Tem coisa mais fora de moda que credos e confissões? Sim. Falar sobre eles. Ou ler sobre eles. Sei que o assunto deve parecer chato para alguns, mas num mundo em que o interessante são os "babados" das celebridades, vale a pena gastar um pouco de tempo sendo fora de moda.
Note que escrever isso também foi um exercício para mim, uma vez que não venho de um contexto confessional. Assim, os argumentos e objeções que levanto aqui também são meus, porque aceitar ou não o uso de credos e confissões – simplesmente por costume ou por moda – não é a melhor forma de lidar com o assunto.
O que é uma confissão de fé?
As confissões e declarações de fé são documentos criados pelas igrejas para expor sistematicamente as doutrinas defendidas por elas. Essas declarações de fé por muitos anos foram o texto utilizado para estudos bíblicos e discipulados dentro das igrejas. Nas palavras de Philip Schaff [1819/93, foi um teólogo europeu protestante e historiador da igreja cristã]:
"Um Credo, regra de fé ou símbolo é uma confissão de fé para uso público, ou uma forma de palavras colocadas com autoridade… que são consideradas como necessárias para a salvação, ou, ao menos, para o bem-estar da igreja cristã."
Em geral, não existe tanta diferença entre um credo, uma confissão, uma profissão ou uma declaração de fé, embora os credos, normalmente, sejam mais curtos, enquanto as confissões expõem mais detalhadamente as doutrinas bíblicas.
A confissão de fé na Bíblia
Muitos pensam que a prática da igreja de fazer esses declarações não vêm das Escrituras. Entretanto, encontramos na Bíblia algumas declarações simples, que eram utilizadas como afirmação daqueles que se uniam como/ao povo de Deus. Por exemplo, já no Antigo Testamento, temos a oração conhecida como Shemá (que significa "ouve"), feita pelo povo judeu até hoje:
"Ouça, ó Israel: O SENHOR, o nosso Deus, é o único SENHOR" (Deuteronômio 6:4).
Podemos crer que tanto Jesus quanto seus apóstolos conheciam essa declaração, recitada em sinagogas a cada reunião. No Novo Testamento, vemos algumas dessas declarações entre a igreja primitiva.
"Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, segundo as Escrituras, e apareceu a Pedro e depois aos doze" (1 Coríntios 15:3-5).
"Não há dúvida de que é grande o mistério da piedade: Deus foi manifestado em carne, justificado no Espírito, visto pelos anjos, pregado entre as nações, crido no mundo, recebido na glória" (1 Timóteo 3:16).
Além disso, alguns entendem também que a declaração "Jesus é o Senhor" era um tipo de confissão da igreja primitiva (Romanos 10:9,10 e 1 Co 12:3). Outro texto relevante para essa questão é a conversa entre Jesus e os discípulos, em que o Senhor espera que eles respondam sobre sua identidade (Mateus 16:16). Certamente Jesus sabia o que se passava no coração dos discípulos, mas a confissão pública, "a boca que faz confissão" (Rm 10:10), tinha seu valor.
A Bíblia valoriza a confissão pública de fé, não como algo que pode nos salvar, mas como parte da vida do cristão e evidência da salvação. O pecado de Pedro, durante o julgamento de Cristo, foi justamente a falta de coragem em declarar que ele seguia a Jesus – mesmo que, em seu coração, ele cresse naquele homem (ainda que de maneira débil ou mesmo superficial). Certamente, o texto não está nos ensinando a sistematizar a fé de maneira como fazemos hoje, mas deixa claro que uma declaração pública tem seu valor pelo testemunho diante dos homens.
A confissão de fé na história
Com o passar dos anos, a igreja, sofrendo ataques de doutrinas contrárias à Palavra de Deus, viu-se na necessidade de constituir o que chamamos de credos: declarações resumidas das doutrinas cristãs básicas. Entre os mais famosos temos o Credo Apostólico, que popularmente é associado aos apóstolos (algo questionável, mas sabe-se que era usado no segundo século pelas igrejas de Tertuliano), e o Credo Niceno, formulado em 325 d.C, a fim de combater heresias antitrinitarianas.
