quarta-feira, 31 de agosto de 2016

FILMES QUE EU VI - 19: "EU, CHRISTIANE F., 13 ANOS, DROGADA E PROSTITUÍDA"

Cara, esse filme foi um dos ícones para a juventude dos anos 80. Na maioria das rodinhas nos recreios dos colégios naquela época tinha uma galera discutindo sobre o livro e o filme homônimos. Ambos também foram usados como base para as fileiras acadêmicas sobre a psicologia adolescente.

Eu tive a oportunidade de ver o filme no cinema e ler o livro em suas duas versões, uma resumida e outra completa, recheada com fotos chocantes de adolescentes e jovens que foram vítimas da heroína na Berlim do final dos anos 70 e início dos 80. Me lembro que o filme era proibido para menores 21 anos e o livro era vendido com uma enorme tarja vermelha com a mesma restrição (mas a gente sempre dava um jeitinho de burlar essas restrições...). A história real se passou na Alemanha, mas qualquer semelhança com a realidade das crackolândias do Brasil não será mera coincidência. 

Um livro, um filme, uma vida 


O próprio nome do filme já consegue explicar sobre o que se trata. Baseado no livro de mesmo nome, no filme alemão "Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada e Prostituída" (Wir Kinder vom Bahnhof Zoo, 1981) é contada uma parte da vida de uma jovem de Berlim que vive no mundo da heroína. 

A história do filme é real e ocorreu na década de 70. Christiane (interpretada por Natja Brunckhorst) tinha apenas 12 anos quando começou a se envolver com drogas. Ela era uma menina, com alguns problemas em casa, e que, como quase todo jovem que passa pela puberdade, queria ser aceita em um grupo de amigos. Foi na boate Sound que Christiane conheceu os amigos que a acompanhariam futuramente na luta diária para conseguir uma picada, inclusive o seu namorado, Detlef (interpretado por Thomas Haustein). 

Naquela época, a heroína era uma novidade em Berlim, e as pessoas a chamavam de "H". A primeira vez que Christiane a experimentou foi após um show do David Bowie -, que inclusive fez uma pontinha especial no filme como ele mesmo. Iniciou com a inalação, mas com o passar do tempo, ela escolheu a injeção. O filme mostra o seu declínio e o avanço de seu vicio, que a leva à prostituição para alimentar sua dependência. 

Christiane vê seus amigos se afundarem junto com ela, e vivencia a morte em seu cotidiano. Nesse filme, é exposta a vida real de muitos jovens que ficavam na Estação Berlin Zoologischer Garten em busca de drogas. Eles deixavam suas casas, pois não havia mais motivo para continuar tentando esconder o vício de suas famílias. 

Direto na veia... e na mente 


Diferente de "Trainspotting – Sem Limites" (1996), o diretor Ulrich Edel optou por representar a realidade dos jovens sem nenhum elemento cômico. "Christiane F.,..." é um filme escuro, denso e forte. Alguns interpretam como um filme de má qualidade, mas eu vejo totalmente pelo contrário. As sombras, a escuridão e os diálogos curtos são recursos propositais para te situar naquele momento. 

É para ser assistido com uma preparação mental prévia. Edel não poupa os espectadores dos detalhes da dependência química, e acredito que tenha criado uma das cenas mais fortes de abstinência que já vi. O choque de ver uma menina, praticamente uma criança, se injetando com heroína na veia dentro de um banheiro público imundo não é para qualquer um. Saber o que acontece é uma coisa; ver o que está acontecendo é outra. E Edel nos transporta para a visão que esses jovens possuem do mundo afora e nos impressiona durante todo o filme. Não é um filme nada fácil, não é uma história agradável, não é para distração. 
A atuação da jovem Brunckhorst é incrível. Fiquei sem palavras quando soube que esse foi o primeiro trabalho dela (e nem me lembro de ter voltado a vê-la em outro). Pegar um papel tão tenso e pesado para interpretar não deve ser moleza. Ela consegue expressar o sofrimento de Christiane, físico e psicológico. As sequências de cenas quando ela e o namorado tentam a desintoxicação e sofrem as crises de abstinência são perturbadoras (fotos acima). É realmente espetacular. 

Não espere um final surpreendente e bem explicado, afinal, não é esse o propósito do filme. Recomendo fortemente a leitura do livro também. Vale à pena fugir um pouco de filmes e documentários forçados sobre drogas, defendendo os dois lados extremos, e entrar na realidade de uma pessoa que vivenciou isso para construir suas próprias críticas. 

O cenário alemão setentista 


Na década de 70, a Alemanha Ocidental era um país de primeiro mundo, superindustrializada e considerada o espelho do Capitalismo. Não existiam mendigos nem famintos, mas o número absurdo de crianças e adolescentes que dormiam na rua, se drogavam e se prostituíam tornou-se um fenômeno ao qual a sociedade estava cética e pouco interessada. Por que tantos menores eram por ela ignorados? O que os levou a se tornarem um "lixo social"? Seria a família de pais violentos, alcoólatras, "trapaceiros" e abandonadores? O lar sujo, sombrio, desumano, sem nenhuma higiene, conforto e lazer? Enfim, o preço do crescimento capitalista era deixar que o futuro dessa sociedade em "evolução" morresse antes mesmo dos 20 anos. 

Que motivos tem a sociedade para não modificar as suas rígidas estruturas, para empenhar-se em mantê-las tal qual, mesmo quando o indivíduo muda? Que conflitos conscientes e inconscientes levam os pais a ignorar ou a não compreender a evolução do filho? O problema mostra assim o outro lado, escondido até hoje debaixo do disfarce da adolescência difícil: é o de uma sociedade, às vezes, frente à onda do crescimento, lúcida e ativa, que lhe impõe a evidência de alguém que quer atuar sobre o mundo e modifica-lo sob a ação de suas próprias transformações. 

O que aprendi vendo o filme 


O adolescente é um ser social e individual, que possui suas dúvidas, angústias e desejos. Quer ter a liberdade de sentir amor e ódio, dependência e independência. Quer mostrar que sabe das coisas e busca aprender mais e mais. Quer construir sua própria família um dia, sem deixar de ter seus pais ou simplesmente quer aproveitar a vida da forma mais normal e naturalmente possível. 

A adolescência é um período fundamental no desenvolvimento do "eu", já que as mudanças físicas, psíquicas e sociais levarão o adolescente a uma crise de identidade cuja resolução contribuirá para a consolidação da personalidade adulta. Com relação a estas crises, especialistas dirão que elas se originam do contato social, primeiro com a família, que é a mais próxima e a que mais facilmente terá influências na conduta do adolescente e, em seguida, a sociedade em si, que intervém muito na sua conflitiva. 

