nepomuceno e os eletricistas do Crefisul, Sebastião da Silva Filho e Alvino Fernandes Martins, receberam condenações de dois anos.

Repercussão na mídia


Alem do filme espírita "Joelma, 23°", pouco depois da tragédia, uma pequena produtora norte-americana produziu o curta-metragem "Incêndio", contando as causas e consequências do fogo, utilizando técnicas de animação gráfica e imagens da cobertura da imprensa. No dia 30 de junho de 2005, o programa Linha Direta da Rede Globo, exibiu o quadro Linha Direta Mistério, com o caso Joelma.

Em 5 de julho de 2008 foi transmitida no Jornal da Record uma reportagem da série "Bombeiro: Herói de Todos", que relembrou o incêndio, mostrando várias cenas da tragédia e o difícil salvamento.

[Fonte: Arquivos e acervos UOL, Terra, Memória Globo]

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