segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

FILMES QUE EU VI 55: "A PRIMEIRA NOITE DE UM HOMEM"

Ao pensar no gênero comédia romântica, provavelmente alguns espectadores já o associam a um filme bobo e clichê como mostram certos representantes atuais do gênero, mas "A Primeira Noite de Um Homem (The Graduate)" – um filme de comédia romântica que foi considerado o mais engraçado de 1967 – acerta onde todos esses erram e cria algo autêntico, com situações engraçadas de verdade.

O filme impressiona com a linguagem cinematográfica, com ângulos do pescoço para cima ocupando a tela toda – mesmo assim, você consegue perceber o que acontece ao fundo – e, ao invés de fazer vários cortes usando duas câmeras durante o diálogo, Mike Nichols – que não por acaso levou a o Oscar de melhor diretor – usa apenas uma, filmando as costas do ator de maneira que o espectador consiga ver o ponto de vista do personagem.

No fim dos anos 60, o público se distanciava muito dos cinemas. As obras já não eram capazes de gerar empatia, o excesso de personagens distantes da realidade americana criou um enorme desinteresse por parte do espectador. Muito inspirada pela Nouvelle Vague, que talvez tenha sido o mais importante movimento cinematográfico da história, veio a Nova Hollywood, que tornou a indústria americana mais focada em filmes com personagens mais humanos. Um dos pioneiros e principais filmes do movimento foi "A Primeira Noite de um Homem", de 1967, exatamente o ano em que nascia esse que vos escreve, portanto, o filme em questão, tem exatos 52 anos.

Sinopse


A história do recém formado Benjamin Braddock que está sem qualquer interesse a respeito de seu futuro profissional e pessoal. Não quer seguir carreira acadêmica, não quer trabalhar com aquilo que estudou. Não quer nada da vida, só pensa em continuar na mordomia que seus pais lhe proporcionam. Enfim, é uma história muito atual apesar de já ter passado mais de 50 anos.

A família de Benjamin conhece os Robinsons há décadas. Os Robinsons possui uma filha que cresceu com Benjamin e os dois ficaram muito próximos, mas os estudos distanciaram a família e os amigos de infância.

Ben é um adolescente de classe média alta que acabou de sair da faculdade. Introvertido e indeciso, sofre com a pressão do futuro em sua cabeça. Durante as festas de boas vindas pelo seu retorno da faculdade, Sra. Robinson, uma coroa bonita e charmosa – mulher do sócio do seu pai – pede uma carona no Alfa Romeo que Ben ganhou de presente. 

Ao chegar na casa da Sra. Robinson, ela pede para Ben entrar, oferece drinques e pede ajuda para se despir, levando o jovem a desconfiar que a senhora esteja flertando com ele. Virgem e perdido, acaba se entregando ao charme de Sra. Robinson, descobrindo assim os prazeres da vida.

Até esse momento no filme, a trama focava na inexperiência de Ben e suas inseguranças como um garoto de 21 anos sem saber o que fazer com seu futuro. Do mesmo modo que o roteiro explorou muito bem essa primeira parte do filme, o momento em que ele reencontra Elaine Robinson não é diferente.

Fechando poeticamente a narrativa, temos um dos finais mais incríveis do cinema americano. Escancarando a falta de profundidade das escolhas do protagonista, a direção de Mike Nichols faz questão de focar no rosto dos personagens por tempo suficiente para que fique nítida a reação deles quando compreendem o que fizeram. 

Mesmo que inicialmente o público tenha uma impressão, os olhares em volta e, posteriormente, a mudança no semblante dos personagens deixam claro o real resultado das escolhas dos jovens. Resta à eles aguentarem o peso de suas escolhas, e ao espectador, imaginar que estes estão fadados a repetir os erros de seus familiares.

Elenco


Entre o elenco, vale destacar a maravilhosa atuação de Dustin Hoffman. Na época com trinta anos, mas vivendo convincentemente um personagem com vinte e um, Hoffman demonstra muito bem o nervosismo e a tensão de Benjamin através da respiração ofegante e do olhar nunca fixo. 

Repare sua empolgação quando ouve a Sra. Robinson contar que Elaine foi concebida em um Ford (..."Um Ford!"). Anne Bancroft também tem uma excelente atuação como a madura e decidida Sra. Robinson. Ciente da inexperiência do rapaz, ela não economiza nos artifícios para seduzi-lo e consegue o que deseja. Vale observar a perfeita composição da personagem, através da sexy voz rouca, dos olhares nada tímidos e dos sensuais movimentos femininos, como as passadas de mão no cabelo. 

Fechando os destaques principais, Katharine Ross vive Elaine com bastante charme, além de transmitir com competência o dilema vivido pela garota, que ama Benjamin, mas não sabe como lidar com a estranha situação que o relacionamento envolve. 

Vale citar ainda Murray Hamilton como o inocente Sr. Robinson, que leva muito tempo até perceber o caso existente entre sua esposa e o jovem rapaz, comprometendo (como era de se esperar) a intenção das duas famílias de casar Benjamin e Elaine.

Trilha sonora


A trilha sonora icônica, a cargo dupla de músicos Simon & Garfunkel, entrou para o rol das mais bonitas do cinema, justamente por ampliar o apelo emocional das cenas. Até o sucesso "Mrs. Robinson" foi criado exclusivamente para a personagem Sra. Robinson desse longa. 