A sociedade, mesmo manejada de diferentes maneiras e com diferentes critérios sócio-econômicos, impõe restrições à vida do adolescente. O adolescente, com a sua força, com a sua atividade, com a força reestruturadora da sua personalidade, tenta modificar a sociedade que, por outra parte, está vivendo constantemente modificações intensas. Tendo consciência da alteração que significa o que afirmo, é possível dizer que se cria um mal-estar de caráter paranóide no mundo adulto, que se sente ameaçado pelos jovens que vão ocupar esse lugar e que, portanto, são reativamente deslocados. O adulto projeta no jovem a sua própria incapacidade em controlar o que está acontecendo sócio-politicamente ao seu redor e tenta, então, deslocalizar o adolescente. 

O mundo adulto hostiliza o adolescente em virtude de todas essas situações conflitivas que ele passa, transferindo para àquele uma atitude paranóide e moralista. Assim, se para nós, adultos "construídos" já é difícil manter a moratória imposta sobre nossos desejos, que dirá para um adolescente em formação, que quer liberar toda sua energia e seus desejos. 

Estudos dizem que a adolescência é uma fase na qual ocorrerá um segundo processo de individuação, ou seja, em vez de os pais se aproximarem emocionalmente dos seus filhos, eles irão se distanciar, dando espaço para que possam se aproximar aos iguais e criar seus vínculos afetivos. Se as figuras parentais estão internalizadas e incorporadas à personalidade do sujeito, então este pode começar seu processo de individuação. 

Com base nas teorias do desenvolvimento do "eu", a crise de identidade, a individuação e o processo de construção da identidade, é o que trás à tona, sob a luz do fenômeno punk da Alemanha dos anos 70, retratado no filme "Cristiane F...." 

O filme, o livro e a vida 


Christiane Vera Felscherinow, uma adolescente normal e comum, feriu o orgulho capitalista alemão quando trouxe à tona a sua história e a de muitos outros adolescentes e crianças que se prostituíam para sustentar seu vício de heroína. 

Christiane cresceu em um bairro pobre, em meio a um ambiente violento. Seu pai era muito agressivo e também alcoólatra. Como forma de compensação dos terríveis momentos que passara na presença de seu pai, sua mãe lhe deu uma vida sem regras, sem responsabilidades.

A Sound era a boate mais badalada em Berlim e Christiane era fascinada em conhecê-la. Para poder entrar na boate, aos 13 anos, com ajuda de sua amiga, Kessi, falsificou a data de nascimento em sua carteira escolar. Lá, Kessi lhe apresentou seu namorado, Mich. Ele já era um dependente de drogas pesadas e morreu meses depois. Foi na Sound que Christiane conheceu seus amigos Axel, Babsi, Atze, Zambie, Stella e seu futuro namorado, Detlef. Atze só falava em drogas e nas melhores formas de "voar". Concordavam entre si quando viam a Heroína como um suicídio. Ninguém a havia experimentado, mas sabiam que usando uma vez não a largariam mais. 

Christiane vivia num mundo errado, com os amigos errados, mas não podia mudar em nada esta situação. Por falar em amigos, eles não possuíam fidelidade entre si, não possuíam vida. Estavam ligados pelas drogas, somente. 

Babsi, 14 anos, tornou-se manchete de jornais por ter sido a mais jovem vítima da Heroína. Era filha adotiva de um famoso pianista alemão e aos 13 anos já era viciada, prostituída e já havia sido espancada e estuprada por bêbados. Quando Babsi morreu, Christiane nem se sensibilizou tanto, pois já esperava algo assim pra quem usa heroína. Pouco tempo antes, elas tinham combinado em deixar o vício. 

Christiane inalou heroína pela primeira vez após assistir ao show de David Bowie, seu grande ídolo. A comparação, feita por Atze, da sensação de um orgasmo induziu-a a injetar heroína, tempos depois. 

O zoológico era um lugar de pessoas deprimentes e acabadas. Cada jovem que ali se encontrava não tinha mais nada que o assemelhasse a um adolescente normal, nem física, nem mentalmente. Esqueciam-se de sua própria existência e a presença de iguais já não significava nada. Eram vistos como a fruta podre da sociedade, esquecidos e ignorados. Os pais sempre foram figuras ausentes. Todos esses jovens vinham de lares desfeitos por separações, violência doméstica, alcoolismo e drogas. 

Conclusão 


Diante desse relato é muito difícil situá-los na busca de um eu, de uma individuação. Seria muito reducionista considerar que o problema da adolescência está somente na sua relação consigo e com os pais, excluindo a sociedade. Em relação ao filme, enquanto as crianças e adolescentes se acabavam na prostituição, na marginalidade e nas drogas dos subúrbios alemães, nada era feito para que este quadro mudasse. Muito pelo contrário, essa situação revelava uma imagem deturpada destas vítimas como sendo os rebeldes, problemáticos, detestáveis e desprezados. 

A sociedade surge ao determinar que os pais não podem ser um objeto sexualmente aceito (atos incestuosos). Dessa forma, o adolescente vai procurar no outro a oportunidade de liberar estes desejos de maneira que o assemelhe a seus pais. Freud nos dirá que este processo se dará através da transição dos desejos infantis aos desejos genitais. Mas, para que o adolescente encontre este objeto de amor, ele precisará elaborar o luto pelos pais. Caso isso não ocorra, seu processo evolutivo ficará em atraso. 

O ego, neste momento, encontra-se na posição de defesa, contra os impulsos inconscientes do id. Se eles não conseguem escapar à realidade, sua carga será voltada para outras atividades que irão liberar a sua energia. Neste caso, a compensação desses desejos estará na busca do prazer por outros meios. Poderíamos dizer, portanto, que a entrega às drogas seria uma compensação, de uma falta. Uma busca de um prazer proibido pelos pais, pela sociedade pela moratória social. 

No caso de Christiane, a busca do prazer nas drogas a tornou dependente de uma satisfação orgânica. O uso de drogas deu a ela um prazer "inacabável", enquanto o organismo estava em transe. Era uma sensação individual que ela não encontrava no mundo externo. 

O adolescente, da década de 70, que procurou o prazer nas drogas e no álcool, brigou com seus pais, criticou a religião ou foi um extremista cristão, é o adolescente de hoje, que também é reprimido e também passa naturalmente por suas mudanças. 

Poder aceitar a anormalidade habitual no adolescente, vista desde o ângulo da personalidade idealmente sadia ou da personalidade normalmente adulta, permitirá uma aproximação mais produtiva a este período da vida. Poderá determinar o entender o adolescente desde o ponto de vista adulto, facilitando-lhe seu processo evolutivo rumo à identidade que procura e precisa. 

Somente quando o mundo adulto o compreende adequadamente e facilita a sua tarefa evolutiva o adolescente poderá desempenhar-se correta e satisfatoriamente, gozar de sua identidade, de todas as suas situações, mesmo das que, aparentemente, têm raízes patológicas, para elaborar uma personalidade mais sadia e feliz.
 