Após a Reforma Protestante, os crentes não-católicos precisaram também sistematizar e formalizar suas doutrinas. Assim, surgem as confissões de fé protestantes, sendo a primeira delas a Confissão de Augsburgo (1530). Depois disso, vieram muitas outras como a Confissão Belga (1561), a 2ª Confissão Helvética (1566) e a Confissão Escocesa (1560).
Entre as igrejas presbiterianas, a Confissão de Fé de Westminster (1646) é a mais aceita e reflete de maneira mais clara a teologia calvinista. Essa confissão não apenas influenciou e guiou igrejas presbiterianas, mas foi base para outras confissões, como a Confissão Batista de Londres (1689).
Atualmente, porém, a prática de confessar ou declarar a fé se torna cada vez menos comum entre as igrejas. Poucas levam a sério a prática de ensinar e publicar sua confissão ou credo, e a maioria dessas poucas ainda prefere usar textos mais genéricos (como o Credo Apostólico) a fim de não parecer excludente. Como consequência, poucos crentes dedicam-se também ao estudo e ao ensino dessas verdades.
Diante dessa situação, devemos realmente repensar o motivo de termos essas confissões ainda. Mesmo que não tenhamos um documento que fundamente nossa confissão, assim como é comum nas igrejas mais ortodoxas (como as batistas, as presbiterianas, as metodistas, as wesleyanas). Aliás, com a diversidade de denominações no segmento evangélico, oficializar um credo não deve ser uma tarefa tão fácil como pode parecer.
Mas, enfim, como podemos "montar" uma confissão de fé que pudesse ser usada por qualquer cristão, independente de sua denominação?
Confissão de fé interdenominacional
I. COMO VOCÊ CRÊ NA BÍBLIA – Cremos que todas as palavra da Bíblia, nas suas línguas originais são inspiradas por Deus, e é a única, exclusiva e suficiente regra de fé e prática (Isaías 8:20; Provérbios 30:5,6; Mateus 5:18; 1 Coríntios 2:13; 2 Timóteo 3:16,17; 2 Pedro 1:20,21; Apocalipse 22:18-19). Os acontecimentos mostram e provam que a Bíblia é a Palavra de Deus.
II. COMO VOCÊ CRÊ EM DEUS – Cremos que Deus é uma Trindade composta por três membros: Pai, Filho e Espírito Santo, todos com funções distintas porém harmoniosas (Mateus 3:16,17; 28:19,20; 1 Coríntios 8:5,6; 2 Coríntios 13:13).
III. COMO VOCÊ CRÊ NO PECADO – Cremos que o homem foi criado sem pecado, mas no entanto perdeu sua posição de inocência, assim sendo, todo homem é pecador por natureza e vontade e, portanto, incapaz obter sua salvação por meio de seus próprios esforços (Salmos 51:5; Eclesiastes 7:20, 29; Jeremias 17:9; Romanos 5:12; 3:9-23; 5:19; Efésios 2:1-3; Gálatas 3:22).
IV. COMO VOCÊ CRÊ NA SALVAÇÃO – Cremos que a salvação provém, exclusivamente, da graça de Deus sem esforços, obras, ou méritos do homem (Isaías 55:1; Romanos 11:6; Efésios 2:8-10; 2 Timóteo 1:9; Tito 3:3-7; Apocalipse 21:6; 22:17).
V. COMO VOCÊ CRÊ NO ARREPENDIMENTO E A FÉ –Cremos que o arrependimento e a fé são necessários para a salvação e significam uma verdadeira conversão, de uma vida de pecado, a uma vida nova em Cristo (Marcos 1:15; Lucas 13:1-5; Atos 11:18; 16:30,31; 20:21; Romanos 10:9-11; 2 Coríntios 5:17; Efésios 2:8; Tito 2:11-14).
VI. COMO VOCÊ CRÊ NA REGENERAÇÃO – Cremos que a regeneração, ou seja, o novo nascimento, faz parte de uma conversão autêntica, efetuada pelo Espírito Santo no pecador elegido, resultando na comunicação de uma nova vida, um novo espírito, ou um novo coração os quais se manifestam através de uma mudança de vida chamada de "frutos do arrependimento" (Ezequiel 36:26-27; Mateus 3:8; João 3:3-6; 10:27; 2 Coríntios 5:17; Efésios 4:20-24; Tito 3:5-7).