Você já deve ter escutado a versão original ou a regravação do Lemonheads da música "Mrs. Robinson" de Simon & Grafunkel, que comandaram a trilha sonora do filme, escrevendo alguns outros clássicos como 
"The Sound of Silence" – que por aqui ganhou a infame versão interpretada por Leandro & Leonardo , que marca a abertura do filme (a também famosa cena onde Benjamin vai andando sobre a esteira rolante do aeroporto, homenageada depois por Tarantino em "Jackie Brown"). Ainda há diversas brincadeiras com a música, como quando a gasolina de Benjamin acaba em uma determinada cena e a música vai acompanhando o ritmo do carro, em sincronia.
Resultado de imagem para imagem do filme a primeira noite de um homeM CENA DO CARRO

Edição


É importante falar da edição em "A Primeira Noite de um Homem". Detalhes só observados por cinéfilos bem experientes, modéstia a parte. Se não fosse ela, que dá um dinamismo incrível a medida que as coisas acontecem o filme poderia ser bem entediante e perder a força de sua premissa.

A junção das ações são dadas de uma maneira que não fica nem um pouco confusa em nossa cabeça o que está acontecendo. Bejamim está na piscina e se levanta. Ele entra por uma porta, então há um corte. Estamos do lado de dentro agora e Ben está de cabelo seco, e logo depois ele pula na cama da Sra. Robinson. 

Quando ele pula há outro corte e ele está de volta à piscina. E tudo isso ligado a continuidade , dá a ideia de que a vida de Ben está passando e ele está várias vezes se encontrando com a mulher do sócio de seu pai. É uma montagem genial.

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Premiações


O filme recebeu sete indicações no Oscar de 1968. O diretor Mike Nichols ganhou o seu único Oscar nesse filme. E as interpretações geraram indicações de Melhor Ator para Hoffman, Melhor Atriz para Brancroft, e melhor atriz coadjuvante para Ross.

Vale ainda observar a fotografia desse filme que também recebeu uma indicação. Diversas vezes vemos um plano sobre outro, algo que entra na frente do que está focado e completa a cena. Até a cena da capa de divulgação mostra a perna da Anne Bancroft a frente do jovem Dustin Hoffman, e esse cuidado de usar a mesma câmera para mostrar duas coisas ao mesmo tempo deixando o foco principal sempre de frente com a câmera é muito legal de se ver.

Mas ao contrário do Oscar, no Globo de Ouro o filme saiu como um dos grandes vencedores da noite, faturando nada mais nada menos do que cinco prêmios: melhor filme em comédia/musical, melhor diretor, melhor atriz em comédia/musical para Anne Bancroft, melhor revelação masculina para Dustin Hoffman e melhor revelação feminina para Katharine Ross.

Quanto ao título em Português


O título original coloca o foco naquela fase do recém formado que ainda possui diversas dúvidas quanto ao seu futuro e essas incertezas lhe permite ter contato com novas experiências, o mundo está se abrindo para o recém formado que passou a vida estudando.
Entretanto a tradução feita tanto aqui no Brasil quanto em Portugal coloca o foco em uma das experiências que esse jovem recém formado teve após a sua graduação. Sim, é fato que Benjamin teve a sua primeira noite nesse filme. 

Mas se o foco do roteiro estivesse na primeira noite de Benjamin, certamente demoraria mais para acontecer a cena dele com a Sra. Robinson, ou tudo o que viesse depois seria consequência do fato de ter sido a primeira vez dele. 

A crise familiar que Benjamin deixou nos Robinsons não foi pelo fato de ter sido sua primeira noite, o mesmo problema teria acontecido mesmo que tivesse sido a sua milésima noite. Por via de regra, sempre existe esse risco ao se envolver com alguém casado.

A direção


E finalmente chegamos ao grande destaque do longa. A impecável direção de Mike Nichols é perceptível logo nas primeiras cenas, quando o diretor utiliza muitos closes no rosto de Hoffman e dos convidados, demonstrando como o rapaz se sentia intimidado naquele ambiente, sufocado pelas pessoas à sua volta. 

Na casa dos Robinson, Nichols cria o plano em que Benjamin diz célebre frase 
"Sra. Robinson, você está tentando me seduzir!"
e a concepção visual da cena é perfeita, com as pernas dela envolvendo o rapaz completamente, como se estivesse arrastando-o para sua armadilha sexual. 

Mas a criatividade de Nichols não para por aí. Observe a forma criativa com que o diretor nos mostra as sensações de Benjamin quando está com a roupa de mergulhador, até mesmo contando com o som para indicar a respiração dele, claramente embaraçado com a situação. 

Repare sua inteligência ao compor o plano em que Benjamin conta a verdade para Elaine, onde tudo é indicado através dos olhares, sem a necessidade de dizer qualquer palavra.


Conclusão


"A Primeira Noite de um Homem" é ainda um filme bastante premiado. Além do Oscar de direção já mencionado, foi indicado ainda a outras seis categorias: melhor filme, melhor ator, melhor atriz para, melhor atriz coadjuvante, melhor fotografia e melhor roteiro adaptado. Uma pena que não tenha levado mais estatuetas. 

Enfim, o filme é excelente, a trilha sonora é marcante e muito boa, a música "The Sound of Silence" de Simon & Garfunkel é repetida em diversas cenas e dá o tom exato de cada momento. Se você estava esperando minha opinião para ver esse filme, já tem minha recomendação positiva. Aliás, este foi por muito tempo o meu filme preferido e ainda tenho até hoje a fita em VHS (foto abaixo), que era para ser assistida no saudoso aparelho de vídeo cassete, recebida de presente de aniversário de minha amada e eterna amiga Claudianí.

Ficha técnica

  • Elenco: Anne Bancroft, Dustin Hoffman, Katharine Ross, William Daniels, Murray Hamilton, Elizabeth Wilson, Brian Avery, Walter Brooke, Norman Fell, Alice Ghostley e Richard Dreyfuss.
  • Roteiro: Calder Willingham e Buck Henry, baseado em livro de Charles Webb.
  • Produção: Mike Nichols e Lawrence Turman.
A Deus toda glória.
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E nem 1% religioso.

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