Concluo com a ideia de que, quebrar estas projeções do passado seria um ótimo começo para a facilitação da relação entre gerações diferentes e para a evolução dessa e de outras gerações que virão. Mesmo sabendo que um sofrimento longo e árduo de um indivíduo não desapareça instantaneamente acredito que, paulatinamente, os indivíduos vão se localizando, encontrando-se a si mesmos neste espaço e este encontro permitirá um primeiro e novo encontro do adolescente com sua personalidade. Como você pode ver, o filme é um soco no estômago e ao mesmo tempo uma verdadeira aula sobre a psicologia adolescente. Se você ainda não assistiu, o que está esperando?
  • Data de lançamento 1981 (2h 18min) 
  • Direção: Uli Edel 
  • Elenco: Natja Brunckhorst, Thomas Haustein, Jens Kuphal 
  • Gêneros: Drama, Biografia 
  • Nacionalidade: Alemanha ocidental

A Deus toda glória.
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   E nem 1% religioso.

ACONTECIMENTOS - AYRTON SENNA, A MORTE DE UM ÍDOLO



"Seja você quem for, seja qual for a posição social que você tenha na vida, a mais alta ou a mais baixa, tenha sempre como meta muita força, muita determinação e sempre faça tudo com muito amor e com muita fé em Deus, que um dia você chega lá. De alguma maneira você chega lá." 
Ayrton Senna

Um sobre comum e popular: Silva. Um rosto sem traços comuns aos galãs midiáticos. O corpo também não era "essas coisas". Sem o uniforme e a fama, provavelmente ele não despertaria muito a atenção. Contudo, ao vestir o macacão, Ayrton Senna e o carro tornavam-se uma só entidade indissociável que sentia cada reação da pista e executava manobras inacreditáveis.

Alguns disseram que era um homem sem medo. A verdade é que o piloto encontrava no equilíbrio perfeito entre habilidade e fé - ele era cristão confesso - os caminhos para correr como nenhum outro adversário poderia prever. Superava qualquer dificuldade em busca das vitórias.

A imagem deste brasileiro, considerado um dos maiores esportistas da história, é reconhecida nos quatro cantos do mundo, seja por seu talento e sua determinação excepcionais, ou por desempenho quase mágico.

É um mito do automobilismo mundial, contando com uma história de sucesso que inclui 41 vitórias, 65 pole positions e 3 campeonatos mundiais na Fórmula 1.

O Legado de Conquistas


O legado de conquistas de Ayrton Senna elevou o nível do esporte a outro patamar. Após 20 anos, ainda há marcas a serem batidas pelos novos pilotos da Fórmula 1 e pesquisas atuais ainda apontam que o piloto e considerado o melhor de todos os tempos.

Entre algumas marcas invejáveis estão as suas 41 vitórias na Fórmula 1, o terceiro piloto com o maior número em toda a história. As 65 poles conquistadas em 10 anos de carreira somente foram superadas no décimo-quinto ano de carreira do único piloto a alcançá-las, Michael Schumacher. Entre as marcas ainda não superadas estão as seis vitórias em Monte Carlo, que lhe rendeu o apelido "Rei de Mônaco".

Triste domingo foi aquele...


Uma batida violenta, na sétima volta do GP de San Marino, na Itália, em 1994, tirou a vida do tricampeão mundial de F-1. Era a terceira etapa de uma temporada que não ia nada bem para Senna. Ele ainda não havia conquistado pontos no campeonato e via um novato, Michael Schumacher, disparar com duas vitórias (o alemão viria a conquistar seu primeiro título naquela temporada). 

Ayrton passou os dois anos anteriores comendo poeira dos carros da Williams e, justo quando se transferiu para a equipe com o melhor veículo, a FIA (Federação Internacional de Automobilismo) proibiu as tecnologias que davam vantagem à escuderia azul e branca. O fim de semana do GP, disputado no circuito de Ímola, já estava carregado por causa de um acidente grave de Rubens Barrichello, nos treinos de sexta-feira, e da morte do austríaco Roland Ratzenberger no sábado. No domingo,1º de maio, foi a vez de Senna.

O passo a passo da morte que chocou o Brasil há 22 anos


  • Sangue na pista


A pista de Ímola tinha muitas ondulações. Os carros de F-1 precisam "grudar" no asfalto e, numa superfície irregular, ficam instáveis e sujeitos a derrapar. Para complicar a situação, os veículos da Williams estavam difíceis de guiar, já que a equipe ainda estava se adaptando à proibição do uso do sistema de suspensão eletrônica.

  • Curva da morte


A Tamburello já havia sido palco de acidentes. Em 1987, Nelson Piquet bateu no mesmo ponto a 280 km/h por causa de um pneu furado. Dois anos depois, Gerhard Berger, amigo de Senna, bateu e incendiou sua Ferrari no muro da curva. Após o acidente de Senna, a curva virou uma inofensiva chicane – sequência de curvas de baixa velocidade.

  • Roda murcha


Uma teoria culpa os pneus. Na primeira volta da corrida, os pilotos tiveram de dirigir devagar por causa de um acidente. Com isso, os pneus esfriaram e perderam 25% da pressão. O carro ficou 5 mm mais baixo, o que pode ter desestabilizado a aerodinâmica. Isso teria causado a perda de aderência da Williams com a pista.

  • Fora de controle


A explicação mais famosa é a de que a coluna de direção, que liga o volante às rodas da frente, quebrou. Senna pediu aos engenheiros que aumentassem o tamanho da peça em 1,8 cm para que o volante ficasse mais próximo dele. Segundo a Justiça italiana, a solda de um pedaço extra de metal teria sido mal feita e causado a quebra da coluna.

  • (Sem) Fio da meada


Os sistemas eletrônicos do carro enviam dados de performance a computadores da equipe. É a chamada telemetria. No caso de Senna, os dados revelam que havia força sendo aplicada na coluna de direção, o que provaria que ela não quebrou antes do impacto. Também dá para saber que o piloto acionou freios e soltou o acelerador.

  • Impacto profundo


O carro não estava tão rápido (216 km/h) e a batida não foi frontal – pilotos já escaparam com vida de acidentes mais violentos. A falta de sorte foi que, na batida, a roda direita ficou prensada entre o muro e o carro. Isso causou a quebra do braço da suspensão, que entrou pela viseira do capacete, perfurou o crânio e atingiu o cérebro.