VII. COMO VOCÊ CRÊ NA JUSTIFICAÇÃO – Cremos que o pecador é justificado, eternamente, por Deus a partir do instante em que crê em Cristo como seu Salvador; a justificação significa o perdão dos pecados e a submissão definitiva do indivíduo ao favor de Deus (Atos 13:39; Romanos 3:24-26; 5:1; 8:1).
VIII. COMO VOCÊ CRÊ NA SANTIFICAÇÃO – Cremos que através da santificação Deus torna santa a vida do crente, dia a dia, visando sua perfeição completa quando da ressurreição do corpo (Provérbios 4:18; Romanos 6:11-23; 2 Coríntios 7:1; 1 Tessalonicenses 4:3-5; 5:23; Filipenses 2:12-13).
VIX. COMO VOCÊ CRÊ NA SEGURANÇA DOS SALVOS – Cremos que o verdadeiro crente está eternamente seguro em Cristo, podendo perder por descuido a comunhão com Deus mas nunca a sua filiação (João 5:24; 10:27-30; Romanos 8:28-33; 35-39 Colossenses 3:1-4; 2 Timóteo 1:12; Tiago 4:7; 1 Pedro 1:3-5).
X. COMO VOCÊ CRÊ NA VINDA DE CRISTO – Cremos na Parousia (ou parúsia), isto é, que Cristo virá em Pessoa pela segunda vez a esta terra; Ele será visto por todos os homens em todos os lugares (Atos 1:11; 1 Tessalonicenses 4:13-18; Apocalipse 1:7).
XI. COMO VOCÊ CRÊ NA CONDENAÇÃO – "Inferno" (João 3:18-19): Cremos que as pessoas que não receberam de Jesus a salvação prometida, vão diretamente para o inferno ao morrerem, passando a sofrer também o castigo eterno, por não se arrependerem de seus pecados e rejeitar a vida eterna que há em "Jesus Cristo" (Mateus 25:41; Marcos 9:43-48; Apocalipse 14:10,11, 15; 19:20; 20:10; 21:8).
Conclusão
Por Que a Igreja de Cristo tem Confissões de Fé?
A Igreja tem Confissões porque os homens são limitados. Ninguém consegue memorizar a Bíblia toda. Ninguém pode sozinho entender toda a Bíblia direito. Ninguém pode entender tudo certo só citando versículos sem nenhuma ajuda para saber a explicação certa. Para ajudar em todas estas limitações a Igreja usa Confissões de Fé. Nelas a igreja explica o que ela entende ser o verdadeiro ensino da Bíblia. Abaixo os motivos pelos quais defendo o uso das Confissões de Fé pela Igreja de Cristo:
A Igreja usa Confissões para declarar a sua fé a Deus e isto para ser salva. Romanos 10:9 diz: "Se com a tua boca confessares Jesus como Senhor e, em seu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo."
A Igreja usa Confissões para evangelizar os homens. Com estes documentos ela proclama no mundo qual é a verdadeira Boa Nova de Jesus. Diz o Senhor Jesus em Mateus 10:32: "Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai que está nos céus".
A Igreja usa Confissões para defender a fé contra ensino falso. Lemos em 1 Timóteo 1:3 o seguinte: "Quando eu estava de viagem, rumo da Macedônia, te roguei permanecesses ainda em Éfeso para admoestares a certas pessoas, a fim de que não ensinem outra doutrina".
A Igreja de Cristo usa Confissões para ensinar a seus membros. Colossenses 3:16 diz: "Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria..."
Uma igreja que não valoriza as fiéis Confissões de Fé geralmente não guarda firme a doutrina de Cristo. A tendência, neste caso, é abrir as portas para uma variedade de ensinos porque tal igreja não sabe bem o que é verdadeiro e o que é invenção dos homens. As confissões que a Igreja de Cristo desenvolveu através dos séculos são bons instrumentos para ajudar-nos a guardar a fé bíblica e crescer nela. Mesmo assim, é de grande importância nunca permitir que as confissões se tornem um substituto pela Bíblia.
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