  • À espera de um milagre


A ambulância levou dois minutos para chegar ao local do acidente – tempo demorado na opinião de especialistas em segurança de corridas. Já fora do carro, Senna teve o pescoço cortado para poder respirar (traqueostomia). Após mais 15 minutos, um helicóptero levou o piloto ao hospital Maggiore, em Bolonha. Ele morreu 40 minutos após ser internado.
"Voltando àquele trágico domingo, 01/05/1994, (...) Senna estava sozinho, numa sala dotada de muitos equipamentos, típica desses centros de recuperação. (...) Estava nu, apenas com uma toalha pequena sobre a genitália. Para se ter uma ideia do que estou dizendo, nós, eu e o padre, não o reconhecemos. Soubemos que era Senna porque um médico nos disse que aquele era o paciente que procurávamos. Seu rosto estava irreconhecível. Sua cabeça ficou do tamanho de uma bola de basquete. Enquanto o corpo não apresentava nenhuma lesão aparente e estava branco, branco, sua cabeça tinha a cor quase negra e estava desfigurada.
Mais tarde, conversando com o doutor Servadei, ele me explicou que quando o traumatismo craniano é profundo, como no caso de Senna, em geral há o rompimento das camadas nervosas que envolvem o tecido nervoso. 
Como entre essas camadas correm liquor, líquido cefalorraquiano, e ele mantém-se sob elevada pressão entre essas camadas, quando ocorrem lesões nelas o seu extravasamento gera um edema
generalizado, desfigurando qualquer superfície da sua forma original. Isso foi o que se passou com Senna. 
Como a perícia técnica apurou que a barra push-rod da suspensão da Williams perfurou o seu frontal, pressionando a cabeça contra a parte de trás do cockpit e causando a fratura de toda base craniana, Senna teve desde lesões ósseas genéricas a danos amplos e irreversíveis no tecido nervoso. Esse quadro justificou sua aparência irreconhecível já minutos depois do impacto da Williams no muro da curva Tamburello."

Lívio Oricchio, jornalista, em reportagem especial ao Estadão 27 de agosto de 2006 


  • Maior de todos


Em 2012, a emissora britânica BBC elegeu Ayrton Senna como o melhor piloto de todos os tempos na F-1.

Imagens mostram o carro de Senna soltando faíscas (indicando contato do assoalho com o solo) antes da Tamburello. Confira em abr.io/sennacrash.

Além do crânio perfurado, não havia outra lesão no corpo de Senna: nenhum osso quebrado ou hematomas. Os bombeiros chegaram 20 segundos após o acidente, mas não tinham o que fazer, já que não houve incêndio. Como resultados da tragédia, o acidente tornou a F-1 mais segura.
A segurança aumentou. Hoje, as rodas são "amarradas" ao carro para não voarem, há reforços nas laterais e uma comissão de segurança da F-.

  • Caso encerrado


A Justiça italiana investigou o caso até 1997. Membros da equipe Williams, incluindo o dono, Frank Williams, foram julgados e absolvidos. "Culpa" de quem? O jornalista Flávio Gomes, especializado em automobilismo, explica: "Não há culpados no sentido de alguém ter sido negligente ou descuidado."

Conclusão


Só há uma palavra para descrever o estilo de Ayrton Senna: ousado. Ele fazia seus carros irem além do que eram capazes. Foi assim que deu inúmeras alegrias ao povo brasileiro e fez história na Fórmula 1, até o fatídico 1º de maio de 1994. Na curva Tamburello, do GP de San Marino, na Itália, despediu-se, fazendo o que mais amava. Há exatos 20 anos, o país perdia um dos maiores pilotos do automobilismo mundial. 

A morte de Ayrton Senna mudou para sempre os rumos da Fórmula 1. Para o bicampeão mundial da categoria, o brasileiro Emerson Fittipaldi, que já havia se aposentado no auge da carreira de Senna, o acidente foi um marco. "Ajudou os construtores a descobrirem novas formas de melhorar a segurança dos carros", argumenta o ex-piloto.

Uma das primeiras atitudes, de acordo com ele, foi subir o cockpit para proteger a cabeça dos atletas. "Houve mais consciência sobre a questão da segurança. Se vale pensar como consolo, sua morte ajudou a melhorar a modalidade", pontua. Vários outros acidentes ocorreram na F-1 desde 1994, mas nenhum terminou com a morte de pilotos.

Fittipaldi acrescenta ainda que a morte do ídolo causou a perda do interesse dos brasileiros por esse esporte. 
"Ayrton era espetacular. Ele ia ao limite dele, da pista e do carro. Infelizmente, morreu no topo da carreira. Isso, inclusive, esfriou o interesse do público pela F-1. Quem tem menos de 25 anos hoje não conviveu com aqueles momentos fantásticos e não sabe da magnitude de tal piloto", 
lamenta. Eu mesmo, nunca mais me interessei por esse esporte, desde a manhã daquele triste domingo.

[Fonte: Livro The Death of Ayrton Senna, de Richard Williams; documentário Seismic Seconds: The Death of Ayrton Senna, da National geographic; e sites The Guardian, Terra Brasil, abril.com, The Independent, BBC, VEJA eFastCompany]

terça-feira, 30 de agosto de 2016

DISCO QUE EU OUVI - 19: LEGIÃO URBANA, "A TEMPESTADE OU O LIVRO DOS DIAS"

Sim, eu já falei sobre outro disco da Legião Urbana aqui nessa série (e certamente voltarei a falar), mas em se tratando de Legião Urbana, não dá para falar e/ou escolher um disco apenas, pois cada disco da banda tem um significado muito importante. "A Tempestade ou o Livro dos Dias" é mais que simplesmente o último disco da carreira da banda. É um disco que podemos considerar como a despedida do próprio Renato [Russo] Manfredinni Júnior (★1960-✞1996).

O livro dos dias 


O ano era 1996 e Renato já sucumbia à fase terminal da doença contra a qual, por sua própria decisão, decidiu parar de lutar. Naquele ano, a medicina já tinha avançado no combate ao vírus HIV, Renato decidiu que não queria mais lutar. 

Poucos registros nacionais concentram uma carga tão melancólica quanto "A Tempestade...", debilitado por conta do tratamento contra a Aids e visivelmente desesperançoso, o cantor, poeta e trovador solitário faz de cada faixa no decorrer da obra uma despedida, algo explícito nos versos de Oswald de Andrade registrados no encarte do álbum: 
"O Brasil é uma república federativa cheia de árvores e gente dizendo adeus"

Uma das obras mais extensa do grupo, com quase 70 minutos de duração, o disco se perde em meio a composições amargas como 'Longe do Meu Lado', 'Quando Você Voltar' e 'A Via Láctea', todas gravadas sob grande esforço do cantor, com os vocais já debilitados por conta da doença. Com a participação ativa de Carlos Trilha, tecladista e produtor que havia acompanhado Russo nos trabalhos em carreira solo, o álbum parece cercado dentro de uma atmosfera própria, com Dado Villa-Lobos apostando na densidade das guitarras e Marcelo Bonfá no uso de uma percussão pouco convencional para a banda.
 

A tempestade


Lançado em 20 de setembro de 1996, menosprezado mediante fatos irrefutáveis "A Tempestade ou O Livro dos Dias" é a melhor produção fonográfica da Legião Urbana. 

O disco que foi a despedida de uma carreira vitoriosa, foi concebido diante de poucas notícias a seu respeito. Naquela época a internet estava engatinhando; seus músicos (que até hoje são assim) sempre foram celebridades discretas - mesmo que isso pareça ser incompatível - mantiveram o segredo sobre a doença de Renato e seu estado terminal. 

Até que em meio a divulgação do sombrio, conceitual, nada comercial disco de capa azul, no dia 11 de outubro de 1996, Renato Russo faleceu vítima das muitas doenças que se alugam na Síndrome da Imune Deficiência Adquirida. 

Mas o disco é bastante especial não somente por isso. 

Faixa a faixa


Porquanto a Legião voltaria em sua primeira faixa a destilar sua ironia, para falar de coisas tristes como doença e desesperança em um rock modelo british 90's. (1) 'Natália' traz Renato no contra-baixo, que está mais audível que sua quase mirrada voz. Em outros tempos o talentoso cantor iria gritar e espumar mediante a polvorosa canção. Não foi desta vez. Ao menos sua linha de baixo é marcante e condizente com seu pedigree musical. 

Em (2) 'L'Avventura' a melancolia. Uma das marcas maiores da LU desde o primeiro disco ("Legião Urbana" - 1985), o arranjo de cordas (feitas pelo teclado) de Carlos Trilha sublinha perfeitamente a desilusão cantada por Renato. Os acordes já se prestam a outros tipos de utilidade: a Legião sai do lugar comum do pop onde a harmonia consonante se basta. Aqui os climas se estabelecem nas texturas delicadas de Dado Villa Lobos ou na sequíssima levada de Bonfá. 

(3) 'Música de Trabalho' não tem estética semelhante nas canções compostas pela LU. O acompanhamento parece ser sampleado (e até certo ponto sem peso). Os arranjos de Renato, Dado e Bonfá primavam por rimar instrumentos e letra. Aqui as cordas só aparecem no refrão, apenas para docificar 
"E quando chega o fim do dia eu só penso em descansar e voltar pra casa pros seus braços". 
Alguns personagens citados (como a polícia) passaram batidos, talvez mediante a condição do cantor, audivelmente debilitado. Em tempos politicamente corretos e na inversão do padrão de valores éticos, talvez hoje Renato sofresse alguma espécie de sanção, tal qual aconteceu com 'Conexão Amazônica' ("Que País É Este?" - 1987) 

(4) 'Longe do Meu Lado' é a balada que não pegou. Não por falta de qualidade. Uma canção com o verso 
"A paixão quer sangue e corações arruinados e saudade é só mágoa por ter sido feito tanto estrago" 
não pode ser considerada ruim, mas infelizmente as rádios receberam como single a igualmente tristonha 'A Via Láctea'. 'Longe do Meu Lado' traz o dueto entre o baladeiro Marcelo Bonfá (também compositor do clássico 'Vento No Litoral' - V - 1991) e Renato Russo. Destaque absoluto para o arranjo de cordas, embora não creditados. 

(5) 'A Via Láctea' era a canção-confissão. Ainda hoje não consigo entender a coragem das rádios receberem uma música cujo um dos versos dizia 
"Hoje a tristeza não é passageira, hoje fiquei com febre a tarde inteira". 
Ela não é a melhor faixa do disco em nenhum quesito e parece que a palavra de Renato foi definitiva. Uma verdadeira carta de adeus. O baixo parece aqueles timbres que vem em teclados amadores e não duvido se a música não é mais "demo" do que propriamente uma faixa trabalhada em estúdio. 

(6) 'Música Ambiente' é o tipo do título que denota falta de tempo para achar um nome melhor. Para quem gosta de histórias curiosas isso acontece normalmente com os compositores. Eles escolhem nomes provisórios enquanto terminam seus corpos musicais. Em outras ocasiões a letra aparece primeiro e depois a música e a letra. 'Música

Ambiente' é uma canção pop da LU, com Marcelo Bonfá muito animado na possibilidade de 'duelar' com o rithm track e sua própria pulsação. Temos mais e mais teclados (existem alguns keybords que chamam este registro de warm strings) cortejando o wah-wah de Dado Villa Lobos. Aliás, este é o disco mais discreto do guitarrista, que também se encarregou da pré-produção, apoiado pelo incansável Carlos Trilha. O verso 
"E quando eu for embora, não não chore por mim" 
resume bem o clima do disco. 

(7) 'Aloha' é a configuração presente em todos os discos da banda. Alguns desabafos políticos 
("Assim é bem mais fácil nos controlar e mentir, mentir, mentir...") 
e um discurso messiânico (o termo midiático é o que verdadeiramente se encaixa no profile do cantor carioca) 
"Será que ninguém vê o caos em que vivemos / os jovens são tão jovens e fica tudo por isso mesmo". 
O disco em termos de som, até aqui, é uma delícia. É possível perceber todos os detalhes, a franzina guitarra de Dado, as cordas ''infinitas" de Trilha e o acompanhamento marcial de Bonfá. Canção perfeita. 

(8) 'Soul Parsifal' é uma parceria inédita entre Russo e a cantora Marisa Monte. Talvez seja clichê demais mas a forma mais classificável da canção e do arranjo é MPB. Embora muito bonita, é mais uma música que não recebeu oportunidade das rádios. 

(9) 'Dezesseis' foi o outro single do disco. A LU foi muito conhecida por fazer em suas canções trilhas sonoras para personagens inventados por Renato. Alguns liam tais criações como pequenas facetas da personalidade do compositor, associando esta canção a mais uma despedida. Não acho que seja o caso. Até porque durante todo o disco o autor já tem a oportunidade de cantar na primeira pessoa e assumir (como assumiu) todo o seu sofrimento. Além da explícita homenagem ao Fab Four cantando o verso 'Strawberry Fields Forever', dos Beatles. 

(10) 'Mil Pedaços' é aquilo que chama de música brega, mas é nela que a Legião se supera em termos de harmonia. Usa recursos tonais interessantes e tem do seu lado um dos melhores intérpretes da música nacional. Poderia ser uma moda de viola, uma música de Ana Carolina e até uma música de algum irmão latino; é uma música da LU com uma sofisticação diferente. 

"Como Gostar da Legião Urbana - e seu estilo - Em Apenas uma Canção". 
Aqui está a configuração master das canções da Legião desde As Quatro Estações (1989). Baixo, teclado, guitarra e violão. Um jeito U2/The Smiths de colocar a guitarra e muitas cordas (strings). Renato não se deu trabalho de mexer nos versos mais coloquiais como 
"Fumar unzinho e ouvir Coltrane" 
ou mesmo 
"Tem uma barata voadora no quarto das crianças e os monstrinhos estão gritando alucinados pra eles tudo é diversão". 
Além do enigmático verso: 
"Às vezes as coisas são difíceis minha amiga mas você sabe enfrentar a beleza dessa vida". 

(12) '1º de Julho' já havia sido gravada por Cássia Eller em seu disco homônimo (1994). Aquela versão tem Roberto Frejat nos violões. Na original - mais uma com cara de demo - Renato toca os violões acompanhado por seu fiel escudeiro Carlos Trilha no rhythm track (uma espécie de bateria eletrônica). Como a gravação é anterior a do disco, ouvimos Renato mais disposto e com sua força interpretativa calibrada. O título da canção veio do dia previsto para o nascimento de Chicão, filho da cantora, morta em "circunstâncias misteriosas" no ano de 2001. 

(13) 'Esperando por Mim' é para mim uma das mais emocionantes do disco. Os versos - tão confessionais quanto alguns de todo o disco - é de prantear tal a clareza e a sinceridade de letras como 
"Hoje a tarde foi um dia bom sai pra caminhar com meu pai conversamos sobre coisas da vida e tivemos um momento de paz". 
A guitarra de Dado chora notas iguais; escondida entre um muro de violões. A canção é muito bela e muito triste. Igualmente nesta dose. 

(14) 'Quando Você Voltar' é mais uma vez o lado brega da LU respirando. Talvez a canção mais 'fraca' do disco. No entanto, vale pelo caminho diferente que a banda parecia estar seguindo. É o arranjo sem arranjo. Já que aqui temos um acompanhamento puro em cima de uma harmonia e uma melodia. Colocaram a cifra na frente dos instrumentos e contaram: 1,2, 3 e foi. Há quem goste. 

(15) 'O Livro dos Dias' traz o ótimo arranjo de bateria de Marcelo Bonfá (até ele nesta produção acerta muito) para canção que encerra o disco. Temos a banda muito entrosada em uma música muito silenciosa na sua percepção primeira. Dado e suas pequenas notas com muita doçura e delicadeza, até na formação dos arpejos e dos harmônicos. A partir do verso 
"Não esconda a tristeza de mim"
o arranjo de cordas é quase apoteótico, os agudos tomam de sobressalto o canto de Renato e temos um encerramento muito digno de toda discografia da Legião Urbana: beleza, talento e tristeza. 

Conclusão 


A banda lançaria no ano seguinte as canções que sobraram deste disco que foi chamado "Uma Outra Estação" (1997). Na verdade, o álbum com desenhos de Marcelo Bonfá, trazia as canções que não entraram na "Tempestade ou O Livro Dos Dias", pois em um primeiro momento, era pretensão da banda lançá-lo em versão dupla. 

Um disco triste, longo, com vocal guia em quase todas as faixas, que por esses motivos tinha tudo para ser um disco ruim. Ao contrário disso, vemos um Renato Russo escrevendo letras quase etéreas, e canções de uma sensibilidade de fazer o mais forte sentir-se fraco. 

Recentemente a Legião Urbana re-lançou seus discos em vinil, incluindo até aqueles que haviam recebido o tratamento de compact disc, caso de "A Tempestade..." e "Uma Outra Estação".

A Deus, o Pai, toda glória.
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      E nem 1% religioso.

A SÃ DOUTRINA - A VERDADEIRA PROSPERIDADE

Uma pequena mas pertinente e relevante observação, feita por uma amada irmã, ao final de uma ministração que eu fiz na igreja, me serviu de inspiração para este artigo. Estava eu pensando nos ensinamentos que tive, nos livros que leio, e principalmente no que as pessoas ao meu redor pensam e acreditam. Uma parte que chamou minha atenção foi justamente Mateus 6:33: "Mas buscai primeiro o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas (grifo meu)."

Olhando para este versículo, muitas coisas vêm à cabeça, e é justamente aí que alguns confundem o real sentido da coisa. Já observei alguns pastores pregando isoladamente sobre ela - ou seja, ignorando completa o contexto. Já ouvi ministros de louvor falando desse verso, vejo também alguns irmãos falando justamente sobre isto, e pior, usando isso como muleta para muitas coisas, inclusive usando isto para culpar Deus de terem fracassado em algo. E faço aqui um mea culpa, pois eu mesmo já cometi esse sutil, contudo, gravíssimo erro teológico.

Texto e contexto eliminam os erros


O que muitas pessoas fazem, de forma errônea, é pegar apenas este versículo e tirar suas próprias conclusões, esquecendo-se de analisar todo o contexto que a palavra envolve; isso acaba dando um sentido distorcido ao que a palavra realmente quer dizer. 

Ao analisarmos este versículo individualmente, temos a sensação de que não teremos mais problemas ao buscarmos o reino de Deus, temos a sensação de que basta frequentar os cultos e orar (jejuar, fazer penitências, fazer votos, pagar promessas, acender velas...)  que os problemas se resolvem e tudo o que você almeja seja realizado.

Atualmente, as pessoas leem este versículo e mentalizam Deus como um "gênio da lâmpada de Aladim", onde basta fazer o pedido e o mesmo será realizado, mas definitivamente não são assim que as coisas funcionam. Para se ter uma ideia mais ampla da situação, vamos pegar os dois versículos acima, os versos 31 e 32:
"Portanto, não vos inquieteis, dizendo: 'Que havemos de comer?' ou: 'Que havemos de beber?' ou: 'Com que nos havemos de vestir?' (Pois a todas estas coisas os gentios procuram.) Porque vosso Pai celestial sabe que precisais de tudo isso (grifos meus)." 
Ao lermos os versos 31 e 32, nota-se que o 33 não diz "todas as coisas" (e/ou "demais coisas") no sentido de "tudo quanto é coisa". Nota-se que o 33 é um complemento do 32, dizendo "todas as [estas] coisas" referentes ao que foi citado (ou seja, vestes, comida e bebida). se lermos ainda os versos anteriores, veremos que nem tampouco o "todas as coisas" se refere a luxúria:
"E pelo que haveis de vestir, por que andais ansiosos? Olhai para os lírios do campo, como crescem; não trabalham nem fiam; contudo vos digo que nem mesmo Salomão em toda a sua glória se vestiu como um deles. Pois, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós, homens de pouca fé?" - Mateus 6.28-30 (grifos meus)
Percebe que se lê "nem mesmo Salomão em toda a sua glória se vestiu como um deles." Isso mostra claramente que Deus não está olhando para a marca da sua roupa, pois até onde sei, os lírios não possuem. Ou seja, Jesus está tratando do básico necessário para a sobrevivência: comer, beber e vestir!

"Todas as demais coisas" é acréscimo ao que não está escrito


Em Apocalipse 22:18,19: 
"Eu, a todo aquele que ouve as palavras da profecia deste livro, testifico: Se alguém lhes fizer qualquer acréscimo, Deus lhe acrescentará os flagelos escritos neste livro; e se alguém tirar qualquer cousa das palavras do livro desta profecia, Deus tirará a sua parte da árvore da vida, da cidade santa das cousas que se acham escritas neste livro".
E no livro do Deuteronômio: em Deuteronômio 4:2: 
"Nada acrescentareis à palavra que vos mando, nem diminuireis dela, para que guardeis os mandamentos do Senhor, vosso Deus, que eu vos mando."
Para finalizar este meu raciocínio, cito Mateus 6:25, que expressamente diz o que Deus enfatiza ao dizer "todas as coisas vos serão acrescentadas", o grande "dilema" aqui dissecado.
"Por isso vos digo: Não estejais ansiosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer, ou pelo que haveis de beber; nem, quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que o vestuário?" (grifos meus)

Conclusão


Passei boa parte da minha vida entendendo - e, pior, até ensinando! - este texto de maneira bem diferente do que realmente Jesus quis nos ensinar. 

É impressionante como, por alguma razão que eu mesmo desconheço, fazemos por tantas vezes uma leitura tão descuidada da Palavra de Deus. E tantas outras que costumamos omitir ou acrescentar por descuido, negligência ou conveniência... ou quem sabe até, por orgulho. 

Quantas vezes já ouvi mensagens, canções ou até mesmo palavras individuais com uma interpretação quase que unânime deste texto da seguinte maneira: "buscai primeiro o reino de Deus e todas as coisas (ou todas as demais coisas) vos serão acrescentadas"... Mas, como vimos, não é isso que o texto nos diz. 

Os pregadores do triunfalismo fácil, do evangelho das facilidades, da famigerada teologia da prosperidade, fazem disso o seu "slogam", vociferam dos púlpitos e das plataformas midiáticas esse chavão gospel e fazem seus seguidores, seus discípulos às multidões. Dessa forma, alimentam a megalomania e o culto às riquezas se esquecem completamente disso: 
"Não acumuleis para vós outros tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem destroem, e onde ladrões arrombam para roubar. Mas ajuntai para vós outros tesouros no céu, onde a traça nem a ferrugem podem destruir, e onde os ladrões não arrombam e roubam. Porque, onde estiver o teu tesouro, aí também estará o teu coração (Mateus 6:19-21)."
E disso: 
"De onde vêm as batalhas e os desentendimentos que há entre vós? De onde, senão das paixões que guerreiam dentro de vós. Cobiçais e nada tendes. Matais e invejais, porém não conseguis obter o que desejais; viveis a brigar e a promover contendas. Todavia, nada conquistais, porque não pedis. E quando pedis não recebeis, porquanto pedis com a motivação errada, simplesmente para esbanjardes em vossos prazeres" (Tiago 4:1-3).
Lendo cuidadosamente o contexto, vemos Jesus falando claramente de alimentos, vestes e do cuidado que Deus dispensa a todas as coisas criadas. Sua maravilhosa provisão vai desde os pardais, lírios do campo, até a coroa da sua criação: os homens. 

Daí a ordem: Busquem em primeiro e creio, em único lugar o seu Reino e todas essas coisas nos serão acrescentadas. Percebi como uma só palavra faz toda a diferença. Jesus não nos fala "todas as coisas" ou "todas as demais coisas", mas "todas essas coisas". A que coisas Jesus se refere? Obviamente ao que vinha falando anteriormente: vestes, alimento, enfim, sua maravilhosa provisão que nos faz prósperos e às quais o salmista Davi já aludia profeticamente:  "Fui jovem e já estou velho, e nunca vi um justo abandonado nem seus descendentes mendigando o pão" (Salmo 37:25).

Jesus nunca nos prometeu coisas do tipo carro, casa, casamento... Jesus nos prometeu cuidar de nós, e dar-nos aquilo que é necessário para sobrevivermos. Paulo estava absolutamente cônscio disso quando escreveu a Timóteo: "tendo, porém, sustento e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes" (1 Timóteo 6:8). 

É lamentável a barganha que se faz hoje com base nesse versículo tão simples e maravilhoso. Vemos uma espécie de "conselho" a descrentes e até aos novos na fé: "busquem o reino de Deus e todas as coisas serão acrescentadas" e é óbvio que quem assim fala, pensa nesta barganha: "faça isto e ganharás aquilo..." Não que Deus em seu absoluto e irrestrito poder não possa, caso queira, nos dar algo mais que isso. Ele pode e certamente o fará após fazer uma análise das nossas reais motivações. Em resumo e em suma, a essência é ter o Reino de Deus e a sua Justiça como o alvo único, principal.

Hoje compreendo que tal mensagem é inaceitável por fugir da essência divina. Não é do caráter de Deus barganhar com o homem. Ele nunca nos prometeu nada daquilo que realmente precisamos: comer, beber, vestir... 

Busquemos o Reino de Deus e a sua Justiça, jamais pensando em obter algo em troca. Penso que nossa função é: cuidar das coisas do Reino e cumprir sua Justiça, e Ele certamente cuidará de nós. E o que passar disso, sem dúvida, vem do maligno!

domingo, 28 de agosto de 2016

A SÃ DOUTRINA CRISTÃ: A REGENERAÇÃO


"E havia entre os fariseus um homem, chamado Nicodemos, príncipe dos judeus. Este foi ter de noite com Jesus, e disse-lhe: 'Rabi, bem sabemos que és Mestre, vindo de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não for com ele.' 
Jesus respondeu, e disse-lhe: 'Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.' Disse-lhe Nicodemos: 'Como pode um homem nascer, sendo velho? Pode, porventura, tornar a entrar no ventre de sua mãe, e nascer?' 
Jesus respondeu: 'Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo'" (João 3:1-7 [Versão Almeida Corrigida Fiel]). 
A palavra traduzida para "regeneração" acha-se somente duas vezes no Novo Testamento (Mateus 19:28; Tito 3:5). O primeiro texto refere-se ao novo estado de coisas, que terá a sua realidade na segunda vinda de Cristo. o outro refere-se à presente vida espiritual do crente, e é considerado como o primeiro dos meios pelos quais a misericórdia de Deus nos salva: 
  • (a) a lavagem da regeneração e 
  • (b) a renovação do Santo Espírito.
Querendo achar a distinção entre 'a' e 'b', devemos dizer que 'a' parece sugerir uma condição de vida em que o Espírito Santo opera a Sua obra de renovação – e, sendo assim, a palavra deverá significar em relação ao presente o que em Mateus 19:28 é significado em relação ao futuro. Palavras cognatas se encontram em várias passagens. Em João 1:12 e seguintes se diz que os crentes são nascidos de Deus – em João 3:3 há referência a um novo nascimento, e em 3:5 a ser o cristão "nascido da água e do Espírito"

Na 1ª epístola de João há vários sinais que caracterizam aquele que é nascido de Deus (2:293:9,10,145:1,4,18). outras frases paralelas são: "uma nova criação" (2 Coríntios 5:17), "passou da morte para a vida" (Jo 5:24) e "filhos de Deus" (1 Jo 3:10). O conceder Deus vida é um fato que se passa secreta e ocultamente entre Deus e a pessoa – mas o nascimento é visível a todos. Devemos, pois, cuidadosamente distinguir entre a implantação de uma vida espiritual por mercê de Deus, e o fato de vir à luz (nascimento) essa vida para observação humana. 

O termo "regeneração" em Tito 3:5, e as palavras de Jesus "quem vem das alturas" (Jo 3:31) descrevem a natividade do latim nativitas e não a geração, do latim, generatus. A alma novamente gerada é novamente nascida, mas renascimento (latim, renatus) pressupõe sempre nova geração (latim, regeneratio). 

O Espírito Santo, que concede vida pela Palavra (Tiago 1:18) é, também, agente divino do novo nascimento (Jo 3:3,5,6,8, nascido de novo, nascido do Espírito), porque é Ele que nos une à comunidade espiritual em que a nossa vida deve crescer (At 2:47: "...acrescentava-lhes o Senhor"). Considerando as coisas do lado terrestre, a alma novamente nascida entra na corporação visível dos cristãos pelo batismo (2:41), naquela esfera em que a sua vida que já existia, deve crescer e operar. 

Desta maneira, do lado espiritual, o Espírito Santo, e do lado temporal a ordenação do batismo, são considerados como introdutórios de uma nova vida com relação à obra espiritual e temporal da igreja. Estes dois modos podem ser coincidentes ou separados, porque o nascimento do Espírito não está ligado ao tempo do batismo. 

A regeneração, quer como nova geração, quer como novo nascimento, deve cuidadosamente distinguir-se da conversão. A regeneração é obra divina – a conversão é a correspondente resposta do homem a essa operação. É a volta da alma para Deus, como resultado do dom da vida. Converter-se alguém é, na verdade, voltar-se para Deus. 

Nascer de novo 


No texto de abertura acima, Jesus trata de uma das principais doutrinas cristãs: a da regeneração. Tal doutrina é fundamental à fé cristã. Ou seja, todo crente em Jesus deve estar consciente que, o novo nascimento - ou regeneração - foi o principal dentre os benefícios do calvário. 

O que significa "nascer de novo"? - Tito 3:5 


O novo nascimento significa o nascimento espiritual só realizado através de um encontro real com Jesus. Não é uma nova religião. Trata-se de uma recriação e transformação da pessoa realizada por Deus através do Espírito Santo (conforme Rm 12:1,2; Efésios 4:17-30). Ou seja, aquele que foi regenerado pelo Espírito Santo, reinicia sua trajetória, deixando para trás todos os feitos corruptos da velha criatura. 

Como nascer de novo? - Jo 3:5 


Só se nasce de novo aceitando Jesus Cristo como único e suficiente Senhor e Salvador. Só através d'Ele é possível ser regenerado. O novo nascimento tem lugar naquele verdadeiramente se arrepende dos seus pecados, os abandona e volta-se para Deus, colocando sua fé pessoal em Jesus Cristo e a sua obra redentora realizada na cruz do calvário (At 4:12). 

Os frutos do novo nascimento - 15:1-8 


A regeneração envolve a mudança, a transformação da velha vida de pecado em uma nova vida de total obediência a Jesus Cristo. O novo nascimento arranca as sementes e raízes que geravam na velha natureza os frutos malignos do pecado (ver Colossenses 3:5-7) e faz germinar a semente do fruto do espírito (3:8-10; Gálatas 5:22-26). Ou seja, aquele que realmente nasceu de novo, está liberto da escravidão do pecado e perde o desejo pelas coisas que não são agradáveis ao Senhor. Seu desejo passa a ser por uma disposição espiritual de obedecer ao Senhor e de seguir a direção do Espírito Santo rumo ao centro da vontade de Deus. 

Por que eu devo nascer de novo? 


A regeneração é necessária porque, à parte de Cristo, todo ser humano, pela sua natureza inerente e pecadora, é incapaz de obedecer a Deus e de agradá-lO. Quando renascemos em Cristo, tornamos-nos espirituais e, então, passamos a discernir as coisas do Espírito (1 Coríntios 2:14-16). Só nascendo de novo, teremos parte com Deus, através de Jesus Cristo (Jo 3:3). 

A regeneração e o pecado 


Quem é nascido de Deus não pode fazer do pecado uma prática habitual na sua vida. Ou seja, quem realmente é renascido em Cristo, não pode continuar vivendo conscientemente na prática do pecado (1 Jo 3:9). 

O novo nascimento resulta em vida espiritual, a qual leva a um relacionamento sempre presente com Deus. Não é possível nascer de novo e não ter desejo sincero e o esforço vitorioso de agradar a Deus e de evitar o mal, mediante uma profunda comunhão com Cristo e a dependência do Espírito Santo (Rm 8:1-14). 

Os regenerados devem conscientizar-se de que a carne (a natureza humana e seus desejos) é uma ameaça constante na sua vida, e que devem sempre estar mortificando as suas más obras por meio do Espírito Santo que neles habita. Enfim, o nascido de novo não está isento da possibilidade de vir a pecar, no entanto, ele não é um pecador contumaz (1 Jo 1:8-10). 

Nasci de novo. E agora? 


Para os nascidos de novo, os regenerados, Deus estabeleceu normas e princípios que devem não só ser observados, mas, principalmente, praticadas. Elas são fundamentais e imprescindíveis para alicerçar, edificar e consumar nossa relação com Ele. 

O novo nascimento faz com que convertamos nosso caminho - ou seja, mudemos de direção. Essa conversão faz com que nos tornemos participantes da natureza divina (2 Pedro 1:4). 

Através da regeneração recebemos a vida divina. Assim, participamos da natureza de Deus, para nos conformarmos com Ele e com sua santidade (Ef 4:24). Dessa forma, ao nascer de novo, devemos nos entregar ao Senhor completamente, para que Ele se revele a nós e nos manifeste Sua glória, fazendo-a fluir em nossa vida e através dela. 

Conclusão 

Princípios do novo nascimento - Jo 3:7b

  • a) Nascer de novo: expressa uma vida de plena comunhão com Deus - Jo 3:5; Tt 3:5.
  • b) Nascer de novo: expressa um rompimento com as práticas pecaminosas do passado - Ef 4:17-32; 5:1.
  • c) Nascer de novo: expressa o amor e a dedicação ao Senhor e à sua obra - Jo 9:4; 1 Jo 2:3-6.
  • d) Nascer de novo: faz com que o fruto do Espírito seja gerado em nosso espírito - Gl 5:22-25.

Características do novo nascimento 

  • Uma paixão incontrolável por Cristo - At 15:25,26
  • Um desejo incontrolável por testemunhar sobre Cristo - Jo 1:40-42
  • Um compromisso inquebrável com a santidade - 1 Jo 1:40-42. 
  • Uma compaixão pelas almas perdidas - At 3.

A Deus toda glória.
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